• Nenhum resultado encontrado

Centrais Sindicais e Contribuição Sindical

Importante aspecto a ser considerado diz respeito à arrecadação das Centrais Sindicais, que passaram a receber recursos do imposto sindical que tanto (algumas) combateram. Numa perspectiva dos direitos sociais, implica esta arrecadação numa maior participação dos trabalhadores numa forma de riqueza coletiva capaz de reduzir algumas das desigualdades provenientes da relação capital e trabalho.

Não menos importante, ressalte-se, foram as dificuldades em se encontrar informações atinentes aos recursos recebidos pelas Centrais Sindicais para melhor fundamentar o presente trabalho.

Em que pesem as dificuldades metodológicas encontradas, alguns dados puderam ser extraídos. Os recursos utilizados para o financiamento do movimento sindical, ou seja, o valor da arrecadação da contribuição sindical obrigatória urbana em 2008, foi de R$ 1.453.946.504.561

Em artigo no Valor Econômico, VILLAVERDE aponta os gastos das Centrais Sindicais, manifestando-se da seguinte maneira:

Passagens aéreas, aluguel de salas em hotéis para realização de seminários, viagem de dirigentes para acompanhar conferências internacionais, compra e reforma de sedes regionais, qualificação de quadros. Foi com despesas como essas que, em 2009, as seis centrais sindicais reconhecidas pelo Ministério do Trabalho gastaram os R$ 80,9 milhões que arrecadaram com o imposto sindical. O valor foi 23% superior aos R$ 65,7 milhões transferidos às centrais em 2008. Se o

559 Pese ainda que a ideologia sindical acabou por fundamentar alguns dos partido políticos, justificando-se, por esta

razão, a procura dos governos em ouvir e atender as reivindicações dos partidos aliados às Centrais Sindicais, dado a influência e atuação destas entidades na política nacional. ANDRADE, Dárcio Guimarães de. Organizações e Centrais Sindicais. In: Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. 31 (61): 119-130. Jan/Jun. Belo Horizonte, 2000. p. 136.

560 NICACIO, Antonio. Centrais Sindicais: reconhecimento como entidades sindicais de representação dos

trabalhadores – MP n. 293/2006. Revista Suplemento Trabalhista LTr. Ano 42; 094/06. São Paulo, 2006. p. 402.

561 Fonte: 2008 SITCS - Sistema de Tratamento da Contribuição Sindical - Caixa Econômica Federal, e SIRT -

repasse deste ano receber reajuste parecido, as centrais embolsarão quase R$ 100 milhões. A fatia equivale a 10% do total arrecadado com o imposto cobrado de todos os trabalhadores formais do mercado de trabalho, equivalente a um dia de salário e que somou quase R$ 810 milhões no ano passado. Igual às pequenas prefeituras do país, o dinheiro do imposto sustenta entre 60% e 80% do orçamento das centrais sindicais.562

É certo que as Centrais exercem inegável papel na conquista por novos direitos, sendo, porém, vários os impasses existentes sobre a contribuição sindical recebida por estas entidades.

Reflexo disso, ressalte-se, foi o veto presidencial por meio da Mensagem n. 139, de 31 de março de 2008, que vetou o art. 6º com supedâneo por inconstitucionalidade, eis que o artigo vetado implicaria em interferência do Estado na atividade sindical, vedado pelo art. 8º da Constituição. Para MARTINS, o sindicato possui natureza privada, o que não justifica a fiscalização do TCU. Nesta linha, “fazer auditoria, por intermédio do Tribunal de Contas da União, no dinheiro recebido pelo governo destinado à Conta Emprego e Salário está correto. Entretanto, não pode haver fiscalização do sindicato, que não é órgão público, mas privado”.563

Por outro lado, a contribuição sindical compulsória é tributo564, embora passe a integrar a receita privada quando do recebimento dos recursos pelas Centrais Sindicais565.

Sobre a relação da contribuição sindical com o princípio da liberdade sindical, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou no sentido de não ser inconstitucional tal contribuição, não ferindo ainda o referido princípio.566

Com efeito, de se considerar ainda os aspectos pertinentes à receita pública, que é o valor obtido pelo governo com tributos ou outras entradas nos cofres públicos. Desta maneira, trata-se daquilo que entra no Tesouro Nacional. Assim, receita é a parte da União, destinada à conta de Emprego e Salário. No entanto, a partir do momento em que tal receita entra no caixa da

562 Fonte: João Villaverde. Imposto paga até 80% do orçamento das centrais. Valor Econômico - 05/03/2010. Acesso

no site: https://conteudoclippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2010/3/5/imposto-paga-ate-80-do- orcamento-das-centrais. Em: 03/05/2010.

563 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p 724.

564 A contribuição sindical distingue-se da contribuição confederativa instituída por Assembléia Geral, nos moldes do

art. 8o, IV, da CF. Além disso, possui a contribuição sindical compulsória (pois instituída por lei), natureza tributária,

conforme se observa em recente discussão no STF. Neste sentido, vide: Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 496.456-2, Rio Grande do Sul. Na mesma linha se encontra o entendimento que a contribuição sindical não afronta o princípio da liberdade sindical, como se observa na ADI 2.522 (Distrito Federal). Vide também Adin 4067.

565 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p 725. 566 Vide: Ag. Reg. no Recurso Extraordinário 279.393 – 1, Santa Catarina.

entidade sindical, a receita é privada e não mais pública. Notadamente importante tal aspecto, pois, tributo é receita pública e, a partir do momento que ingressa nos caixas dos sindicatos, tornam-se privadas tais receitas.567

Sendo assim, o dinheiro não pertence à União, mas ao sindicato. Verifique-se neste sentido, que o percentual está previsto na alínea „b‟ do art. 589 da CLT. Ademais, as receitas das Centrais Sindicais e sindicatos são privadas, não exercendo os sindicatos funções delegadas de Poder Público (conforme era previsto no art. 166 da Emenda Constitucional no 1/69). Não obstante, o parágrafo único do art. 70 da CF/88 estabelece que “prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária”. E, com efeito, constata o autor que a natureza de tal receita é privada, não comportando, pois, tal aplicação.568

Acerca da natureza jurídica da contribuição sindical, esclarece NASCIMENTO que possui tal contribuição natureza pública, pois criada por lei e devida por todos os que exercem atividade descrita pelo seu fato gerador. De se observar ainda que as Centrais precisam preencher os requisitos estabelecidos em lei para que possam ter acesso aos recursos da contribuição sindical. Para o autor:

Enquanto a contribuição sindical existir poderá ser fiscalizada pelo Estado. É o que resulta da sua natureza pública tributária. Assim, se uma parcela da mesma – 10% da destinada à Conta Especial Emprego e Salário do Ministério do Trabalho e Emprego – fica com as Centrais, estas teriam que também prestar contas dos seus gastos ao Estado. Não vejo nisso nenhuma interferência do Poder Público na organização sindical, mas mera fiscalização de contas da entidade, o que pode existir quer quanto à entidades públicas, quer quanto à entidades privadas.569

567 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p 725.

568 Para o mesmo autor, o certo seria uma descrição detalhada na internet para que a população possa impugnar e

fiscalizá-la. Idem. p. 725.

569 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. As Centrais Sindicais e as Modificações de 2008. Suplemento Trabalhista.

Conforme MARTINS, as Centrais Sindicais são órgãos de cúpula, intercategoriais, situando-se acima das confederações, eis que a própria lei dispõe que são elas órgãos. Destarte, são filiados às Centrais as confederações, federações e sindicatos.570

Pese-se que a lei não exige registro das Centrais Sindicais no cadastro Nacional das Entidades Sindicais, mas terão elas que preencher os requisitos de representatividade a ser aferido pelo MTE. Assim, não basta apenas o registro destas entidades no cartório civil de pessoas jurídicas para que tenham representatividade e o direito de participar dos recursos advindos da contribuição sindical. As Centrais que se mantiverem com tais registros serão associações, mas não Centrais Sindicais representativas, por não terem submetido ao MTE a verificação do cumprimento dos requisitos legais capazes de lhes conferir tal status.571

Pese-se ainda que as Centrais Sindicais brasileiras são associações civis de que tratam os incisos XVII e XXI do art. 5° da CF/88, de sorte que podem elas impetrar mandado de segurança coletivo (art. 5°, inc. LXX, alínea “b” da CF/88). E por não serem destinatárias da investidura sindical, as Centrais Sindicais não possuem legitimidade jurídica para a decretação de greves, para celebrar convenções ou acordos coletivos de trabalho, como também não podem instituir juízo arbitral ou representar categoria de trabalhadores em dissídios coletivos da competência da Justiça do Trabalho.572

Acerca da prestação de contas de uma entidade que não é sindical, como as Centrais Sindicais, PASTORE assevera o seguinte:

A Constituição Federal de 1988 (art. 8°, inciso I) estabelece que as entidades sindicais não tem de prestar contas ao Estado, porque este não pode interferir na sua vida. Mais. O art. 150, inciso VI, letra c, assegura imunidade tributária para as entidades sindicais dos trabalhadores. Em vista disso, pergunto: 1. A isenção de prestar contas garantida às entidades sindicais valerá para as organizações

570 MARTINS, Sérgio Pinto. Centrais Sindicais. In: Jornal Trabalhista Consulex. Ano 26; n° 1259; Jan. Brasília,

2009. p. 19. De se ressaltar ainda as críticas direcionadas à tentativa de se reconhecer as Centrais por meio de Medida Provisória (no caso a MP n° 293/2006), quando o Governo Federal cria, no dia 08 de maio do mesmo ano (MP n° 394/06), órgão (Conselho Nacional de Relações de Trabalho) para que ele negocie com trabalhadores e empregadores sem que, com isso, incentive a negociação direta entre os mesmos. MACIEL, José Alberto Couto. O Reconhecimento das Centrais Sindicais: Medida Provisória n° 293/06. In: Jornal Trabalhista Consulex. Vol. 23; n° 1130; Julho. Brasília: 2006. p. 7.

571 Afirma o autor que terão as Centrais que demonstrar filiações de sindicatos em regiões, nas regiões “um número

mínimo de sindicatos e em setores de atividades também um número mínimo de sindicatos a ela filiados, sem o que não poderá ser declarada representativa e não será uma Central financiada”. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. As Centrais Sindicais e as Modificações de 2008. Suplemento Trabalhista. Ano 44; 45/08; São Paulo: LTr, 2008. p. 227.

572 SÜSSEKIND, Arnaldo. As Centrais Sindicais. Suplemento Trabalhista LTr. Ano. XXVI. n° 97/90. São Paulo:

não sindicais?; 2. A imunidade tributária será aplicável a elas?; e 3. O Tribunal de Contas e os demais órgãos de fiscalização e controle terão algum papel em relação ao uso daqueles recursos?573

Ante tais indagações, já se sabe que, conforme anteriormente mencionado, é inconstitucional a fiscalização pelo TCU de tais recursos repassados para as Centrais Sindicais.

Porém, acreditamos que nada impede que o Ministério Público do Trabalho fiscalize (e fiscalização é diferente de intervenção) os recursos repassados para as Centrais, seja por sua função de fiscal da lei e da própria ordem jurídica trabalhista, seja pela atuação em alguns casos que recaem sobre entidades privadas, notadamente nos casos em que atua o MP no direito de família, no caso das fundações, por exemplo, sem que, com isso, haja uma “interferência” do Poder Público nestas relações privadas.

Primeiro porque, como entidades civis que são, não integram o sistema constitucionalmente previsto, no sentido de que não são entidades sindicais propriamente ditas. Segundo porque a fiscalização pelo MPT traria benefícios para os próprios trabalhadores, que são os responsáveis diretos pelo pagamento da contribuição sindical repassado para as Centrais Sindicais. Além disso, os repasses e a aplicação destes recursos tenderiam a ficar mais transparentes, no sentido de que a publicidade na aplicação destas verbas contribuiria ainda mais com a democratização nas relações de trabalho.

Além disso, poderá o Estado fiscalizar a contribuição sindical, tendo em vista sua natureza tributária.574

ZYLBERSTAJN, por exemplo, indaga sobre a possibilidade em se conciliar a contribuição com a prestação de serviços e a efetiva representatividade. Assim, aponta o seguinte:

O caminho seria desvincular a compulsoriedade da contribuição (que é perfeitamente defensável) da garantia do recolhimento. O Estado deixaria de garantir a coleta, só garantiria o direito do sindicato de cobrar. Ao sindicato caberia a responsabilidade pela cobrança, o esforço de recolher as contribuições dos trabalhadores, bem como a decisão de quanto e como repassar a receita para as entidades superiores. Tendo que cobrar diretamente dos trabalhadores, seria mais pressionado a prestar contas a eles.575

573 PASTORE, José. Os Recursos das Centrais Sindicais. In: Jornal Trabalhista Consulex. Ano 25; vol. 1204; jan.

Brasília, 2008. p. 17.

574 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. A Legalização das Centrais. In: Revista “O Trabalho”. Suplemento Especial

“O Trabalho em fascículos. Encarte 135. Maio/2008. p. 4422.

575 ZYLBERSTAJN, Hélio. Contribuição Sindical ou Confusão Sindical? Jornal Trabalhista Consulex. Ano 25; n°

Além disso:

Há situações em que centrais que não preencheram os critérios de representatividade, desde que façam acordo com outra que preencheu, poderá participar dos órgãos colegiados, desde que isto não implique reduzir espaços de outras que cumpriram plenamente os requisitos. Já em relação à contribuição sindical somente fará jus a central que isoladamente conseguir comprovar o cumprimento dos requisitos de representatividade. Especificamente sobre a contribuição, cabem os seguintes esclarecimentos. O sindicato que estiver filiado a duas centrais, mesmo que ambas tenham cumprido o requisito de representatividade, a contribuição não vai para nenhuma delas; segue para a “Conta Emprego e Salário” do Ministério do Trabalho e Emprego, exceto se o MTE considerar como válida a última filiação registrada em seu cadastro. 576

MENDES, por exemplo, constata que é inconciliável a autonomia sindical com a parafiscalidade decorrente da arrecadação proveniente da contribuição sindical compulsória. Conforme a autora, as Centrais Sindicais perderam um importante momento histórico, na medida em que conquistaram seu formal reconhecimento à custa da perpetuação do anacrônico modelo imposto por Vargas, atrelando-se ao “sindicalismo de Estado” que, algumas das Centrais, tanto combateram durante o regime militar.577

Conforme a autora:

O surgimento das centrais no Brasil correspondeu à necessidade de modificação do sistema, já incompatível com a realidade que emergia e continua a se desenvolver no cenário nacional. As insatisfações das classes assalariadas santam no plano legal para se estabelecerem na situação de fato imposta pelas necessidades sociais, isto é, a estrutura sindical já não mais representa satisfatoriamente os trabalhadores.578