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2. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2.1. Caracterização do peão e sua inserção na rede pedonal

Segundo Adams (2007), citado por Margarida M. M. Coelho, na dissertação para obtenção de grau de mestre em Engenharia Civil, março de 2011, ISEL, o peão pode ser descrito como “o maior

Pitágoras do mundo, preferindo sempre hipotenusa”, referência ao facto de que o peão, na maior

parte das vezes opta pelo caminho mais curto e linear, a diagonal, indiferente se este é o caminho mais indicado e seguro.

Já Daros (2000) afirma que o pedestre possui características dinâmicas e estáticas mais uniformes do que os veículos automotores, porém a engenharia em sua maioria procura atender as necessidades dos veículos motorizados oferecendo-lhes condições de infraestrutura a fim de garantir a circulação dos automóveis. Por outro lado essa mesma preocupação é reduzida quando trata-se da circulação pedonal, então o peão se depara com diversas situações adversas e proibitivas à sua mobilidade.

O peão possui grande flexibilidade em suas deslocações devido à liberdade de movimentos que o mesmo consegue executar. Essa flexibilidade pode ser vista como uma potencialidade desta tipologia de mobilidade, porém no caso dos idosos essa diversidade de movimentos é reduzida devida a limitações físicas e sociais, e o que poderia ser considerado como uma potencialidade, torna-se um agravante ao seu comportamento e desempenho caso a rede pedonal e o sistema viário não ofereçam qualidade suficiente à esse grupo de pessoas.

A imprevisibilidade de reações e as diferenças de movimentos que o pedestre pode executar durante um percurso são, segundo o Projecto Mobilidade Sustentável da Agência Portuguesa do Ambiente, uma das principais causas dos problemas de segurança rodoviária. Dessa forma o desenho urbano do ambiente rodoviário deve ser feito de modo que seja garantida a segurança para todos os diferentes grupos de peão, incluindo os idosos.

Daros ainda afirma que “Pedestre somos todos nós que andamos a pé no espaço público. Também é pedestre o portador de deficiência física. Ser pedestre é uma condição natural do ser humano. Com o objetivo de poupar sua energia muscular e de dispor de maior conforto e mobilidade, especialmente em percursos longos, o homem criou e desenvolveu tipos de veículos e de sistemas de tração. A partir daí, surgiram duas novas condições: a de passageiro e a de condutor. Estas

11 últimas, porém, não são naturais, e sim criadas pelo homem. Somos pedestres. Estamos

passageiros e condutores” (Daros, 2000). Por todos sermos pedestres, em algum momento da vida,

está a importância de uma rede pedonal com infraestrutura suficiente, pois somente ela dentre as demais categorias de mobilidade tem a capacidade de atender à todos.

Jan Gehl ainda menciona no seu livro Cidade para as pessoas (2014), que o homem foi criado para caminhar em todos os eventos da vida, sejam eles grandes ou pequenos. Os eventos se desdobram diante de nós quando estamos caminhando. Caminhar sempre foi o início de partida desde os primórdios da humanidade e continua sendo essencial no cotidiano dos homens, porque há muito mais no caminhar do que o simples movimento de andar.

O guião da Agência de Transportes neozelandês (Pedestrian planning and design guide, 2009) caracteriza o peão quanto ao espaço ocupado. Para o guião o espaço mínimo de passagem sem barreiras de um passeio pedonal é de 1,00 metro, essa largura mínima do passeio aplica-se à aquele que utiliza muletas como suporte para a sua deslocação ou qualquer outro equipamento de auxílio como bengalas e andadores, o mesmo acontece para o peão que carrega consigo um carrinho de bebês. Quanto a passagem de pessoas portadoras de cadeiras de rodas o espaço mínimo, livre de barreiras e obstáculos, estipulado pelo guião é de um passeio com largura mínima de 1,20 metro para a circulação de apenas um cadeirante e de 1,80 metro para um passeio que comporte a circulação de dois cadeirantes que podem transitar em sentidos opostos ou até mesmo em um único sentido, ver Figura 2.1. Já para passeios locados em zonas que tenham um volume maior de transeuntes o espaço mínimo estipulado, livre de obstáculos, é de 2,00 metros segundo a Agência de Transportes.

Figura 2.1 – Características dos peões, espaço ocupado - Pedestrian planning and design guide,

12 A velocidade é também uma característica importante para a análise de uma caminhada e é considerada como condicionante no desenvolvimento de passeios pedonais, pois esse é um dos fatores que determinam a possibilidade de ampliar a relação entre o indivíduo e entorno. A perceção humana do espaço varia de acordo com a sua velocidade. Em um percurso percorrido por um condutor em um automóvel, aproximadamente 60km/h, é obrigatório que a escala seja remota à grandes áreas, grandes placas e nenhum detalhe, fazendo com que se perca a oportunidade de observar detalhes e pessoas. Já um percurso percorrido a pé, a velocidade de aproximadamente 5km/h, permite o desdobramento de espaços pequenos, placas pequenas, muitos detalhes e a aproximação entre pessoas, proporcionando a identificação de espaços com escala reduzida, edifícios, detalhes, rostos e atividades que contribuem para uma experiência sensorial rica e intensa (GEHL, 2014).

Segundo um estudo de Cahier TEA (1995) a velocidade média do pedestre é medida consoante a dois fatores, a velocidade do peão versus a inclinação da via tanto na subida quanto na descida. Em uma descida a velocidade média do peão é considerada a um valor de um pouco menos de 4km/h à uma inclinação de 40%, chegando a velocidade máxima de 5km/h e, de 4 km/h à uma inclinação de 0% da via com velocidade máxima de um pouco mais de 5km/h. Já na subida esses valores alteram-se, sendo que é considerado uma velocidade média de 4 km/h à uma inclinação de 0% chegando a uma máxima de um pouco mais do que 5km/h e, quanto maior a inclinação da via durante uma subida, gradativamente reduz-se a velocidade média e máxima do peão chegando a média de 2km/h e máxima de quase 3km/h à uma inclinação aproximada de 40%. Ver Gráfico 2.1.

Gráfico 2.1 – Características dos peões, velocidade – Cahier TEA, 1995 citado pela Brochura de

13 A rede pedonal tem a função de garantir a ligação entre as habitações e o comércio, equipamentos, escolas, transportes urbanos entre outros serviços cruciais no cotidiano de uma cidade por meio de percursos convidativos, seguros e estruturados ao peão. As deslocações pedonais são parte importante e devem ser garantidas através da infraestrutura pedonal.

Um dos principais conflitos da rede pedonal urbana é falta de continuidade e homogeneidade. Além da dificuldade de garantir essas duas características, as áreas de transição entre os diferentes circuitos de mobilidade acabam por menosprezar o percurso pedonal priorizando a faixa de rodagem à serviço dos automotores e induzindo o peão à insegurança ao caminharem em um espaço destinado aos veículos.