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O presente tópico pode ser polêmico porque afirma a possibilidade de colisão entre o princípio da eficiência e os demais princípios, contudo isso será demonstrado de forma bem fundamentada. A possibilidade de conflito parte da própria ideia caracterizadora de um princípio. Conforme será discutido, se não houvesse essa possibilidade, a eficiência administrativa não seria um princípio, mas um trivial vetor interpretativo.

É mister esclarecer que a pacificação dos conflitos entre princípios difere fundamentalmente das soluções aplicadas no caso de colisão entre regras. A fim de se compreender essa importante distinção será utilizado um exemplo trazido por Robert Alexy (2015).

Imagine-se uma regra escolar cuja determinação obriga os alunos a retirarem-se da sala de aula somente após ouvirem o som do sinal de “toque liberador”. Além dessa regra, existe uma outra que preceitua o seguinte: “caso o alarme de incêndio toque, todos os discentes deverão sair da escola”.

Agora amplie-se o esforço imaginativo para visualizar o momento em que o alarme de incêndio começa a soar, sendo que o toque de liberação dos alunos ainda não ocorreu. É um excelente caso de conflito entre normas, especificamente entre regras.

A resolução se dá mediante a inserção de uma cláusula de exceção na primeira regra. Ou seja, basta aduzir que os alunos somente poderão retirar-se da sala de aula ao ouvirem o som do sinal de “toque liberador”, a não ser em casos de incêndio.

Caso a solução da “cláusula de exceção” não baste, uma das regras conflitantes deverá ser banida do ordenamento jurídico, pois a regra aplica-se em conformidade com a máxima do “tudo ou nada”. Pode-se aplicar nesses casos os conhecidos critérios para a solução de conflito previstos na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

Em hipóteses de colisão entre princípios a solução é distinta. O antagonismo pode advir na medida em que o conteúdo normativo ou expressão deôntica de um conflite com a do outro. Imagine-se que determinada conduta seja proibida pelo princípio A, mas permitida pelo princípio B. Como se apaziguaria a colisão? Consoante Alexy (2015):

As colisões entre princípios devem ser solucionadas de forma completamente diversa. Se dois princípios colidem – o que ocorre, por exemplo, quando algo é proibido de acordo com um princípio e, de acordo com o outro, permitido –, um

35 dos princípios terá que ceder. Isso não significa, contudo, nem que o princípio cedente deva ser declarado inválido, nem que nele deverá ser introduzida uma cláusula de exceção. Na verdade, o que ocorre é que um dos princípios tem precedência em face do outro sob determinadas condições. Sob outras condições a questão da precedência pode ser resolvida de forma oposta.

Os princípios, se considerados de forma abstrata, encontram-se no mesmo nível. Todavia, ao serem mergulhados no caso concreto adquirem pesos diferentes; a realidade da vida ora pode os salvar, ora pode desprezá-los. Não é outro o entendimento de Alexy (2015), senão vejamos:

A solução para essa colisão consiste no estabelecimento de uma relação de precedência condicionada entre os princípios, com base nas circunstâncias do caso concreto. Levando-se em consideração o caso concreto, o estabelecimento de relações de precedências condicionadas consiste na fixação de condições sob as quais um princípio tem precedência em face do outro. Sob outras condições, é possível que a questão da precedência seja resolvida de forma contrária.

Agora passa-se a analisar a possibilidade de conflito entre o princípio da eficiência administrativa com outros princípios existentes no ordenamento jurídico brasileiro. A este respeito, interessa esclarecer que, assim como sugere o título do presente capítulo, não há que se falar em princípio da eficiência administrativa, caso inexista a possibilidade de choque com os demais princípios.

Castro (2006), a título de exemplo, arrazoa no sentido da impossibilidade de conflito entre o princípio da eficiência e demais princípios como o da legalidade e moralidade. Contudo, este entendimento contraria a própria ideia de princípio, conforme demonstrado.

Para o autor, não se pode conceber uma ação dentro dos limites da legalidade que não atente para a eficiência e vice-versa. Contudo, é oportuna a discordância ao posicionamento do autor, pois uma das características dos princípios é sua capacidade de ponderação.

Obviamente, os princípios podem confrontar-se em determinadas situações, resolvendo-se o conflito mediante a acurada análise do caso concreto. A situação fática específica irá determinar qual princípio será aplicado e qual achar-se-á renegado.

Isso sucede com todos os princípios do ordenamento jurídico. Cita-se como exemplo a possibilidade de uma ação legal ser imoral. Interessante exemplo pode ser encontrado no direito privado. Na seara cível, por exemplo, o simples desrespeito à boa-fé, em um negócio jurídico, pode motivar sua nulidade.

Outro exemplo refere-se às hipóteses em que a liberdade de expressão e o direito à informação entram em conflito com o direito à privacidade. A priori não se pode precisar qual o direito a ser aplicado, mas somente com a análise do caso concreto. Semelhantemente, podem os princípios em comento colidirem.

Nessa linha de raciocínio, assim como um ato pode ser legal e imoral, o que constitui verdadeira “injustiça legal”, pode existir uma ação moral e legal em conflito com a eficiência. Castro (2006), citando Bento, aduz que o princípio da eficiência poderia ser usado para impossibilitar atos legais e morais por serem ineficientes.

Ora, a tese da impossibilidade de conflito do princípio da eficiência com os demais princípios, se verdadeira, esvazia todo o conteúdo normativo da eficiência administrativa, pois elimina um dos principais elementos constitutivos de todo e qualquer princípio: possibilidade de ponderação.

Antônio de Amaral (2002) compartilha também do posicionamento de que o princípio da eficiência não pode conflitar com outros princípios como o da legalidade. O autor entende que não há oposição entre a eficiência e a legalidade, haja vista um ato não poder ferir a legalidade visando somente a eficiência.

No entanto, olhando-se de uma perspectiva diversa pode ser constatado um possível conflito entre os dois princípios. É bem possível que uma conduta administrativa seja legal, mas seja ineficiente. Nesse caso, o conflito deve ser resolvido por meio da técnica da ponderação de princípios desenvolvida por Robert Alexy (2015). Somente mediante a análise do caso concreto o aplicador do direito saberá se o ato será ou não passível de anulação.

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