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os trabalhadores e (ou) os excluídos da riqueza

31 COELHO, Ilanil Op cit., p 55.

assimilar ao país que o acolheu. Portanto, nenhum alemão ou descendente poderia ter dupla cidadania. Isto entrava em choque não só com o Estado Novo como com a própria ideologia étnica teuto-brasileira que, apesar de afirmar a nacionalidade alemã do teuto-brasileiro, afirmava a sua cidadania brasileira. Por isso, a xenofobia, uma das principais características dos agentes nacionalizadores, provocou uma verdadeira campanha anti-nazista.

Conforme Jacques Revel, a eficácia da viagem do soberano é, em primeiro lugar, simbólica32. A brasilidade pretendida pelo Estado Novo fez-se simbolizar, durante a visita de Vargas em Blumenau, através de magnífica execução do hino nacional a oito vozes, sob a regência do maestro Hans Geyer. Simbolizou-se a brasilidade também através das longas e largas faixas verde-amarelas foram estendidas na fachada externa do Teatro Carlos Gomes, e de inúmeras bandeirinhas nacionais foram distribuídas entre os populares que assistiam ao desfile. Em nome de seu projeto nacional, Vargas apelou para que os blumenauenses tomassem parte na grande “marcha ascensional da prosperidade e da grandeza da Patria”. Este projeto ficou inclusive simbolizado na “marcha” do presidente pela rua XV de novembro, rumo ao palanque oficial.

Marcha” dos blumenauenses durante visita de Getúlio Vargas, em 10.03.1940, na rua XV de novembro - Blumenau: a simbolização da construção da brasilidade33.

Para o Estado Novo, a construção da brasilidade também estava relacionada à criação de um tipo físico único para o brasileiro. Para tanto, aquele regime fundamentou-se em teses de educação física, saúde e higiene, que enfatizavam a necessidade do trato do corpo pelo exercício físico, higiene e, sobretudo, o aprimoramento eugênico da raça. Neste ponto, é flagrante a simpatia que o Estado Novo mantinha pela “homogeneidade racial em favor dos arianos”34. Segundo esta autora, “o tipo germânico (modelo ideal de homem) e o nazi-fascismo (modelo ideal de

regime), idolatrados pelos dirigentes do país, tornaram-se metas de homogeneização racial e prática governamental para o Brasil”35. O Estado Novo baseou-se no modelo

33 Não consta nome do autor. Sem título. Blumenau, 1940. 1: preto e branco, 15 x 9 cm Arquivo Histórico José Ferreira da Silva, pasta 5.15.4 - Visitas Ilustres - Presidentes Brasil.

34 CARNEIRO, Maria Lúcia Tucci. O racismo na história do Brasil, p. 38.

nazista, o “povo da educação física”, que desde 1933 empenhava-se na massificação do esporte como recurso de melhoria da saúde do povo36

Os jornais blumenauenses, controlados pelo Departamento de Imprensa e Propaganda, tratavam também de veicular a ideologia do regime, como era o caso do jornal Der Urwaldsbote. Este jornal caracterizava o blumenauense como “povo sadio”37 e elogiava o empenho do presidente na “formação de uma raça eugenicamente perfeita

e constitucionalmente forte”38. Também em suas páginas publicou-se propagandas de

remédios, sob os mesmos argumentos veiculados pelo projeto getulista, ou seja, um melhor trato do corpo promoveria o aprimoramento do tipo brasileiro e da capacidade produtiva individual:

DISPOSTO PARA O TRABALHO:

Um homem com saúde perfeita está sempre disposto para o trabalho, e dessa boa disposição resulta que o trabalho se torna 100% produtivo. Mas não é de esperar, uma tal disposição de quém sofre dos rins e da bexiga. As dores locais, as micções ardentes e difíceis, a formação de areias e depósitos tornam a vida um suplício. Felizmente existe à mão um remédio providencial: HELMITOL de Bayer (...)39 A saúde era tomada como sinônimo de trabalho produtivo, por isso deveria ser cuidada para que cada brasileiro desse sua contribuição ao país. A questão da saúde encontrava-se diretamente ligada à noção de trabalho: o trabalho é um dever social, e assim, todo aquele que não trabalha é um doente. Ser vagabundo significava ser

36 LENHARO, op. cit., p. 81.

37 A visita do Chefe da Nação em Blumenau. Der Urwaldsbote, Blumenau, 15.03.1940. n. 74. 38 O presidente da república em Blumenau. Der Urwaldsbote, Blumenau, 08.03.1940. n. 1940. 39 Cidade de Blumenau, Blumenau, 10.04.1940. n. 40, p. 03.

doente. O universo do trabalho durante o Estado Novo não comportava meios-termos: ou se é trabalhador, com profissão regulamentada e carteira assinada, ou se é vagabundo (voluntário ou involuntário)40.

Visando a criação do tipo ideal brasileiro, organizou-se em 1941 o Primeiro Congresso de Brasilidade, promovido pela Comissão de Unidade Étnica41 do governo de Getúlio Vargas. No projeto de Unidade Étnica, o trabalho, juntamente com a saúde e a beleza, seriam os principais elementos necessários para uma “padronização

brasílica”, uma “elevação biotipológica”, a criação de um homem que “deve ser tanto um tipo ideal eugênico, quanto disciplinado”42. O Estado Novo veiculava uma

valorização do tipo brasileiro: “possuímos qualidades superiores de agilidade, destreza

e perspicácia!”43. Tinha-se a concepção de que o melhoramento da raça, através da

eugenia, deveria “vir de dentro para fora”, por isso o cuidado do corpo deveria ser essencial, o “primeiro dever do brasileiro para bem servir o Brasil’44.

Sendo assim, como ficavam os teuto-brasileiros no projeto de construção do trabalhador nacional dos anos 30 e 40? Apesar da simpatia do Estado Novo pelo “modelo alemão”, como seus objetivos eram a brasilidade e, consequentemente, a homogeneidade, este regime era contrário ao cultivo das diferenças. As colônias alemãs foram seu principal alvo no sul do Brasil, nas quais instituiu-se a Campanha de Nacionalização visando normatizar e padronizar os indivíduos. Contudo, durante a

40 DUARTE, op. cit.

41 PRIMEIRO CONGRESSO DE BRASILIDADE ... p. 06. 42 Ibid. p. 19.

43 Ibid., p. 21. 44 Ibid., p. 19.

primeira República, os discursos tenderam sempre a desqualificar os catarinenses descendentes da imigração açoriana, tomando-os como indolentes, atrasados, incapazes e doentes. As elites catarinenses produziam essa imagem negativa do habitante do litoral visando promover uma remodelação modernizadora do espaço urbano, que passaria, necessariamente, por mudanças nos hábitos tradicionalmente conservados pelas populações. Em contraposição, atribuía-se a noção de disciplina à nacionalidade germânica ou italiana.

O próprio significado da palavra “colono” erigiu-se em contraposição ao trabalho do brasileiro. Essa concepção foi reforçada pelos próprios descendentes de imigrantes, pois o trabalho afirmava positivamente os descendentes de alemães no Brasil45. Crispim Mira, um jornalista joinvillense, assassinado em 1927, através de uma perspectiva ética-pedagógica chegou a pregar as virtudes da operosidade e do “espírito de trabalho” alemão como fatores de “regeneração nacional”. Apesar de luso-brasileiro, caracterizou-se como um brilhante herdeiro da estrutura mental e espiritual teuto-brasileira46.

A idéia de que o progresso agrícola e industrial do estado estava indissociado da participação do imigrante tinha servido durante muito tempo às elites e ao próprio governo, no sentido de consolidar uma sociedade moderna em Santa Catarina. Contudo, diante do projeto nacionalista de Vargas e da necessidade de valorização do

45 ARAÚJO, Hermetes Reis de. Apud CAMPOS, op. cit., p. 59/ 60.

46 VEGINI, Edmundo. A personalidades histórica de Crispim Mira e a regeneração nacional pela ética

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