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Curitiba pode traçar o surgimento do circuito artístico desde cerca de 1880 (GOTO, 2014) revelando-se precoce em relação ao contexto brasileiro. O artista plástico e jornalista curitibano Newton Goto nos informa que em Curitiba há “espaços institucionais expositivos e com um histórico de mostras oficiais e de acontecimentos autônomos reconhecidos nacionalmente, o circuito curitibano de artes visuais é bastante estruturado. Alguns artistas e feitos desta cena chegaram e chegam a ter projeção Internacional” o artista prossegue nos informando que paradoxalmente este fato parece desencaixado de uma assimilação por parte da maioria das leituras sobre a produção artística brasileira, ainda centrada em São Paulo e Rio de Janeiro. Curitiba e outros centros urbanos se apresentam invisíveis nessa leitura da produção de arte nacional.

Contexto

Curitiba tem uma formação peculiar em relação aos outros territórios do Brasil, decorrentes do processo tradicional de colonização portuguesa e miscigenação entre branco, negro e índio (apesar de também ter ocorrido em menor escala). E por conseguinte, peculiar também foi a origem do circuito de arte local na cidade.

A singularidade de Curitiba se dá pelas levas de imigrantes e migrantes na cidade, fato que se releva na identidade cultural curitibana que não é muito sedimentada (GOTO, 2014). Economicamente, na época colonial, a cidade estava em uma situação secundária em relação ao grandes ciclos do café, cana e mineração, tendo uma participação mais influente nos ciclos econômicos regionais de tropeirismo e erva-mate.

A partir destes ciclos econômicos houve um progresso no Paraná que culminou no seu desmembramento com São Paulo em 1853. Apesar deste quadro de progresso e consolidação econômica na cidade, Newton Goto revela que o circuito artístico de Curitiba não vem da elite local que ansiava por uma imagem de civilidade europeizada. Esta diferença da gênese da formação do circuito de arte pode ser considerada a partir da formação étnica da sociedade paranaense, composta por um contingente de imigrantes europeu, tendo-se então uma periferia europeia.

De acordo com Goto a primeira experiência de fato de uma sistematização de um circuito artístico de artes visuais em Curitiba ocorreu a partir de período de progresso advindo da economia ervateira. É nesta época que é fundado a escola de Belas Artes e Industrias do Paraná, pelo português Mariano de Lima em 1886. De acordo com Goto, a escola era subsidiada com recursos da Província do Paraná e oferecia cursos gratuitos a quem se interessasse.

Já no início do século XX, o circuito de arte passa por uma manifestação ao movimento regionalismo, o conhecido Paranismo. Como Goto explica o pinheiro era o símbolo deste grupo “muitas vezes estilizado, indo de padronagens gráficas usadas no calçamento petit‑pavé de Curitiba, criadas por Lange de Morretes, até a propostas de capitéis de coluna e design de moda, em projetos de João Turim.” Na pintura, Alfredo Andersen surge como “o pai da pintura paranaense”.

Nos anos sessenta, na contramão do Paranismo surge uma arte “engajada com a vida e o tempo presente”, que tinha como característica a destruição dos ícones da elite cultural curitibana, considerada conservadora. Muitos dos artistas que trabalhavam nesta estirpe estavam ligados à Revista Joaquim, que tinha como coordenador editorial o contista Dalton Trevisan. Colaboravam nestes periódicos artistas como Poty Lazarotto, Vinicius de Moraes, Carlos Drummond de Andrade e Wilson Martins.

A estirpe do ideário rebelde de Joaquim foi logo saudada pela intelectualidade brasileira: João Cândido chamou‑a de “a irreverente e heroica” pela “energia em derrubar os fósseis e educar os leitores”, análise essa consoante ao ímpeto dos próprios editores da revista que acusavam “os donos da arte do Paraná” de terem “medo da vida” e por isso fediam “como cadáveres desenterrados” despertando então nos jovens artistas o dever de “efetuar a matança dos mortos sagrados”. Foi uma guerra declarada ao ufanismo regionalista estetizado e condensado no Movimento Paranista, e um ataque frontal a dois dos maiores ícones da arte local até então, o poeta Emiliano Perneta e o pintor Alfredo Andersen. Ao primeiro, Dalton dedicou o texto “Emiliano, poeta medíocre”, e ao segundo “Viaro, hélas… e abaixo Andersen!. (GOTO, 2014)

A partir da década de 70 começa a ser evidenciado os coletivos de artes experimentais em Curitiba. Uma figura importante neste meio é Adalice Araújo, crítica de arte, que idealizou Os Encontros de Arte Moderna que ocorre em 1969, este evento marca o primeiro contexto coletivo de arte experimental no âmbito das artes visuais do Estado. Estes encontros agregaram ações urbanas, oficinas e palestras com atividades orientadas por artistas locais e nacionais. Este encontro em muito se assemelha a proposta para o espaço de arte que esta monografia trata, que tem como um dos anseios tratar da arte de forma mais local, a arte que de fato é produzida aqui.

Figura 37: Revista Joaquim. Fonte: pinterest.com

Os coletivos de artistas se fortalecem em Curitiba na década de 80, vale destacar o Bicicleta formado em 1982, alguns dos artistas deste grupo formaram no ano seguinte o Moto Contínuo. Também em 1983 surge o Sensibilizar, realizando happenings, especialmente em espaços públicos. O trabalho deste grupo e de outros grupos nesta época partem de um contexto artístico de cunho político no país, partindo sempre da reflexão do problemas sociais brasileiros. Um das ações mais radicais desta arte política refere-se a ação Grito Manifesto, que agrega a dezenas de carrinheiros (catadores de papel) na Boca Maldita, para a leitura de um manifesto poético e crítico, em torno de monumento efêmero feito com lixo, em ato de desagravo pelos 20 anos do golpe militar (GOTO, 2014). Já a década de 90 o circuito de arte no Brasil é marcado pelas obras expostas em salão, devido ao surgimento do marketing cultural, seguindo a mesma tendência Curitiba passa pela mesma influencia. A colaboração entre artistas e coletivos retornam com força apenas nos anos 2000. (GOTO, 2014)

Figura 38: Grupo Sensibilizar: happening “31 de março de 1964″, Boca Maldita, Curitiba, 1984. Fonte: Sensibilizar

Dos anos 2000 podemos citar os trabalhos do Coletivo Azulejo, que iniciaram em 2004, reunindo artistas gráficos e “escritores de rua”. Também surgem artistas ciberativistas criando websites de debate de criação e editorial coletivo, que é o caso do coletivo de artistas Orquestra Organismo. Também se pode citar o espaço do teatro

Espaço Cênico, depois ACT – Ateliê de Criação Teatral, que permite o encontro de diferentes

área para debates e relatos de experiência artísticas.

Em 2005 o movimento cicloativista, com a Bicicletada e Arte Bicicleta Mobilidade, atuam nos espaços públicos com a ideia de re-signigficação do espaço, atuando artisticamente e politicamente sobre as questões de mobilidade urbana da cidade. Desde 2011 o espaço Bicicletaria Cultural, com oficinas de bicicleta e junto com a galeria de arte Farol proporciona eventos, peças de teatro e exposições. Este movimento é responsável por várias conquistas políticas em Curitiba, como as ciclofaixas, Via Calma, e a Praça de Bolso do Ciclista.

Outros espaços de arte autônomos que podem ser citados é o Tardanza, desde 2011 sob a coordenação de Eliana Borges e Joana Corona. A Selvática Ações Artísticas, desde 2012, que funciona sob a coordenação dos residentes-artistas de teatro, proporcionando eventos, peças e exposições de diversas áreas da arte. Outros espaços também proporcionam oficinas e exposições, como o próprio ateliê da artista plástica Guita Soifer, chamado Apartamento Ateliê. O Água Viva Concentrado Artístico, que oferecem encontros de troca e discussão artística na sua casa. Outros espaços como o Ateliê Soma, que se propõe como uma museu-galeria tendo uma proximidade com novos artistas autônomos, e também criando inúmeros eventos de diversas áreas. A Wake Up Colab, que proporciona oficinas, cursos em diversas áreas e também eventos e exposições.

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