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Coletânea de alguns dos principais textos de Barthes, selecionados por Sarlo e publicados em 1981 pelo Centro Editor de América Latina, que a abrigou durante a ditadura militar (cf Capítulo Três).

a Universitária

77 Coletânea de alguns dos principais textos de Barthes, selecionados por Sarlo e publicados em 1981 pelo Centro Editor de América Latina, que a abrigou durante a ditadura militar (cf Capítulo Três).

78 Roland Barthes. O saber com sabor. São Paulo: Brasiliense, 1983.

79 O livro, publicado pela editora Ática, é tido como “indispensável” por Haroldo de Campos. Cf. “Sobre Roland Barthes”. Metalinguagem & outras metas. Ensaios de teoria e crítica literária. São Paulo: Perspectiva, 1992 (4a ed. revista e ampliada), p. 124.

Tel Quel, repelido pela autora),80 representa uma síntese introdutória da teoria crítica francesa,

com a valorização do escritor enquanto crítico e com especial atenção a três vertentes, que batiza como “a crítica-obsessão” de Maurice Blanchot, “a crítica-invenção” de Michel Butor e, como não poderia faltar, “a crítica-seduçãó” de Roland Barthes. É, portanto, outra espécie de “panfleto” francófono, com fins de divulgação no festivo meio universitário e intelectual brasileiro da época (e até hoje, já que o livro mereceu recente reedição).

Após a estréia com O novo romance francês (1967), publicaria, em 73, outro livro - finto de seu doutoramento - que é também amplamente tributário da vertente telqueliana: Falência da

crítica. Um caso limite: Lautréamont, em que rastreia os equívocos, as indecisões, a estupefação

e os problemas experimentados pela crítica diante de Isidore Ducasse, o enigma franco-uruguaio,

o i

que continuaria a decifrar, com sucesso, mais tarde, ao lado de Emir Rodríguez Monegal. Em seu longevo “caso limite”, adotaria o mesmo tom de libelo do discurso de seus pares, ao, por exemplo, sugerir a assinatura do atestado de óbito de “certa crítica” desde a introdução (localizada e datada: Universidade de São Paulo, outubro de 1972). “A escritura de Lautréamont”, diz ela a partir de Felipe Sóarte, “institui a morte do sujeito falante, pela ambigüidade da enunciação”.82 O editor de Tel Quel lançava, assim, a bandeira da “desenunciação generalizada” (como mencionado antes, em outros termos), a partir dos estudos de Freud, de Lacan, de Benveniste, de Derrida.

No final de Falência da critica, Perrone-Moisés chega a exaltar, explicitamente, o trabalho da vanguarda telqueliana.

Os resultados a que chegou a crítica de Tel Quel com relação a Lautréamont parecem-nos pois extremamente importantes, porque essa crítica tomou possível a solução de vários problemas até então insolúveis.83

80 V. entrevista, p. 75; afirma aí que seu irmão, militante comunista e pró-chileno, como ela, brincava sério que os maôs eram agentes da CIA. Registre-se, de passagem, que tanto Perrone-Moisés quanto Santiago (v. entrevista, p. 89) têm irmãos políticos de esquerda, dos quais são admiradores incondicionais. E que, no caso de seus similares argentinos, não parecia haver lugar para essa espécie de cisão, com o que levariam à risca o ideal da fusão de prática e teoria revolucionárias, conforme declarado por Tel Quel com particular insistência. 81 O ensaio “Isidore Ducasse et la rhétorique espagnole”, em parceria com Monegal, aparece em sua revista ideal: Poétique n° 55, Paris, set. 1983, p. 351-77; após a morte do crítico uruguaio, Perrone-Moisés conclui o projeto do livro Lautréamont austral, publicado bem mais tarde (Montevideo, Brecha, 1995); v. entrevista, p. 80-81.

82 Perrone-Moisés, L. Falência da crítica. Um caso limite: Lautréamont. São Paulo: Perspectiva, 1973, p. 133.

Na base desses libelos aparece, ainda uma vez, além do Conde de Lautréamont, o

português Jorge Luis Borges,84 de alguma maneira: como se lê na conclusão de Falência da crítica, autor e leitor não devem se distinguir mais, a exemplo do que propusera em “Pierre

Menard, autor dei Quijote”, entre outros lugares.

Levando mais água ao moinho do problema, resgato dois breves enunciados de caráter “manifestário” das conclusões do livro dedicado à crítica de Lautréamont (que representa todo um caso por si só, mas jamais um limite), em sua enumeração de chavões de um discurso teórico que se queria prático, manifestando toda sua sanha finalista ou teleológica, recusada bem mais tarde - como se fosse exclusividade de Sóarte à época - em, por exemplo, Altas literaturas:85

A aproximação da poeticidade anuncia o fím de toda literatura, assim como a aproximação da formalização analítica anuncia o fim de toda crítica literária. Mas a ciência dos signos literários é apenas um dos caminhos da crítica literária, arte agonizante como todas as artes. Um outro caminho se abre à crítica, onde ela desaparecerá para renascer, acedendo à força que sempre lhe foi negada. Esse caminho é o da escritura.

Vemos então chegar o momento do encontro, o momento em que a crítica e a literatura, tendo o mesmo objetivo, a mesma atitude e os mesmos meios, se fundirão finalmente na escritura e correrão todos os riscos dessa “experiência inaugural” .

A crítica, como a literatura e a arte em geral, será então coisa do passado.86

84 Sabe-se que os antepassados de Borges são originários de Portugal. Segundo sua conferência de 72 sobre Luís de Camões, citada na introdução, um antepassado seu teria sido ferido gravemente pelo poeta lusíada, fato que o levaria ao exílio, às viagens e, finalmente, à escritura de seu vasto poema...

85 PeiTone-Moisés, L. Altas literaturas. São Paulo: Cia. das Letras, 1998, p. 37.

86 Perrone-Moisés, L. Falência da crítica, op. cit., p. 166 (ambas citações).

VI. Do abstracionismo ao concretismo

A letra da primeira canção de Chico Buarque de Hollanda contém a semente de toda a sua obra futura. É uma espécie de auto-apresentação, de repertório, de núcleo gerador ou, como

diriam os estruturalistas, de reserva paradigmática. O primeiro

verso - “Tem mais samba no encontro que na espera” - representa por si só uma síntese de sua temática.

Leyla Perrone-Moisés87

Se a Arte deve ser “coisa do passado”, embora haja “mais samba no encontro que na espera”, o telquelismo em versão paulistana solicita o maior recuo temporal do ensaio, uma vez que a militância francófona de Perrone-Moisés no jornalismo cultural começa já em fins da década de 50. Já então abordava os novos romancistas que lhe fascinam e fazia referências à revista Tel Quel - nada reverentes, aliás. Sua longa trajetória como crítica literária e também cultural - porque mais tarde se debruçará, ainda que brevemente, sobre a arte popular, da música ao teatro e aos quadrinhos88 - obedece a uma continuidade quase absoluta, linha reta que (per)sigo e mimetizo em parte aqui, enquanto estratégia de exploração de seus textos “antigos”. Não haveria lugar, portanto e pour cause, para desvios transversais, e os saltos perpetrados no ensaio obedecem, por sua vez, a essa idéia de evolução. Por outro lado, feito “novo romântico”, mimetizo (e talvez venha há tempo mimetizando), a técnica sarrautiana da sub-conversa ou do

sub-acontecimento, “respectivamente, conversa e acontecimento interior paralelos à conversa e

acontecimento exteriores”.89

O faro literário demonstrado pela jovem aspirante a intelectual - quando se divide entre a pintura abstracionista e a crítica literária na maior metrópole da América do Sul - permitiria-lhe

87 “Pra ver a vida passar7’. Suplemento Literário/O Estado de S. Paulo, 25 nov. 1967, p. 6 (grifo meu). Parece sintomático que a crítica dedique um artigo a um “politicamente correto” Chico Buarque e não à irreverência dos baianos emergentes.

88 ç f “o R aciais de Barrault”, idem, 8 fev. 1969, p. 1, e “Quadrinhos”, idem, 17 jun. 1967, p. 1. A propósito

da veia pop representada pelas historietas, observe-se que um colaborador da primeira etapa da revista Los

Libros, Oscar Masotta - introdutor de Lacan na Argentina -, dedica ensaios pioneiros ao gênero na década de

60.

predizer, inclusive, certas atitudes futuras do diretor de Tel Quel sob a máscara revolucionária, em sua “recensão” de Le Parc, feita quatro décadas atrás90 O artigo termina com uma sentença quase cristalina: “Se P. S. se tomar um grande escritor, o que é possível, com toda a certeza se arrependerá da publicação desse esboço de romance” (o que de fato acontece). Mas digo “quase cristalina” porque se P. S. (como aí denomina aquele que um belo dia se autodenominou Felipe

Sóarte) merece estar no cânone futuro de Alias literaturas, é discutível que seja um “grande

escritor”, no sentido de um scriptor capaz de criar seus precursores, embora se saiba que sua prosa experimental exerceu influência decisiva entre certos teóricos-críticos fundamentais em tomo de 70. Contudo, mais do que daquela de Robbe-Grillet e do nouveau roman, parece autoextinguir-se rapidamente e como por conta própria.

Perrone-Moisés é, portanto, desde o princípio, uma crítica extremamente atilada, além de, como sempre se soube, voraz devoradora das novidades literárias de França. A série que descreve seu texto tem, nessas primeiras colaborações ao suplemento literário do grande jomal, uma coerência que antecipa a ênfase dada aos valores literários elevados, aos quais converge (repito) algumas décadas depois, vindo a tomar-se simultaneamente seu cavalo-de-batalha e sua marca registrada. É facilmente verificável como a referida linearidade “jornalística” de seu discurso crítico se mantém, mesmo com a progressiva aquisição e absorção de instrumental teórico-crítico-político - do nouveau roman e Blanchot a Barthes, Derrida, Lacan e daí ao Mai

68 q a Allende -, marcando sua preocupação por constante e progressiva atualização, que é e tem como saudavelmente salutar.

No final de 1960, publica uma resenha sobre Le livre à venir, de Blanchot, considerado decisivo no período de formação.91 A “Literatura” (tal qual a “Arte”) ainda aparece como uma Senhora a quem se deve antes de tudo respeito - e, em conseqüência, letra maiúscula (como em

Le degré zéro de l'écriture -, mas que está prestes a se suicidar: “O romance se transformou em

estudo acerca do romance: a poesia tomou-se meditação a respeito da essência da poesia e, com isso, se está suicidando”, diz. Com essa visão ainda essencialista da literatura (e não poderia ser diferente), a crítica paulistana lê Blanchot, para quem, segundo sua interpretação, “Um artista não é alguém que tem algo que dizer, mas alguém por meio de quem a Arte quer falar. O artista

90 Cf. rubrica “Literatura”, seção “Resenha Bibliográfica”. Suplemento Literário/O Estado de S. Paulo, 16 jun. 1962, p. 2.

91 V. entrevista, p. 67. O texto sobre Blanchot aparece a 26 de novembro de 1960 na rubrica “Literatura” da seção “Resenha Bibliográfica” (p. 2), um espaço menos nobre do Suplemento Literário do Estadão, editado em caracteres diminutos e aberto às mais diversas áreas.

deve, pois, ser um instrumento passivo da Arte”. Cabe recordar que, assim como Perrone- Moisés, os telquelianos são, nesse momento, antes blanchotianos do que propriamente

telquelianos.

Representante de uma São Paulo ainda “quatrocentona”, a jovem pintora e jornalista cultural assume, portanto, o seu papel de crítica literária com uma performance incisiva, clara e objetiva, apesar de ser a néofíta entre os notáveis do suplemento literário do secular Estadão. Os julgamentos emitidos sobre seu objeto exclusivo à época, a literatura francesa, nunca deixam lugar a dúvidas, são absolutas certezas - o que por si só é surpreendente, e o é ainda mais por se manter impávido como traço principal durante toda sua bem-sucedida carreira. Leiam-se, por exemplo, as frases sibilinas de “Aspectos do Nouveau Roman”, de abril de 60, que além do mais, a exemplo da resenha de Le Pare, se revelariam corretas antevisões das artes de um engenheiro agrônomo francês de nome Alain Robbe-Grillet. Como se sabe, Robbe-Grillet foi também roteirista e cineasta, mas faria fama e fortuna através de “fracas” tramas literárias, segundo ela: “Para compensar a pobreza de conteúdo, seus romances são os mais cuidados na parte formal. Seu estilo é puro, clássico, preciso, frio. É um daqueles casos de estilo à procura de assunto” 92

Apesar da evidência da ainda incipiente relação com o aparato teórico, esta no entanto vai se anunciando aos poucos - de modo semelhante ao que ocorre, como se viu antes, durante o período de formação de Santiago -, através do desenvolvimento, em seu caso, da querela em tomo do nouveau roman, que logo se desfaz para dar lugar àquela da nouvelle critique. De todo modo, seu olhar arguto sobre a “vitrine” cultural parisiense a credencia desde cedo diante de qualquer gênero de monstro sagrado, seja em São Paulo, seja em Paris. Como dizia e repito, sua abordagem do “fato literário” é então necessariamente limitada pelo substancialismo e a psicologia, o que não era exclusividade sua. Para um exemplo a propósito de sua admirada Nathalie Sarraute, manifestaria claramente tais características na mesma “recensão”:

Suas qualidades de romancista são a capacidade de síntese e a penetração psicológica, que faz com que toque exatamente o ponto nevrálgico de cada personagem ou acontecimento. Seus romances não têm enredo, mas dir-se-iam romances de aventura, tal o “suspense” em que somos mantidos pelas aventuras psicológicas.93

92 “Aspectos do ‘Nouveau Roman’”, op. cit., p. 2. 93 Idem, ibidem.

Mas, ao mesmo tempo, Perrone-Moisés já naquele momento demonstrava deter o veneno e seu remédio na discussão sobre o que ligaria a “já famosa trindade do roman nouveau” (como diz no fecho do artigo, imitando seu predecessor Brito Broca na inversão do rótulo). Se, por um lado, seriam todos tidos como continuadores de Marcel Proust, Franz Kafka e James Joyce, por outro

Diríamos ser essa continuação um a oposição; assim é, e principalmente porque os representantes do “nouveau roman” caracterizam-se tam bém por um esteticismo próxim o da “arte pela arte” dos parnasianos, e alheio aos predecessores citados. M as, enquanto Robbe- Grillet constrói obras em que o engenho formal é o mais importante, Butor e N. Sarraute correm menor perigo em face dessa esterilizante tendência. Seria esse esteticismo, afinal presente em todos eles, uma inclinação dos romancistas a fechar os olhos diante dos problemas de cerne do nosso dramático século XX, para apenas pensar os problemas puramente estéticos, de solução individual e portanto mais fácil? Só no futuro saberemos ao certo.94

A então “jornalista cultural” previa, quase sem querer, o advento de uma década tão louca quanto prodigiosa - espaço de tempo suficiente para afirmar a certeza de que, em tomo de 70, havia mesmo chegado a hora em que a Literatura seria anônima escritura e a Revolução urgente e permanente; e em que o “abstracionismo” e o “concretismo” como que se tocariam, posicionados nos lugares entre que são próprios de um pintor estrangeiro no Brasil e de um poeta brasileiro no mundo - respectivamente, Samson Flexor e Haroldo de Campos.

94 Idem, p. 3.

VI. Rumo às mas do texto

O grupo da revista “Tel Quel” pediu aos programadores da União [dos Escritores] uma plataforma mais precisa, ao que estes responderam que um programa muito rígido seria contrário às intenções da União, desejosa de uma discussão o tanto quanto possível aberta e livre. Os participantes dos debates fixariam, pouco a pouco, com base nas reflexões comuns as opções teóricas do movimento. Por outras palavras, o trabalho da União seria um trabalho criador.

Leyla Perrone-Moisés95

Em 1968, a já eminente colunista do Estadão, autora de O novo romance francês, publicado um ano antes, está (ou volta) profundamente estruturalizada de seu trânsito franco- brasileiro, sob os ventos da revolução, de resto inevitáveis em sua condição de viajante, apesar do lenço e do documento, quero dizer, do destino reto e certo. Mesmo em uma leitura de circunstância da música popular brasileira, conforme o trecho epigrafado antes, não consegue deixar de manifestar a sua adesão da hora.

Contrapondo o pensamento barthesiano com o advento de Pour une théorie de la

production littéraire de Pierre Macherey, também de 67, a crítica tem no artigo “Uma

necessidade livre”96 um bom representante de uma das sucessivas etapas de sua leitura do pensamento deliberadamente cambiante de Roland Barthes, então “estruturalista”, em pleno momento das insurreições operário-estudantis. Juntamente com elas, como se sabe, tudo passa a ser redefinido (“autodefmindo-se”, diria Santiago), e a crítica sente-se na obrigação de oferecer a sua versão do Maio de 68, através de sua por enquanto protegida trincheira no Suplemento

Literário, o qual, como indicado antes, iniciava a fase de declínio. Digo “na obrigação” porque o

95 “Os intelectuais e a revolução cultural”. Suplemento Literário/O Estado de S. Paulo, 10 ago. 1968, p. 1. Note-se que a “União” foi formada “no dia 21 de maio de 1968, às 11 horas” por “um grupo de escritores chefiados por Michel Butor, Nathalie Sarraute e Jean-Pierre Faye” (já dissidente de Tel Quel), à procura de “um trabalho em comum”. V. abordagem do artigo adiante.

início do texto é dedicado à justificativa de sua pertinência - “Uma coluna dedicada às Letras Francesas não poderia ficar alheia à crise que agitou a França nos últimos meses e às suas repercussões no terreno artístico e literário” -, como se desejasse antes de mais nada evitar qualquer censura dos editores do jornal, algo que logo se tomaria impossível no Brasil, a partir do dia 13 de dezembro de 69. Já, ao final do texto de título “chinoísta”, “Os intelectuais e a revolução cultural”, detectaria ou decalcaria a imperiosidade da tomada do poder pela imaginação, e mesmo assim no tom distanciado de quem não deseja ou de quem reprime maiores comprometimentos:

O problema fundamental dos intelectuais franceses nos dias tumultuosos de maio foi justamente o de confrontar a cultura com a ação, integrar o intelectual na realidade, sacudir a poeira das velhas estruturas culturais para ver se algo ainda resiste ou é preciso começar tudo de novo.

Isto é, enfim, 68. O texto dedicado em julho a Macherey, ao mesmo tempo que estudadamente o critica, prepara o terreno para sua série de conferências na Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo, que seriam proferidas um mês depois. Tendo a obra artística como um sistema de signos cujas estruturas formais procura explicitar, em detrimento do conteúdo de seu conteúdo ou “mensagem”, segundo Perrone-Moisés, a crítica de extração estrutural segue, através de “vários críticos jovens”, “a trilha de Lévi-Strauss e Jakobson”, com o detalhe de que Barthes e Butor são colocados lado a lado (mas não por muito tempo) enquanto “os grandes representantes desse tipo de crítica”.

“Diante da maré crescente do estruturalismo, que se tomou a ‘coqueluche’ ou o ‘ópio’, como se quiser, da nova crítica francesa, Pierre Macherey, jovem crítico marxista, procura encontrar uma posição intermediária”, escreve ela, que então se deixara confessadamente levar por dita “doença” ou “vício”. Macherey, pioneiramente à procura de saídas ao banquete estruturalista, propõe “la constitution d’une question critique nouvelle: quelles sont les lois de la production littéraire”, às vésperas de sua visita à grande metrópole brasileira (segundo nota apensa ao próprio texto).

“Ora” - prosseguiria ela, em sua missão pedagógica que é “uma necessidade livre” -, “a palavra ‘criação’ é também sinônimo de ‘invenção’, isto é, criar uma forma nova ou um arranjo novo, e nesse sentido nada tem de mítico. A visão do escritor como operário da produção

literária dá ao artista uma função puramente mecânica; negar a criatividade do homem é vê-lo como puro joguete de forças produzidas ao acaso”. Mas se a crença na “criatividade do homem” soa como um resíduo existencialista e a crença na “criação” - mesmo enquanto invenção - parece, a princípio e entre outras coisas, discrepante em relação ao caráter aberto da obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica, a própria crítica trataria de arredondar o seu argumento em favor da peculiar faculdade de criar, ao final do artigo: para o estruturalismo (quer dizer,

pour moi), “a obra é necessária não como o produto de um estado de coisas mas como uma

resposta a certas faltas, a certas falhas num estado de coisas. É nesse sentido que a obra é criadora”.

Além disso, “Uma necessidade livre”, em sua defesa apaixonada do estruturalismo, já disseminava a querela básica do debate intelectual da época, que pode ser sintetizada, com o perdão de Hamlet, em ser ou não ser a-histórico. Esta questão motiva o ataque em bloco de Macherey a Mallarmé, Blanchot e Barthes, sendo que Perrone-Moisés insiste na luta por seu credo: “Ainda e sempre, o crítico atribui aos estruturalistas um formalismo absoluto que não existe”. Ao mesmo tempo, a crítica que nasce da leitura, diria ela, lendo Barthes, Roubaud e Butor, “não deve ser repetição”, “pure lecture” (Macherey), “mas prolongamento inventivo”, uma vez que qualquer obra deve ser considerada como “inacabada” (Butor).

Em nome dos prolongamentos inventivos da criação, assim como, naturalmente, de sua sólida pedagogia, os parágrafos finais do artigo vão adquirindo um tom de libelo, como exigia o momento:

N a linguagem artística, o sentido não é único e claro. A obra pode ser lida em vários planos, e nenhum é definitivo. O sentido está sempre suspenso, como diz Barthes, ou aberto, como diz Umberto Eco. Quem compreender isto terá compreendido o Novo Romance, o