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O PAPEL FORMADOR DO JORNALISMO CIENTÍFICO

1.5.1) O CASO DA VINC

Funcionando no período de 1999 a 2003, o caderno Da Vinci é mantido pela UFRN, e circulou quinzenalmente encartado no Diário de Natal. Ele está sem circular a aproximadamente um ano, desde que aconteceu a sucessão de reitores em 2004. A nova gestão da UFRN já aprovou o projeto novamente, mas por enquanto, ele ainda aguarda a liberação formal de verbas. Segundo informações do editor Alex de Sousa, do Diário de Natal, ele voltará a circular em 2005, com novidades em seu projeto gráfico, com mais páginas e nova diagramação12.

O caderno possuía oito páginas que comportavam oito artigos acadêmicos ilustrados com obras de arte de artistas potiguares. Tal procedimento era adotado para também divulgar os trabalhos dos artistas locais. O caderno, contudo, possui rotinas diferentes de edição. Um conselho editorial formado por professores representantes de todos os centros da UFRN é que escolhe os textos a serem publicados. O editor do Diário de Natal apenas titula e faz a revisão gráfica nos textos, além de escolher as ilustrações. Ele concedeu entrevista a este autor e explicou o funcionamento do suplemento: “Não é um caderno comum, é um projeto experimental. Desta forma ele não sofre alterações na redação. Excepcionalmente, nós substituímos palavras e termos não-usuais para o jornal ou, em casos mais raros, colocamos algumas frases em ordem direta, para facilitar a leitura” (SOUSA, 2005).

Algo, contudo, que facilita o trabalho de edição é que existem normas de padronização para publicar os textos. Os autores já entregam os artigos ou ensaios dentro destas normas e o conselho editorial da UFRN faz a triagem dos textos selecionados. Entre as maiores dificuldades no projeto encontradas pelo editor Alex de Souza, estão a falta de prazos

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e de infra-estrutura. “Os artigos eram entregues com poucos dias de antecedência, às vezes, 24 horas antes do prazo final. Ou seja, não tínhamos tempo para produzir as páginas com mais qualidade. Assim como os recursos empregados no projeto não eram suficientes e nós nos restringimos a utilizar o material da redação do Diário de Natal (computadores, arquivo de imagens, etc.) algo que nem sempre atende aos critérios mais exigentes de qualidade” (SOUSA, 2005).

Os assuntos do caderno têm uma amplitude temática muito vasta, pois estão ligados a toda produção científica da UFRN. No último número do Da Vinci, por exemplo, encontramos textos de Educação, Biologia, Engenharia Mecânica, Piscicultura, Artes Plásticas e Psicologia. Um detalhe deve ser lembrado: os artigos não possuíam bibliografia por falta de espaço nas páginas, mas o editor do Diário de Natal fica responsável por escolher sugestões de leitura vinculadas ao tema.

Em cinco anos de existência, o Diário de Natal disponibilizou ao caderno três editores: Carlos de Souza, Rodrigo Hammer e por fim, Alex de Souza. Este último também diagramou o caderno durante estes cinco anos. Entre os vários editores consultados do Diário de Natal, incluindo o diretor de redação, jornalista Osair Vasconcelos, nenhum se lembrou, ou confirmou a existência, no passado, de outras editorias ou projetos científicos relevantes desenvolvidos pelo Diário de Natal.

O Da Vinci possui um campo discursivo em seu cerne. Podemos afirmar que os produtores da informação (acadêmicos), realizam a mediação destas informações (através da publicação em jornais), mas fica-se sem saber sobre a recepção destes textos diante da audiência, do público. Mas mesmo sem ter como medir o nível de aceitação do Da Vinci diante do leitor potiguar, esta dissertação cita uma prática bastante comum no Rio Grande do Norte: os cadernos com assuntos pedagógicos que circulam nos jornais (Educação, Ciência e Turismo) geralmente possuem uma distribuição à parte que não vai apenas às

bancas de jornais e assinantes. Os suplementos são distribuídos gratuitamente nas escolas públicas, em repartições do Estado, em livrarias ou sebos. As sobras da circulação também são doadas a instituições culturais ou filantrópicas, o que significa dizer que, mesmo sem ter como checar a aceitação do público sobre o Da Vinci, sabemos que ele tem ampla e gratuita distribuição.

Podemos concluir, portanto, afirmando que o caderno Da Vinci, não pode ser classificado como um elemento estratégico de poder discursivo de uma elite dominante, apenas por circular na mídia. Ao contrário, serve como um instrumento para legitimar os textos científicos, tentando popularizar este tipo de documento que não possui um nicho específico de mercado, e que tradicionalmente no Brasil tem um número reduzido de leitores. É também a complementação que faltava à concepção editorial do Diário de Natal, que não possui editoria de ciência e nem tem suficientes equipes de reportagem para cobrir a produção científica realizada nos laboratórios da UFRN.

Outro fator importante é que o suplemento abre espaço a idéias polêmicas e discordantes dentro da produção científica - que geralmente não encontram espaço editorial nas ditas publicações oficiais da academia. Então, assuntos mais polêmicos como a Nanotecnologia ou os Fractais, já encontraram respaldo nas páginas do Da Vinci. Vale dizer, por último, que o caderno ainda não é uma publicação indexada pelos órgãos oficiais de pesquisa. Para os pesquisadores profissionais as publicações indexadas têm valor curricular.

O Da Vinci e os outros suplementos citados nesta dissertação se depararam com um paradoxo bastante comum na atualidade dos meios de comunicação. Eram produtos eruditos que dependiam do sistema de produção da chamada indústria cultural. Neste sentido vale citar a análise que Bordieu (1999, p. 105), realiza sobre a estrutura de funcionamento do campo da produção erudita, ao lembrar que existe um sistema de relações objetivas entre as diferentes instâncias definidas pela difusão de bens simbólicos e intelectuais. Bordieu

distingue o produto erudito do popular sem realizar, no entanto, julgamentos ou análises valorativas sobre estes produtos. Sua intenção é demarcar a existência deste campo social da produção destas idéias.

[...] de um lado, o campo de produção propriamente erudito enquanto sistema que produz bens culturais, e os instrumentos de apropriação destes bens. [...] Por outro lado, o campo da indústria cultural, especificamente organizado com vistas à produção de bens destinados ao grande público (BORDIEU, 1999, p. 05).

Bordieu (1999, p. 105) salienta que o sistema da indústria cultural obedece às leis do mercado, através da concorrência, pois o objetivo é ampliar cada vez mais o público, enquanto o campo da produção erudita tende a produzir ele mesmo suas normas de produção e critérios de avaliação de seus produtos. A vantagem deste paradoxo, é que ambos os sistemas podem se alimentar das virtudes do outro. Enquanto a produção erudita apresenta e difunde um conhecimento científico que geralmente não chega a um grande público leitor, por outro lado, os veículos de comunicação se credibilizam com aquele tipo de informação, gerando então, sistemas híbridos de informação; algo já previsto pela Escola de Frankfurt. Por último deve se lembrar que tanto a produção erudita, quanto a indústria cultural são obrigadas a se adaptarem em termos de linguagem, quando se dirigem a um público vasto, e quase sempre, leigo. As populares revistas de ciência (Science, National Geographic, etc) são exemplos destes sistemas mistos. São revistas balizadas por renomadas associações científicas, mas que se utilizam do aparato técnico da indústria cultural para disseminar as suas informações, quase sempre em linguagem jornalística.