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2. SITUAÇÃO ATUAL DO SETOR DAS PESCAS EM PORTUGAL

2.2 INSPEÇÃO SANITÁRIA DE PESCADO

2.2.3 Causas de rejeição

Como já foi anteriormente referido, os produtos da pesca, tal como os outros géneros alimentícios, estão sujeitos a um controlo rigoroso por parte da entidade competente que inclui o Médico Veterinário Oficial. Há diversos fatores que alteram a qualidade do pescado, podendo conduzir à sua rejeição (Nunes et al., 2007).

De acordo com o Capítulo III do Regulamento (CE) n.º 854/2004, de 29 de abril, os produtos da pesca devem ser declarados impróprios para consumo humano se:

1) Os controlos organoléticos, químicos, físicos ou microbiológicos ou de parasitas

tiverem demonstrado que não cumprem a legislação comunitária na matéria;

2) Contiverem nas suas partes comestíveis contaminantes ou resíduos em teores

superiores aos estabelecidos na legislação comunitária ou em teores tais que a ingestão calculada por via alimentar exceda a dose diária ou semanal admissível para o homem;

3) Forem provenientes de: i) peixes venenosos,

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ii) produtos da pesca que contenham biotoxinas tais como a ciguatera ou outras as

toxinas perigosas para a saúde humana, ou

iii) moluscos bivalves, equinodermes, tunicados ou gastrópodes marinhos que

contenham biotoxinas marinhas em quantidades totais que excedam os limites referidos no Regulamento (CE) n.º 853/2004, ou;

4) A autoridade competente considerar que podem constituir um perigo para a saúde

pública ou animal, ou que são, por quaisquer outras razões, impróprios para consumo humano.

O fator mais preponderante que conduz à rejeição de pescado é a alteração de frescura. Após a morte do animal têm início um conjunto de processos químicos, bioquímicos e microbiológicos que vão diminuindo gradualmente o grau de frescura (Nunes et al., 2007), conforme é possível visualizar nas Figuras 2, 3 e 4.

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Figura 5 - Solha (Platychthys flesus) com exteriorização visceral (imagem gentilmente cedida por Engª Ana

Santos).

Figura 6 - Goraz (Pagellus bogaraveo) com guelra descolorada e apresentando muco opaco (imagem

gentilmente cedida por Engª Ana Santos).

Atualmente, na União Europeia, recorre-se ao Regulamento (CE) n.º 2406/96 relativo à fixação de normas comuns de comercialização para certos produtos da pesca, entre eles peixes teleósteos azuis e brancos, elasmobrânquios, cefalópodes e crustáceos, para detetar o grau de frescura de produtos da pesca. Neste regulamento estão descriminadas tabelas de cotação específicas para avaliar o grau de frescura dos produtos, que podem ser classificados em três categorias: E (Extra, qualidade mais elevada), A (boa qualidade) e B (qualidade satisfatória)

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(Barbosa e Vaz-Pires, 2004), devendo-se rejeitar todos os produtos da pesca com classificação inferior a B por serem inaptos para consumo humano (Nielsen et al., 2002).

A Tabela 1 foi adaptada do Regulamento (CE) n.º 2406/96, de 26 de novembro, sendo referente aos critérios de frescura para Peixes Azuis.

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Tabela 1 - Critérios de frescura para Peixes Azuis (adaptado do Regulamento (CE) n.º 2406/96).

Critérios Extra (E) A B Não admitidos

Pele Pigmentação viva, cores vivas, brilhantes, irisadas; diferença nítida entre superfície dorsal e ventral Perda de brilho; cores mais baças; menos diferença entre superfície dorsal e ventral

Baça, sem brilho, cores deslavadas;

pele plissada quando se dobra o

peixe

Pigmentação muito baça; pele a

destacar-se da carne

Muco cutâneo Aquoso,

transparente

Ligeiramente turvo

Leitoso Cinzento amarelado, opaco

Consistência da carne Muito firme, rígida Bastante rígida, firme Ligeiramente mole Mole (flácida)

Opérculos Prateados Prateados,

ligeiramente tingidos de vermelho ou de castanho Escurecimento e extravasações sanguíneas extensas Amarelados Olho Convexo, abaulado; pupila azul- preto vivo, «pálpebra» transparente Convexo e ligeiramente encovado; pupila escura; córnea ligeiramente opalescente Chato: pupila enevoada; extravasações sanguíneas à volta do olho Côncavo no centro; pupila cinzenta; córnea leitosa

Guelras Vermelho vivo

a púrpura por todo o lado; sem muco Cor menos viva, mais pálida nos bordos; muco transparente Em descoloração muco opaco Amareladas; Muco leitoso

Cheiro das guelras A algas

marinhas frescas; picante; iodado Ausência de cheiro a algas marinhas; cheiro neutro Cheiro gordo, um pouco sulfuroso, a toucinho rançoso ou a fruta podre Extremamente acre

Há diversos regulamentos e diretivas que impõe que a inspeção do pescado tenha uma vertente direcionada para a deteção de parasitas, como o Regulamento (CE) n.º 2074/2005, que assegura que em terra ou navios – fábrica sejam realizadas inspeções numa dimensão e frequência em função do risco pelo manipulador durante o corte e evisceração dos produtos.

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De acordo com o Regulamento (CE) n.º 2074/2005, de 5 de dezembro, ‘’Por «transiluminação» entende-se, no que se refere a peixes chatos ou a filetes de peixe, observar o peixe contra uma fonte de iluminação numa sala escurecida para detetar parasitas’’, sendo este considerado um método físico de verificação de qualidade, realizado aquando da inspeção visual.

Por sua vez, o Regulamento (CE) n.º 852/2004 refere que os operadores não devem aceitar produtos contaminados por parasitas, sob o risco do consumidor final receber um género alimentício impróprio para consumo.

O Regulamento (CE) n.º 853/2004 assegura que produtos obviamente contaminados por parasitas não possam ser colocados no mercado. Para além disso, impõe que peixes ósseos e moluscos cefalópodes destinados a serem consumidos crus (como no sushi) e os prontos a consumir que não tenham sido sujeitos um processamento suficiente para destruir os parasitas viáveis, sejam submetidos a um tratamento de congelação a pelo menos -20 Grau Celsius (º C), durante 24 horas, exceto os que:

✓ São ou derivam de produtos devidamente congelados;

✓ Estão designados a serem submetidos a um tratamento térmico que elimine todas as formas viáveis;

✓ Alguns casos especiais, com dados epidemiológicos seguros ou de produção aquícola controlada, a serem previamente autorizados pela Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV).

Todos estes regulamentos têm como objetivo proteger o consumidor final e assegurar a qualidade dos produtos, pois a presença de parasitas no pescado é uma situação comum que diminui o valor comercial das peças por lhe conferir um aspeto repugnante. Para além disso, há espécies parasitárias que podem transmitir doenças ao ser humano (zoonose), como é o caso de

Anisakis sp., aquando do consumo de peixe cru ou indevidamente confecionado, mais frequente

em países como o Japão, Holanda, Estados Unidos da América, Noruega e Peru, devido aos seus hábitos alimentares (Luque, 2004).

A prevalência e a intensidade da infeção pela espécie Anisakis simplex, nemátode muito frequente na sua forma larvar em peixes marinhos, deve-se em grande parte ao regime alimentar e à disponibilidade dos hospedeiros intermediários parasitados. Aquando do consumo de

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pescado parasitado com larvas viáveis, o ser humano desenvolve uma anisaquíase, que pode manifestar-se sob a forma alérgica ou sob a forma gástrica (Daschner et al., 2000).

Em Portugal, nas últimas décadas, verificou-se um aumento do consumo de peixe cru devido à popularidade dos pratos tradicionais japoneses (sushi, sashimi, entre outros) e consequentemente, os peixes teleósteos comercializados para o efeito podem conter larvas de nemátodes anisaquídeos no interior da cavidade abdominal, nas vísceras ou intra- muscularmente (Ramos, 2011).

Durante a realização do nosso estágio foi possível observar rejeição de pescado devido à presença de parasitas, que na maioria dos casos revelou ser Anisakis sp., frequentemente observável como larvas de 1 a 2 centímetros (cm), nas vísceras e parede abdominal do peixe, podendo migrar para o músculo, conforme se pode visualizar na Figura 5. Sempre que se detetava a presença de larvas intra-muscularmente, as peças eram imediatamente rejeitadas por não ser possível a sua destruição por métodos térmicos e por constituírem um perigo para a saúde dos consumidores.

Figura 7 - Pescada (Merluccius merluccius) com Anisakis sp. na serosa (imagem gentilmente cedida por Engª

Ana Santos).

Outro fator comum de rejeição é o incumprimento dos tamanhos mínimos legais, sendo de extrema importância adequar a pesca ao estado e condição dos recursos naturais disponíveis, assegurando deste modo a sua gestão sustentável. Ao abrigo do Regulamento (CE) n.º 850/98, de 30 de março, pretende-se conservar os recursos da pesca através de determinadas medidas técnicas de proteção dos juvenis de organismos marinhos. No Anexo XII do referido regulamento estão explícitas para variadas espécies, os tamanhos mínimos admitidos, medidos

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desde a ponta do focinho até à extremidade da barbatana caudal, como demonstrado na Figura 6. No caso do carapau (Trachurus trachurus) tratam-se de 15 cm (Regulamento (CE) n.º 850/98).

Figura 8 – Pontos de referência para a medição de tamanhos mínimos admitidos (retirado do Regulamento (CE)

n.º 850/98).

Ainda como possível causa de rejeição dos produtos da pesca surge a presença de contaminantes, nomeadamente de metais pesados, como o mercúrio. Este pode surgir sob três formas químicas: mercúrio elementar, mercúrio orgânico e mercúrio inorgânico (Oehlenschläger, 2002). A toxicidade deste metal pesado varia consoante a sua forma química, sendo que os que assumem maior relevância para a saúde humana são o dimetilmercúrio (DDM) e o metilmercúrio (MM), que pertencem à forma química de mercúrio orgânico (Autoridade de Segurança Alimentar e Económica [ASAE], 2009).

O Regulamento (CE) n.º 1881/2006, de 19 de dezembro, visa fixar os teores máximos de certos contaminantes presentes nos géneros alimentícios, de modo a garantir uma maior segurança ao consumidor. Assim, ‘’nos produtos da pesca e parte comestível do peixe, com exceção das espécies tamboril (Lophius species), peixe-lobo riscado (Anarhichas lupus), bonito (Sarda sarda), enguia (Anguilla species), ronquinhas, olho-de-vidro, olho-de-vidro laranja (Hoplostethus species), lagartixa-da-rocha (Coryphaenoides rupestris), alabote-do-atlântico (Hippoglossus hippoglossus), espadins (Makaira species), areeiros (Lepidorhombus species), salmonetes (Mullus species), lúcio (Esox lucius), palmeta (Orcynopsis unicolor), fanecão (Tricopterus minutes), carocho (Centroscymnus coelolepis), raia (Raja species), peixe- vermelho (Sebastes marinus, S. mentella, S. viviparus), veleiro-do-atlântico (Istiophorus

platypterus), peixe-espada (Lepidopus caudatus, Aphanopus carbo), bicas e gorazes (Pagellus

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pretiosus, Gempylus serpens), esturjão (Acipenser species), espadarte (Xiphias gladius) e atuns

(Thunnus species, Euthynnus species, Katsuwonus pelamis) os teores máximos de mercúrio são de 0.50 miligramas/quilograma de peso fresco’’. Estes teores máximos também se aplicam aos crustáceos, com exceção da carne escura do caranguejo e da carne da cabeça e tórax da lagosta e de grandes crustáceos similares (Regulamento (CE) n.º 1881/2006).

Por vezes, podem também ser encontrados perigos físicos nos produtos da pesca, resultantes da arte de pesca utilizada ou do seu habitat natural, como pedras, anzóis ou corpos estranhos, que podem causar danos ao consumidor (Huss e Embarek, 2004). Por conseguinte, pode ocorrer a rejeição de produtos da pesca que apresentem perigos físicos que coloquem em causa a saúde humana (Regulamento (CE) n.º 854/2004).

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