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CAPÍTULO III – MÉTODO

3.1 CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA

Para analisar a percepção de professores de crianças de 4 a 6 anos sobre a superdotação e a extensão com que os mitos sobre esse fenômeno fazem parte das crenças desses professores, este estudo adotou uma abordagem qualitativa, de caráter exploratório- comparativo. A escolha se justificou por esta perspectiva proporcionar ao pesquisador ajuizar sentido às proposições dos participantes, por meio da compreensão dos significados e sentidos das palavras, frases e reações dos sujeitos (MARTINS; BICUDO, 1994).

Para Ludke e André (1999), a abordagem qualitativa se caracteriza por uma coleta de dados rica em descrições de situações, pessoas e acontecimentos. Também é marcada pela preocupação em verificar o problema no processo, ou seja, o foco do estudo está na forma como o evento se manifesta, em atividades, procedimentos, ou interações no cotidiano. Outra particularidade desta abordagem é a possibilidade de considerar os diversos pontos de vista dos participantes. Nesta linha, Lukde e André (1999, p. 12) pontuam que “os estudos qualitativos permitem iluminar o dinamismo interno das situações, geralmente, inacessível ao observador externo”.

Seguindo a mesma linha de Trivinos (1992), o caráter exploratório deste estudo buscou aprofundar a descrição de uma realidade, seguindo procedimentos sistemáticos. Entre as finalidades apontadas pela literatura sobre estudos exploratórios estão aumentar a familiaridade do pesquisador com um fato, fenômeno ou ambiente, com vistas a estudos futuros mais aprofundados, e modificar ou clarificar conceitos.

3.2. PARTICIPANTES

Foi utilizada uma amostra intencional de conveniência de 20 professores de salas regulares de crianças de 4 a 6 anos, da rede de ensino público e privado do Distrito Federal, os quais foram selecionados entre aqueles que já tinham experiência com alunos com altas habilidades/superdotação (N=10), denominados grupo CE (grupo com experiência) e os que não tinham tal vivência (N=10), chamados grupo SE (grupo sem experiência). Para a seleção dos participantes, usou-se, como critério de inclusão, o docente estar lecionando para a faixa etária prevista, e de exclusão, ter participado de cursos de especialização na área de superdotação, tendo em vista os objetivos da pesquisa.

Todos os participantes eram do sexo feminino, com idades entre 23 e 51 anos (M=38,5). Os dois grupos apresentaram médias etárias aproximadas, sendo a do grupo CE (M=37,3) ligeiramente inferior a do grupo SE (M=39,8).

Entre as 20 professoras participantes, duas pertenciam à rede pública de ensino do Distrito Federal. As demais trabalhavam em escolas particulares. As participantes eram oriundas de cinco escolas, situadas em diferentes regiões administrativas do Distrito Federal, sendo duas escolas no Plano Piloto, duas no Guará e uma em Águas Claras.

Quanto à formação acadêmica, exceto por uma participante que ainda cursava a especialização por ocasião da coleta de dados, as demais professoras possuíam pelo menos uma pós-graduação lato sensu, sendo que oito delas haviam feito duas ou mais especializações. Destas, seis pertenciam ao grupo CE. Psicopedagogia foi a especialização lato sensu com maior frequência, realizada pela metade das participantes, seguida por neurociência/neuropedagogia, feita por sete docentes. Outras especializações citadas foram educação infantil, gestão escolar, orientação educacional, docência do ensino superior e letramento/alfabetização. Duas professoras cursavam especialização em Síndrome de Down, quando os dados foram coletados.

Em relação ao tempo de magistério, os grupos CE e SE apresentaram médias aproximadas (M=16,8 anos e M=16,2 anos, respectivamente). No que diz respeito ao tempo de magistério com crianças de 4 a 6 anos, o grupo SE apresentou média (M=14,7) superior ao grupo CE (M=12,2).

No que concerne à série que lecionavam durante o ano de 2011, metade das 20 professoras entrevistadas ensinavam para crianças de 6 anos, cinco (25%) ensinavam para crianças de 5 anos e outras cinco (25%) para as de 4 anos. Das professoras do grupo CE (N=10), sete professoras lecionavam para o 1º ano do ensino fundamental (crianças de 6 anos); e as outras, duas, para o Infantil 5 ou 2ª período (crianças de 5 anos), e uma para o Infantil 4 ou 1º período (crianças de 4 anos). Em contrapartida, no grupo SE (N=10), quatro professoras atuavam em turmas do Infantil 4 ou 1º período; três, em turmas de Infantil 5 ou 2º período; e as outras três, em turmas de 1º ano do ensino fundamental. Frente à experiência com outros alunos de inclusão, com exceção de três docentes, duas do grupo CE e uma do grupo SE, as demais docentes afirmaram já ter tido.

Na Tabela 1, é apresentada uma síntese da caracterização dos participantes, tanto por grupos, quanto na totalidade. Nela estão expressas as frequências e as porcentagens referentes à idade, escolarização, tempo de magistério, experiência com crianças de 4 a 6 anos e o ano/série em que lecionavam em 2011.

Tabela 1. Síntese dos dados de identificação dos participantes (N=20) Variáveis Categorias f % Grupo CE (N=10) Grupo SE (N=10) Total (N=20) Grupo CE (N=10) Grupo SE (N=10) Total (N=20) Idade 20 a 30 anos 2 2 4 20,0 20,0 20,0 31 a 40 anos 3 3 6 30,0 30,0 30,0 41 a 50 anos 5 4 9 50,0 40,0 45,0 51 a 60 anos 0 1 1 0,0 10,0 5,0 Escolaridade Especialização 9 10 19 90,0 100,0 95,0 Espec. Incompleta 1 0 1 10,0 0,0 5,0 Tempo de magistério 1 a 5 anos 0 1 1 0,0 10,0 5,0 6 a 10 anos 2 1 3 20,0 10,0 15,0 11 a 15 anos 0 2 2 0,0 20,0 10,0 16 a 20 anos 5 3 8 50,0 30,0 40,0 21 a 25 anos 3 2 5 30,0 20,0 25,0 26 anos ou mais 0 1 1 0,0 10,0 5,0 Cont.

Variáveis Categorias f % Grupo CE (N=10) Grupo SE (N=10) Total (N=20) Grupo CE (N=10) Grupo SE (N=10) Total (N=20) Tempo de magistério com crianças de 4 a 6 anos 1 a 5 anos 0 1 1 0,0 10,0 5,0 6 a 10 anos 6 2 8 60,0 20,0 40,0 11 a 15 anos 1 3 4 10,0 30,0 20,0 16 a 20 anos 1 2 3 10,0 20,0 15,0 21 a 25 anos 2 1 3 20,0 10,0 15,0 26 anos ou mais 0 1 1 0,0 10,0 5,0 Série para que lecionava em 2011 Inf. 4/ 1° período 1 4 5 10,0 40,0 25,0 Inf. 5/ 2° período 2 3 5 20,0 30,0 25,0 1° ano do E.F. 7 3 10 70,0 30,0 50,0 3.3. INSTRUMENTO

Foi utilizada a entrevista individual semiestruturada, a qual permite uma compreensão mais detalhada de atitudes, valores, crenças e motivações em relação aos comportamentos dos indivíduos em contextos sociais particulares. Ao discutir esta modalidade, Gaskell (2003) sinaliza que:

O emprego da entrevista qualitativa para mapear e compreender o mundo da vida dos respondentes é o ponto de entrada para o cientista social que introduz, então, esquemas interpretativos para compreender as narrativas dos atores em termos mais conceptuais e abstratos, muitas vezes em relação a outras observações. A entrevista qualitativa, pois, fornece os dados básicos para o desenvolvimento e a compreensão das relações entre os atores sociais e sua situação. (p. 65)

A entrevista, cujo roteiro se encontra no Apêndice A, foi organizada em três partes. Na primeira parte, foram coletados os dados demográficos (sexo, idade, escolarização e experiência profissional) para caracterização dos participantes. A segunda parte foi composta

por questões abertas, na quais foram abordadas as concepções de superdotação, características de indivíduos superdotados e a possível influência da experiência com alunos superdotados na compreensão dos professores sobre esse construto.

Por fim, na terceira parte, foram apresentados os mitos sobre superdotação. Com o apoio visual de fichas temáticas, os professores foram convidados a comentar as 21 frases que representam mitos sobre superdotação. O conjunto de 21 fichas foi construído com base nos mitos categorizados por Pérez (2003), anteriormente explorados: mitos sobre constituição, distribuição, identificação, níveis ou graus de inteligência, desempenho, consequências e atendimento e a partir dos ajustes realizados no estudo piloto. Tais mitos foram expressos em frases, as quais foram submetidas às participantes para que as mesmas se posicionassem. São exemplos dessas frases: (a) altas habilidades/superdotação é uma característica que depende exclusivamente do estímulo ambiental; (b) crianças com altas habilidades/superdotação serão adultos de destaque; e (c) a pessoa com altas habilidades/superdotação não enfrenta dificuldades ou desafios.

3.4. ESTUDO PILOTO

Como previsto no projeto de pesquisa, foi feito um estudo piloto com duas professoras de crianças de 4 a 6 anos, sendo que uma já tinha tido experiência com aluno identificado com altas habilidades e a outra não. Com este procedimento, pôde-se verificar a clareza e compreensão dos itens e perguntas, bem como a coerência entre as questões e os objetivos da pesquisa. Após o estudo piloto, foi incluído na primeira parte da entrevista o item experiência com outros alunos de inclusão, com o intuito de acrescentar informações sobre a experiência profissional, uma vez que as crianças com altas habilidades/superdotação são incluídas nessa modalidade de ensino, de acordo com a legislação em vigor (BRASIL, 2011).

Em relação às perguntas abertas sobre concepção de superdotação e a possível influência da experiência com superdotados na compreensão desse construto, as entrevistas piloto revelaram clareza e coerência. Constatou-se, entretanto, a necessidade de reformulação da questão 4 “Quais são as características de um(a) aluno(a) com altas

habilidades/superdotação?”, para que os entrevistados em suas respostas expandissem seus comentários, para além dos aspectos cognitivos. A questão passou, então, para a seguinte redação: “Quais são as características de um (a) aluno (a) com altas habilidades/superdotação (personalidade, aspectos cognitivos, emocionais, sociais, físicos, estilos de aprendizagem)?”

O estudo piloto contribuiu também para ajustar os procedimentos que seriam adotados na terceira parte das entrevistas. Um conjunto de frases sobre mitos relacionados à superdotação foi submetido às duas professoras durante a pilotagem. Das 24 afirmações, dez foram mantidas, três retiradas e 11 modificadas em suas redações. No Quadro 5, são apresentadas as afirmações em relação aos mitos sobre superdotação/altas habilidades, após o estudo piloto.

Quadro 5. Frases relacionadas aos mitos sobre superdotação utilizadas no roteiro de entrevista Categorias de mitos Frases apresentadas

MITOS SOBRE CONSTITUIÇÃO

Altas habilidades/superdotação é uma característica exclusivamente genética.

Altas habilidades/superdotação é uma característica que depende exclusivamente do estímulo ambiental.

O(A) aluno(a) com altas habilidades/superdotação é “metido”, “sabichão”, “exibido”, “nerd”, “CDF”.

O indivíduo com altas habilidades/superdotação é fisicamente frágil, socialmente incapaz e com interesses restritos.

MITOS DE DISTRIBUIÇÃO

As pessoas com altas habilidades/superdotação provêm de classes econômicas privilegiadas.

Poucos são os indivíduos que, de fato, têm altas habilidades/superdotação. Todos os indivíduos têm altas habilidades/superdotação, basta estimulá-los e poderemos “fabricar” uma pessoa com altas habilidades.

MITOS SOBRE IDENTIFICAÇÃO

Quando a criança é identificada com altas habilidades/superdotação, ela passa a ser discriminada/rotulada por seus colegas e professores. Não se deve identificar a pessoa com altas habilidades/superdotação. Não se deve comunicar à criança que ela tem altas

habilidades/superdotação

MITOS SOBRE NÍVEIS OU GRAUS

DE

INTELIGÊNCIA

A pessoa com altas habilidades/superdotação é apenas aquela que tem uma inteligência excepcional (Q.I. elevado- medido por testes de inteligência). A pessoa que se destaca nas áreas de artes, música ou nos esportes não pode ser considerada superdotada.

Categorias de mitos Frases apresentadas

MITOS SOBRE DESEMPENHO

A criança com altas habilidades/superdotação se destaca em todas as áreas do currículo escolar, apresentando um excelente rendimento em todos os aspectos.

MITOS SOBRE CONSEQUÊNCIA

A pessoa com altas habilidades/superdotação tem mais predisposição para desenvolver doenças mentais, desajustamento social e instabilidade emocional.

A inteligência se mantém estável durante toda a vida.

Crianças com altas habilidades/superdotação serão adultos de destaque. A pessoa com altas habilidades/superdotação não precisa da orientação de professores para aprender, é autodidata.

A pessoa com altas habilidades/superdotação não enfrenta dificuldades ou desafios.

MITOS SOBRE ATENDIMENTO

O aluno com altas habilidades/superdotação não necessita de atendimento educacional especial.

Alunos com altas habilidades/superdotação devem frequentar escolas especiais ao invés de escolas regulares.

A melhor abordagem de atendimento para os alunos com altas

habilidades/superdotação é a aceleração. (procedimento pelo qual os alunos cumprem o programa escolar em menos tempo)

3.5. PROCEDIMENTOS

A identificação das professoras que já lecionaram ou lecionavam para alunos com altas habilidades/superdotação foi feita, inicialmente, por consulta aos profissionais das salas de recursos da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal, local onde é oferecido o atendimento educacional especializado para alunos superdotados. Aos docentes/psicólogos deste atendimento foi solicitado sugerir escolas em que estudaram ou estudavam alunos com indicação para altas habilidades/superdotação e o ano/série escolar que estariam cursando. Procederam-se visitas às escolas dos alunos indicados e seleção dos professores. Nesse momento, pediu-se autorização à direção ou coordenação para a coleta de dados e foi entregue a carta de apresentação (Apêndice B), que explicava o objetivo da pesquisa.

Após os primeiros contatos com as docentes nas escolas regulares, não foi mais necessário repetir o procedimento inicial em outras salas de recurso, uma vez que as

professoras procuradas, com muita disponibilidade e gentileza, indicaram outras colegas que também tinham a experiência exigida para a participação da pesquisa. De forma similar, estas apontaram outras profissionais da mesma instituição que não tinham a experiência com alunos com altas habilidades/superdotação. A paridade da amostra entre grupos e escolas visou à garantia de grupos de pesquisa mais homogêneos em termos de práticas docentes utilizadas.

Após a autorização da escola, as professoras foram contatadas em seus locais de trabalho, para explicação dos objetivos do estudo, verificação da disponibilidade em participar e marcação de dia, hora e local da entrevista. No caso das docentes indicadas por seus colegas, o contato inicial foi feito via telefone ou pessoalmente na própria instituição de ensino. As entrevistas foram conduzidas pela pesquisadora, sendo que 18 ocorreram no local de trabalho das participantes e duas nas residências das professoras, uma vez que estavam de férias. Antes de iniciar a gravação, todas as participantes foram, mais uma vez, esclarecidas sobre o objetivo da pesquisa e solicitadas a assinarem o termo de consentimento livre e esclarecido (Apêndice C).

No início do encontro, anterior ao momento da gravação, ressaltou-se às participantes a desobrigação de domínio de conhecimento sobre o que seria perguntado e que poderiam se sentir à vontade para dizer o que achavam, mesmo que não tivessem certeza. As entrevistas, gravadas em áudio e transcritas na íntegra, foram realizadas no período de 18 de novembro a 26 de dezembro de 2011 e tiveram média de 23 minutos, variando entre 15 e 38 minutos.

3.6. ANÁLISE DE DADOS

Os dados transcritos foram organizados e analisados de forma qualitativa interpretativa, por meio da técnica da análise de conteúdo. Tal opção foi feita por conceber que seus caminhos metodológicos possibilitariam o alcance dos objetivos deste estudo. Bardin (2011) assim define este procedimento:

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) dessas mensagens. (p. 48)

Conforme prediz a análise de conteúdo, as informações contidas no corpus (transcrições das entrevistas) foram tratadas seguindo as três etapas propostas por Bardin (2011): a pré-análise do material, a exploração dele e, por fim, o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação. Na primeira fase, realizou-se a leitura flutuante e a escolha de indicadores (trechos das entrevistas) que compuseram os quadros de análise. Em seguida, efetuarem-se as operações de codificação e decomposição, em função das unidades de registro, que foram delimitadas a partir dos indicadores e da teoria que embasa o assunto. Neste estudo, foi escolhido o tema como unidade de registro, que é bastante utilizado nos estudos sobre representações sociais, motivações de crenças, valores, conceitos, atitudes, entre outros (BARDIN, 2011; FRANCO, 2008).

Definidas as unidades de registro, passou-se ao processo de categorização, onde os dados foram organizados em três grandes blocos de análise: definição, caracterização e mitos. Para cada um desses, foram organizadas categorias de análise, sendo que, para os dois primeiros agrupamentos, as respectivas categorias surgiram durante a pré-análise, em um processo de idas e vindas de recortes do texto, codificações e classificações. Já no terceiro bloco, que trata da temática “mitos”, foram traçadas categorias, definidas a priori, e subcategorias, definidas a posteriori, em função da estrutura e quantidade de material obtido nas entrevistas. Em relação às possíveis diferenças entre os grupos de professores pesquisados, objeto de interesse dessa pesquisa, os dados referentes a este aspecto perpassaram os três blocos de análise. Visto que houve o interesse em saber a intensidade do aparecimento dos diferentes elementos da categorização, foi realizada também quantificação das frequências em que estas categorias ocorreram.

Na última fase da análise, os dados foram tratados, dando-lhes significação à luz da literatura. Sobre esse processo, Franco (2008) e Gibbs (2009) ressalvam que no processo de inferência é que se encontra a relevância teórica, o qual implica ao menos uma comparação, indo além da informação puramente descritiva.

CAPÍTULO IV - RESULTADOS

Neste capítulo, serão descritos os resultados referentes às questões que nortearam esta pesquisa. Serão apresentadas as concepções das professoras de alunos de 4 a 6 anos sobre superdotação, as crenças em mitos referentes às altas habilidades/superdotação e a percepção dos dois grupos pesquisados em relação a este fenômeno. Organizados conforme os objetivos específicos deste estudo, os resultados serão expostos em três seções, a saber: concepções sobre superdotação, mitos acerca da superdotação, e a influência da experiência em lecionar para crianças com altas habilidades/superdotação na concepção sobre esta temática. Também serão apresentados os comentários feitos pelas professoras no encerramento da entrevista, quando foi oferecido espaço para que acrescentassem o que lhes conviesse.

Assim, em cada seção, constará descrição dos resultados segundo as categorias e subcategorias encontradas com as respectivas frequências, além de uma tabela com tais dados. Serão pontuados aspectos das entrevistas considerados relevantes, seguidos de falas que exemplificam as categorias e subcategorias encontradas, com a identificação da respectiva participante. Em cada seção, também serão apresentados os resultados da comparação das respostas dos dois grupos pesquisados.

3.7. CONCEPÇÕES SOBRE SUPERDOTAÇÃO

Com relação à definição de superdotação, foi identificado um conjunto de respostas (N=30), organizado em cinco categorias. As maiores frequências centraram-se nas categorias “desenvolvimento acima da média” (46,6%) e “habilidades em áreas específicas” (33,3%). Outras categorias que expressaram elementos definidores da superdotação foram “aspectos neurológicos” (10%), “precocidade” (6,6%) e “divindade” (3,3%), conforme mostrado na Tabela 2.

Tabela 2 - Definições de superdotação (N= 30)

Categorias Grupo CE Grupo SE Total

f % f % f %

Desenvolvimento acima da média 5 33,4 9 60,0 14 46,8

Habilidades em áreas específicas 6 40,0 4 26,8 10 33,3

Aspectos neurológicos 3 20,0 0 0,0 3 10,0

Precocidade 1 6,6 1 6,6 2 6,6

Divindade 0 0,0 1 6,6 1 3,3

Total 15 100,0 15 100,0 30 100,0

Nota: a frequência refere-se ao número de respostas, não ao número de participantes.

Seguem trechos que exemplificam as categorias encontradas. → Desenvolvimento acima da média

[...] São crianças que conseguem ter uma capacidade, em várias linguagens, acima da média que a gente conhece. [...] (PCE06)

[...] Eu acho que é a criança que está num nível de desenvolvimento mental... eu acho que é muito acima... (PSE13)

Crianças com facilidade de se desenvolver, além do esperado. (PSE18)

→ Habilidades em áreas específicas

Eu colocaria que é uma habilidade de desenvolver um conhecimento específico, numa determinada área. (PCE01)

É uma habilidade muito grande em alguma área. [...] (PSE11)

→ Aspectos neurológicos

[...] Utilizam o cérebro mais, porcentagem maior em algumas áreas, sei lá... alguma coisa nesse estilo.[...] (PCE07)

[...] Eu acho que tem muito a ver com a neurologia. Então, assim, é uma parte do cérebro dela que é mais desenvolvida, que faz com que ela se destaque naquela área. (PCE08)

Disfunção neurológica que, por um lado, traz vantagens cognitivas, mas, eu acho, tem uma perda socioafetiva grande, pelo pouco que eu convivi com essas crianças... [...] (PCE10)

→ Precocidade

[...] E assim, que iniciou prematuramente. (PCE01)

[...] com um grau de maturidade que o biológico ainda não alcançou. (PSE11)

→ Divindade

Para mim, é uma criança especial, enviada por Deus. [...] (PSE15)

Possíveis diferenças em relação à percepção de professoras com experiência docente com crianças superdotadas e professoras sem experiência podem ser examinadas. Entre estas estão: (a) no grupo CE, quase todas (N=7) as professoras que indicaram a categoria desenvolvimento acima da média mencionaram também que este se expressava em alguma área específica, já no grupo SE, essa referência foi pouco mencionada; (b) somente no grupo CE a superdotação foi vinculada a questões neurológicas, como diferenças funcionais no cérebro ou mesmo disfunção neurológica; e (c) foi no grupo SE que uma professora relacionou o fenômeno a uma bênção divina.

Em relação às características de crianças superdotadas, as professoras apresentaram um número elevado de predicados. Interessante mencionar que, em suas descrições, as respondentes explicitaram características típicas da superdotação na área acadêmica. As respostas foram agrupadas em categorias conforme Tabela 3.

Tabela 3 – Características de crianças com altas habilidades/superdotação (N=39)

Categorias Grupo CE Grupo SE Total

f % f % f %

Dificuldades em algumas áreas 8 42,1 7 35,0 15 38,6 Destaque em áreas específicas 7 36,8 6 30,0 13 33,3

Crianças diferentes 1 5,3 4 20,0 5 12,8

Desmotivação frente à escola 1 5,3 2 10,0 3 7,7

Crianças “normais”, com vários

perfis 2 10,5 0 0,0 2 5,1

Crianças globalmente dotadas 0 0,0 1 5,0 1 2,5

Total 19 100,0 20 100,0 39 100,0

As maiores frequências foram “dificuldades em algumas áreas” (38,6%) e “destaque em áreas específicas” (33,3%). Outras características mencionadas em menor frequência foram: “crianças diferentes” (12,8%) e “crianças “normais”, com vários perfis” (5,1%). Para esta última categoria, as opiniões se deram em função de uma docente ter tido contato com mais de uma criança com altas habilidades e a outra, por orientação recebida da psicóloga do seu aluno. Também foi encontrada, em frequência ainda menor, comentários sobre “crianças globalmente dotadas” (2,5%). Interessante observar que houve 7,7% das professoras que incluíram em seus comentários, ao caracterizar as crianças com altas habilidades, a possibilidade de a criança se desmotivar frente à realidade escolar. Nessa questão, uma

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