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questionamento das instituições burocráticas.51 No entanto, apesar dos limites cronológicos apresentados, o período temporal é dilatado, ainda que em aspetos pontuais, para contextualizarmos as origens dos cuidados de saúde não hospitalares e da Enfermagem Comunitária assim como as situações e políticas à sua volta.

Atendendo aos objetivos delineados, optouCse pela realização de um estudo de índole qualitativa no campo da história social, com uma abordagem da microChistória no domínio da história da saúde, cruzando a história dos cuidados de saúde, e suas instituições, com a da enfermagem comunitária. Nesse sentido, este trabalho é também uma narrativa sobre as políticas públicas para os cuidados de saúde não hospitalares e para a enfermagem.

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O corpus documental deste trabalho é constituído por fontes escritas e iconográficas, de informação primária, secundária e terciária, integrando também fontes orais a partir de entrevistas em profundidade para recolha de histórias de vida. Das fontes escritas constam documentos manuscritos e impressos. Das fontes de informação primária, fazem parte cartas, memorandos, memórias, relatos de carácter biográfico, fotos, gravuras, notas, legislação, atas de reuniões, relatórios. Como fontes de informação secundária foram consultados artigos de jornais, artigos em revistas cientificas e/ou profissionais, livros e outros registos.

A pesquisa documental foi realizada nos arquivos da Direção Geral da Saúde, da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), do Instituto Nacional de Saúde (INSA) Doutor Ricardo Jorge, da Casa Museu Bissaya Barreto, das Câmaras Municipais de Setúbal, Lisboa e Sesimbra. Recorremos também à Biblioteca Nacional, às Bibliotecas Municipais de Lisboa (Palácio Galveias e Biblioteca Museu República e Resistência), ao Centro de Documentação do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, ao Centro de Documentação do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, às bibliotecas da Escola Nacional de Saúde Pública e Escola Superior de Enfermagem de Lisboa. Foram também utilizados espólios pessoais de alguns dos nossos entrevistados e diários das sessões parlamentares da Assembleia Nacional, estes disponíveis onCline.

A utilização de fontes documentais, escritas e iconográficas, possibilitou também verificar, e complementar, os resultados obtidos através de entrevistas. Os documentos foram fotocopiados, fotografados ou digitalizados ou, não sendo possível tais procedimentos, feita transcrição dos textos no local de consulta. ConfirmouCse a genuinidade e autenticidade das fontes, nomeadamente através da leitura cuidadosa dos documentos, do material de que são feitos e do seu enquadramento histórico, tendo sido feitas fichas documentais.

O recurso a fontes orais para este estudo revelouCse de extrema importância, não só como meio de informação mas também como experiência de vida. Sublinhemos que a história oral tem antecedentes nas biografias da antiguidade e hagiografias, captandoCse também nos relatos da Idade Média e do Renascimento. Caídas em desuso nos finais do século XIX, só a partir da Primeira Guerra Mundial voltaram a ganhar relevância. Na sua obra, # 7 8

7 &, Marc Bloch abre a possibilidade de os historiadores recorrerem à recolha de

testemunhos como fontes de informação52. A Segunda Guerra Mundial interrompeu o desenvolvimento dos estudos em história oral, relegandoCos para segundo plano, de tal forma que Florence Descamps localiza a " & a partir dos finais de 1960 e durante as

décadas seguintes, quando a conjugação dos avanços tecnológicos e o diálogo e partilha entre as várias ciências sociais, encorajados principalmente pela Escola de Chicago, permitiu a valorização das metodologias qualitativas e dos testemunhos orais. 53 Desde esse momento a história oral conquistou terreno e faz o seu caminho na história contemporânea social e politica,54 abrangendo objetos de estudo diversificados, desde a história de minorias étnicas, de grupos de trabalhadores, das mulheres, do comunismo, do fascismo, do nazismo, do franquismo, dos conflitos armados do século XX, do quotidiano. Neste enquadramento a história oral renascia participativa e socialmente comprometida.55

Face ao reconhecimento dos testemunhos orais como relevantes fontes da história, os historiadores têm clarificado conceitos e métodos. A confrontação de vários testemunhos com documentos escritos e/ou impressos, tal como a crítica interna e externa, permitiram que as fontes orais ganhassem uma importância indiscutível na história contemporânea, na sociologia e noutras

52 BLOCH, Marc C 2 XJ I X J 1 Paris, 1949.

53 DESCAMPS, Florence et al 9 ( XJ ) I D I 2 2 F1 Bréal

éditions: RosnyCsousCBois, 2006.

54 VEYNE, Paul C D J K 1 Lisboa: Edições 70, 2008; MOTA, Luís – Memória, História e Discursos Identitários: Contributos para um debate. In RIBEIRO, Maria Manuela Tavares (coord.) – !

< K 1 Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2010.

55 DESCAMPS, Florence et al 9 ( XJ ) I D I 2 2 F1 Bréal

éditions: RosnyCsousCBois, 2006; PUJADAS, Joan José C El método biográfico y los géneros de la memoria. Revista de Antropologia Cultural. 9 (2000) 127C158.

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ciências sociais. 56 Descamps distingue, entre as várias funções dos testemunhos contemporâneos o de atestar a autenticidade de um acontecimento já que o vivenciou e o de ser uma pessoa memória, pois detém um “capital memorial” em risco de desaparecimento.

A opção metodológica de utilizar as histórias de vida neste trabalho está ligada ao facto de estas permitirem obter informação fundamental para a identificação e reconstituição de percursos e proporcionarem a perspetiva do vivido, de como as pessoas em questão viveram e recordam situações de que muitas vezes só conhecemos o enquadramento legal.57

É pois compreensível que as histórias de vida, nomeadamente o relato de vida, que Daniel Bertaux qualifica como história de uma vida tal como a pessoa a narra ao investigador58, sejam de grande riqueza histórica, não só pela quantidade de informação que transmitem mas também porque não podemos isolar a história de uma pessoa do seu contexto social e cultural. Neste sentido elas dãoCnos uma imagem contextualizada do nosso objeto de estudo.

Segundo Ferraroti, as histórias de vida constituem um desafio perante um objeto de estudo dinâmico, fazendo que o investigador seja ao mesmo tempo 2 &.59 Sobre o método biográfico Pujadas lembra que ele acarreta uma revalorização do indivíduo enquanto ator social, como construtor e protagonista da realidade60 Também Pàmpols refere que as histórias de vida possibilitam o entendimento de como pessoas concretas reagem às mudanças históricas e à forma como são preparadas essas mudanças, sendo que a fecundidade das biografias acarreta sempre uma reflexão dialógica61.

Optámos por recolher histórias de vida de profissionais de saúde que estão, ou estiveram, ligados aos cuidados de saúde não hospitalares, quer pelo exercício profissional direto, quer por cargos de gestão ou por cargos de dimensão política. ColocandoCse a questão da escolha das testemunhas, optouCse por uma dimensão a várias vozes que permitisse preservar diversos pontos

56 DESCAMPS, Florence et al 9 ( XJ ) I D I 2 2 F1 Bréal

éditions: RosnyCsousCBois, 2006.

57 FERRAROTTI, Franco C Historias de vida y Ciencias Sociales. In FEIXA, Carlos – Entrevista a Franco Ferrarotti. Perifèria : Revista de recerca y formación en antropologia. 5 (Diciembre 2006) 1C44.

58 BERTAUX, Daniel C ( #I : ) (] 5 L &I J . 3ª ed. Paris: Armand Colin, 2010.

59 FERRAROTTI, Franco C Historias de vida y Ciencias Sociales. In FEIXA, Carlos – Entrevista a Franco Ferrarotti. Perifèria : Revista de recerca y formación en antropologia 5 (Diciembre 2006) 1C44.

60 PUJADAS, Joan José C El método biográfico y los géneros de la memoria. Revista de Antropologia Cultural. 9 (2000) 127C158.

61 PÀMPOLS, Carlos Feixa C La imaginación autobiográfica. Perifèria: Revista de recerca i formació en antropologia. 5 (Diciembre 2006) 1C41; RIBEIRO, Manuela – As histórias de vida enquanto procedimento de pesquisa sociológica: reflexões a partir de um processo de pesquisa de terreno. Revista Crítica de Ciências Sociais. 44 (Dezembro de 1995) 125C141.

de vista e proporcionasse uma análise de papéis, de funções, de trajetórias profissionais, de culturas ideológicas, de contradições e de convergências.

Tendo em consideração que era/é claramente impossível estudar todos os atores envolvidos e todas as conceções, houve necessidade de selecionar os atores. Recorremos assim, a um pequeno grupo de informantes com conhecimento, interesse e preocupação específica sobre o assunto. Seguindo as orientações de Poirier62, não faria sentido tentar construir uma amostra representativa, pelo que se optou por escolher informantes privilegiados, tendo sido entrevistadas dezoito pessoas. A escolha de pessoas que, pelas suas experiências, são informantes privilegiados, permitiu recolher uma diversidade de pontos de vista sobre a sua experiência enquanto atores e relativamente a outros atores. Em relação às enfermeiras, fezCse a recolha de histórias de vida

& como as designa Poirier, pois elas permitemCnos apreender o sentido e impacto dos

acontecimentos sobre os indivíduos e os modelos culturais do grupo a que pertencem.63 Foram entrevistados catorze enfermeiros e quatro médicos.

DecidiuCse utilizar entrevistas semidiretivas, ou em profundidade. Poderemos dizer que o termo “interlocução biográfica” é uma melhor expressão para designar a relação tida com os interlocutores pois existiu diálogo, mais propriamente existiram conversas guiadas64. Tendo em atenção que a história de vida não abrange toda a existência da pessoa, foram delineados temas que orientaram a narrativa autobiográfica, recolhendo os saberes específicos dos narradores. (Apêndice I)

FezCse o registo das entrevistas em áudio sendo depois integralmente transcritas. Cada entrevista foi datada, registada a sua duração e o local onde se realizou. FezCse posteriormente a organização, montagem, enquadramento e interpretação dos textos através da análise de conteúdo. Algum do material biográfico obtido foi complementado por fotos e documentos escritos, como já referido.

As histórias de vida dos profissionais médicos foram utilizadas como fontes para o estudo da evolução dos cuidados de saúde não hospitalares, tendo essencialmente uma função expressiva,65 enquanto as histórias de vida dos enfermeiros são visibilizadas em capítulos próprios

62 POIRIER, Jean et al C < K D U 1 Oeiras: Celta Editora, 1999. 63 Idem.

64 CONDE, Idalina – Falar da Vida (II). Sociologia: Problemas e Práticas. Lisboa.16 (1994) 41C74.

65 GUERRA, Isabel Carvalho – 5 5 D U E 3 . Lisboa:

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para uma melhor compreensão do processo evolutivo da enfermagem comunitária e das vivências dos enfermeiros nas instituições.

A análise das entrevistas foi realizada através da análise de conteúdo. Tendo em conta que o termo abarca uma multiplicidade de conceitos e métodos que têm conhecido uma crescente utilização na história e nas ciências sociais, especificamos termos utilizado a análise categorial, no sentido de categoria definido por Poirier como $ ,

&::a partir da qual se desenvolveu uma análise interpretativa.

Em apêndice apresentamos os perfis biográficos dos entrevistados (Apêndices II e III) e o percurso de análise realizado (Apêndice IV).

A análise das histórias de vida foi baseada nas sugestões de Poirier et al67, e nas recomendações de Isabel Carvalho Guerra68.

Foi utilizado também o método prosoprográfico que nos permitiu descrever atores implicados no estudo, nomeadamente recolhendo dados sobre faixa etária, formação profissional e académica, e demais dados que nos permitiram a sua caracterização.

As 5 V I foram salvaguardadas através de consentimento informado, sendo os