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Já foi justificado nesta tese que, durante a coleta, fui impulsionada a fazer intervenção e incorporar aos dados de pesquisa os textos produzidos pelos participantes a

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"O Pacto Nacional pelo Fortalecimento do Ensino Médio, instituído pela Portaria nº 1.140, de 22 de novembro de 2013, representa a articulação e a coordenação de ações e estratégias entre a União e os governos estaduais e distrital na formulação e implantação de políticas para elevar o padrão de qualidade do Ensino Médio brasileiro, em suas diferentes modalidades, orientado pela perspectiva de inclusão de todos que a ele tem direito."

Disponível em:

<http://pactoensinomedio.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=1:pacto- pelo-fortalecimento-do-ensino-medio&catid=8&Itemid=101>. Acesso em: 7 jan. 2016.

partir de propostas que eu mesma elaborei e os quais eu mesma corrigi. Intencionava analisar e refletir sobre o ensino e as intervenções das professoras regentes, porém tive que refletir sobre minha própria prática na condição de pesquisadora-professora naquela ocasião.

Conforme já mostrado anteriormente, as redações dos dois simulados que os alunos fizeram durante a coleta de dados para esta pesquisa foram avaliadas e corrigidas através de códigos, os quais eram de conhecimento dos alunos. Nesta pesquisa, em consonância com as definições de Serafini, avaliação e correção são consideradas duas atividades distintas.

A correção é o conjunto das intervenções que o professor faz na redação pondo em evidência os defeitos e os erros, com a finalidade de ajudar o aluno a identificar os seus pontos fracos e melhorar.

A avaliação é o julgamento que o professor dá ao texto, através de uma nota ou de um comentário verbal, com o objetivo de quantificar seu resultado em relação ao dos demais alunos e aos resultados anteriores do próprio aluno. (SERAFINI, 2004, p. 97, grifos da autora).

No caso da redação do ENEM, apesar de o edital falar de correção, só ocorre, de fato, avaliação, visto que nenhuma intervenção é feita no texto do candidato. O Anexo II (p. 142) traz o espelho de uma redação avaliada no ENEM 2014 e nela não há qualquer marcação feita pela banca avaliadora. Portanto, houve apenas avaliação, não correção conforme estou tratando nesta tese.

Sei que os códigos que usei são passíveis de críticas e, "pela própria natureza, limitados em termos de significação" (RUIZ, 2013, p. 157), visto que são ambíguos; cumulativos, como no caso do sinal V para indicar problemas de: ortografia, acentuação, crase, maiúsculas e minúsculas, concordância; mas eles têm a vantagem de desafiar o aluno a ler novamente o seu texto e a refletir sobre o que produziu, sobre os usos linguísticos em determinados contextos, isto é, considerar, pelo menos, a frase em que a palavra foi escrita. Esse exercício dará ao aluno mais condições de evitar os mesmos erros em outras produções. Como se verá na análise do questionário, com a reescrita, muitos alunos puderam perceber que tinham cometido "erros bobos" na primeira versão.

Segundo Serafini: "A catalogação dos erros e o uso sistemático das categorias na correção não são vantajosas só para o estudante; tornam o trabalho do professor mais mecânico." (2004, p. 109).

Uma crítica mais pertinente quanto à eficiência ou não da lista de códigos que foi usada nesta pesquisa poderia ser feita a partir da análise da reescrita feita pelos alunos da primeira versão corrigida, tarefa essa que fugiu ao escopo da presente pesquisa e, portanto,

não foi efetivada. Remeto o leitor interessado nesse assunto ao trabalho de Cristiane Bouzada (2014), que investigou os efeitos do feedback do professor na reescrita dos alunos.

Certamente, um professor-pesquisador de Língua Portuguesa, que tenha um olhar mais reflexivo sobre suas aulas e sobre a aprendizagem de seus alunos e que contemple atividades de produção de texto, com correção e reescrita, poderá, ao final de um ano letivo, obter resultados ilustrativos sobre o uso desse ou de quaisquer outros tipos de correção.

De qualquer modo, seja como for, "a correção de um texto desafia especialmente os professores novatos, que só se tranqüilizam depois de certo tempo de prática, quando adquirem um método próprio, um estilo de correção e, principalmente, parâmetros para avaliar novos textos" (SERAFINI, 2004, p. 107).

Interessada na problemática sobre como se corrige redações na escola, para categorizar as intervenções do professor no texto do aluno, Ruiz (2013) segue uma tipologia proposta por Serafini (2004), uma autora italiana. As correções, segundo esta, se encontram entre três tendências: indicativa, resolutiva e classificatória:

A correção indicativa consiste em marcar junto à margem as palavras, frases e períodos inteiros que apresentam erros ou são pouco claros. Nas correções desse tipo, o professor freqüentemente se limita à indicação do erro e altera muito pouco; há somente correções ocasionais, geralmente limitadas a erros localizados, como ortográficos e lexicais.

A correção resolutiva consiste em corrigir todos os erros, reescrevendo palavras, frases e períodos inteiros. O professor realiza uma delicada operação que requer tempo e empenho [...] (SERAFINI, 2004, p. 113). A terceira tendência de correção é a chamada classificatória: "Tal correção consiste na identificação não-ambígua dos erros através de uma classificação. Em alguns desses casos, o próprio professor sugere as modificações, mas é mais comum que ele proponha ao aluno que corrija sozinha o seu erro." (Ibid., p. 114).

Além dessas três categorias apontadas por Serafini, Ruiz (2013) discute uma quarta tendência, denominada correção textual-interativa, nas correções usadas pelos professores: "Trata-se de comentários mais longos do que os que se fazem na margem, razão pela qual são geralmente escritos em sequência ao texto do aluno [no espaço apelidado de 'pós-texto']. Tais comentários realizam-se na forma de pequenos 'bilhetes' [...]" (RUIZ, 2013, p. 47).

No caso do feedback que forneci aos discentes durante a fase de intervenção desta pesquisa, procurei utilizar, prioritariamente, a correção classificatória, visto que visava a reescrita dos alunos a partir das minhas intervenções. Em alguns casos, também me vali dos "bilhetes no pós-texto" para tratar de aspectos que demandavam mais atenção e/ou reflexão da

parte do aluno, como a insistente falta de "pingos nos is", de "perninhas nos as" em finais de palavras, por exemplo. Trata-se, pois, de uma instância mais dialógica entre professor e aluno. Ruiz argumenta que "não há dúvida: os 'bilhetes' seriam o ideal, sempre (tanto quanto um atendimento oral individualizado...). Não obstante, as condições de trabalho do professor só têm lhe permitido operar dentro do universo do possível" (RUIZ, 2013, p. 166). Felizmente, além do feedback individual, por escrito, em cada redação que o aluno fez para a pesquisa, houve uma discussão coletiva em sala de aula e também alguns casos de feedback individual e oral, situações em que conversei com um ou outro aluno, fora da sala de aula, sobre problemas individuais. Foi o caso, por exemplo, de A15, que escreveu textos grandes demais para o limite de 30 linhas.

A45 foi outro aluno com quem julguei relevante conversar fora de sala de aula sobre redação. Isso porque o participante tinha obtido boas notas nos dois simulados, mas apresentava problemas que demandavam mais atenção. Esse aluno teve desempenho de destaque também na redação do ENEM 2014, com nota 800, uma pontuação lhe possibilitou ingressar, no segundo semestre de 2015, pelo SISU, no Curso de Odontologia da UFJF.

4 ANÁLISE DOS DADOS

A idade dos 45 alunos que participaram desta pesquisa varia entre 17 anos (a idade da maioria) e 21 anos. São pessoas de classes sociais heterogêneas, em geral, filhos de: comerciantes, funcionários públicos e trabalhadores rurais. Desses, apenas 4 frequentaram um cursinho pré-ENEM ao mesmo tempo em que cursavam o 3º ano EM.

Por razões éticas, não identificarei os sujeitos da pesquisa com seus nomes reais. Usarei letras maiúsculas e algarismos arábicos para identificar: 1) as professoras - P1 (Professora 1) e P2 (Professora 2), 2) os alunos - A1 (Aluno 1), A2 (Aluno 2) etc. e 3) as redações - R1 (Redação 1), R2 (Redação 2) etc.

Já na primeira etapa da pesquisa de campo, quando apresentei o Termo de Assentimento, chamou-me a atenção o fato de que alguns alunos não quiseram participar da pesquisa por se sentirem intimidados, alegando que "não sabiam escrever, não sabiam fazer redação" e que sentiam vergonha por eu ler os textos que iriam escrever.

A18, que aceitou participar da pesquisa, também confessou que tinha muita dificuldade e demonstrou uma autoestima muito baixa em relação às suas habilidades de leitura e escrita. Esse participante disse que tinha muita dificuldade para entender o que lia e que achava não ser possível para ela escrever uma boa redação.

É interessante dizer que também as professoras participantes da pesquisa tinham um sentimento de intimidação, de dúvida, para trabalhar com a produção de textos em sala de aula. Em uma única aula observada, a professora P1 falou que estava muito insegura e nervosa, "com o coração saindo pela boca". Segundo ela, na aula seguinte, sem a minha presença na sala, o conteúdo fora abordado novamente, com mais tranquilidade. Isso demonstra como a presença de uma pesquisadora em sala de aula provocou alteração no comportamento da professora que estava sendo observada.

A professora P2, por sua vez, disse nunca ter tido uma redação sua, enquanto estudante, devidamente corrigida por um professor, com uma correção que apontasse erros e acertos na escrita do texto. Chamou-me a atenção o fato de ela ter pedido para fazer a redação junto com seus alunos no primeiro simulado e que eu corrigisse seu texto tal como os dos discentes.

Nessa etapa de observação, poucas foram as atividades de produção de texto solicitadas aos alunos, mas o fato mais preocupante é que, infelizmente, nenhuma das turmas pesquisadas recebeu o devido feedback da professora, ou seja, não recebeu seu texto de volta, corrigido. O processo de escrita se encerrou com a entrega dos textos às professoras.

Conforme se verá em 4.1.4 (p. 99), na entrevista realizada com as professoras, depois de encerrado o ano letivo, elas disseram que essa ausência de resposta aos alunos era justificada pela presença da pesquisadora, viso que havia o medo de “arriscar”, de “fazer errado” e confundir seus alunos.

De qualquer modo, vale destacar que um feedback positivo para o aprendiz é, com certeza, a principal motivação que ele pode receber para continuar produzindo outros textos. Deve haver elogios ao que for bom e uma orientação justa quanto ao que tiver que ser corrigido. É preciso também que o discente sinta que escreve para alguém ler, realmente, não apenas para cumprir uma obrigatoriedade da escola.