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Eficiência administrativa como norma princípio e direito fundamental à boa administração: a concretização dos valores democráticos no âmbito da administração pública

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO SERIDÓ CAMPUS CAICÓ

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

JOSÉ ELIVELTO DE MEDEIROS BATISTA

EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA COMO NORMA PRINCÍPIO E DIREITO FUNDAMENTAL À BOA ADMINISTRAÇÃO: A CONCRETIZAÇÃO DOS VALORES DEMOCRÁTICOS NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

CAICÓ – RN 2019

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JOSÉ ELIVELTO DE MEDEIROS BATISTA

EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA COMO NORMA PRINCÍPIO E DIREITO FUNDAMENTAL À BOA ADMINISTRAÇÃO: A CONCRETIZAÇÃO DOS VALORES DEMOCRÁTICOS NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Rogério de Araújo Lima

CAICÓ – RN 2019

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Batista, José Elivelto de Medeiros.

Eficiência administrativa como norma princípio e direito fundamental à boa administração: a concretização dos valores democráticos no âmbito da administração pública / José Elivelto de Medeiros Batista. - Caicó, 2019.

40f.

Monografia (Bacharel em Direito) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ensino Superior do Seridó. Departamento de Direito.

Orientador: Prof. Dr. Rogério de Araújo Lima.

1. Princípio constitucional - Monografia. 2. Princípio da eficiência - Monografia. 3. Administração pública - Monografia. 4. Administração pública Aspectos morais e éticos

-Monografia. 5. Eficiência administrativa. 6. Direito fundamental à boa administração pública. I. Lima, Prof. Dr. Rogério de Araújo. II. Título.

RN/UF/BS-Caicó CDU 35.071.3

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Profª. Maria Lúcia da Costa Bezerra - - CERES--Caicó

(4)

UFRN

UNIV ERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO SERIDÓ

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

ATA DE DEFESA DE TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

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EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA COMO NORMA PRINCÍPIO E DIREITO FUNDAMENTAL À BOA ADMINISTRAÇÃO: A CONCRETIZAÇÃO DOS VALORES DEMOCRÁTICOS NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito.

Aprovada em: ____/____/____

BANCA EXAMINADORA

____________________________________ Prof. Dr. Rogério de Araújo Lima

Orientador

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

____________________________________ Prof. Dr. André Melo Gomes Pereira Universidade Federal do Rio Grande do Norte

____________________________________ Prof. Dr. Rodrigo Costa Ferreira Universidade Federal do Rio Grande do Norte

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Dedico este trabalho de conclusão de curso especialmente aos meus pais, os quais comigo já não mais estão, mas sem os quais eu nada seria hoje.

Também não posso esquecer o apoio da minha família, em especial minha tia Maria Suerda.

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A Deus, em primeiro lugar, pois é Nele que reside a razão da minha existência, e como um rio que segue o seu curso natural assim é a minha vida que flui em direção a Ele. Ao meu orientador pela ajuda na elaboração do trabalho, bem como pela liberdade a mim concedida em sua elaboração.

Aos meus sinceros amigos que, de forma direta ou indireta, contribuíram para a conclusão dessa etapa acadêmica.

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[...] Por um maravilhoso paradoxo, é quando paro de me olhar e olho os que me cercam que conheço a mim mesmo sem ter pensado em fazê-lo: é quando paro de buscar o meu próprio bem e busco o de outrem que encontro também o meu. Todo raio de luz deve iluminar o mundo antes de voltar a iluminar a mim mesmo [...]. Louis Lavelle

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Trata-se de uma discussão acerca da normatividade do princípio da eficiência administrativa. O trabalho objetiva problematizar a ideia de eficiência administrativa como norma princípio, considerando que, para alguns autores, trata-se apenas de uma “norma álibi”. Dois elementos constituem a chave para se problematizar a normatividade de um princípio: a) força normativa capaz de anular os atos que o contrarie, e b) aplicação limitada por outros princípios, o que sugere a possibilidade de colisão entre princípios, os quais, em casos tais, deverão ser ponderados. Estes dois elementos podem ser identificados na eficiência administrativa, o que a torna, de fato, uma norma princípio. Como princípio, eficiência administrativa relaciona-se diretamente com o “Direito Fundamental à Boa Administração Pública”. E, na medida em que promove a retirada de barreiras que limitam o exercício das liberdades básicas, torna-se um instrumento catalisador do desenvolvimento humano, teorizado por Amartya Sen. O método adotado foi o dedutivo, bem como buscou-se realizar uma revisão bibliográfica e jurisprudencial (na medida das possibilidades teórico-metodológicas adotadas).

Palavras-chave: Eficiência Administrativa. Princípios. Direito Fundamental à Boa Administração Pública.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 10

2 REFORMA ADMINISTRATIVA: NECESSIDADE OU invencionice? ... 13

3 EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA: ENTRE OS MEIOS (EFICIÊNCIA) E OS RESULTADOS (EFICÁCIA) ... 17

4 EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA COMO NORMA PRINCÍPIO ... 22

5 DIREITO FUNDAMENTAL À BOA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DESENVOLVIMENTO HUMANO ... 30

6 EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA “NA MEDIDA DO POSSÍVEL”: A

PONDERAÇÃO COMO CONDITIO SINE QUA NON PARA A

CARACTERIZAÇÃO DE UM PRINCÍPIO ... 34

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 37

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1 INTRODUÇÃO

Por trás de toda a criação existe um ajuste fino. Tudo encontra-se perfeitamente interligado e, na gênese da mínima partícula do universo, existe um propósito definido; uma finalidade. Com a administração pública não é diferente. Assim como o olho tem por fim a visão, a administração deve visar a prestação de um serviço público eficiente.

Contudo, da mesma forma que a nossa saúde encontra-se sujeita aos alvedrios da vida, a administração pública também pode ser acometida por alguma “enfermidade”. Não raras as vezes vê-se uma máquina pública "cega" no que se refere aos fins para os quais foi projetada. Se tais problemas não são passíveis de solução imediata, ao menos podem ser amenizados através da concretização do princípio da eficiência administrativa.

O tema eficiência administrativa é de atual relevância no cenário da administração pública brasileira. Já era mencionado na Constituição em seu artigo 74, II, e tido por alguns como princípio implícito. Contudo, foi inserido como princípio explícito na Constituição Federal de 1988 pela Emenda Constitucional n° 19 de 1998, no contexto da reforma administrativa, e, desde então, tem gerado acaloradas discussões sob os mais variados enfoques.

Não se pretende no presente estudo fazer uma análise histórica pormenorizada do tema “reforma administrativa”. Busca-se tão somente explicá-la sucintamente a fim de estabelecermos um cenário contextual coerente para a correta compreensão acerca das circunstâncias em que o princípio da eficiência administrativa foi positivado na Constituição Federal de 1988.

A mencionada reforma administrativa era visivelmente necessária, considerando a calamitosa situação de crise em que país se encontrava, a qual foi potencializada por uma hierarquização rígida da estrutura organizacional, delineada na Constituição de 1988. Os obstáculos ao desenvolvimento eram notórios. Tais obstáculos eram praticamente intransponíveis, assim como areia movediça, deslizando e arruinando de maneira arrastada, capciosa e astuciosamente corruptiva a administração pública brasileira.

A administração pública brasileira não podia simplesmente mergulhar nas virtuosas águas de Juventa e rejuvenescer. Assim, a fim de reinventar-se, segundo o curso dinâmico da sociedade, restou-lhe o caminho de uma reforma administrativa.

É nesse contexto de crise que foi aprovada a Emenda Constitucional n° 19, a qual inseriu a eficiência administrativa como princípio constitucional, a fim de tornar-se o alicerce sustentador da atuação dos agentes públicos. Foi dessa forma que o famoso

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acrônimo “LIMPE” tornou-se completo, por meio da inserção de uma eficiência que se materializa por meio de uma ação contínua e perene por parte poder público.

A mudança nunca se pretendeu imediata. É tão certo que é no esforço moderado, mas contínuo, que reside a energia real e fecunda, e que todo trabalho que se afasta dessa baliza pode ser considerado um trabalho fadado ao fracasso. É bastante evidente, portanto, que o verdadeiro antagonista da má administração é a eficiência, que pode ser visualizada como uma força contínua.

Ademais, existem efeitos práticos gerados pela observância do princípio da eficiência administrativa. Um desses efeitos refere-se ao desenvolvimento humano proporcionado.

Aqui mira-se além da visão tecnicista e econômica da ideia de eficiência administrativa. Pretende-se atrelar a eficiência administrativa à busca pela concretização dos direitos fundamentais dos indivíduos. Além do mais, a eficiência administrativa relaciona-se com a remoção das barreiras que limitam as liberdades fundamentais dos administrados.

No primeiro caso, trabalha-se a concepção daquilo que podemos denominar de um “Direito Fundamental à Boa Administração Pública”, e no segundo, tem-se própria concepção de Desenvolvimento Humano, materializado na retirada de barreiras limitadoras das liberdades básicas, teorizado por Amartya Sen.

Este mundo de possibilidades práticas advindas da efetivação do princípio ora estudado decorre da sua normatividade. Assim, o presente trabalho objetiva demonstrar que a eficiência administrativa, inserida no caput do artigo trinta e sete da Constituição Federal de 1988 trata-se efetivamente de uma norma princípio. A concepção de norma princípio aqui adotada é a do jurista Robert Alexy, tal como ele a trabalha na obra Teoria dos direitos fundamentais.

Utilizar-se-á, a fim de alcançar tal objetivo, a análise dos atos administrativos no que tange à obrigatoriedade de observância do princípio da eficiência na sua execução, bem como a possibilidade de conflito com os demais princípios.

Dessa forma, pretende-se refutar a premissa adotada por alguns autores, segundo a qual, a eficiência administrativa trata-se apenas de uma norma “álibi”, colocada no rol dos princípios constitucionais, mas sem nenhum efeito prático.

A discussão se mostrará útil na medida em que se verificará a possibilidade ou não de conflito entre a eficiência administrativa com outros princípios constitucionais, como a moralidade e a legalidade. Parte da doutrina entende que a eficiência não poderá, em

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hipótese alguma, se contrapor a tais princípios, atuando sempre de modo conjunto. Não se questiona que isso possa ocorrer. No entanto, se a eficiência administrativa é, de fato, norma princípio, deve, necessariamente, ser passível de ponderação. E logicamente não há ponderação onde inexiste possibilidade de conflito.

Utilizou-se como diretriz para o presente trabalho o método dedutivo, bem como buscou-se realizar uma revisão bibliográfica e jurisprudencial (na medida das possibilidades teórico-metodológicas do estudo).

O método dedutivo utilizado poderá ser melhor visualizado pelo silogismo a seguir:

Premissa 01:

Toda norma princípio possui força normativa capaz de anular atos que a contrariem; sendo, todavia, limitada por outros princípios, considerando que as eventuais colisões entre princípios serão solucionadas pela técnica da ponderação;

Premissa 02:

A Eficiência Administrativa possui força normativa capaz de anular os atos que a contrariem, além de poder ter sua aplicação limitada por outros princípios, hipótese em que utilizar-se-á a técnica da ponderação a fim de solucionar a colisão;

Conclusão:

A Eficiência Administrativa trata-se de uma norma princípio.

Por tratar-se de uma dedução, na hipótese de as premissas 01 e 02 serem provadas verdadeiras, a conclusão necessariamente será verdadeira. À vista disso, a demonstração da veracidade de cada uma das premissas será preocupação dos tópicos a seguir problematizados.

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2 REFORMA ADMINISTRATIVA: NECESSIDADE OU INVENCIONICE?

A eficiência administrativa foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro como norma princípio, de forma expressa, no texto da Constituição Federal de 1988, com o advento da Emenda Constitucional n° 19. Parte da doutrina pátria defende que a inserção do princípio foi resultado da vitória de uma ideologia liberal. Todavia, o professor Paulo Modesto (2001), oferece-nos um interessante contrassenso.

Enquanto a maioria dos críticos afirma que o princípio da eficiência é fruto de uma ideia de Estado liberal, Modesto (2001) demonstrou o contrário. Embora a ideia da eficiência administrativa tenha surgido entre os liberais, é mais coerente afirmar que se trata de uma exigência do Estado social. Como afirma o autor, o agir estatal de qualidade constitui uma exigência do Estado social democrático. O Estado social tem o dever de justificar os recursos que extrai da sociedade, bem como o de primar por resultados adequados.

Seja a eficiência administrativa uma exigência do Estado social ou do liberalismo econômico, é necessário que a sua problematização se dê no seu devido contexto, o qual traz como pano de fundo a reforma administrativa. A reforma administrativa, no Brasil, no período em que foi proposta, pretendeu modificar as normas e os princípios que regulamentavam a administração pública brasileira.

Em consequência da estrutura sobremaneira verticalizada da administração pública brasileira, delineada na Constituição de 1988, existiam sistemas de controles visivelmente desnecessários, bem como barreiras burocráticas praticamente intransponíveis. Diante desse cenário foi que surgiu a Emenda Constitucional n° 19 de 1998 (EC n° 19), a qual pretendia amenizar tais problemas.

O tema “reforma administrativa” não foi algo exclusivo do Brasil. Diversos países contemporâneos foram pioneiros no que se refere a sua normatização, e o Brasil seguiu mais uma tendência. Pode-se dizer que um dos aspectos comuns das reformas administrativas no Brasil e no mundo foi a substituição do modelo burocrático pelo gerencial. Dessa concepção emergiu a intitulada “administração pública dos resultados”.

O contexto da reforma administrativa no Brasil é de crise. A crise na economia brasileira chegou ao auge nos anos de 1990 (PEREIRA, 1996). Contudo, somente em 1995, com a eleição de Fernando Henrique Cardoso, o tema “reforma administrativa” adquiriu relevância.

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Conforme Luiz Carlos Bresser Pereira (1996), entre os anos de 1979 e 1994, o Brasil passou por um período de grande estagnação de renda per capita, e de grande inflação sem precedentes. A situação econômica ganhou estabilidade com o advento do plano real. Pode-se entender a crise da administração pública no Brasil sob três planos: crise fiscal, crise no modo de intervenção e crise na forma burocrática de administração.

Os “planos da crise” acima destacados também são problematizados por Uadi Lammêgo Bullos (1998). A intervenção excessiva do Estado na economia estava causando grande desgaste. Além disso, a própria capacidade administrativa do Estado deteriorava-se a cada dia, fato este que culminou no desprestígio da burocracia estatal. Apesar de tais problemas não serem novidades, agravaram-se cada vez mais com o passar do tempo.

A crise da administração burocrática teve início no regime militar. Os militares, ao invés de consolidarem uma burocracia profissional por meio de concursos públicos, preferiram recrutar administradores das empresas estatais para ocuparem os altos cargos da administração pública. Conforme Pereira (1996), a crise agravou-se ainda mais com o advento da Constituição Federal de 1988, pois, a Carta Política enrijeceu sobremaneira a estrutura da administração pública. As consequências não poderiam ser diferentes: alto custo para o Estado e serviços públicos de baixa qualidade.

Apesar das objeções que possam ser levantadas, alguma medida deveria ser adotada a fim de minimizar os problemas acima narrados, ao menos no nível de uma mudança de mentalidade. Sob essa ótica, a reforma administrativa foi, visivelmente, necessária.

As reformas administrativas, de um modo geral, constituem condição sine qua non para o exercício das liberdades democráticas dos cidadãos. A imutabilidade da administração pública apenas subsiste em regimes políticos autoritários. Não é outro o entendimento de Jaime Rodrígez-Arana Muñoz (2012, p. 21), para o qual:

A reforma da Administração na democracia constitui um trabalho permanente porque é permanente a adequação de governos e administrações às necessidades coletivas dos cidadãos e muito especialmente à condição de melhores condições vitais que permitam o exercício da liberdade solidária das pessoas. Para isso, a reforma da Administração Pública deve realizar-se a partir da realidade.

Todavia, não foram poucas as objeções lançadas contra a reforma administrativa no Brasil. A primeira delas questionava se o Brasil estava preparado para receber as inovações do modelo de administração gerencial. Em segundo lugar, indagava-se se o poder público teria condições para concretizar todo o projeto trazido pela EC n° 19.

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A esta segunda objeção responde-se mediante uma análise sucinta, mas precisa, do real objetivo da EC n° 19, ou seja, da própria reforma administrativa. Seria o objetivo maior da reforma causar uma transformação imediata? Ou, antes disso, a finalidade seria proporcionar uma mudança de “mentalidade” no âmbito da administração pública? A segunda hipótese é mais coerente, haja vista, a necessidade de superação do ultrapassado modelo de administração burocrática.

Uadi Bullos (1998) oferece três razões para o insucesso das reformas administrativas: supervalorização do elemento institucional, mentalidade dos destinatários diretos e indiretos dos preceitos constitucionais reformados e suposição de que reformas constitucionais constituem o remédio para todos os males da administração pública.

Sobre a supervalorização do elemento institucional como uma razão para o insucesso das reformas administrativas, argumenta o autor que as reformas não podem apenas se fundamentar em textos legais ou reorganizações estruturais. A simples alteração do texto constitucional seria incapaz de produzir uma “reforma administrativa”. Ademais, os governantes utilizam-se desse elemento institucional para lançar promessas ilusórias, atribuindo à lei a capacidade de modificar a sociedade.

Bullos (1998) sugere que o princípio da eficiência não tem condições de mudar a realidade da administração pública. O autor, seguindo a linha intelectiva acima exposta, afirma que a simples alteração do texto constitucional não altera em nada o cenário fático. De fato, seria ingenuidade acreditar que a mera mudança legislativa ocasionaria uma imediata mudança da realidade.

O autor acima mencionado alinha-se ao posicionamento de Marcelo Neves (1994), que entende o princípio da eficiência como uma norma “álibi”, a qual serve apenas para o legislador oferecer uma resposta às críticas da sociedade. Todavia, conforme será demonstrado, a positivação do princípio da eficiência administrativa não objetivava a alteração da realidade fática de imediato.

O princípio da eficiência administrativa surgiu em um contexto de crise da administração pública. Como será problematizado em tópico apropriado, a ideia de eficiência administrativa relaciona-se intimamente com os direitos fundamentais.

De modo geral, os princípios e as regras que atualmente estão no ordenamento jurídico emergiram a partir de problemas concretos. O mesmo ocorre com o princípio da eficiência administrativa.

No mais, não é incomum a positivação de normas incapazes de mudar a realidade fática de imediato. Suponha-se que apenas se colocasse “no papel” normas capazes de se

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impor no momento. Assim sendo, vigeria na nossa Constituição de 1988 o objetivo fundamental da República segundo o qual coloca-se como meta a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades?1 A resposta óbvia é somente uma: não.

Sobre os possíveis objetivos da reforma administrativa, Pereira e Spink (2003) mencionam dois: um a curto prazo e outro a médio prazo. A curto prazo a reforma administrativa objetivou facilitar o ajuste fiscal, principalmente no âmbito municipal e estadual. A médio prazo o objetivo era o de tornar a administração mais eficiente, capaz de possibilitar um melhor atendimento aos cidadãos.

O modelo de administração burocrática estava longe de favorecer a aplicação dos valores democráticos no âmbito da administração pública. A partir desse cenário nasce a concepção da necessidade de uma administração gerencial, regida pelo princípio da eficiência administrativa.

1 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: III – erradicar a pobreza e a

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3 EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA: ENTRE OS MEIOS (EFICIÊNCIA) E OS RESULTADOS (EFICÁCIA)

Comumente se confunde os conceitos de eficiência e eficácia, por isso, mister se faz diferenciá-los. A distinção entre eficiência e eficácia é extremamente necessária para que se entenda o real objetivo do princípio constitucional inserido pela EC n°19/1998.

De acordo Juliano Cereijido (2001), a eficiência tem a ver com a busca pelos melhores meios para se alcançar determinada finalidade. Dessa forma, a eficiência administrativa se relaciona com a ideia de seleção dos melhores métodos de atuação para a concretização dos objetivos finais da atividade administrativa.

Para o autor, a busca pelos melhores meios e não os fins traduzem a principal finalidade do princípio da eficiência. Deve-se destacar, entretanto, que a doutrina administrativista brasileira, ao teorizar sobre eficiência administrativa, tende, na maioria das vezes, a fazer uma relação quase que necessária entre esta e os resultados.

Ora, e afinal o que se espera de uma administração eficiente se não bons resultados? No entanto, os resultados não podem ser atingidos de qualquer maneira, mas da melhor possível. Dessa forma, entende-se que a busca pelos melhores meios traduz de forma mais precisa a finalidade do princípio da eficiência do que a busca absoluta por resultados.

Alexandre de Morais (1999) também trabalha com a ideia de que o princípio da eficiência se relaciona com os melhores meios legais e morais para a prestação de um serviço público voltado para o bem comum.

Contudo, importa compreender as vozes dissonantes que afirmam que a eficiência administrativa constitui a busca pelos melhores resultados. Como exemplo dessas vozes cita-se Flávia Trombini Perez (2009). A autora argumenta que a administração eficiente visa prioritariamente os bons resultados. Aduz em resumo que administração pública assemelha-se a uma empresa privada na medida em que busca eficiência econômica, e almeja resultados satisfatórios.

De fato a administração pode e deve almejar bons resultados, mas estes de per si não traduzem a finalidade do princípio da eficiência administrativa. A autora, todavia, insiste em colocar os resultados como objetivos centrais da eficiência.

Para Perez (2009), a eficiência busca a prestação de um melhor serviço público, decisões mais rápidas, redução de gastos administrativos e redução de custos nas empresas

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do Estado. Tais objetivos relacionam-se visivelmente com a ideia de resultados, ou seja, com os fins da atividade administrativa.

Como resultado, por exemplo, espera-se um serviço público de qualidade. Mas de que forma se alcança tal resultado? Escolhendo-se os meios mais adequados para tal. Isso é eficiência administrativa, e a consequência (resultado alcançado) tem a ver com a eficácia. Dessa forma, vê-se uma “confusão” conceitual, pois apesar de eficiência e eficácia se relacionarem, não se confundem.

Não fica claro se a autora supramencionada coloca a busca por resultados como a principal finalidade do princípio da eficiência, ou se defende que a busca por resultados pode integrar a ideia do conceito de eficiência, o que é totalmente possível, conforme se verá.

A eficiência e a eficácia podem se relacionar intimamente. Uma organização eficiente, ou seja, que utiliza meios adequados, otimizando tempo e recursos, tem maior probabilidade de alcançar seus objetivos (de ser eficaz). Contudo, a eficiência não é condição sine qua non para a eficácia. De outra forma, pode-se dizer que os conceitos de eficiência e eficácia não são interdependentes. De modo que é totalmente possível uma organização ser eficiente, mas não ser eficaz, e a recíproca também é verdadeira.

Antônio Carlos da Cintra de Amaral (2002) diferencia eficiência de eficácia utilizando o critério de Chiavenato. O autor, a fim de estabelecer a distinção entre os conceitos, recorre ao jurista Trabucchi, civilista que faz distinção entre obrigações de meios e obrigações de resultado. Sendo que o referido autor afirma que o princípio da eficiência, arrolado no artigo trinta e sete da Constituição Federal, trata-se de uma obrigação de meio.

Dito isto, o que se entende por uma administração pública eficiente? Ou por atos administrativos eficientes? Algo que seja voltado para os meios ou resultados? A administração voltada somente para os resultados não pode ser denominada de eficiente, eficaz talvez. Eficiência administrativa, diz respeito à utilização dos recursos administrativos (meios) da maneira mais adequada, como foi visto.

De toda forma, os fins não podem ser ignorados no que tange à eficiência, e por uma questão bem simples. Não se escolhem meios, ou métodos específicos, sem um objetivo à vista. O meio não é um fim em si mesmo. Escolhe-se um meio visando-se um fim. A eficiência jamais poderá perder de vista a eficácia, ou seja, os meios não podem se desvirtuar dos fins. Disso não decorre, ou ao menos parece decorrer, uma relação necessária entre os dois conceitos?

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Amaral (2002) partilha da ideia de que a eficiência não se preocupa com os fins, mas somente com os meios. Contudo, pelo exposto acima, não se pode concordar com o posicionamento do autor neste ponto. A eficiência é a busca pelos melhores meios, sim, mas de modo algum deixa de preocupar-se com os fins, ou seja, com a eficácia, conforme visto anteriormente.

Com efeito, não faz o menor sentido a seleção dos melhores meios sem um objetivo a ser alcançado. Talvez a ideia oposta seja a verdadeira, ou seja, busca-se entender primeiramente o objetivo (resultado) a ser alcançado e, a partir disso, pensa-se nos meios mais eficientes para alcançá-lo. Por exemplo, tendo em vista que finalidade do serviço público é contribuir para o bem-estar da sociedade (fim), a partir disso, pensa-se nos melhores recursos a serem utilizados para que este objetivo seja obtido (eficiência).

Entretanto, não se pode afirmar que os dois conceitos são interdependentes, na medida em que a eficácia pode ser alcançada sem eficiência. Mas no que tange especificamente à eficiência, esta não pode se desvincular da ideia de eficácia. Isso é lógico na medida em que se entende, como anteriormente exposto, que é irracional a seleção dos melhores meios sem um fim em mente. Assim, se a eficiência é a utilização dos melhores meios, estes estão atrelados, necessariamente, a uma busca por resultados, ou seja, à eficácia.

Nem sempre se é eficiente e eficaz ao mesmo tempo, por isso, não são conceitos interdependentes, embora mantenham relação. Rodrigo Batista de Castro (2006) utiliza uma analogia interessante para diferenciar os dois institutos. Para o autor, a eficiência se assemelha a jogar futebol com arte, enquanto eficácia tem a ver com ganhar o jogo.

Dessa forma, é completamente possível existir uma organização eficiente e ineficaz ao mesmo tempo, basta que não consiga alcançar os objetivos/resultados pretendidos. Com isso, a ideia trabalhada de que a eficiência sempre almeja a eficácia não seria contrariada? De modo algum. A não concretização dos objetivos de uma organização eficiente não implica a negação da ideia de que a eficiência sempre busca a eficácia. Sucede apenas que a eficácia não foi alcançada, apesar de ser o objetivo primordial das medidas eficientes.

A administração pública não pode perder de vista os fins de sua atuação. Atua com eficiência quando seleciona os melhores meios para alcançar determinado fim de um serviço público (vislumbre da eficácia).

Assim, torna-se claro que a administração pública tem o dever de agir com eficiência, não obrigando-se apenas a lançar-se numa busca cega por resultados. Não se deseja conquistar os resultados de qualquer maneira, mas da melhor maneira. Do contrário,

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ter-se-ia a concretização do caduco discurso maquiavélico segundo o qual os “fins justificam os meios” aplicado à administração pública.

Por esta razão, concorda-se com Onofre Alves Batista Júnior (2012, p. 93) na sua definição de eficiência administrativa:

A eficiência representa a relação entre os recursos aplicados e o produto final obtido, ou seja, a razão entre esforço e resultado, entre custo e o benefício resultando (relação entre meios e fins). Está voltada para a melhor maneira pela qual as coisas devem ser feitas os executadas (métodos), a fim de que os recursos sejam aplicados da forma mais racional possível. Verifica-se, pois, que a eficiência preocupa-se com os meios, com os métodos e procedimentos mais indicados, que precisam ser devidamente planejados e organizados, a fim de assegurar a otimização dos recursos disponíveis. Portanto, nos domínios da Ciência da Administração, a eficiência tem a ver com o fazer corretamente as coisas, com a melhor utilização dos recursos disponíveis, enfim, com a otimização da relação meio/fim.

Superada esta querela, calha mencionar a existência de um novo e importante conceito estudado na ciência administrativa: o de efetividade. Diferentemente da eficiência e da eficácia, a efetividade almeja saber em que medida determinada ação traz benefícios à população. A eficácia tenciona saber se o objetivo foi atingido e a efetividade busca entender se o objetivo trouxe benesses efetivas para a sociedade.

Segundo Torres (2004), o conceito de efetividade é mais complexo do que o de eficiência e de eficácia. A efetividade é compreendida através da relação entre a necessidade e oportunidade de determinadas ações estatais. Para o autor, enquanto o conceito de eficiência é de viés mais econômico, o de efetividade é mais social. O Estado poderia atuar de modo eficiente, e ferir a efetividade na medida em que possa ser eficiente numa ação que não seja necessária.

Todavia, não se pode concordar com o autor supramencionado, pois, em conformidade com os conceitos de eficiência trabalhados até o momento, restou demonstrado que a busca por eficiência representa uma busca real pela materialização dos ideais de justiça no âmbito da administração pública. Nessa linha de intelecção, a ideia de efetividade deve ser abrangida pela de eficiência.

O conceito trazido por Alexandre de Morais (1999) integra, de certa forma, ao princípio da eficiência, a eficácia e a efetividade. Para o autor, o princípio obriga a administração direta e indireta e seus agentes à pratica do bem comum, de maneira imparcial e eficaz, sempre almejando a qualidade, e adotando os critérios necessários para melhor utilização dos recursos públicos.

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Contudo, para Amaral (2002) o princípio da eficiência, explícito no rol do artigo trinta e sete da Constituição Federal de 1988, não engloba a eficácia nem a efetividade. Entretanto, este posicionamento contraria a ideia de Di Pietro e de Alexandre de Morais, como foi demonstrado. E, além disso, se ponderarmos sobre o contexto da reforma administrativa torna-se difícil fiar-se que o legislador estava pensando apenas em eficiência em stricto sensu. Mais coerente é a análise lato senso do princípio, ou seja, integrar a busca dos meios com busca pelos resultados e a necessidade do serviço.

Para Paulo Modesto (2001), a atuação eficiente possui duas dimensões. A primeira é a dimensão da racionalidade e otimização dos meios. A segunda é a dimensão da satisfatoriedade dos resultados da atividade administrativa pública. Dessa forma, Modesto também não considera que a eficiência é somente a busca pela otimização dos melhores meios. Conforme o autor, para o jurista, a eficiência é tanto a busca pela otimização dos meios, como a qualidade do agir administrativo.

O autor também menciona a efetividade ao lado da eficiência, quando está a discutir sobre o princípio constitucional da eficiência. Afirma que a celeridade, eficiência e efetividade são condensadas sob o rótulo do princípio da eficiência.

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4 EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA COMO NORMA PRINCÍPIO

No presente capítulo trabalhar-se-á a ideia de “norma princípio”. De logo, se afere um detalhe importante: o termo norma é qualificado pelo vocábulo princípio. Esta qualificação do que se entende por norma foi teorizada pelo jurista Robert Alexy na obra Teoria dos direitos fundamentais.

O autor acima aludido constata a existência de dois tipos de normas: regras e princípios. Na intelecção do jurista, tanto as regras quanto os princípios são normas, pois ambos relacionam-se com a dimensão do dever ser. Um e outro podem ser formulados por meio das expressões deônticas básicas do dever, da permissão e da proibição (ALEXY, 2015, p. 87). No que se refere a distinção entre regras e princípios, Alexy (Ibid., p. 90) estabelece que:

O ponto decisivo na distinção entre regras e princípios é que princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida do possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Princípios são, por conseguinte, mandamentos de otimização, que são caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras colidentes.

A distinção entre regras e princípios será trabalhada de forma mais aprofundada no capítulo “Eficiência administrativa “na medida do possível”: a ponderação como conditio sine qua non para a caracterização de um princípio”. Por ora, pretende-se analisar o conteúdo principiológico da eficiência administrativa.

À vista disso, cumpre ressaltar que, a eficiência administrativa, entendida como norma-princípio, encontra-se limitada normativamente por outros princípios, de sorte que sua aplicação, ou seja, a busca pelos melhores meios, ocorre na medida do possível e não de modo absoluto.

Os melhores meios e resultados podem ser definidos como aqueles que garantem os direitos fundamentais e as liberdades básicas dos cidadãos. Talvez se objete contra tamanha abstração. No entanto, como mencionado anteriormente os “melhores meios” para determinada finalidade somente podem ser identificados mediante a análise do caso concreto.

À vista disso, concorda-se com Muñoz (2012) no sentido de que se deve priorizar a análise da realidade concreta a fim de identificar os melhores meios de atuação a serem

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seguidos. Assim, as "ações eficientes" irão revelar-se a partir do real, não apenas de abstrações.

De maneira bem simplista, pode-se dizer que, diferentemente das regras, princípio é aquilo que “é porque é”. Ou seja, o homem médio pode não conseguir oferecer uma explicação elaborada sobre a sua razão de ser, mas ele o entende. A constatação desse fato pode ser de fácil percepção, mas a sua análise demanda uma profundidade teórica colossal, a qual não é objeto da presente temática.

Não é fato notório, corroborado pela experiência cotidiana, que o cidadão mais simples e incauto consegue visualizar nitidamente a injustiça por trás de uma má atuação da administração pública local que está ocasionando sofrimento às pessoas em decorrência da ineficiência na prestação de um serviço público de qualidade.

Outrossim, todos compreendem, ainda que de forma singela, que é imoral a atitude de um empregado que descumpre os seus deveres perante o seu empregador. Em decorrência do comodismo, o trabalhador procrastina as tarefas a ele incumbidas. É patente que tal conduta constitui verdadeira injustiça.

A analogia acima pode ser aplicada, mutatis mutandi, à administração pública. Os destinatários diretos dos serviços públicos são os cidadãos; eles custeiam a demanda da máquina estatal. De sorte que é uma verdadeira injustiça e imoralidade quando os agentes públicos utilizam-se da morosidade na prestação de seus serviços.

A eficiência administrativa representa a busca pelos melhores meios de atuação a fim de se alcançar os melhores resultados. Todavia, comumente se objeta contra a necessidade de entender a eficiência administrativa como norma princípio. Por que não se contentar apenas com a ideia de uma “boa administração pública”? Porque, apesar de a eficiência estar contida na ideia de boa administração, com ela não se confunde.

A eficiência constitui uma norma cogente que obriga a eleição dos melhores meios viáveis para se obter o resultado desejável. E o melhor meio é aquele que está em sintonia com os demais princípios constitucionalmente consagrados.

Considerando a teoria dos princípios de Alexy, bem como a definição ora adotada sobre o que seja “princípio da eficiência administrativa”, a sua expressão deôntica, pode ser melhor compreendida no preceito de que a administração pública (latu sensu) está obrigada a buscar e empregar os melhores meios a fim de se atingir os melhores resultados, possuindo como ratio essendi (razão de ser) o indivíduo sujeito de direitos.

Analisando-se o controle dos atos administrativos por parte do Poder Judiciário tem-se um vislumbre da normatividade do princípio da eficiência administrativa.

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Pretende-se, assim, entender os reflexos do princípio da eficiência administrativa nos atos administrativos emitidos pelo poder público.

A melhor maneira de identificar se a eficiência administrativa é ou não um princípio da administração pública é observando se possui força o bastante para invalidar as disposições que a contrarie.

A eficiência administrativa apenas poderá ser considerada como um princípio da administração pública caso possua força cogente, capaz de invalidar os atos que a contrarie. A quebra de um princípio basta para invalidar todo e qualquer ato do Estado, conforme Celso Antônio Bandeira de Mello (1999).

Ademais, deve-se ressaltar que princípios não são criados por juristas, eles são identificados e consequentemente reconhecidos no ordenamento jurídico. Não surgem da mera vontade do legislador. Sendo assim, ao concordar-se com a ideia de que se trata de uma norma “álibi” não há que se falar em “princípio da eficiência administrativa”, pois restaria claro que é mero fruto do livre arbítrio do legislador.

Dentro desse quadro, é necessário estabelecer o que se entende por eficiência administrativa. Trata-se realmente de um princípio e não decorre da criativa imaginação do legislador constituinte. Maurício Antônio Ribeiro Lopes (1998, p. 15), entretanto, afirma que a eficiência não passa de um “princípio retórico, e sem nenhuma relevância jurídica”.

Outros autores, como Celso Antônio Bandeira de Mello, também consideram que a inserção do princípio da eficiência não trouxe nenhuma novidade, e que sempre existiu a ideia de que a administração pública e seus agentes devem prestar serviços de forma eficiente, e que isso nada mais é do que o velho princípio da boa administração.

Concorda-se com o autor neste ponto, e justamente por sempre ter existido, fato que sugere a existência de uma norma, já estava mais do que na hora de ser positivado, conforme será discutido adiante.

Também não se pode afirmar, de forma absoluta, que a positivação do princípio da eficiência não trouxe novidades. Para citar apenas um exemplo, veja-se o caso da antiga estabilidade do servidor público, praticamente inviolável, fato este que foi mudado com a reforma introduzida pela Emenda Constitucional n° 19. Graças ao princípio da eficiência, o servidor público pode ser demitido por insuficiência de desempenho. Ademais, várias outras mudanças serão discutidas no presente trabalho.

Argumenta-se aqui que a eficiência administrativa constitui norma princípio, reconhecida e não inventada pelo legislador. O fato é que sempre foi visivelmente lógico

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que uma administração pública, pautada por valores democráticos, deve esforçar-se para atender às demandas dos cidadãos por meio de uma ação eficiente.

Como visto anteriormente, autores como Hely Lopes Meirelles (2007) e Bandeira de Mello (1999) afirmam que sempre houve o dever da prestação do serviço público de forma eficiente pela administração pública. E concorda-se com os insignes juristas no que tange a esta questão. Contudo, não se pode concordar com o argumento de que a inserção do princípio da eficiência no rol do artigo trinta e sete da Constituição Federal de 1988 foi desnecessária.

Estendendo a análise para os demais princípios arrolados no artigo trinta e sete da Carta Magna pode-se usar o mesmo argumento da desnecessidade de positivação. Utilize-se como exemplo o princípio da moralidade. Ora, é totalmente descabido falar-Utilize-se em uma administração pública, num Estado democrático de direito, que não observe a moralidade.

Na linha de intelecção dos autores mencionados, não havia a menor necessidade de sua positivação no texto constitucional para que todos os agentes públicos e demais cidadãos soubessem de sua obrigatoriedade.

Se tais institutos, como moralidade administrativa e eficiência, possuem obrigatoriedade tão óbvia é forçoso admitir que se tratam de normas princípios, existentes a despeito da vontade do legislador. Com isso em vista, o poder constituinte reformador, positivou o princípio da eficiência administrativa na Carta Maior ao lado de todos os demais princípios.

Na verdade, mutatis mutandis, o argumento utilizado pelos renomados juristas pode ser utilizado como uma defesa para a positivação da eficiência administrativa. Bandeira de Mello (1999), como vimos, defende que a eficiência é tão lógica a ponto de sempre ter sido um dever para os agentes públicos. Resta saber se isso implica na desnecessidade de positivação. Entende-se que o contrário é verdadeiro. Ou seja, se a necessidade de eficiência sempre foi tão óbvia e obrigatória para a administração pública, vê-se claramente que se trata de uma norma princípio da administração pública. O legislador foi totalmente coerente ao positivar o princípio em comento.

Não obstante, no que tange à positivação da eficiência administrativa como norma princípio, cabe destacar que normas positivadas podem ser exigidas com maior facilidade. Mesmo que sempre tenha havido a necessidade de observância à eficiência na administração pública, há de se concordar que era praticamente inviável o seu controle por parte da população.

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O legislador, ao arrolar no artigo trinta e sete, a eficiência administrativa com princípio constitucional, ofereceu aos cidadãos um verdadeiro direito subjetivo a uma administração pública eficiente. Isso faz com que os mecanismos de controle sejam aperfeiçoados.

Sendo assim, torna-se notório que o princípio da eficiência administrativa não foi criação da Reforma Administrativa. Esta apenas o reconheceu e o positivou junto aos demais princípios constitucionais que regem a administração pública. A eficiência sempre foi um dever a ser observado pela administração.

Dito isto, pode-se afirmar que o princípio da eficiência contribui para a concretização dos valores democráticos no âmbito da administração pública. Conforme Dal Bosco (2007), o princípio da eficiência constitui verdadeiro instrumento de concretização dos direitos fundamentais dos administrados.

A autora acima mencionada afirma que, ao não observar a eficiência, o Estado passa a prestar serviços de baixa qualidade aos cidadãos, fato que afeta a dignidade daqueles que sustêm o Estado. Consoante esse entendimento, quando o Estado fere a eficiência os próprios direitos fundamentais são violados.

Sendo assim, o direto à saúde, à educação, e o próprio direto à vida podem ser prejudicados por uma ação estatal ineficiente. Este fato corrobora com a ideia de que a eficiência é norma princípio, considerando ser extremamente necessária a sua observância, estando atrelada aos demais princípios, como da dignidade da pessoa humana.

Ademais, como já observado anteriormente, a eficiência administrativa mostra sua força de princípio constitucional de forma nítida ao anular os atos administrativos com ela incompatíveis. Os atos que conflitam com o princípio da eficiência tornam-se passíveis de anulação. E isso decorre da normatividade do princípio da eficiência, tendo em vista que, como todo princípio, possui aplicabilidade direta e imediata, capaz de revogar e anular disposições em contrário.

Cereijido (2001) utilizando-se da classificação dos pressupostos do ato administrativo de Celso Antônio Bandeira de Mello, coloca a eficiência como pressuposto objetivo do ato administrativo. Dessa forma, a eficiência estaria no campo da validade e não no da existência do ato administrativo. Um ato administrativo pode existir sendo eficiente ou não, contudo não será válido na hipótese de violar a eficiência.

Tal entendimento é totalmente coerente com a realidade administrativa. Um ato ou conduta do Estado que não possua aptidão para produzir efeitos de forma eficiente não

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pode ser tido como válido. Contudo, conforme será discutido a seguir, a produção de efeitos se relaciona melhor com a eficácia, ou seja, com os resultados, e não a eficiência.

Atos administrativos violadores do princípio da eficiência estão passíveis de serem invalidados. E isso decorre da normatividade do princípio da eficiência que, assim como todo princípio, possui aplicabilidade direta e imediata, capaz de revogar e anular disposições contrárias, bem como impor ao poder público o dever de atuação, conforme será demonstrado.

Para a correta compreensão da normatividade do princípio da eficiência administrativa far-se-á uma análise do controle dos atos administrativos realizado pelo Poder Judiciário. Para tanto, serão discutidos três julgados sobre o tema.

Não se pretende aqui discutir o mérito sobre a possibilidade ou não do controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário no que tange à eficiência. Para todos os efeitos adota-se, aqui, o posicionamento que afirma a possibilidade de tal controle.

A primeira decisão em que se pode perceber a obrigatoriedade de aplicação do princípio da eficiência refere-se ao REsp. nº 492.194-SC do Superior Tribunal de Justiça (STJ), exemplo este trabalhado por Edilson Pereira. Tal julgado estabeleceu que deve haver “apresentação de Declaração de Operações Imobiliárias em meio magnético”, pois isso favorece à celeridade e à eficiência da prestação do serviço. No caso em comento, a declaração feita não foi aceita por ter sido datilografada, fato que, segundo o entendimento do STJ, feriu o princípio da eficiência.

Karina Munari Rezende (2005) traz outro interessante julgado do STJ referente à questão da conclusão de processos administrativos de outorga, nos casos de rádio comunitária e de anistia política:

[...] 2. Déficit na estrutura administrativa, com excessiva demora na apreciação dos pedidos de autorização, ensejando excepcional consentimento judicial para o funcionamento. 3. Exame da legalidade no moderno direcionamento, que não pode ser entendido como submissão absoluta à lei. [...] o Judiciário não pretende imiscuir-se na atividade precípua do órgão público. A intervenção que se pretende é em nome do princípio da eficiência e da moralidade, porque não se pode admitir que permaneça uma comunidade a aguardar solução, por mais de um ano (sic). O que se espera é que haja uma resposta, uma informação, um reconhecimento, pelo menos. A era da pós-modernidade está a exigir da Administração Pública postura que a identifique com a sociedade à qual serve, superando a grave crise de identidade e de gestão, ambas escondidas no princípio da legalidade, retórico, formal, ocultando, sem dúvida alguma, o intuito de manter-se no status quo. Não se apregoa aqui a quebra do princípio da legalidade. Afinal, é ele a expressão maior do Estado de direito. No entanto, pretende-se proclamar, sim, que o princípio da legalidade não pode ser entendido como submissão absoluta à lei, deixando os Poderes da República a reboque do Legislativo. [...] A nova proposta é para que se assente a legalidade, a que se

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submete a Administração, na dimensão global do ordenamento jurídico, no qual estão consagrados valores constitucionalmente inerentes ao modelo de Estado ali previsto. E, nesse modelo, a transparência, a eficiência e a moralidade transparecem como corolários da legalidade (STJ, REsp. 549253/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU 15-12-2003).

Percebe-se claramente como a eficiência se relaciona com a dignidade da pessoa humana, como outrora discutido, pois no caso em comento, por ineficiência, o poder público estava causando prejuízo aos cidadãos. Também nota-se, como abordado anteriormente, a possibilidade de conflito entre a eficiência e a legalidade. Não no sentido de se permitir que um ato fira a legalidade na busca por eficiência. É justamente o contrário, ou seja, o poder público atuando de forma legal, como no julgado, pode ter sua atuação reprimida por ferir a eficiência administrativa.

Outro exemplo pode ser citado. A internação hospitalar numa dada unidade de saúde foi prejudicada mesmo havendo dezoito leitos disponíveis. O Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS)2 demorou excessivamente no cadastramento dos leitos, e o resultado foi sentido pela população que carecia daquele serviço. O caso foi julgado pelo Tribunal Federal Regional da 4º Região. Vê-se, assim, que o princípio da eficiência, nessa situação, encontra-se diretamente atrelado ao direito fundamental à saúde.

Diante disso, surge uma questão fundamental: Como definir o conteúdo de algo como “eficiência administrativa”? Não basta aduzir simplesmente que se resume à busca dos melhores meios objetivando a fim de se atingir os melhores resultados, pois ainda permanece o problema de definir quais os melhores meios e resultados.

Muñoz (2012) parte do pressuposto de que se deve priorizar a análise da vida concreta para a criação dos melhores meios de atuação do poder público. A eficiência constitui verdadeira norma de caráter obrigatório capaz de gerir e medir a atuação dos agentes públicos, todavia, não existe a priori possibilidade de definirmos definitivamente os melhores meios e resultados esperados. As "ações eficientes" irão revelar-se a partir do real, e não de abstrações.

A realidade é por demais fluida. Os problemas postos ante o aplicador do direito são vários e “estranhos”, de modo, não fosse a generalidade e abstração dos princípios, não haveria solução para tais casos.

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Os melhores meios e resultados podem ser definidos como aqueles que garantem os direitos fundamentais e as liberdades básicas dos cidadãos. Talvez se objete contra tamanha abstração. No entanto, como mencionado anteriormente os “melhores meios” para determinada finalidade somente podem ser identificados mediante a análise do caso concreto.

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5 DIREITO FUNDAMENTAL À BOA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DESENVOLVIMENTO HUMANO

Antes de se entender o conceito de boa administração, convém lançarmos luz sobre o que significa uma má administração. Má administração pode ser conceituada como um conjunto de atos emanados do poder público que, por sua ineficiência ou inobservância aos preceitos legais, violam os direitos fundamentais constitucionalmente garantidos.

Para Muñoz (2012, p. 112), “[...] se produz má administração quando um organismo público não atua em conformidade com as normas e princípios que deveriam se ater obrigatoriamente”.

Falar em um “direito à boa administração” implica uma responsabilidade para o suposto garantidor desse direito, no caso, o poder público. Se é direito, pode ser exigido nos tribunais. Todavia, a este respeito há que se considerar as dificuldades que surgirão, tendo em vista a recente construção de algo como o “conteúdo” desse direito à boa administração pública.

Consoante o artigo 43 da Carta de Nice (2002):

Qualquer cidadão da União, bem como qualquer pessoa singular ou colectiva com residência ou sede social num Estado-Membro, tem o direito de apresentar petições ao Provedor de Justiça da União, respeitantes a casos de má

administração na actuação das instituições ou órgãos comunitários, com

excepção do Tribunal de Justiça e do Tribunal de Primeira Instância no exercício das respectivas funções jurisdicionais.

Diante disso, é notório que o princípio da eficiência administrativa relaciona-se intimamente com a garantia aos direitos fundamentais dos cidadãos, e, se for respeitado, oportuniza a retirada de colossais barreiras impeditivas ao desenvolvimento humano do país. Esta ideia representa o ideal da boa administração.

Concorda-se com Muñoz (2012) quando o insigne autor defende que o estudo sobre a boa administração deve prezar pela interdisciplinaridade. É nessa linha de intelecção que se resgata a ideia de Amartya Sen (2000) sobre desenvolvimento humano, aplicando-a ao tema ora estudado com as contextualizações devidas.

Amartya Sen teorizou de forma exaustiva sobre o tema Desenvolvimento Humano, lançando por terra a ideia vigente de que o crescimento econômico constituía o único parâmetro definidor de "desenvolvimento”.

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Amartya Sen, juntamente com seu colega paquistanês Mahbub Ul Haq, foi um dos colaboradores na criação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), medida muito mais fidedigna de mensuração da qualidade de vida de um país do que o Produto Interno Bruto (PIB), propondo um foco maior nas capacidades individuais. O IDH é utilizado como fonte para o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e tem por base três dimensões de avaliação, as quais são: a saúde, por meio da mensuração da expectativa de vida ao nascer; a educação, avaliada pelos índices de analfabetismo e porcentagem de matrícula em todos os níveis de ensino; e renda, medida pelo poder de compra da moeda de cada país.

O ideal de desenvolvimento seniano diz respeito à promoção do bem estar social. A liberdade seria o meio e o fim para a conquista do efetivo desenvolvimento. Uma administração púbica eficiente, na medida em que propicia a retirada de barreiras que limitam as liberdades fundamentais dos cidadãos, influi decisivamente no desenvolvimento de um país. Dessa forma, um país que seja economicamente próspero, mas cerceador das liberdades políticas, não pode ser considerado um país desenvolvido.

A ideia da boa administração pública, norteada pela eficiência administrativa, relaciona-se, ainda, com o desenvolvimento humano teorizado por Amartya Sen na medida em que uma máquina pública ineficiente na prestação dos serviços públicos viola, das mais variadas formas, os direitos fundamentais de seus administrados.

É um erro acreditar que existe liberdade em um Estado Democrático de Direito cuja máquina pública é ineficiente. Sem liberdade não existe democracia. Payot (2018) critica a crença de que a ideia da nossa liberdade nos faz livres. Em outros termos, o autor afirma que não basta afirmarmos a liberdade em abstrato para sermos livres. Pelo contrário, a crença infundada em tal liberdade constitui fator limitante à real liberdade. Aqueles que supõem serem muito livres, omitem-se no esforço para conquistar a liberdade que, de fato, poderiam ter.

Uma sociedade que priva sua população de exercer suas liberdades básicas não pode ser considerada desenvolvida ou justa. O próprio Rawls (2000) afirma que a justiça está atrelada à ideia de liberdade. À vista disso, qualquer restrição a ela torna-se injusta por condenar indiscriminadamente pessoas a uma condição de calamidade. A justiça, pois, concretiza-se com o estabelecimento da liberdade.

Ora, direitos como o acesso à educação de qualidade e a um serviço público de saúde razoável, estão passíveis de serem brutalmente violados num cenário de uma administração pública ineficiente. O direito fundamental à boa administração pública

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nasce, assim, para todos os setores da sociedade a fim de extirpar tais cerceamentos, ou, não podendo tanto, ao menos minimizá-los.

Não apenas no Brasil, mas no mundo ainda existem diversas formas de privação de liberdades. Fome e miséria assolam diversas partes do globo, negando a possibilidade de sobrevivência a muitas pessoas. Falta de educação ou sistemas educacionais ineficientes negam capacidade de discernimento a outro tanto de desafortunados, provocando sua permanência no analfabetismo político-social. Sistemas de saúde falidos transformam o paciente em mais um número nas infindáveis estatísticas de morbidade/mortalidade, impedindo o acesso a uma vida longeva.

Com as devidas contextualizações, tais problemas podem ser atribuídos de maneira direta ou indireta à inobservância ao direito fundamental à boa administração das pessoas vitimadas por tamanha injustiça. Não restam dúvidas, gestões públicas ineficientes minam as liberdades fundamentais dos seus cidadãos.

Sobre as liberdades, Amartya Sen (2000) analisa a existência de cinco tipos de liberdades, que segundo ele, são instrumentais: a) liberdades políticas, b) facilidades econômicas, c) oportunidades sociais, d) garantias de transparência e e) segurança protetora. Por meio de encandeamentos, uma liberdade acaba vinculada à outra, fazendo com que seus diferentes tipos possuam uma intrínseca relação entre si. Uma liberdade pode contribuir para promover outros tipos de liberdade; esse é o enfoque da liberdade instrumental trabalhado por Sen.

O Japão é um exemplo de como as liberdades se suplementam e se fortalecem. Através da educação, esse país teve condições de criar um efetivo corpo de recursos humanos, graças às oportunidades sociais (SEN, 2000), o que foi determinante para seu desenvolvimento econômico. Assim, percebe-se que o crescimento econômico é diretamente favorecido pelas oportunidades sociais.

Todos esses exemplos relacionam-se com a busca por eficiência na gestão pública. Países que entendem que os serviços públicos devem ser prestados de forma eficiente, tendo os indivíduos de sua nação como fim, são tidos como desenvolvidos.

Nessa linha de intelecção, não é necessário um esforço imaginativo hercúleo para prever as consequências do futuro da população de um país que não forneça um serviço educacional de qualidade, ou seja, de forma eficiente.

Dessa forma, o princípio da eficiência não diz respeito uma invenção, advinda dos alvedrios do legislador constituinte originário. Ele sempre esteve latente na própria ideia de administração da coisa pública; é um dever que se impõe e não uma faculdade.

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Sendo assim, da análise do princípio da eficiência no contexto do direito fundamental à boa administração pública, emerge outra relação interessante e bastante lógica: a obrigatoriedade da observância de uma eficiência administrativa atrela-se perfeitamente ao princípio da indisponibilidade do interesse público. O princípio da indisponibilidade do interesse público prescreve que o gestor da coisa pública não a possui, sendo sua ação vinculada às determinações legais.

Em decorrência dessa premissa, coloca-se a eficiência administrativa como norma obrigatória. Assim, aduzir que a observância da eficiência, de algum modo, enquadra-se na discricionariedade dos agentes públicos, contraria frontalmente a ideia de indisponibilidade do interesse público.

De acordo com Muñoz (2012), as instituições públicas numa democracia não pertencem aos seus dirigentes. Significa dizer que os agentes estatais não podem assenhorar-se da máquina pública de forma arbitrária. Devem, antes, servir à sociedade que lhes patrocina, prestando um serviço público de qualidade.

Resta evidente que a busca pela eficiência administrativa simboliza o legítimo anseio por justiça no modo de prestação dos serviços públicos e atuação estatal. A estrutura organizacional do Brasil difere substancialmente da estrutura de outros países, como aqueles do bloco europeu. O serviço público em “terra brasilis” é imprescindível na grande maioria dos casos. Sendo assim, uma “má administração” não traz apenas um “mal-estar”; pode constituir um atroz instrumento cerceador de direitos fundamentais (MUÑOZ, 2012).

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6 EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA “NA MEDIDA DO POSSÍVEL”: A PONDERAÇÃO COMO CONDITIO SINE QUA NON PARA A

CARACTERIZAÇÃO DE UM PRINCÍPIO

O presente tópico pode ser polêmico porque afirma a possibilidade de colisão entre o princípio da eficiência e os demais princípios, contudo isso será demonstrado de forma bem fundamentada. A possibilidade de conflito parte da própria ideia caracterizadora de um princípio. Conforme será discutido, se não houvesse essa possibilidade, a eficiência administrativa não seria um princípio, mas um trivial vetor interpretativo.

É mister esclarecer que a pacificação dos conflitos entre princípios difere fundamentalmente das soluções aplicadas no caso de colisão entre regras. A fim de se compreender essa importante distinção será utilizado um exemplo trazido por Robert Alexy (2015).

Imagine-se uma regra escolar cuja determinação obriga os alunos a retirarem-se da sala de aula somente após ouvirem o som do sinal de “toque liberador”. Além dessa regra, existe uma outra que preceitua o seguinte: “caso o alarme de incêndio toque, todos os discentes deverão sair da escola”.

Agora amplie-se o esforço imaginativo para visualizar o momento em que o alarme de incêndio começa a soar, sendo que o toque de liberação dos alunos ainda não ocorreu. É um excelente caso de conflito entre normas, especificamente entre regras.

A resolução se dá mediante a inserção de uma cláusula de exceção na primeira regra. Ou seja, basta aduzir que os alunos somente poderão retirar-se da sala de aula ao ouvirem o som do sinal de “toque liberador”, a não ser em casos de incêndio.

Caso a solução da “cláusula de exceção” não baste, uma das regras conflitantes deverá ser banida do ordenamento jurídico, pois a regra aplica-se em conformidade com a máxima do “tudo ou nada”. Pode-se aplicar nesses casos os conhecidos critérios para a solução de conflito previstos na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.

Em hipóteses de colisão entre princípios a solução é distinta. O antagonismo pode advir na medida em que o conteúdo normativo ou expressão deôntica de um conflite com a do outro. Imagine-se que determinada conduta seja proibida pelo princípio A, mas permitida pelo princípio B. Como se apaziguaria a colisão? Consoante Alexy (2015):

As colisões entre princípios devem ser solucionadas de forma completamente diversa. Se dois princípios colidem – o que ocorre, por exemplo, quando algo é proibido de acordo com um princípio e, de acordo com o outro, permitido –, um

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