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1 POLÍTICA HABITACIONAL NO BRASIL: A HABITAÇÃO DE INTERESSE SOCIAL EM QUESTÃO

GRÁFICO 3.3.1 CONTRATAÇÕES DO FGTS 1995-

3.3.4 Carta de Crédito

Nessa sequência de programas que foram implementados e com a conjuntura econômica que limitava o orçamento existente na liberação de recursos no atendimento às demandas habitacionais da população de baixa renda, verificamos as ações do governo FHC em incentivar o mercado imobiliário, a partir de novos programas de habitação voltados para a ampliação do nível salarial das famílias a serem beneficiadas, ampliando o direcionamento dos recursos para a população com renda econômica mais elevada e diminuindo a quantidade de recursos direcionada às famílias mais pobres.

Para tanto, FHC criou o Programa Carta de Crédito, com linhas de financiamento encaminhadas diretamente ao cidadão, podendo também ser direcionadas para as pessoas físicas organizadas em sindicatos, associações, cooperativas ou até concedendo financiamento para as Companhias de Habitação e também construtoras do setor habitacional (LORENZETTI, 2001).

O Programa Carta de Crédito não se caracterizava como um programa de habitação de interesse social voltado para as camadas sociais de maior fragilidade econômica, considerando que abrangia uma população cuja renda familiar era de até 12 salários mínimos, utilizando recursos da caderneta de poupança e do FGTS (SILVA, 2009)248.

O Programa se dividia em duas modalidades, sendo a primeira a Carta de Crédito Individual e a segunda a Carta de Crédito Associativa, sendo que, conforme Lorenzetti (2001, p. 23),

A primeira implicava no crédito direto ao cidadão para aquisição de habitação nova ou usada, além de ampliação e melhoria da habitação já existente, construção de moradia ou aquisição de lote urbanizado para construção, bem como a compra de material de construção com recursos do FGTS. Na segunda modalidade associativa o programa volta-se para as pessoas físicas agrupadas em condomínios ou organizadas por associações, sindicatos, cooperativas ou empresas construtoras ou órgãos semelhantes.

Esse Programa, entre os anos de 1995 a 2000, investiu em torno de R$ 11,3 bilhões, financiando aproximadamente 854 mil unidades habitacionais (CEF, 2005).

Destacamos a utilização dos recursos do FGTS para atingimento das classes sociais com maior renda familiar. Este Programa foi o que recebeu maior volume de recursos, sendo não compreendido como de atendimento à população que compunha o quadro de maior carência em habitação.

Em suma, as famílias beneficiadas caracterizavam-se pelo perfil mais próximo ao teto estabelecido pelo Programa, ou seja, o de 12 salários mínimos, sendo que as famílias com renda familiar abaixo dos 05 salários mínimos eram encaminhadas para inscrição junto aos Programas Pró-Moradia e Habitar Brasil com grandes limitações orçamentárias, conforme já verificado anteriormente.

Uma confirmação dessa preferência pelo atendimento às famílias com renda familiar mais elevada pelo Programa Carta de Crédito pode ser verificada no percentual dos recursos destinados às famílias atendidas nas duas modalidades. A modalidade Carta de Crédito Associativa teve 15,8% dos recursos destinado às famílias até cinco

248 Lembrando que o grande déficit qualitativo e quantitativo da habitação encontra-se na população cuja renda familiar é de até três salários mínimos.

salários mínimos, sendo que para as famílias com renda de até três salários mínimos, somente 1,9% destes foram executados (BONDUKI, 2008).

Já às famílias com renda superior a cinco salários mínimos, a CEF destinou 84,2% de todos os recursos, sendo que destes, para às famílias acima dos dez salários mínimos alocou 49,7% de todos os recursos. Já na modalidade Carta de Crédito Individual foram investidos 6,2% dos recursos no atendimento às famílias de até três salários mínimos, sendo que quando consideradas no total, juntamente com as famílias de até cinco salários mínimos verificamos o direcionamento de 21,3% dos recursos, enquanto que acima dos cinco salários mínimos representou a aplicação de 78,7% de todo o volume de recursos realizados nessa modalidade (BONDUKI, 2008).

O principal programa da SEPURB/SEDU em termos de quantidade de investimento direcionado para habitação foi a Carta de Crédito individual (60,48%), seguido da Carta de Crédito associativo (19,06%), demonstrando uma predileção no atendimento habitacional pela política nacional voltada para a classe média e alta da população brasileira (LORENZETTI, 2001).

Diferentemente de outros Programas como o Pró-Moradia e o Habitar Brasil, que tiveram uma redução significativa entre o valor previsto e o executado no atendimento às demandas habitacionais da população de baixa renda, o Programa Carta de Crédito teve os investimentos ampliados, praticamente dobrados, passando entre os anos de 1995 a 1998 de R$ 6.000.000,00 para quase R$ 12.000.000,00(CARDOSO, 2008). Segundo Lorenzetti (2001, p. 23) “desde 1995 até 2000, segundo boletim informativo da Caixa Econômica Federal, o Programa investiu em torno de 11,3 bilhões, financiando em torno de 854 mil unidades habitacionais”.

A necessidade de buscar alternativas econômicas que garantissem a viabilidade financeira da Política Habitacional Brasileira distanciava a população que compunha o quadro de maior carência habitacional do atendimento público na área na promoção de segurança e qualidade no modo de inclusão social a partir do espaço físico urbano, a cada novo programa habitacional implementado pelo governo.

O estímulo dado às empresas privadas de construção civil ampliava-se na mesma proporção que a implantação de novos programas era viabilizada, caracterizando uma política governamental na área setorial da habitação urbana, voltada para uma diminuição da participação do Estado no atendimento a um público ao qual não viabilizava o retorno das aplicações financeiras realizadas com os recursos provenientes, em sua maior parte, dos próprios trabalhadores, como o FGTS e a caderneta de poupança, demonstrando uma incoerência política no uso dos recursos públicos que deveriam, em sua maior parte, atender à população que compunha o quadro de maior carência habitacional.

Verificamos que as novas alternativas formuladas pelo governo na área gravitavam em torno de redução do déficit público e de um estímulo dado aos setores econômicos privados, a fim de proporcionar crescimento e estabilidade econômica, deixando para este a responsabilidade de ofertar a “habitação”, desconsiderando suas especificidades como “produto” e como elemento fundamental na vida do cidadão garantido por Lei.