• Nenhum resultado encontrado

2 PROTEÇÃO DE DADOS NA NOVA ECONOMIA E AMBIENTE DA

2.2 Buscadores: utilização dos dados como matéria-prima e eficiência

2.2.4 Caso Google (EUA, UE e Brasil)

Desde 2010 até os dias de hoje, o buscador Google Inc. vem enfrentando investigações em virtude da prática de “busca enviesada”, isto é, como já esclarecido anteriormente, por trabalhar seus algoritmos de modo a privilegiar determinados sites, bem como por ter criado plataformas de buscas específicas como as de shopping e de localização.

Desta forma, foram abertas investigações pela Comissão Europeia, pela Federal Trade Comission e pelo CADE, a fim de se averiguar condutas verticalmente anticoncorrenciais do Google.

No Brasil, o Google possui três processos administrativos em seu desfavor, sendo estes o Processo Administrativo nº 08012.010483/2011-94, Processo Administrativo nº 08700.009082/2013-03 e o Processo Administrativo nº 08700.005694/2013-19.

O primeiro processo administrativo foi aberto em razão de denúncia do E- commerce de que o Google estaria de forma inadequada privilegiando seus sites temáticos, como o Google Shopping, em detrimento de sites supostamente concorrentes a este - Buscapé e Bondfaro, em busca orgânica. Ademais, neste processo analisa-se a denúncia do E-commerce de que o Google estaria posicionando o Google Shopping entre os links patrocinados, posição supostamente privilegiada, de modo a se beneficiar em relação aos concorrentes. Este processo ainda verifica se o Google estaria reduzindo o espaço da busca orgânica em relação à patrocinada, ou mesmo, adotando mecanismos para confundir o usuário, no que tange aos resultados de uma e de outra.

Outra conduta investigada ainda neste processo seria o fato de o Google, de forma discriminatória, veicular por meio de seus sites temáticos, no caso o Google Shopping, anúncios com fotos e não permitir que assim o façam os sites comparadores de preços: Buscapé e Bondfaro. Segundo a denúncia, o Google, em um primeiro momento, teria se recusado a vender ao Buscapé anúncio com foto e, posteriormente, quando este passou a ter a funcionalidade de venda de produtos próprios, o Google, para vender-lhe o anúncio, teria requerido em troca dados concorrencialmente sensíveis.

O Processo Administrativo no 08700.009082/2013-03 apura outra denúncia do E- commerce de que o Google teria se utilizado de uma prática anticoncorrencial denominada “scraping”, a qual consiste na “raspagem” pelo Google de conteúdo concorrencialmente relevante dos sites comparadores de preços. Tais conteúdos seriam comentários de clientes, opinando sobre as qualidades ou defeitos de lojistas e produtos, presentes nas páginas do Buscapé e do Bondfaro.

O último Processo Administrativo no 08700.005694/2013-19 está fundado em alegações da Microsoft acerca de algumas restrições anticompetitivas no contrato de prestação de serviços da plataforma de publicidade online do Google,

denominada de Google Adwords. Trata-se de uma plataforma por meio da qual os anunciantes, que compram espaço de publicidade na página do Google, gerenciam suas campanhas, utilizando para tanto da associação do referido anúncio a uma palavra-chave.

É, também, por esta plataforma que são organizados os anunciantes que aparecem nos links patrocinados do Google. A referida seleção é resultado de uma disputa realizada por leilão, de acordo com critérios como valor do lance e qualidade do anúncio.

Segundo a denúncia da Microsoft para este caso, o Google teria colocado restrições aos anunciantes que os impedem de gerenciar suas campanhas, de modo a replicá-las em outros sites buscadores concorrentes do Google. A esta interoperabilidade pretendida pela Microsoft foi dado o nome de “multihoming”.

Esta ferramenta ajuda os anunciantes a divulgarem suas campanhas em diversos sites de buscas, reduzindo os custos desta operação, bem como permite comparar o desempenho da campanha em cada uma destas plataformas de busca. Dessa forma, de acordo com a denúncia, as restrições impostas pelo Google desestimulariam os anunciantes a veicularem suas campanhas em buscadores rivais, prejudicando estes concorrentes.

Todos os três processos administrativos ainda aguardam julgamento pelo CADE, não tendo este ainda exarado seu entendimento acerca das condutas anticompetitivas que lhes foram apresentadas. O único juízo exarado pelo CADE foi o de ao receber as denúncias, entender que as referidas condutas tinham potencial anticompetitivo e, por isso, ensejariam a abertura de processos administrativos90,91.

Nos Estados Unidos, as investigações sobre o Google se deram pelas mesmas razões e condutas como manipulação de busca, rebaixamento de sites, utilização

90 CADE. Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Pesquisa Processual. Disponível em:

<http://www.cade.gov.br/Default.aspx?a8889b6caa60b241d345d069fc>. Acesso em: 05 dez. 2014. 

91 Id. Sei! Pesquisa Pública. Disponível em: <http://sei.cade.gov.br/sei/institucional/pesquisa/

processo_pesquisar.php?acao_externa=protocolo_pesquisar&acao_origem_externa=protocolo _pesquisar&id_orgao_acesso_externo=0>. Acesso em: 28 nov. 2015. 

de sites temáticos em destaque, a fim de eliminar ou reduzir os competidores. No entanto, em 2013, a Federal Trade Comission chegou à conclusão de que todas as medidas tomadas pelo Google consistentes na alteração de seus algoritmos, ainda que prejudiciais a outros competidores, trataram-se de inovações tecnológicas, que vieram a melhorar o serviço de busca fornecido pelo Google e, consequentemente, beneficiar os consumidores, que deste se utilizam.

De modo a melhor explicitar este entendimento exarado pela FTC, convém ressaltar trecho de reportagem publicada sobre o caso no próprio site desta autoridade, a saber:

The FTC conducted an extensive investigation into allegations that Google had manipulated its search algorithms to harm vertical websites and unfairly promote its own competing vertical properties, a practice commonly known as “search bias.” In particular, the FTC evaluated Google’s introduction of “Universal Search” – a product that prominently displays targeted Google properties in response to specific categories of searches, such as shopping and local – to determine whether Google used that product to reduce or eliminate a nascent competitive threat. Similarly, the investigation focused on the allegation that Google altered its search algorithms to demote certain vertical websites in an effort to reduce or eliminate a nascent competitive threat. According to the Commission statement, however, the FTC concluded that the introduction of Universal Search, as well as additional changes made to Google’s search algorithms – even those that may have had the effect of harming individual competitors – could be plausibly justified as innovations that improved Google’s product and the experience of its users. It therefore has chosen to close the investigation92.

92 FEDERAL TRADE COMMISSION. Google Agrees to Change Its Business Practices to Resolve FTC Competition Concerns in the Markets for Devices Like Smart Phones, Games and Tablets, and in Online Search. Washington, DC, 3 jan. 2013. Disponível em: <http://www.ftc.gov/news- events/press-releases/2013/01/google-agrees-change-its-business-practices-resolve-ftc>. Acesso em: 05 dez. 2014.

Tradução livre: “A FTC conduziu uma extensa investigação sobre as alegações de que o Google tinha manipulado os seus algoritmos de busca, para prejudicar os sites verticais e injustamente promover suas próprias propriedades competitivas verticais, prática conhecida como “busca enviesada”. Particularmente, a FTC avaliou a introdução do Google sobre a “Busca Universal” – um produto que proeminentemente exibe em destaque algumas propriedades do Google, em resposta para específicas categorias de busca, como shopping e local – a fim de determinar se o Google utilizou este produto para reduzir ou eliminar uma ameaça competitiva nascente. Similarmente, a investigação focou-se na alegação de que o Google alterou seu algoritmo de busca para rebaixar determinados sites verticais em um esforço de reduzir ou eliminar a nascente ameaça concorrente. De acordo com a declaração da Comissão, contudo, a FTC concluiu que a introdução da Busca Universal, assim como algumas mudanças adicionais feitas nos algoritmos de busca do Google – mesmo aquelas que podem

Por outro lado, na Europa, as investigações que se iniciaram em novembro de 2010 culminaram em abril de 2015, em conclusões preliminares e em um Comunicado de Objeções ao Google, relativamente ao favorecimento do seu serviço comparador de preços93.

A Comissão Europeia responsável pela Política da Concorrência abriu as referidas investigações, em razão de quatro práticas desenvolvidas pelo Google, que a preocuparam, a saber: (i) o fato de o Google exibir seus próprios serviços especializados de busca de forma mais proeminente do que os serviços dos concorrentes; (ii) a utilização pelo Google de conteúdo dos concorrentes de seus serviços especializados sem o consentimento destes; (iii) a imposição pelo Google de exclusividade aos anunciantes que queriam se utilizar de seus programas de publicidade; (iv) imposição de restrições aos anunciantes que se utilizam dos programas de publicidade disponibilizados pelo Google94.

Durante estes cinco últimos anos, a Comissão Europeia tem discutido com o Google uma forma de encerrar estas investigações por meio de um acordo vinculativo. O Google, até janeiro de 2014, havia feito três propostas de acordo à Comissão Europeia, sendo que as duas primeiras foram rejeitadas e a última está sob discussão.

Em fevereiro de 2014, Joaquín Almunia, Vice-Presidente da Comissão Europeia responsável pela Política da Concorrência, fez uma declaração em Bruxelas sobre o caso e expôs suas preocupações acerca das negociações.S egundo este, três exigências serão levadas em conta durante a negociação: (i) os links rivais dos sites temáticos do Google deverão ter uma apresentação comparável com os links dos sites temáticos do Google, tendo em vista que os formatos visuais destes são de suma importância para atrair o click do usuário; (ii) a mesma

ter gerado um efeito prejudicial aos competidores individuais – podem ser plausivelmente justificadas como inovações que aperfeiçoaram os produtos do Google e a experiência de seus usuários. Por isso, optou por encerrar a investigação”.  

93 EUROPEAN COMMISSION. Press Release Database. Antitrust: Comissão envia Comunicação

de Objeções (CO) à Google relativamente a serviço comparador de preços; inicia procedimento formal de investigação distinto sobre o sistema Android. Bruxelas, 15 abr. 2015. Disponível em: <http://europa.eu/rapid/press-release_IP-15-4780_pt.htm>. Acesso em: 25 ago. 2015. 

94 Id. Press Release Database. Statement on the Google investigation. Bruxelas, 5 fev. 2014.

Disponível em: <http://europa.eu/rapid/press-release_SPEECH-14-93_en.htm>. Acesso em: 26 nov. 2014. 

velocidade e dinâmica com que o Google desenvolve seus serviços deve ser disponibilizada aos links rivais; (iii) os serviços temáticos de busca do Google, igualmente, devem estar sujeito aos compromissos impostos pelo próprio Google aos seus links rivais. Segue trecho desta declaração que alude ao já exposto:

In this context, three issues have been of critical importance to me in the most recent discussions with Google.

First, given the importance of the choice of visual formats in attracting user clicks, it is essential that the presentation of rival links is comparable to that of the Google services.

Secondly, given the speed with which Google develops its services, that comparability of presentation of rival links has to be ensured dynamically over time. This means that if Google improves the presentation of its services, so must the presentation of rival links.

Finally, in a fast-moving market, any commitments must retain their relevance throughout their lifetime. This means that any new vertical search services developed by Google must also be subject to the commitments”95.

O último andamento divulgado deste caso é o de que o Google respondeu ao Comunicado de Objeções, emitido pela Comissão Europeia, aduzindo inclusive não ter sido levado em consideração, por esta, a gratuidade dos serviços de buscas96.

95 EUROPEAN COMMISSION. Press Release Database. Statement on the Google investigation.

Bruxelas, 5 fev. 2014. Disponível em: <http://europa.eu/rapid/press-release_SPEECH-14- 93_en.htm>. Acesso em: 26 nov. 2014.

Tradução livre: “Neste contexto, três questões foram de fundamental importância, nas mais recentes discussões com o Google.

Em primeiro lugar, dada a importância da escolha de formatos visuais em atrair clicks dos usuários, é essencial que a apresentação dos links rivais seja comparável à dos serviços do Google.

Em segundo lugar, dada à velocidade com que o Google desenvolve seus serviços, a comparabilidade de apresentação de links rivais deve ser assegurada de forma dinâmica ao longo do tempo, de modo que, se o Google aperfeiçoa a apresentação de seus serviços, assim deve ser a apresentação de links rivais.

Finalmente, em um mercado em rápida evolução, os compromissos devem manter sua relevância ao longo do tempo. Entende-se que quaisquer novos serviços de busca verticais desenvolvidos pela Google também devem estar sujeitos aos compromissos”. 

96 CHEE, Foo Yun. Google diz que multa antitruste da União Europeia seria “inapropriada”. Reuters. Bruxelas, 3 nov. 2015. Disponível em: <http://tecnologia.uol.com.br/noticias/reuters/ 2015/11/03/google-diz-que-multa-antitruste-da-ue-seria-inapropriada.htm>. Acesso em: 28 nov. 2015; EUROPEAN COMMISSION. Competition. Cases. Bruxelas, 30 nov. 2010. Disponível em: <http://ec.europa.eu/competition/elojade/isef/index.cfm?fuseaction=dsp_result&nace_code=999 50>. Acesso em: 28 nov. 2015. 

Analisando todas estas investigações, verificamos que todas são muito semelhantes e buscam examinar se a ausência de neutralidade e as inovações criadas pelo Google Inc. de modo a aperfeiçoar a busca fornecida aos seus usuários, poderiam ou não ser vistas como condutas prejudiciais à concorrência e que, portanto, mereçam ser coibidas.

Conforme bem delineado anteriormente, entendemos, da mesma forma que a Federal Trade Comission, que o Google Inc. criou diversas inovações no mercado de buscas, sendo uma delas, inclusive, a ausência de neutralidade, que permite uma busca enviesada e direcionada aos interesses dos seus usuários, assim, é que de certa forma deve levar em conta certos critérios de julgamento que o Google entende por eficientes.

Ademais, vale aqui destacar mais uma vez que não haveria razão para o Google não eleger critérios para trabalhar seus algoritmos de modo a não resultar em uma busca eficiente, já que diante desta conduta, consequentemente, iria perder poder de mercado.

Outra inovação criada pelo Google que merece destaque é justamente os seus serviços temáticos de busca, os quais igualmente representam uma melhoria em prol do usuário. Seria razoável frente ao direito de propriedade intelectual exigir do Google que disponibilize as inovações por si criadas prematuramente e em sua plataforma? Parece que não.

As inovações, como outrora salientado, em um primeiro momento podem trazer condutas aparentemente anticoncorrenciais por parte de seu criador, mas, na verdade, aperfeiçoam o mercado, beneficiam os consumidores e acirram a concorrência, pois os demais fornecedores passam a se preocupar com a melhoria também de seus serviços e de realizar estas inovações para poder se manter no mercado.

No mais, quanto aos processos administrativos brasileiros, verifica-se ser, no mínimo, discutível a alegação de que os sites temáticos do Google, em particular o Google Shopping, estariam no mesmo mercado que os sites Buscapé e

Bondfaro, já que aquele se trata de um site de busca especializado, ao passo que estes são comparadores de preços.

Por fim, não pensamos ser o Google uma “essential facility” ao acesso ou publicidade dos demais sites da internet. Isso, pois, muito embora boa parte das pessoas acessem a internet por meio do Google e este detenha, no Brasil, cerca de 90% (noventa por cento) do mercado de buscas, segundo dados deflagrados nos processos administrativos em trâmite junto ao CADE, para acessar a internet não é necessário fazê-lo por meio de site de busca e, muito menos, pelo Google.

Além disso, o Google não seria o único canal de publicidade dos demais sites e aplicativos, ainda restam aos anunciantes outros meios, como a televisão, rádio, folhetos, e-mail marketing e até mesmo outros sites parceiros. Desta feita, muito embora, o Google tenha um elevado poder de mercado, este não é a única via de acesso aos demais sites ou mesmo de acesso à publicidade destes.

Por todo o exposto, entendemos que o Google ao privilegiar alguns sites em específico, disponibilizando uma “busca enviesada”, está, na verdade, entregando aos pesquisadores e usuários resultados relevantes por estes buscados.

Partindo desta conclusão, se o Google fosse um buscador neutro e os resultados apresentados fossem enumerados sem qualquer controle editorial, o serviço de busca não se prestaria a entregar os resultados pretendidos pelos usuários e, portanto, este iria perder a sua relevância.

Assim, observa-se que a neutralidade do buscador não beneficia o usuário e muito menos é por este almejada, o que o usuário quer é justamente resultados que demonstrem a máxima afinidade com seus interesses.

Ademais, restou demonstrado que as inovações trazidas pelo Google ao mercado de buscas não são prejudiciais à concorrência, pelo contrário, prestam-se a acirrá-la, à medida que o mercado passa a exigir que os concorrentes também entreguem um serviço de busca tão eficiente quanto o prestado pelo Google. Dessa forma, todas estas alegações em face das inovações trazidas pelo Google devem ser analisadas muito cautelosamente para que não se determine medidas anticoncorrenciais por meio de argumentações aparentemente pró-concorrenciais.

Em conclusão, cumpre destacar entendimento de Geoffrey A. Manne, fundador e diretor executivo do International Center for Law and Economics:

The set of claims that are adduced under the rubric of “search neutrality” or the “essential facilities doctrine” against Internet search engines in general and, as a practical matter, Google in particular, are deeply problematic. They risk encouraging courts and other decision makers to find antitrust violations where none actually exist, threatening to chill innovation and efficiency- enhancing conduct. In part for this reason, the essential facilities doctrine has been relegated by most antitrust experts to the dustbin of history. As Joshua Wright and I conclude elsewhere: Indeed, it is our view that in light of the antitrust claims arising out of innovative contractual and pricing conduct, and the apparent lack of any concrete evidence of anticompetitive effects or harm to competition, an enforcement action against Google on these grounds creates substantial risk for a “false positive” which would chill innovation and competition currently providing immense benefits to consumers97.