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OBJETIVOS 2.1 Objetivo Geral

4. PERCURSO METODOLÓGICO

4.4. Coleta de Dados: Instrumentos e Procedimentos

Após a aprovação da pesquisa no Comitê de Ética da UFSC, sob nº 1649 CEPSH, foi realizado contato com a Secretaria Municipal de Saúde, com o intuito de marcar uma conversa com a Coordenadora da Atenção Básica do Município, ocasião em que foram esclarecidos os objetivos da pesquisa e se obteve a autorização para a realização deste estudo. Após a seleção das UBSs, que possuíam Equipes de Saúde da Família, a pesquisadora se dirigiu a cada uma das UBSs selecionadas e se apresentou aos respectivos coordenadores, com o intuito de esclarecer os objetivos da pesquisa e definir as equipes participantes.

O próximo passo foi agendar o horário para o contato inicial com as equipes, que ocorreu em uma das reuniões semanais, momento em que foram esclarecidos os propósitos do estudo e solicitada a permissão para acompanhá-los, inicialmente em suas atividades diárias. Foi realizado também o agendamento dos grupos focais, que aconteceram nas UBS em horário compatível com a disponibilidade das equipes, por volta de um mês, após o início da observação-participante.

Uma pesquisa deve buscar uma apreensão ampliada da realidade estudada, por este motivo foi utilizada a triangulação dos dados, que segundo Triviños (1990), busca uma ampla descrição, explicação e compreensão do fenômeno em questão, pois, é inviável conceber sua existência isolada, sem abarcar a macrorrealidade social. A triangulação permite que a coleta e a análise dos dados se retroalimentem, possibilitando a alteração de procedimentos em decorrência de situações inusitadas durante a execução da pesquisa. Assim, foram utilizadas a observação-participante, o grupo focal e a entrevista semiestruturada.

A observação-participante marcou o primeiro contato com os sujeitos da pesquisa e serviu como uma inserção suave do pesquisador

em seu cotidiano, assim como possibilitou aos participantes o conhecimento dos propósitos da pesquisa. Foi realizada na UBS, durante as diferentes atividades realizadas pela equipe e mais especificamente nas atividades que, segundo o discurso dos participantes, propiciam a promoção em saúde.

Essa técnica, realiza-se por meio do contato do observador com a realidade de interesse, enquanto parte desse contexto, realizando o registro das ações na medida em que ocorrem. Segundo Minayo (2000), essa forma de obtenção de dados pode ser considerada como parte essencial do trabalho de campo na pesquisa qualitativa, como forma complementar da captação da realidade empírica. Visa, dentre outros objetivos, realizar a descrição do local e suas circunstâncias, dos conflitos e atitudes dos envolvidos diante da realidade e da compreensão das ações dos sujeitos no contexto natural, fatores valiosos na elucidação dos aspectos da realidade (Chizzotti, 2006).

Segundo esse autor, a observação possibilita a elaboração de resumos descritivos da participação do pesquisador, e das circunstâncias dessa participação, buscando maior clareza sobre os dados coletados e a obtenção de maior fiabilidade, pertinência e qualidade. Foi utilizado também o diário de campo como um dos instrumentos da coleta de dados, que possibilitou o registro das situações vivenciadas e partilhadas com os sujeitos. Segundo Boïng, Crepaldi e More (2008), esse instrumento se caracteriza pela descrição das impressões do pesquisador sobre a realidade que está investigando, e os dados ali registrados enriquecem a análise por meio de melhor contextualização e integração dos dados coletados pelos outros instrumentos.

Esse momento inicial de observação foi muito rico, pois, além de propiciar uma intimidade que se revelou fundamental no debate em grupo, revelou uma dificuldade que permeava a fala dos sujeitos: a relação com o NASF (Núcleo de Apoio à Saúde da Família). A partir dessa constatação, e pela importância desse dispositivo19 interdisciplinar na ampliação do escopo das ações de promoção em saúde, optou-se pela inclusão de um item no roteiro do grupo focal e da entrevista, que investigasse a relação das equipes de referência com as equipes do NASF.

Os grupos focais aconteceram logo após o período de observação inicial em cada equipe, sendo que foram realizados duas sessões de

19 Um dispositivo é algo que dispara um movimento de mudança para transformar as práticas vigentes (Brasil, 2009d).

grupo focal, uma com cada equipe envolvida. Essa técnica é muito utilizada na pesquisa social e, pode-se defini-la como um grupo de discussão informal, que tem por objetivo coletar informações sobre um tema específico a partir do diálogo e do debate entre os participantes. Permite a expressão de características psicossociais e culturais e sua característica principal é um processo de reflexão, expresso por meio da „fala‟ dos sujeitos envolvidos, que produz dados qualitativos sem a preocupação com a formação de consensos (Cruz Neto, Moreira & Sucena, 2002). Como balizador da discussão dos grupos focais, foi utilizado um Roteiro de Debate (Apêndice B, p. 188) que norteou a ação desta pesquisadora e elencou os principais tópicos a serem levantados no grupo.

Existem algumas funções essenciais na realização dos grupos: mediador, relator, observador e operador de gravação. O mediador tem função-chave, visto que, ele é o responsável pelo desenvolvimento e motivação dos debates e o controle do tempo, favorecendo a integração dos participantes e a valorização da diversidade de opiniões. O relator tem como tarefa registrar a linguagem não verbal e as principais ideias contidas nas falas dos participantes, já o observador avalia o processo de condução do grupo, atentando para as dificuldades. Comumente, essas quatro funções são realizadas por duas pessoas, uma exerce a mediação e o outro se encarrega das tarefas do relator, observador e operador de gravação (Cruz Neto, Moreira & Sucena, 2002). Nesta pesquisa, as atividades com os grupos foram realizados em uma sala da própria UBS pela pesquisadora/mediadora, com o auxílio de outro psicólogo que atuou como relator, observador e operador de gravação.

Pela proximidade com a equipe, os grupos aconteceram de maneira produtiva e descontraída e tiveram a duração de aproximadamente uma hora e meia para cada grupo. No entanto, após a avaliação do grupo realizado na primeira equipe pesquisada, que contou com a presença da gestora/enfermeira da equipe, optou-se pela realização do segundo grupo com apenas os profissionais sem cargo de gestão. Dessa forma, foi realizada uma entrevista semiestruturada com o gestor da segunda equipe pesquisada.

A entrevista é uma técnica de interlocução que envolve duas pessoas em uma situação „face a face‟ e que inclui a interação entre entrevistado e entrevistador. Quando tem a finalidade de investigar pontos de interesse, sem cercear as possibilidades de interação entre seus participantes, é denominada de entrevista semiestruturada. A flexibilidade das entrevistas semiestruturadas permitem ao entrevistador realizar intervenções e perguntas que ampliem o campo de resposta do

entrevistado, possibilitando o aprofundamento do nível de informações e opiniões coletadas. Esse tipo de técnica requer um roteiro para balizar as ações do entrevistador e abarcar de forma abrangente as questões que se buscam investigar, sem, no entanto, seguir uma sequencia rígida desses assuntos (Minayo, 2000). O Roteiro da Entrevista semiestruturada realizada com o gestor da segunda equipe constou dos mesmos itens do Roteiro de Debate utilizado para a realização dos grupos focais.

4.5. O processo de Análise dos Dados

Trabalhar com dados qualitativos implica em trazer para análise o objetivo e o subjetivo, os fatos e seus significados, a ordem e o conflito, evidenciando a viabilidade do rigor teórico e técnico dispensados nesse processo (Minayo, 2000). Desse modo, a análise dos dados coletados nesta pesquisa foi realizada com todo o rigor técnico necessário, sem, no entanto, abrir mão da intersubjetividade que caracteriza a pesquisa de abordagem qualitativa. Nesse percurso, são evidenciados os procedimentos da análise dos dados coletados, buscando a contextualização dos significados obtidos e colocando luz ao tratamento dispensado a esses dados.

Minayo (2000) afirma que existem três grandes obstáculos no caminho do pesquisador na análise dos dados: (1) o perigo da compreensão ingênua dos dados; (2) o deslumbramento do pesquisador pelos métodos e técnicas, esquecendo-se da fidedignidade das significações; e, (3) a dificuldade de imbricar teorias e conceitos abstratos aos dados coletados em campo. O enfrentamento desses obstáculos nesta pesquisa foi realizado por meio de uma determinada maneira de tratar os dados, denominada Análise de Conteúdo.

A Análise de Conteúdo deste estudo teve como referência norteadora a compreensão que Ruiz-Olabuénaga (1999), enquanto uma técnica para ler e interpretar o conteúdo de vários tipos de documentos e textos, concebendo todo texto como uma construção social e política. Essa forma de tratamento dos dados implica em extrair inferências do texto e seu contexto, ou seja, das condições dos sujeitos e seu entorno social, cultural e ideológico, configurando a inferência como elemento central. Trabalhar nessa perspectiva envolve a leitura da mensagem explícita e intencional de seu locutor e dos aspectos latentes que permeiam os dados coletados, explicitando os meandros imbricados nas entrelinhas do que aparece como figura.

A análise teve início após a realização da coleta de dados, a partir da transcrição dos grupos focais e da entrevista, que juntamente com os diários de campo, foram salvos em um software denominado ATLAS TI 5.0 (Qualitative Research and Solutions), utilizado para auxiliar na organização dos dados. Cabe ressaltar, que a análise de dados foi realizada a partir desses cinco documentos concomitantemente, a saber: transcrição dos dois grupos focais e da entrevista juntamente com os dois diários de campo. Logo após a inserção dos textos no software foram realizadas várias leituras do material e destacadas unidades de significados, que estavam vinculadas a códigos. Na coluna à direita da Figura 1 (p. 65), aparecem as codificações iniciais que mais tarde delimitarão as categorias.

A análise dos dados foi ganhando forma à medida que foram analisadas os códigos (coluna da direita na Figura 1), posto não haver nenhum esquema de categoria previamente construído. A leitura flutuante e releituras exaustivas de todo o material e dos códigos formaram 21 categorias prévias, por meio do agrupamento dos elementos destacados do corpus de análise20. Essas categorias prévias foram submetidas à nova análise, tendo como foco os princípios da significância em relação à questão abordada, da exaustividade e da exclusão, chegando-se a um total de 12 categorias. Essa última reorganização das categorias foi realizada em um documento fora do ATLAS TI 5.0, com a finalidade de ter mais liberdade no manejo das mesmas.

A visualização das relações evidenciados no próprio corpus (por meio dos discursos dos sujeitos) e da literatura consultada, que foi objetivada pelo Software(Figura 2, p. 65), propiciou o agrupamento das diversas categorias em três núcleos temáticos.

20 Conjunto de textos analisados: transcrição dos grupos focais e da entrevista e os diários de campo.

Documentos Unidade de Significado Códigos Anotações

Figura 1: Tela principal do ATLAS TI 5.0

Figura 2: Tela complementar do ATLAS TI 5.0, que permite a visualização das relações entre as categorias.

Cabe evidenciar algumas dificuldades que permearam esta análise de dados. A primeira, e que se apresentou logo no início do processo de organização dos dados foi: “Como „separar‟ em categorias algo que é intimamente imbricado?” “Como fragmentar o todo em partes?” Principalmente levando-se em consideração o fato desta dissertação versar sobre uma visão ampliada de saúde, abarcando em seus percalços um olhar crítico sobre a perspectiva biomédica que separa em especialidades o todo, que fragmenta o sujeito em partes de um corpo. Sob este olhar, mostrava-se contraditório fragmentar o conhecimento produzido.

Para além dessa reflexão, evidenciou-se também a necessidade de colocar em destaque algumas nuances que passariam despercebidas sob um olhar geral e amplo, além do perigo de “andar em círculos” sem chegar a “lugar algum”. Essa percepção impôs a necessidade didática de „organizar‟ as informações e apresentá-las de forma a explicitar um “fio condutor”, o que fatalmente acaba por apresentá-las em segmentos. No entanto cabe ressaltar que as análises aqui apresentadas estão intimamente relacionadas e reafirmar a indissociabilidade dos núcleos temáticos e categorias na conformação de uma análise mais ampla, condição sine qua non para a coerência exigida neste estudo.

Uma característica que foi se delineando na coleta de dados, e que no início da organização dos mesmos, configurou-se em um paradoxo a ser enfrentado, foram as diferenças entre as duas equipes. As formas de gestão e organização interna e o nível de sofrimento entre os integrantes dos dois grupos, constituem-se em muitos momentos em polos opostos, dessa forma, a questão que se apresentou resume-se em: “Como abordar essas diferenças sem ser superficial e sem desviar da questão central do estudo?” Areflexão levou a certeza que seria inviável entrar nessa diferenciação. Dessa forma, optou-se por colocar em foco os dados que mais se destacaram, sem diferenciação da equipe em questão.

Por fim, um último obstáculo, delineou-se durante a análise: “Como realizar o recorte de um tema com tal complexidade?” ou “Como excluir dados que poderiam ser úteis a outros estudiosos às voltas com suas pesquisas?” A opção encontrada foi focalizar a atenção ao tema central e realçar suas implicações em cada núcleo temático, deixando de fora o material que não era central ao assunto.