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1.3.3) TEMAS, FONTES E A COBERTURA DO JORNALISMO CIENTÍFICO

O PAPEL FORMADOR DO JORNALISMO CIENTÍFICO

1.3.3) TEMAS, FONTES E A COBERTURA DO JORNALISMO CIENTÍFICO

Os temas fixos e a fontes também necessitam de uma análise específica ao se discutir o Jornalismo Científico. Segundo Bueno (2001), existem problemas clássicos no JC contemporâneo: - A corrida pela leitura do livro da vida; o arrendamento da base de lançamento de foguetes brasileiros para os EUA; o lobby de laboratórios internacionais para a liberação de novas drogas e os interesses em disputa no universo dos transgênicos. Estes temas apontam para a relação, cada vez mais perigosa, entre a produção de ciência e tecnologia (C&T) e o jogo da política de mercado10. Segundo o pesquisador essa é a discussão mais premente a se empreender no Jornalismo Científico, tendo em vista o fato de que essa relação compromete definitivamente a independência e a qualidade da informação na produção de ciência e tecnologia (C&T).

A mídia, mais antenada com a busca de audiência e a transformação da notícia em espetáculo, na maioria das vezes, faz a sua parte neste jogo, postando-se invariavelmente ao lado dos que postulam o atrelamento da ciência e da tecnologia ao mundo do capital. Com raras exceções, a cobertura de ciência e tecnologia, realizada pelos meios de comunicação, está à mercê de fatos espetaculares e vive em função de espasmos, pecando pela irregularidade e pela falta de especialização. Por isso, é tão difícil identificar profissionais de imprensa que trabalham exclusivamente neste campo, ainda que, felizmente, os que aí se postam sejam, em geral, lúcidos e competentes. Relegada a segundo plano (entregue a jornalistas sem experiência ou especialização), a cobertura de C&T acaba sendo fragmentada, não contextualizando as notícias e, sobretudo, alimentando, ingenuamente, a sanha dos que se apropriam do conhecimento científico visando unicamente auferir lucros (BUENO, 2001, p. 03).

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Existe uma teoria na História da Comunicação que estuda estes processos. Ela se chama Economia Política e se desenvolve a partir dos anos 60. A vertente assume uma análise sobre o desequilíbrio dos fluxos de informação, levando em consideração a realidade dos países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Herbert Schiller, principal teórico desta escola, escreveu a obra “Mass Communications and American Empire” (1969) inaugurando uma série de pesquisas que levam em consideração a imbricação entre o complexo militar industrial e a indústria da comunicação. Foi ele quem criou o conceito de “imperialismo cultural”. (MATTELART, 1999, p.113).

Ainda citando Bueno (2001), basta consultar os jornais, as revistas e a televisão brasileira para identificar medicamentos que prometem, a cada dia, curas milagrosas, terapias alternativas e gurus que proclamam a superioridade do produto estrangeiro. “O cerco à informação científica está, portanto, se fechando, graças a esse esforço global de estabelecer, a qualquer custo, o sigilo e controle da informação científica, visando proteger interesses de parceiros privados, recrutados para financiamento de grandes projetos” (BUENO, 2001, p. 07).

Continua sendo importante dispor de boas fontes, conhecer o assunto de que se fala, mas o jornalista também precisa (e deve para isso, ser conscientizado ainda nas universidades) desconfiar de quem entrevista e daquilo que lê para fundamentar as suas matérias. Boas fontes não significam que são “insuspeitas” e instituições estabelecidas nem sempre são independentes. Para Bueno, a maioria das escolas de Jornalismo não inclui uma disciplina voltada à produção de matérias de C&T e, se o fizerem, devem cuidar para que seja prática e que esteja sob a responsabilidade de professores que tenham esta visão crítica da relação entre ciência e poder.

É preciso que os jornalistas de C&T tenham um mínimo de visão interdisciplinar, capacidade de reflexão, liberdade e coragem para deixar de lado velhos clichês e condicionamentos comuns nas redações, que, na verdade, refletem os condicionamentos da própria sociedade. Jornais e mídia eletrônica, em geral, seguem atrás dos fatos. Mas é preciso escapar das críticas a este modelo.

Dificilmente conseguem colocar-se uma curva adiante, entender antes, fazer projeções mais ou menos seguras. Basta consultarmos as coleções da imprensa para confirmarmos isso. Meia dúzia de fontes determina o que os jornais e a TV vão dizer (MORAIS, 2003).

mídia, como por exemplo, transgênicos, mudanças climáticas, clonagem, biodiversidade e biopirataria, astrofísica e cosmologia, políticas de C&T no Brasil. Para o pesquisador falta, nas escolas e nos veículos, a conscientização sobre a importância da democratização do conhecimento científico e do papel que os meios de comunicação podem desempenhar neste sentido.

Percebe-se, gradativamente, que esta situação tende a mudar e, nos próximos anos, uma parte significativa dos cursos de jornalismo deverá incorporar disciplinas ou práticas laboratoriais voltadas para essa área. Isso já está ocorrendo na pós-graduação (especialização, mestrado e doutorado). Com a capacitação de novos docentes nessa área, certamente a oferta na graduação também deverá experimentar um incremento (BUENO, 2004).

Bueno (2004) não poupa críticas na hora de avaliar os interesses que cercam a pauta do noticiário científico e tecnológico.

Infelizmente, o Jornalismo Científico ainda vive refém dos grandes interesses, certamente porque a pauta tem sido definida fora das redações. Com isso, ele não tem cumprido o seu papel crítico de contextualizar as informações, as descobertas etc., a partir do interesse público. Na verdade, o jornalismo científico precisa das fontes especializadas, mas deve estar atento aos seus compromissos. Não há dúvida de que as corporações (nacionais e multinacionais) precisam da mídia, mas em geral elas desencadeiam processos mais próximos do marketing do que do Jornalismo Científico, tendo em vista a sua contaminação por interesses comerciais” (BUENO, 2004).

Na sua opinião é preciso especializar os repórteres e editores que trabalham nestas áreas, com intuito de amadurecer a redação científica. Para ele é preciso deixar claro o processo de produção científica e entender como a ciência e o cientista trabalham. Também se faz necessário discutir a alfabetização científica no Brasil, evidenciando o caráter pedagógico do JC.

É fundamental deixar explícito que também nesta área convergem grandes interesses e que é necessário enxergar além do noticiário e não se tornar refém de fontes

comprometidas com interesses políticos, comerciais, ideológicos. Finalmente é preciso definir linguagens que sejam adequadas à audiência que se pretende atingir. Para Bueno, o Jornalismo Cientifico será diferente na mídia impressa, no rádio e na televisão ou na Internet, em função do perfil da audiência.

Os maiores desafios estão exatamente no fato da produção jornalística e da produção científica possuírem características distintas. Também se deve levar em consideração que apenas recentemente, jornalistas e pesquisadores estão buscando trabalhar em parceria, aglutinando a competência de ambos os lados. A insuficiente formação do jornalista para cobrir ciência e a incompreensão de boa parte dos cientistas sobre o papel do Jornalismo Científico, podem comprometer a qualidade final destes produtos noticiosos. Mas essa situação pode mudar se ambos (jornalistas e pesquisadores) se dispuserem a dialogar, a entender as particularidades dos processos de produção das notícias. Sobretudo, é importante que eles tenham consciência da necessidade de democratizar o conhecimento científico e que trabalhem em prol da construção da cidadania.

Devemos lembrar a existência de correntes modernas nos estudos da comunicação que defendem até a existência do jornalismo enquanto “negócio de educação”, a exemplo da corrente norte-americana Civic Journalism com presença marcante na Universidade do Texas, em Austim. Neste caso, o conceito do jornal não está voltado apenas para os agentes econômicos, mas é destinado às necessidades sociais da comunidade e para a interação com os membros desta. Neste caso, ocorre a substituição da visão meramente mercadológica de que se impregna a imprensa no final dos anos 80, por uma atitude voltada para a sociedade, tratando o leitor não como um consumidor de um produto qualquer, mas tentando levar em consideração sua plena cidadania.

1.4) PANORAMA HISTÓRICO DO JORNALISMO CIENTÍFICO NO BRASIL E NO