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Esquema temático da literatura

2 PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO: EXPANSÃO URBANA E CONFIGURAÇÃO SOCIOAMBIENTAL DE CAMPINA GRANDE

2.2 CAMPINA GRANDE: BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO

O município de Campina Grande (mapa 01)15 possui 407.472 habitantes16 e cerca de 593,026 km² (IBGE, 2017). Além disso, configura-se como uma Capital Regional do tipo B17 (REGIC, 2007, figura 01).

15 Campina Grande está situada nas imediações do rebordo Oriental do Planalto da Borborema (CORRÊA et al,

2010).

16 População estimada [2018] (IBGE, 2018). Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br. Acesso em: 19 de jan. de

2019.

Figura 01: Campina Grande – Capital Regional B.

Fonte: REGIC, 2007.

Ao observar a figura 01, pode-se afirmar que, na hierarquia urbana do país, a cidade configura-se como um polo regional18, abaixo da capital, João Pessoa (Capital Regional do tipo A), e acima de outras cidades do Nordeste, como Petrolina e Juazeiro (Capitais Regionais do tipo C). Campina Grande faz parte também de um dos arranjos populacionais do Nordeste, se destacando enquanto um centro regional tradicional não litorâneo (IBGE, 2015).

Atualmente, a cidade pode ser considerada como uma cidade média. Para Maia et al, as cidades médias19 são “centros urbanos que apresentam concentração e centralização econômicas expressivas em dada escala” (MAIA, et al, 2013, p. 31). No que diz respeito às reflexões sobre cidades médias no Brasil, Sposito (2007a, p. 242) expõe:

Observando o Brasil atual, encontramos cidades denominadas como médias que tiveram seus papéis ampliados e suas redes de relações se tornaram supra-regionais (entendida aqui a pequena região composta pelas cidades pequenas que ela polarizava e ainda polariza).

Nesse contexto, “Campina Grande [...] mantém uma centralidade bastante significativa na Região Nordeste” (MAIA et al, 2013, p. 31). Os anos de história dessa cidade e uma série de acontecimentos importantes contribuíram para que ela se tornasse um dos mais importantes

18 Ou seja, exerce influência no seu entorno imediato e em outros espaços interestaduais, como alguns municípios

de Pernambuco e do Rio Grande do Norte, por exemplo.

19 Outras contribuições valiosas, não apresentadas aqui, em virtude do espaço e dos objetivos do capítulo, a respeito

centros urbanos do interior do Nordeste20. A respeito do papel de Campina Grande perante as cidades médias brasileiras, Maia afirma:

No que se refere à sua situação no quadro das cidades médias brasileiras, desempenha importante papel regional: mantém forte relação com a área da qual está situada [...], mas também compõe o conjunto que representa no mercado nacional [...]. (MAIA et al, 2013, p. 31).

Devido à sua importância regional, Campina Grande foi e ainda é um centro urbano de forte atração populacional. Pode-se citar como exemplo o aumento populacional que houve entre as décadas de 1940 e 198021. Conforme afirma Silva (1987, p. 57), a população de Campina Grande “[...] passou de 47.446 habitantes em 1940, para 225.887 habitantes em 1980, representando um crescimento da ordem de 400% (conforme dados do IBGE)”. A autora complementa:

[...] Campina Grande desempenha um papel de centro de assentamento de migrantes de origem rural, tanto na condição de primeira pousada de um itinerário migratório mais prolongado quanto em caráter definitivo, na tentativa de fixação num potencial mercado urbano de trabalho (idem).

Esse fato se dava porque alguns dos migrantes permaneciam na cidade e outros seguiam para cidades maiores do Sudeste, a exemplo de São Paulo e do Rio de Janeiro. Segundo Lima (2010):

[...] é preciso destacar que nem todos os imigrantes que abandonavam o campo ou as pequenas cidades do interior se dirigiam para o Centro Sul. Até pelo apego a terra natal tão decantada em verso e prosa pelos poetas nordestinos, era comum, antes de partirem para o distante Sul, esses imigrantes tentarem a sorte nas cidades maiores dentro da própria região. Ou seja, muitos desses imigrantes ‘optavam’ por cidades onde houvesse alguma chance de conseguir emprego e, Campina Grande, sendo a cidade do Estado que apresentava maior ascensão econômica, torna-se pólo de atração para as pessoas que deixam o campo fugindo da seca ou deixam as cidades de menor porte onde as chances de emprego e de melhoria de vida são ínfimas” (LIMA, 2010, p. 49-50).

Observa-se, portanto, que mesmo com parte da população seguindo para outras regiões do país, as migrações do campo para a cidade bem como as intermunicipais dentro do próprio estado da Paraíba e estados vizinhos, constituíram fatores fundamentais para o aumento da

20 Ao longo do século XX a cidade passou por importantes processos, como a chegada do sistema ferroviário, a

reforma urbanística, a pujança industrial e comercial que significaram muito para a sua inserção e destaque no cenário nordestino e nacional. O que se lamenta é que toda essa importância da cidade não tenha servido a todos os seus moradores, mas apenas a parcelas especificas da sociedade.

21 A tendência do crescimento populacional seguiu pelas décadas posteriores. Assim, em comparação com a década

de 1950 que apresentava uma população urbana de 81.332 pessoas, a década de 2000 alcançou uma população de 367.209 pessoas. No que se refere às taxas de urbanização de Campina Grande, a década de 1950 apresentava uma porcentagem de urbanização de 46,95%, enquanto na década de 2000 essa taxa era de 95,33% (IBGE apud COSTA, 2013).

população e crescimento da cidade de Campina Grande. Entretanto, nem sempre as cidades que recebiam essa população do campo, em busca de melhor qualidade de vida, dispunham de condições suficientes para recebê-la, ocasionando, assim, diversos tipos de problemas, tendo em vista que as desigualdades já eram intensas.

Faz-se mister expor que os problemas existentes na cidade de Campina Grande também se relacionavam intensamente aos processos que se davam à escala do país, a exemplo da crise econômica instaurada na década de 1980, com indícios já no final da década de 1970. Reforçando tal afirmação tem-se que,

[...] a partir de 1979, os reflexos da chamada “Crise do Milagre” (que, entre outros fatores, gerou: profunda redução dos atrativos incentivos fiscais aos investimentos do Nordeste; redução dos financiamentos bancários e aumentos exorbitantes nas taxas de juros bancários; aceleramento do processo inflacionário e, consequentemente, aumento constante dos preços das matérias-primas, redução do capital de giro para repor estoque, etc.) se fizesse sentir no setor industrial de Campina Grande, com o início de desaceleração da sua economia, que culminou com o fechamento de importantes indústrias locais e de outras regiões, instaladas no parque industrial campinense (SILVA, 1987, p. 53, 57).

As dificuldades econômicas pelas quais o país passava ecoaram na cidade de Campina Grande que já aparecia, nessa época, no cenário regional como importante e tradicional entreposto comercial e polo industrial na Região Nordeste. As indústrias da cidade22 sofreram impactos no momento em que a economia do país se tornava fragilizada. Muitas dessas indústrias tiveram seu fechamento decretado, a partir da inversão de prioridades do governo militar que passou a investir pesadamente nas capitais em detrimento das demais cidades brasileiras, inclusive Campina Grande na qual anos de “progresso” foram minados.

Aliado a isso ocorre que muitos dos benefícios, anteriormente trazidos pela Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) para a cidade, foram encerrados, contribuindo também para o fechamento dessas indústrias23. E, aos fortes problemas sociais já existentes, unem-se o crescente desemprego na cidade, a pobreza e a periferização24 dos estratos mais pobres da sociedade. No que se refere ao conceito de pobreza, Demo (1993, p. 199) discorre:

22 Destaca-se que “O período (1940-60) foi marcado por transformações espaciais significativas para Campina

Grande, que registrou grande índice de crescimento e viu a formação de duas zonas industriais nos eixos rodoviários que cortam a cidade – BR 230 e BR 104 - (SÁ, 2000, p. 182). Eram indústrias relacionadas ao beneficiamento de matérias-primas regionais, tais como, têxteis, alimentícias e curtumes que se localizaram nas proximidades do açude Velho e do açude de Bodocongó” (COSTA, 2003, p. 43).

23 Para mais detalhamento sobre o tema, consultar Lima (2010) e Costa (2003).

24 Vasconcelos, a respeito da terminologia “periferização”, afirma: “A noção de periferização no Brasil está

substituindo a de marginalização espacial. Essa noção é muito próxima da de marginalização, mas com um componente espacial mais forte” (VASCONCELOS, 2013, p. 31, grifo do autor).

Basta aceitar que pobreza é conceito relativo, ou seja, não se reduz a parâmetros fixos lineares, sobretudo apenas materiais, para entender que, em qualquer sociedade, haverá pobres, pelo menos no sentido de gente que tem acesso menor aos bens materiais produzido na respectiva sociedade.

Embora haja vários estudos sobre o tema, sobretudo de órgão oficiais, a exemplo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), que trazem dados quantitativos a respeito do tema, concorda-se com o autor quando o mesmo afirma que não existem parâmetros fixos para definição de pobreza, bem como a pobreza não se refere apenas aos bens materiais ou a ausência deles, mas pode envolver inúmeras outras variáveis. Uma outra referência que também trata sobre a pobreza é Rocha (2006, p. 09) que afirma:

Pobreza é um fenômeno complexo, podendo ser definido de forma genérica como a situação na qual as necessidades não são atendidas de forma adequada. [...] Em última instância, ser pobre significa não dispor dos meios para operar adequadamente no grupo social em que se vive.

Ainda que a autora afirme ser uma abordagem genérica, essa perspectiva é interessante no sentido de apontar que a ausência de pobreza seria o atendimento adequado das necessidades. Isso significa dizer que não basta ter uma necessidade atendida, como ter uma casa, por exemplo, mas essa necessidade tem que ser atendida de maneira adequada. Assim, retomando o exemplo da moradia, as pessoas necessitam de um espaço onde possam viver de maneira digna, tendo todas as suas necessidades atendidas.

Para Demo e Rocha, pobreza e desigualdade são conceitos e realidades interdependentes. A primeira não pode ser entendida sem a compreensão da segunda, que estaria para Demo (1993, p. 201) “[...] na raiz da pobreza, porque os recursos não chegam aos pobres”. Relacionando a discussão da pobreza ao espaço urbano, Santos (2009, p. 10) afirma:

A cidade em si, como relação social e como materialidade, torna-se criadora da pobreza, tanto pelo modelo socioeconômico, de que é o suporte, como por sua estrutura física, que faz dos habitantes das periferias (e dos cortiços) pessoas ainda mais pobres. A pobreza não é apenas o fato do modelo socioeconômico vigente, mas, também do modelo espacial.

Além de trazer a discussão para o urbano, Santos aborda a importância de considerar a pobreza também como algo que se faz presente no espaço, como se tem visto historicamente na produção do espaço urbano brasileiro, uma vez que “[...] sobretudo, nos períodos mais recentes, o processo brasileiro de urbanização revela uma crescente associação com o da pobreza, cujo lócus passa a ser, cada vez mais a cidade, sobretudo a grande cidade” (idem).

É importante fazer uma observação: a partir das décadas de 1970, 1980 e 1990 sobre as quais vem se falando ocorreu um processo mais intenso de empobrecimento e periferização

de alguns segmentos da sociedade, impulsionado pelos engodos socioeconômicos. Para Maricato (2003b, p. 152):

A extensão das periferias urbanas (a partir dos anos de 1980 as periferias crescem mais do que os núcleos ou municípios centrais nas metrópoles) tem sua expressão mais concreta na segregação espacial ou ambiental configurando imensas regiões nas quais a pobreza é homogeneamente disseminada. Pela primeira vez na história do país registram-se extensas áreas de concentração de pobreza, a qual se apresentava relativamente esparsa nas zonas rurais antes do processo de urbanização. A alta densidade de ocupação do solo e a exclusão social representam uma situação inédita.

Paralelamente a esse processo de aumento e consolidação da pobreza, conforme será visto adiante a respeito de Campina Grande, podia se observar a produção de um espaço urbano que servia aos interesses de outros estratos e agentes sociais, a exemplo do setor imobiliário. Nessa cidade, por exemplo, da década de 1970 em diante,

A classe mais abastada começou a constituir moradias especiais – os condomínios, localizados nas periferias da cidade – em busca de melhor infra-estrutura (pouca poluição do ar, poluição sonora, mais espaços verdes). Essas construções removem a população mais pobre para as áreas que apresentam, por vezes, mínimas condições de sobrevivência, tais como as várzeas de rios e/ou riachos, encostas sujeitas a deslizamentos, enfim, áreas de difícil acesso (SÁ, 2000, p. 186).

Já naquele período a apropriação do espaço urbano se dava de maneira fragmentada e contraditória, na qual as classes de renda mais alta buscavam as exclusividades e amenidades, através de moradias em condomínios fechados de luxo, ficando os mais pobres com a parcela do espaço urbano cujas áreas eram de difícil acesso e os problemas socioambientais uma característica inerente.

Em meio ao processo de modernização e urbanização da cidade de Campina Grande se pode perceber a produção de um espaço urbano demasiadamente desigual, ou seja, “A experiência mostra que a urbanização de Campina Grande é socialmente seletiva e economicamente concentrada” (SILVA, 1987, p.63). Todo esse processo resultou, entre outros fatos, em um crescimento da demanda por moradia, além do crescimento de áreas autoconstruídas da cidade, caracterizadas por habitações e infraestrutura precárias, bem como serviços escassos.

Outro problema que ganhou notoriedade em cidades como Campina Grande, a partir da urbanização desigual do país, foi a exploração e degradação da natureza. Assim, aliados aos engodos relacionados à falta de habitação ou às suas condições precárias, surgiram ou agravaram-se alguns problemas relacionados à apropriação da natureza. Considera-se que esse processo deu origem a inúmeros espaços cujas vulnerabilidades passaram a fazer parte do seu

contexto, intensificando as possibilidades de ocorrência dos chamados desastres nessas áreas. Tiveram origem e permaneceram, assim, as denominadas “áreas de risco”.

A priori, pode-se afirmar que as áreas de risco são aqueles espaços vulneráveis à ocorrência de algum tipo de desastre, levando em considerações seus aspectos físicos e socias, conforme será abordado no capítulo 5 desse estudo. Em Campina Grande essas áreas são alvo de enchentes e inundações quando da ocorrência de fortes chuvas, o que tem causado inúmeros transtornos de vários tipos nesses espaços e às pessoas.

Visando entender melhor essa dinâmica e a maneira como a cidade de Campina Grande cresceu e teve seus espaços apropriados, a seguir será feita uma apresentação do crescimento horizontal da sua malha urbana ao longo dos anos, tendo como ponto de partida a análise do seu sítio natural.

2.3 ANÁLISE SOBRE A EXPANSÃO URBANA DE CAMPINA GRANDE E SUA