• Nenhum resultado encontrado

CARACTERIZAÇÃO DA COMUNIDADE: A GÊNESE DO TERRITÓRIO VILA

3. DO DELINEAMENTO DA PESQUISA À TERRITORIALIZAÇÃO DO BAIRRO

3.5 CARACTERIZAÇÃO DA COMUNIDADE: A GÊNESE DO TERRITÓRIO VILA

No ano de 1978, em todo o país se fazia campanha para eleição de deputados estaduais e federais. O arquiteto Altair Guidi fora eleito Prefeito de Criciúma em 1977, com mandato até 1983, pela então Aliança Renovadora Nacional, ARENA.

Segundo depoimento dos moradores mais antigos do bairro, no ano de 1978, com as campanhas eleitorais, o chefe do poder executivo, para promover o candidato que apoiava para deputado estadual, Aristides Bolan, doou lotes para cidadãos que não tinham condições econômicas de adquirir os terrenos, numa relação clientelista.

Em depoimento, João Alves (2000) assim relata o processo de ocupação, apropriação do espaço e formação do território da Vila Manaus:

“No ano de 1978 era muito fácil se apossar de um lote na Vila Manaus, isso antes das eleições para deputado, vinham mudanças de todos os cantos, até de outras cidades, mas... depois de 15 de novembro de 1978, quando terminaram as eleições, as ameaças por parte do prefeito, então Sr. Altair Guidi (ARENA) começaram. Já não bastava a agonia da falta de infra- estrutura, começou a existir o medo, o terror de ter que chegar em casa após o trabalho e ver tudo no chão.”

“Até um capanga chamado Valmor Martinhago, contratado pelo Sr. Prefeito foi encarregado de impedir novas invasões e expulsar os que aqui já estavam, mas o povo era persistente...” (ALVES, 2000, depoimento pessoal).

A área localizava-se entre os bairros Cidade Mineira e Santa Luzia, destinada originalmente para a instalação do Distrito Industrial. Apesar de ter colocado pessoas de confiança para efetuar a relação clientelista-fisiológica de troca de terrenos por votos no processo eleitoral, a notícia da doação se espalhou pela região e de todos os cantos foram aparecendo pessoas querendo um lote para fixar-se e colocar seu barraco. Uns ganhavam, outros compravam, mas a maioria apossou-se. Num período de 03 (três) meses, já havia aproximadamente uns 300 (trezentos) barracos instalados no local. (NIETTO, s/d). (FIGURA 11).

FIGURA 11: Representação cartográfica de ruas e pontos de referência da ocupação do território do Bairro Vila Manaus, Criciúma, SC. Elaborado pelo movimento de ocupação, 1980. Legenda: “grupo” corresponde à Escola Marcilio Dias de San Thiago. A Igreja da Santa Luzia situa-se a Sul do bairro. As ruas 1 e 9 compreendem ao atual limite Leste do bairro e correspondem às Avenidas Assembléia de Deus e Av. Boa Vista. A rua 15 corresponde à Av. Catarinense que é central e a rua 26, à Av. Montenegro.

A Vila Manaus está localizada na região sul, na periferia urbana de Criciúma, próxima às regiões mineradas. A área foi ocupada, inicialmente, por cerca de 600 famílias de sem-teto, trabalhadores pobres de Criciúma e migrantes de outras regiões. Durante o governo Guidi (1977-1983), esse número subiu para 1.200 famílias, que moravam em casebres e barracos construídos de forma irregular.

Com o passar do tempo novos moradores foram se instalando nos lotes. Sem nenhuma infra-estrutura, sem água, nem luz e nenhuma demarcação a comunidade foi crescendo e começava a ser chamada de Vila Manaus.

Quanto à procedência dos moradores do Bairro Vila Manaus, em levantamento efetuado pelo Departamento de Habitação, da Secretaria de Habitação, Desenvolvimento Social e Comunitário da Prefeitura Municipal de Criciúma, em maio de 1994, para caracterizar a situação sócio-econômica dos requerentes de escrituras, encontra-se os seguintes resultados:

Tabela 2: Naturalidade dos requerentes para escrituras de lotes do bairro Vila Manaus, Criciúma-SC. Maio de 1994.

NATURALIDADE Percentual (%)

Do município 34,0

Outros Municípios do Estado 55,0

Outros Estados 11,0

TOTAL 100,0

Fonte: Prefeitura Municipal de Criciúma, Departamento de Habitação. Maio de 1994.

Em relação à procedência, mais da metade dos entrevistados não eram naturais do município de Criciúma: para 55% a naturalidade é de municípios vizinhos, tais como: Jaguaruna, Araranguá, Meleiro, Bom Jardim da Serra, Orleans, Sombrio.

FIGURA 12: Origem dos moradores da Vila Manaus – Criciúma, SC.

Fonte: Prefeitura Municipal de Criciúma, Departamento de Habitação. Maio de 1994.

Esta situação também é relatada por CAROLA (1993, p. 27) com os moradores do bairro Corda Bamba, onde 67 % das famílias eram oriundas de outras cidades, em sua maior parte dos municípios que compõem a região sul do Estado.

A maioria dos entrevistados pelo Departamento de Habitação na Vila Manaus, residiam em Criciúma há mais de dez anos. O fato de mais da metade da população ter vindo de outras localidades e terem se fixado em Criciúma se devia à perspectiva de melhoria das condições de vida e à procura por empregos.

O aumento da população na década de 80, em Criciúma, segundo NUERBERG e MELLER (1984) eram decorrentes do êxodo rural do próprio município, do crescimento acentuado de indústrias cerâmicas e do vestuário, que exerceram forte atração para o espaço urbano em formação.

Por ser considerada uma cidade pólo, um centro econômico em expansão na região sul de Santa Catarina, Criciúma alimentava a expectativa de dias melhores para muitos migrantes desafortunados. Criava-se então a ilusão perante uma realidade desconhecida. No

34,00%

55,00% 11,00%

Do município

Outros Municípios do Estado Outros Estados

entanto, ao cair do véu da esperança por melhores condições de vida, agrava-se a situação. Os que chegavam a Criciúma se deparavam muitas vezes com a fome, a miséria e o desespero.

Uma nova categoria de atores sociais, os despossuídos, os excluídos, os rejeitados pelo modelo econômico vigente na cidade, formavam um novo território, de miséria e abandono na periferia, no entorno poluído, rejeitado e desumano.

Estes migrantes oriundos da zona rural e dos municípios da região carbonífera do sul do Estado estabeleceram-se na periferia de Criciúma, criando bolsões de “miséria” e favelas sem infra-estrutura e higiene. No local de origem dos chefes de família predominavam atividades econômicas extrativistas em declínio (carvão e fluorita) e agrícolas com caráter de subsistência, sendo os principais fatores de abandono do local de origem de ordem econômica, habitacional e familiar. (NUERBERG e MELLER, 1984, p. 32).

A leitura aqui apresentada da formação do território da Vila Manaus se contrapõe à chamada história oficial porque constrói um quadro analítico que procura apreender aspectos dos modos de vida daqueles que não tiveram suas posições e interesses explicitados por esta mesma história e, ainda, foram excluídos do acesso à cidade e, por isso, encontraram, na mobilização e na organização comunitária, uma forma de se contrapor aos interesses hegemônicos.

4 A REFUNCIONALIZAÇÃO DA VILA MANAUS E OS MOVIMENTOS SOCIAIS