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O Estilo de Pensamento da Promoção de Saúde Comportamental (PSC)

OBJETIVOS 2.1 Objetivo Geral

3. REVISÃO DA LITERATURA 1 Sistema Único de Saúde SUS

3.4.2 O Estilo de Pensamento da Promoção de Saúde Comportamental (PSC)

A Promoção de Saúde Comportamental (PSC) ou behaviorista é calcada na busca pela modificação dos estilos de vida, e parte do pressuposto que as atitudes e comportamentos inadequados são os responsáveis por uma considerável parcela dos problemas de saúde da população. Essa abordagem procura romper com o modelo biomédico ao focalizar a atenção na melhoria do ambiente12 (alterando o foco das ações sanitárias) e na redução de riscos autoimpostos, sendo apontada como a perspectiva dominante nas práticas de promoção de saúde (Carvalho, 2010; Heidmann, 2006; Rabello, 2010; Stotz & Araujo, 2004). Essa perspectiva ainda está atrelada a um modelo preventivista, pois, a saúde é percebida como em oposição à doença e a doença está vinculada a falta de cuidados (Luz, 2007; Mascarenhas, 2005)

Em alguns países, como nos Estados Unidos, existem sites especializados que oferecem conselhos de saúde personalizados, dentre outros recursos, objetivando a mudança para estilos de vida mais saudáveis, esses sites são recomendados por profissionais da área da saúde, prioritariamente médicos, como coadjuvante na transformação do comportamento, com vistas à melhoria nas condições de saúde da população (Woolf et al., 2006).

Carvalho (2010) afirma que estudos comprovam a melhoria significativa da qualidade de vida de alguns grupos sociais, derivadas da utilização da estratégia de alteração dos estilos de vida. Mas o mesmo autor ainda ressalta que esse resultado positivo está diretamente vinculado à posição social que o indivíduo pertence, ou seja, as populações melhor situadas na escala social têm uma melhoria das condições de saúde, sendo que as populações mais carentes sofrem um agravamento dessas condições.

Segundo Figueira e colaboradores (2009), em ambientes desfavoráveis, a responsabilização do sujeito e a culpa pela não adoção do estilo de vida preconizado, levam a um sentimento de incapacidade e diminuição da autoestima, o que geralmente produz passividade diante das situações, alimentando a incapacidade de mudança. Mascarenhas (2005) ainda ressalta, que o excesso de informações sem o conhecimento das reais possibilidades de sua aplicação na prática pode

12 Nessa perspectiva, segundo Carvalho (2010), o ambiente é definido como tudo que se relaciona com a saúde e seja externo ao corpo humano.

engendrar a impotência, pois, o aumento de conhecimento sem o concomitante aumento da perspectiva de mudança pode gerar somente ansiedade ou sensação de privação.

Na PSC, é delegada à população a responsabilidade pela melhoria de suas condições de saúde, favorecendo o processo de culpabilização da vítima, ao diluir o social em uma retórica comportamental a-histórica, considerando como fator determinante do cuidado a força de vontade individual. Esse aspecto é denunciado por vários autores (Campos & Wendhausen, 2007; Castiel & Diaz, 2007; Fernandez et al., 2008; Figueira et al., 2009; Gaudenzi & Schramm, 2010; Lacerda & Valla, 2007; Rabello, 2010; Stotz & Araujo, 2004; Verdi & Caponi, 2005). Deixa-se de levar em consideração que em alguns ambientes, determinados comportamentos não saudáveis são inevitáveis e, alguns estilos de vida inacessíveis às populações. Essa ênfase na modificação das atitudes e estilos de vida mascara a determinação social da saúde e centraliza as ações no aspecto individual, em detrimento de estratégias mais amplas de intervenção (Calatayud, 1999; Castiel, 2006; Mascarenhas, 2005).

Um exemplo claro desse estilo de pensamento é explicitado em um estudo americano que avalia quatro programas de promoção em saúde, realçando a dificuldade dessa tarefa por se tratar de programas que abordam os mais variados comportamentos. Este artigo aponta a importância da promoção da saúde como uma intervenção dos serviços que se embasam em estratégias de mudança nos estilos de vida, e utiliza a autopercepção da saúde como padrão de medida para avaliar os programas. A pesquisa foi realizada seis meses após a realização de programas de promoção da saúde, que tinham como foco respectivamente: exercícios físicos, perda de peso, nutrição e combate ao estresse (Rohrer, Naessens, Liesinger & Litchy, 2010). Esse trabalho evidencia a falta de discussão sobre a determinação social do processo saúde-doença, restringindo-a à força de vontade individual e aos aspectos comportamentais.

As estratégias educacionais, vinculadas a essa forma de perceber a promoção da saúde, destinam-se a informar as pessoas sobre o que é saudável, influenciando os hábitos e comportamentos. Estão quase sempre calcadas em uma perspectiva pedagógica de relações verticais, onde o saber dos técnicos predomina sobre a autonomia dos sujeitos. Utiliza-se o conceito de empowerment psicológico, no qual o indivíduo, munido de informações adequadas, pode fazer as escolhas saudáveis e tem a sensação do controle das situações (Castiel, 2006). No entanto, o sentimento de poder é radicalmente divergente da possibilidade de

intervir nos condicionantes da saúde, que em sua grande maioria, são controladas pela política e pelas práticas macrossociais, o que evidencia a tendência do empowerment psicológico a ignorar a influência dos fatores estruturais. Não se trata de negar a importância dessa forma de emancipação individual, mas de ressaltar que ela desconsidera o contexto político e histórico das pessoas envolvidas (Carvalho, 2010). É pertinente ressaltar ainda, as questões éticas referentes a essa posição. Castiel e Diaz (2007) advertem para a existência de juízos de valores implícitos, a indução de uma vida marcada pela padronização e regularidade das atividades cotidianas, que conformam as identidades e não se referem apenas a „como agir‟, mas também delimitam „quem ser‟. Nesse processo, a saúde passa a ser um fim em si mesmo, às custas da autonomia dos indivíduos e coletividades, podendo conduzir a discriminação dos „não saudáveis‟, esvaziando-se dos aspectos políticos que permeiam o campo. Essa saúde promocional, apresenta-se como portadora de concepções biopolíticas, que exercem a função de controle e regulação do social e que, portanto, mantém o status quo (Gaudenzi & Schramm, 2010; Sant‟Anna & Hennington, 2010).

O resultado da busca de práticas desenvolvidas a partir dessa perspectiva, evidencia um número significativo de intervenções, seguidas de pesquisas para avaliação dos resultados, principalmente no contexto internacional. Essas pesquisas abordam a promoção da saúde, prioritariamente, vinculada aos estilos de vida saudáveis e ao trabalho preventivo. Serão abordadas a seguir, três pesquisas realizadas na Espanha, Suíça e Finlândia, e que avaliaram intervenções realizadas anteriormente, que tem como marco referencial a PSC.

A primeira pesquisa foi realizada em oito Centros de Cuidados Primários da Espanha, constitui-se em uma pesquisa quase- experimental, e realiza a avaliação de um programa de aconselhamento de estilo de vida saudável. Os autores associam a adoção de estilos de vida saudáveis, com a redução significativa nas taxas de incidência de mortalidade para doenças crônica, colocando a promoção da saúde como o desafio crucial dos cuidados primários. O estudo objetiva contribuir com modelos de intervenção que conduzam a mudanças nas práticas de promoção, no âmbito da Atenção Primária de Saúde. Aponta quatro fatores como fundamentais para o sucesso das intervenções: (1) compromisso dos profissionais em parceria com a comunidade; (2) competência para a mudança; (3) cooperação interdisciplinar entre os envolvidos no processo; e, (4) disponibilidade de recursos necessários. Ressalta a sobrecarga de trabalho e a alta rotatividade da equipe como fatores que comprometem o trabalho (Sanchez et al., 2009), uma

realidade que, nesse sentido, aproxima-se da vivenciada nos serviços de saúde brasileiros. Fica claro neste estudo, que a participação comunitária resume-se à adoção do estilo de vida saudável recomendado no programa, não sendo abordada a reflexão sobre as condições de vida e da cultura que permeia os hábitos a serem „superados‟.

O segundo estudo foi realizado na Suíça e avaliou a alteração nos níveis de atividade física dos pacientes, participantes de um programa de combate ao sedentarismo, um ano após a intervenção. O autor inicia o texto alertando que 64% da população do país não atinge os níveis recomendados de atividade física. Ressalta que o sedentarismo é um dos grandes problemas da saúde pública nas sociedades modernas, relacionado a problemas cardiovasculares, diabetes e hipertensão. Atesta, a partir desses dados, que a Atenção Primária deve ser o local privilegiado para se enfrentar esse desafio, pois 61% da população do país têm um médico da família. Os resultados do estudo apontam um pequeno aumento do número de pacientes sedentários que iniciaram a atividade física e, revela que os que praticam atividades físicas também necessitam de aconselhamento para manter as atividades (Sabti, 2010). A terceira pesquisa, de abordagem quantitativa, foi realizada na Atenção Primária de Saúde da Finlândia. Tinha por objetivo avaliar o efeito preventivo de um Programa de Saúde Bucal em crianças com menos de cinco anos de idade, realizado por meio da orientação aos seus cuidadores. O estudo destaca a importância dos hábitos saudáveis e padrões de higiene desenvolvidos precocemente, afirmando que contatos repetidos com profissionais de saúde auxiliam no desenvolvimento de hábitos bucais saudáveis, por meio de educação, motivação, e apoio aos cuidadores. Um dos resultados do estudo chama atenção ao revelar que, nas famílias mais favorecidas economicamente houve uma diminuição significativa de cáries nas crianças e, ao contrário, nas famílias da classe operária não houve alteração das taxas (Meurman, 2009). Esses dados corroboram o que foi apontado anteriormente, que em ambientes desfavoráveis, a responsabilização do sujeito pela não adoção do estilo de vida preconizado, levam a um sentimento de incapacidade e diminuição da autoestima, produzindo geralmente passividade diante das situações e alimentando a incapacidade de mudança (Figueira et al., 2009).

3.4.3 O Estilo de Pensamento da Nova Promoção de Saúde (NPS)