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2. Focos de Incêndio

2.1. Causas de ignição

O ICNF divide as causas de ignição em cinco grandes categorias, mais uma de causas indeterminadas, como se verifica no Quadro V, que são o uso do fogo, causas acidentais, causas estruturais, incendiarismo, causas naturais e causas indeterminadas.

Nas causas por uso do fogo incluem-se a queima de lixo, as queimadas, o lançamento de foguetes, as fogueiras, os fumadores que lançam as pontas incandescentes para o solo, o uso de fogo por apicultores e as chaminés que dispersão faúlhas ou outros materiais incandescentes.

Como causas acidentais são contabilizadas as ignições provocadas pelos transportes e comunicações (como por exemplo os incêndios provocados pelas linhas elétricas, tubos de escape, acidentes de viação), pela maquinaria e equipamentos de uso específico nas atividades agrícolas ou por outras causas menos comuns como a utilização de explosivos em usos civis, disparos de caçadores, exercícios militares (Fot. 4).

Fot. 4 – Incêndio em automóvel perto de um espaço florestal em Valongo

33 As causas estruturais englobam a caça e vida selvagem, ou seja, causas com origem em comportamentos e atitudes reativas aos condicionamentos dos sistemas de gestão agroflorestais, o uso do solo, que é entendido como as causas com origem em conflitos relacionados com o uso do solo, a defesa contra incêndios cujo incêndio tem origem na atividade de deteção, proteção e combate aos incêndios florestais, e ainda outras causas estruturais.

O incendiarismo divide-se em causas inimputáveis e imputáveis. As causas inimputáveis são situações em que há ausência de dolo como é o caso das brincadeiras de crianças que dão origem a ignições, da irresponsabilidade de menores ou da piromania. As causas imputáveis são consideradas situações de dolo como é o exemplo do fogo posto com o intuito de desviar as atenções, provocação aos meios de combate, conflitos entre vizinhos, vinganças ou vandalismo.

Como causas naturais o ICNF considera as descargas elétricas com origem em trovoadas.

Por fim as causas indeterminadas em que há ausência de elementos objetivos suficientes para a determinação da causa. Isto pode resultar da indeterminação da prova material, da indeterminação da prova pessoal ou da indeterminação por lacuna na informação ou ainda pela não investigação das causas.

Para Galante (2005) as causas de ignição dos incêndios florestais podem ser naturais, negligentes, intencionais ou desconhecidas. Uma ignição é considerada como causa natural quando resulta de descargas elétricas provocadas pela trovoada. As causas são negligentes quando a ignição ocorre devido ao comportamento negligente do uso do fogo, como é frequente acontecer como o uso do fogo para a agricultura ou pastorícia. As ignições por causas negligentes podem ocorrer também associadas a brincadeiras de crianças, queima de lixos, lançamento de foguetes, cigarros, entre outros. Quando por detrás da ignição existe uma motivação para o ato o fogo é encarado como “fogo-posto” sendo a causa considerada intencional. As causas desconhecidas podem resultar da falta de investigação do incêndio ou da impossibilidade da sua determinação por falta de provas materiais ou pessoais.

Lourenço et al. (2012) utilizou a classificação do ICNF como referência, agrupando as causas em seis categorias, sendo elas o uso do fogo (inclui os incêndios provocados pela queima de lixo, queimadas, lançamento de foguetes, fogueiras, fumar, apicultura e chaminés), causas acidentais (engloba os transportes e comunicações e a maquinaria e equipamentos entre outras causas), causas estruturais (compreende os

34 incêndios causados pela caça e vida selvagem, uso do solo, defesa contra incêndios e ainda outras causas), incendiarismo (inclui as causas inimputáveis e imputáveis), causas naturais (onde se consideram apenas os incêndios provocados por raios) e causas indeterminadas. Embora não seja mencionado pelo ICNF, o reacendimento foi considerado pelos autores como elemento secundário.

Segundo a Proposta Técnica para o Plano Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios (PNDFCI), realizada entre 2004 e 2005, mais de 97% das ignições em Portugal eram de origem humana, podendo tratar-se de ignorância, incompetência, negligência, dolo ou crime preconcebido. Este valor traduz “a existência de conflitos e tensões sociais e económicas nos territórios agroflorestais associados ao ordenamento do território e as suas políticas e o incorreto uso do fogo”.

Quadro V – Codificação e definição das categorias das causas de incêndios florestais

CODIFICAÇÃO E DEFINIÇÃO DAS CATEGORIAS DAS CAUSAS

A classificação da causalidade dos incêndios florestais assume uma estrutura hierárquica de três níveis, identificando-se cada causa específica com três algarismos:

primeiro algarismo – identifica uma das seis categorias de causas.

segundo algarismo – descrimina as causas do nível anterior, identificando-as em grupos e descriminando atividades específicas.

terceiro algarismo – divide em subgrupos as atividades e descrimina comportamentos e atitudes específicas.

1 USO DO FOGO

11 Queima de lixo Destruição de lixos pelo fogo.

111 Autárquica Uso do fogo com origem em lixeiras autárquicas, com ou sem intervenção humana na fase de ignição.

112 Indústria Uso do fogo para destruição de resíduos industriais.

113 Comércio Uso do fogo para destruição de lixos provenientes de atividades comerciais, como por exemplo resíduos de feirantes, etc. 114 Atividades

clandestinas

Queima de lixos e entulhos acumulados em locais não permitidos. Por vezes, a queima nem é provocada pelo responsável pela acumulação do material.

115 Núcleos habitacionais permanentes

Queima de lixos resultantes da atividade doméstica (releixo). 116 Núcleos habitacionais

temporários associados ao recreio

Destruição de lixos por queima com origem em de zonas

temporariamente frequentadas, como por exemplo parques de lazer, parques de merendas, campismo, etc.

12 Queimadas Queima pelo fogo de combustíveis agrícolas e florestais.

121 Limpeza do solo agrícola

Queima de combustíveis agrícolas de forma extensiva, como é o caso do restolho, panasco, etc..

122 Limpeza do solo florestal

Queima de combustíveis florestais empilhados ou de forma extensiva, como restos de cortes e preparação de terrenos.

123 Limpeza de áreas urbanizadas

Queima de combustíveis empilhados ou de forma extensiva, para limpeza de áreas urbanas e urbanizáveis.

124 Borralheiras Queima de restos da agricultura e matos confinantes, após corte e ajuntamento.

125 Renovação de pastagens

Queima periódica de matos e herbáceas com o objetivo de melhorar as qualidades forrageiras das pastagens naturais.

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caça e margens dos rios

penetração do homem no exercício venatório e da pesca. 127 Limpeza de caminhos,

acessos e instalações

Queima de combustíveis que invadem casa, terrenos, acessos, caminhos, estradões, etc.

128 Proteção contra incêndios

Uso do fogo de forma incorreta, quando se pretende diminuir os combustíveis para proteção contra incêndios.

129 Outras Outro tipo de queimadas.

13 Lançamento de foguetes Uso do fogo para diversão e lazer.

131 Com medidas preventivas

Lançamento de foguetes com licenciamento, seguros, presença dos corpos dos bombeiros, autoridades, etc.

132 Clandestinos Lançamento clandestino de foguetes sem qualquer medida preventiva, incluindo as anteriores.

133 Auto-ignição Ignição de material explosivo proveniente do lançamento de foguetes, decorrido algum tempo.

14 Fogueiras Uso do fogo com combustíveis empilhados.

141 Recreio e lazer Uso do fogo em parques de campismo, "fogos de campo", Rallye de Portugal, etc.

142 Confeção de comida Uso do fogo para confeção de alimentos, designadamente sardinhadas, churrascos, etc.

143 Aquecimento Uso do fogo para aquecimento, designadamente em trabalhos a céu aberto.

144 Reparação de estradas Uso do fogo para construção, reparação ou manutenção de estradas asfaltadas.

145 Outras Outro tipo de fogueiras.

15 Fumar Fumadores que lançam as pontas incandescentes ao solo.

151 Fumadores a pé Cigarros e fósforo lançados ao solo por fumadores que se deslocam a pé.

152 Em circulação motorizada

Cigarros e fósforo lançados ao solo por fumadores que se deslocam em veículo motorizado.

16 Apicultura Uso do fogo por apicultores.

161 Fumigação Por esvaziamento do conteúdo do fumigador ou por contacto com combustíveis finos ou mortos.

162 Desinfestação Uso do fogo para desinfestação de material apícola, para afugentar animais nocivos, etc..

17 Chaminés Transporte de partículas incandescentes.

171 Industriais Dispersão de faúlhas ou outro tipo de material incandescente a partir de chaminés industriais.

172 De habitação Dispersão de faúlhas ou outro tipo de material incandescente a partir de chaminés de casas de habitação e instalações agrícolas.

173 Outras Outro tipo de chaminés.

2 ACIDENTAIS

21 Transportes e comunicações

Faíscas e faúlhas que dão origem a ignições de combustível.

211 Linhas elétricas Linhas de transporte de energia elétrica que por contacto, descarga, quebra ou arco elétrico, dão origem à ignição.

212 Caminhos de ferro Material incandescente proveniente do sistema de travagem ou locomoção de circulação ferroviária.

213 Tubos de escape Libertação de material incandescente e condução de calor através de condutores de escape de veículos de circulação geral.

214 Acidentes de viação Acidentes de viação que originam ignições em combustíveis vegetais. 215 Outros acidentes Outras causas acidentais ligadas aos transportes e comunicações.

22 Maquinaria e equipamento

Maquinaria e equipamento de uso específico nas atividades agroflorestais.

221 Alfaias agrícolas Ignições com origem no atrito de partes metálicas com pedras. 222 Máquinas agrícolas Emissão de partículas incandescentes, faíscas e transmissão de calor

por condução.

223 Equipamento florestal Emissão de partículas incandescentes, faíscas e transmissão de calor por condução.

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por condução.

225 Máquinas florestais Emissão de partículas incandescentes, faíscas e transmissão de calor por condução.

226 Máquinas industriais Emissão de partículas incandescentes, faíscas e transmissão de calor por condução.

227 Outra maquinaria e equipamento

Outra maquinaria e equipamento que dê origem a ignições de combustível vegetal.

23 Outras causas acidentais Causas acidentais menos comuns.

231 Explosivos Utilização de explosivos em usos civis, nomeadamente rompimento de estradas, pedreiras, minas, etc.

232 Soldaduras Trabalhos de soldadura em construção civil, como por exemplo canalizações, pontes metálicas, etc.

233 Disparos de caçadores Disparos de caçadores provenientes de armas de fogo. 234 Exercícios militares Incêndios com origem em atividades militares, nomeadamente

disparos de artilharia, utilização, de

maquinaria, utilização de fogo para aquecimento ou confeção de alimentos por parte de soldados.

235 Vidros Incêndios com origem em montureiras e outras de acumulações daqueles materiais com probabilidade de

ocorrer o efeito de lente.

236 Outras Outras causas acidentais.

3 ESTRUTURAIS

31 Caça e vida selvagem Causas com origem em comportamentos e atitudes reativas aos condicionalismos dos sistemas de gestão agroflorestais.

311 Conflitos de caça Incêndios originados por conflitos motivados pelo regime cinegético. 312 Danos provocados pela

vida selvagem

Quando existem danos em culturas agrícolas provocados por javali, lobo, coelhos, etc., é utilizado o fogo para afastar os animais.

33 Uso do solo Causas com origem em conflitos relacionados com o uso do solo.

333 Alterações no uso do solo

Incêndio motivado por alterações no uso do solo, como são exemplos a construção, os limites do PDM, etc.

334 Pressão para venda de material lenhoso

Incêndio provocado com o objetivo da desvalorização do material lenhoso ou falta de matéria prima.

335 Limitação ao uso e gestão do solo

Incêndio provocado para resolver algumas limitações de uso e gestão do solo, como sucede por exemplo com áreas protegidas.

336 Contradições no uso e fruição dos baldios

Incêndios motivados pela forma de exploração e usufruto de baldios, independentemente da modalidade de gestão.

37 Defesa contra incêndios Atividades de DFCI.

337 Instabilidade laboral nas atividades de DFCI

Incêndios com origem na atividade de deteção, proteção e combate aos incêndios florestais.

38 Outras causas estruturais

Outras situações estruturais.

4 INCENDIARISMO

41 Inimputáveis Situações de ausência de dolo.

412 Brincadeiras de crianças

Brincadeiras várias que dão origem a ignições. 413 Irresponsabilidade de

menores

Menores que provocam incêndios de forma irresponsável. 417 Piromania Incêndios provocados por indivíduos com esta anomalia. 419 Outras situações

inimputáveis

Outras situações de anomalia, como por exemplo a demência, etc.

44 Imputáveis Situações de dolo.

441 Manobras de diversão Fogo posto com o intuito de enganar, desviar as atenções e confundir as forças de combate, autoridade, etc..

444 Provocação aos meios de combate

Fogo posto com o objetivo de despoletar a atuação dos meios de combate, especialmente os meio aéreos.

445 Conflitos entre vizinhos

Fogo posto como forma de resolver vários tipos de conflitualidade entre vizinhos.

37

448 Vandalismo Utilização do fogo por puro prazer de destruição. 449 Outras situações

dolosas

Situações que não estejam ainda tipificadas.

5 NATURAIS

51 Raio Descargas elétricas com origem em trovoadas.

6 INDETERMINADAS

60 Indeterminadas Ausência de elementos objetivos suficientes para a determinação da causa.

610 Prova material Indeterminação da prova material. 620 Prova pessoal Indeterminação da prova pessoal.

630 Outras informações Indeterminação por lacunas na informação.

Fonte: ICNF

Bento-Gonçalves (2006) refere, citando J. D. Silva (2001), que para se determinar a causa de um incêndio é necessário ter experiência, concentração e perseverança passando-se por várias etapas sendo, por isso, um processo complexo. Mas se o fogo for detetado logo no início é um bom ponto de partida para a determinação das causas da sua origem pois pode-se identificar corretamente a área de eclosão.

Segundo o mesmo autor, com base nas causas investigadas pelo Corpo Nacional da Guarda Florestal entre 1993 e 2003, cerca de 60% das ocorrências verificadas em Portugal Continental têm origem em negligência e em intencionalidade, 2,5% têm origem em relâmpagos e 38,3% são de causa indeterminada. Ao contabilizar apenas as ignições com causa apurada 97% são de origem negligente ou intencional e apenas 3% têm causas naturais (Bento-Gonçalves, 2007).

Um recente estudo (Lourenço et al., 2013) mostra que entre 1996 e 2010 83,9% dos incêndios florestais em Portugal Continental não foram investigados e apenas 8% tiveram causa conhecida. Contabilizando apenas os incêndios com causa investigada entre 1996 e 2010 em 50,7% dos casos não se conhece a causa, 19,4% têm como causa o incendiarismo, 19% o uso do fogo, 6,2% o reacendimento, 3% têm causa acidental e as causas naturais e estruturais representam 0,8% cada.

Bento-Gonçalves (2006), usando os dados do PNDFCI (2005), refere que existem diferenças nas causas de incêndios entre os distritos do norte e do sul do país. Nos distritos do norte, especialmente nos localizados no litoral, existe uma maior percentagem de causas intencionais enquanto nos distritos do sul regista-se maior percentagem de causas com origem na negligência.

Outro aspeto relevante, as estatísticas da Justiça referentes à investigação das causas de incêndio florestal são, segundo Bento-Gonçalves (2007), “pouco rigorosas e

38 particularmente incompletas”, contribuindo para isto o fato de se tomarem por base os tipos legais de crime do Código Penal que engloba na mesma categoria situações bastante diversas.

Apesar do aumento do número de crimes de incêndio/fogo posto registados entre 1998 (2469 crimes) e 2004 (5435 crimes) o número de arguidos e condenados tem vindo a decrescer desde 1993, passando o número de arguidos de 134 em 1993 para 9 em 2004 e o número de condenados de 81 em 1993 para 5 em 2004. Bento-Gonçalves (2007) considera que estes números se devem, não só à dificuldade na recolha de provas materiais que permitam uma condenação mais fácil de quem comete este tipo de crime, mas também ao menor investimento e menor prioridade dada à investigação criminal de incêndios florestais ao longo da última década. Ainda assim a relação entre o número de arguidos e condenados manteve-se entre os 30 e os 60%.

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