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O surgimento do conceito de capital intelectual remonta a uma análise de Bourdieu, no século passado, quando criou o conceito de capital cultural, relacionando-o a todo o tipo de produção cultural ou intelectual decorrente de conhecimentos, técnicas e habilidades possuídos individualmente ou coletivamente por pessoas. Nesta tese, o conceito de capital intelectual de Stewart (“constitui a matéria intelectual – conhecimento, informação, propriedade intelectual, experiência que pode ser utilizada para gerar riqueza”) se correlaciona ao capital cultural. De acordo com Bourdieu (1979; 2002) o capital cultural pode ter os estados do tipo incorporado, do tipo objetivo e do institucionalizado.

No estado incorporado indivíduos acumulam capital cultural por meio de investimento pessoal, num trabalho de inculcação. Bourdieu (2002, p.197) comenta:

As sociedades desprovidas de escrita – circunstância que permite conservar e acumular, sob forma objetivada, os recursos culturais herdados do passado - e do sistema de ensino que dota os agentes de atitudes e disposições indispensáveis para terem a possibilidade de se reapropriarem simbolicamente deles só podem conservar seus recursos culturais no estado incorporado. Na seqüência, elas não podem assegurar a perpetuação dos recursos culturais destinados a desaparecer ao mesmo tempo em que os agentes seus portadores, senão mediante um trabalho de inculcação, que, conforme é demonstrado pelo caso dos bardos, pode ser tão longo como o tempo de utilização.

Capital cultural incorporado ou, conforme Stewart (1998, xvi) “ativos intelectuais” refere-se a técnicas diferenciadas aprendidas. E continua analisando a origem e a atualidade do capital cultural incorporado (1998, xvi):

A guilda medieval, uma das primeiras formas de organização/firma, representa uma forma de gerenciar os ativos do conhecimento – quando o conhecimento é escasso, o armazenamos, atribuindo-lhe uma aura de magia e mistério e barrando o santuário interno a todos, exceto alguns iniciantes. É a forma de gerenciar o conhecimento que sobrevive hoje em guildas e sacerdócios contemporâneos, como

a Medicina e o Direito, o Colégio dos Cardiais e, obviamente, o departamento de serviços de informática de uma organização.

Trabalhadores de todas as áreas, sejam braçais ou intelectuais – utilizando mais ou menos tempo – por meio do processo descrito por Bourdieu como inculcação (processo de internalização da técnica/do conhecimento) desenvolvem as técnicas específicas de sua profissão/área de trabalho. Seja ele herdado ou adquirido, é reconhecido como competência especializada. O valor de troca desse capital está ligada a sua necessidade mercadológica. Assim, o capital incorporado como habilidade profissional específica (digitação, por exemplo) tem um baixo valor de troca; enquanto programação de computadores (em linguagens novas e procuradas), dada sua baixa oferta, tem alto valor de troca. O estado objetivo do capital cultural refere-se a bens culturais. Conforme Bourdieu (2002, p.197) :

Da mesma forma que a riqueza econômica só pode funcionar como capital na relação com um aparelho econômico, assim também a competência cultural, sob todas as suas formas, só se constitui enquanto capital cultural nas relações objetivas que se estabelecem entre o sistema econômico de produção e o sistema de produção dos produtores (constituído, por sua vez, pela relação entre o sistema escolar e a família).

A objetivação do capital cultural, de acordo com Bourdieu, acontece em livros, filmes, peças teatrais, representação simbólica – material – do capital cultural incorporado. Ou como descreve Stewart (1998, xiii): “patentes e direitos autorais (…) o capital intelectual é intangível. É o conhecimento da força de trabalho”. E relacionando ao valor do mesmo para as organizações/firmas, continua (1998, xiii): “O capital intelectual é a soma do conhecimento de todos em uma empresa, o que lhe proporciona vantagem competitiva”. Ainda há mais uma forma de capital cultural para Bourdieu: o capital cultural no estado institucional. O estado institucional do capital cultural é definido pelas qualificações acadêmicas. Ou como Bourdieu ( 2002, p.197 e 198) explica:

A objetivação operada pelo diploma e, mais geralmente, por todas as formas de

poderes (credentials), no sentido de “prova escrita de qualificação que confere crédito e autoridade”, é inseparável daquela que garante o direito ao definir

posições permanentes independentes dos indivíduos biológicos reivindicados por elas e suscetíveis de serem ocupadas por agentes biologicamente diferentes, embora intercambiáveis, em relação aos diplomas que deverão possuir. Desde então, as relações de poder e dependência deixam de se estabelecer diretamente entre pessoas, mas instauram-se, na própria objetividade, entre instituições, isto é, entre diplomas e cargos – garantidos e defindos, respectivamente, do ponto de vista social; e, através deles, entre os mecanismos sociais que produzem e garantem o valor social dos diplomas e cargos, por um lado e, por outro, a distribuição desses atributos sociais entre os indivíduos biológicos.

O autor continua demonstrando a relação do capital cultural institucionalizado com o capital econômico (Bourdieu, 2002, p.197): “os diplomas escolares são para o capital cultural o que a moeda é para o capital econômico”. Tendo assim, o seu possuidor acesso diferenciado ao mercado de trabalho e um salário correspondente à sua distinção.

Stewart (1998, xiv) relata:

Estamos deixando para trás um mundo econômico cujas principais fontes de riqueza eram físicas. O que comprávamos e vendíamos eram, realmente, coisas; podíamos tocá-las, cheirá-las, chutar seus pneus, bater suas portas ou ouvir um som agradável. A terra, recursos naturais como petróleo, minério e energia, e o trabalho humano e mecânico eram os ingredientes a partir dos quais se gerava riqueza. As organizações de negócios dessa era eram planejadas para atrair capital – capital econômico – a fim de desenvolver e gerenciar essas fontes de riqueza (…) Nessa nova era, a riqueza é produto do conhecimento (…) Hoje os ativos capitais necessários à criação da riqueza não são terra nem trabalho físico, tampouco ferramentas mecânicas e fábricas: ao contrário são os ativos baseados no conhecimento.

Conforme Stewart, o capital intelectual – o trabalho do conhecimento, assim como o conhecimento em si – é um produto cooperativo, propriedade conjunta, o indivíduo e o grupo que compartilhadamente produziu o capital são detentores dele; portanto, o grupo media sua avaliação econômica junto à organização. O capital intelectual – um capital de fundamentação social – é fonte de riqueza tanto para indivíduos como para organizações; e uma propriedade conjunta, quando realizado integradamente para a organização. Com base nessas novas realidades, o capital intelectual passa a ser um fundamento da organização capitalista atual ou pós-industrial. Há outro fator destacável nas bases da organização capitalista atual?