• Nenhum resultado encontrado

3 DO CINEMA ANALÓGICO AO CINEMA DIGITAL

3.7 Cinema Novo Alemão

Após a divisão do país em 1945 e das consequências do pós-guerra, a Alemanha ainda não tinha experimentado o mercado cinematográfico, sobretudo pela postura dos seus cineastas durante o Nazismo. Mas, mesmo com uma iniciativa tardia, o Cinema Novo alemão tornou-se um movimento duradouro, favorecendo uma rede entre realizadores, público e quem investia nas produções. Neste cenário, nomes como Rainer Werner Fassbinder, Alexander Kluge, Werner Herzog e Wim Wenders se tornaram os representantes de uma geração de cineastas que almejavam uma renovação do cinema alemão.

O impulso para este novo movimento que surgia na Alemanha se conretizou em fevereiro de 1962, durante a oitava edição do Festival Nacional de Curtas-Metragens de Oberhausen, com a publicação do manifesto que marcou a reação de um grupo composto por 26 cineastas alemães.

O colapso do cinema convencional alemão há muito tempo impede uma atitude intelectual e o rejeitamos em suas bases econômicas. O novo cinema tem, assim, a chance de vir à vida. Em anos recentes, curtas-metragens alemães, realizados por jovens autores, diretores e produtores, receberam inúmeros prêmios em festivais e atraíram a atenção de críticos de outros países. Esses filmes e o sucesso por eles alcançado demonstram que o futuro do cinema alemão está com

aqueles que falam uma nova linguagem cinematográfica. Como em outros países, o curta-metragem na Alemanha tornou-se um espaço de aprendizado e uma área de experimentação para o filme de longa-metragem. Declaramos que nossa ambição é criar o novo filme de longa-metragem alemão. Esse novo filme exige liberdade. Liberdade das convenções da realização cinematográfica. Liberdade das influências comerciais. Liberdade da dominação do interesse de grupos. Nós temos idéias intelectuais, estruturais e econômicas realistas sobre a produção do Cinema Novo alemão. Nós estamos prontos a correr os riscos econômicos. O velho cinema está morto. Nós acreditamos no novo cinema (Oberhausen, 28 de fevereiro de 1962).

A intenção era demarcar novas possibilidades estéticas e ideológicas, totalmente diferente daquilo que se vinha produzindo no pós-guerra. Então, logo após o manifesto, foi criado o Comitê do Jovem Cinema Alemão (Kuratorium junger deutscher Film), que investiu nos primeiros filmes19 de longas-metragens do grupo, especialmente por ter como aliados alguns profissionais ligados à crítica e aos estudos de cinema.

As primeiras produções tinham algo em comum: destacar as causas e as consequências do ideário nacional-socialismo. Ainda assim, o tratamento dado a esta temática, assim como os aspectos formais escolhidos nas produções, não eram os mesmos: algumas apresentavam uma linguagem mais clássica e sóbria, outras privilegiavam “uma estrutura mais aberta, com espaço para comentários em voz- over, intertítulos, cenas documentais e justaposição de fotos e textos” (Cánepa, 2006: 316).

Muitas outras produções também se relacionaram com o cinema norte-americano, como o gênero Western e os filmes de gângsteres, especialmente pelo público se identificar com a cultura em questão. A conotação de agressividade, com situações de assassinato, suicídio e revolta, também foi identificada em alguns projetos, como pontua Thomas Elsaesser (1989):

essa temática agressiva, muitas vezes acompanhada de comentários irônicos em voz-over e de inserções de cenas documentais, era recebida pelos espectadores como arrogante e manipuladora, sensação reforçada por um certo hermetismo e pela precariedade de produção dos filmes. Com isso, tornava-se muito difícil para o jovem cinema alemão encontrar seu público (Elsaesser, 1989: 73).

A dificuldade em encontrar uma forma de alcançar o público na Alemanha fazia com que as produções dos cineastas pertentecentes ao Comitê não tivessem um retorno mercadológico e financeiro. Enquanto isso, o cinema comercial alemão ganhava destaque

19 Os primeiros filmes foram Saudades de ontem (1966), de Alexander Kluge, e O jovem Tõrless (1966), de Volker Schlõndorff.

por apostar no voyeurismo sexual, com a produção de filmes pornográficos, também chamados de sexploitation, como Quarteto na cama (1968), de Peter Schamoni e Rob Houwer.

Já nos anos seguintes, especificamente no início da década de 1970, o mercado cinematográfico ofereceu maior atenção às produções dos jovens cientistas. O realizador Rainer Werner Fassbinder, com O mercador das quatro estações (1972), começou a ganhar prestígio por ter mudado a sua abordagem: das figuras marginais, Fassbinder passou a priorizar “situações melodramáticas e a usar efeitos típicos dos filmes desse gênero, como a luz irrealista e a estetização do décor” (Kaes, 1997: 620). Conjuntamente, o cineasta propunha o exagero da trilha sonora e do gestual, o que resultava em uma crítica mais contundente por parte do público.

Mas foi a parceria com os canais de televisão que alavancou a produção do Cinema Novo alemão. Em 1974, por exemplo, foi lançado O enigma de Kaspar Hauser, de Herzog, um dos filmes que ganhou destaque internacional, inclusive nos Estados Unidos por conta da distribuição coordenada por Francis Ford Coppola. Nesse mesmo período, começaram a aparecer filmes com temática feminista, como o drama social Trabalho

ocasional de uma escrava (1973), de Kluge, que tratava de uma mulher que fazia abortos e

lutava por causas sociais.

Os documentários também foram beneficiados com a parceria televisiva. Nessa época, ganham destaque as seguintes produções: O grande êxtase do entalhador Steiner (1974) e How much wood woulda woodchuck chuck (1976), de Herzog, e Winifred Wagner

e a história da casa Wahnfried (1975), de Syberberg.

Em 1977, no entanto, o Cinema Novo alemão experimentou seu auge e seu declínio, com a quantidade de atentados terroristas que assolaram o país, impondo um estado de alerta a todo o território. Em consequência desse cenário de violência, Alemanha

no outono (1978) marcou o fim do movimento, mas também o início de uma fase em que