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OBJETIVOS 2.1 Objetivo Geral

3. REVISÃO DA LITERATURA 1 Sistema Único de Saúde SUS

3.4.1 Estilos de Pensamento: Um Marco Metodológico

O termo „estilo de pensamento‟ provém da epistemologia construtivista de Ludwik Fleck (1935/2010), que concebe a ciência como algo que nunca é realizado individualmente, mas sempre de maneira cooperativa. Em decorrência da complexidade do fenômeno saúde-doença, este autor afirma que não é possível uma visão global ou unitária, mas diversas percepções sobre o fenômeno. Tais considerações levam à existência, tanto no campo disciplinar quanto no prático, de diferentes perspectivas de uma mesma realidade, embasadas em diferentes pressupostos, apesar de observarem os mesmos fenômenos ou fatos científicos.

Um estilo de pensamento indica o entrelaçamento das instâncias psíquicas, cognitivas e sociológicas, que delimitam as fronteiras da percepção dos sujeitos, orientado e restringindo o pensamento, as práticas, os questionamentos e as respostas propostas por um determinado coletivo. Apesar de Fleck ter desenvolvido essa categoria por volta de 1930, esta se mantém extremamente atual, pois, atribui especial valor a compreensão histórica e social dos fenômenos, prerrogativa que vai de encontro à lógica da Saúde Coletiva (Tesser, e

10 Uma explanação abrangente dos vários modelos e concepções de

promoção de saúde foi abordada por Dowbor (2008) e Carvalho (2010).

11 Termo utilizado por Da Ros (2000) ao abordar as concepções

predominantes na área da saúde: saúde pública e saúde coletiva.

Luz, 2008), sendo essa compatibilidade decisiva na eleição dessa categoria analítica para este estudo.

Na realidade não existe uma definição única de estilo de pensamento, situação que evidencia sua potencialidade enquanto categoria analítica para a construção de uma teoria do conhecimento. Por ser uma categoria ampla e flexível, constitui-se em necessidade crucial, a delimitação do sentido que está sendo utilizado, para preservar sua capacidade explicativa. Uma tentativa interessante de agrupar os vários sentidos é realizada por Da Ros (2000, pp. 44-45), ao afirmar que estilos de pensamento são:

“uma postura teórico-psicológica de aceitação de uma verdade provisória que subordina conhecimentos. Tal postura é determinada histórico-sócio-culturalmente e, embora se movimente continuamente, apresenta resistências a transformações. Neste contexto, desenvolve uma aparente lógica formal, a partir de áreas do

conhecimento científico, nascendo,

portanto, do „velho‟ para criar o novo. E isto é feito dentro de um coletivo que tem o mesmo modo de pensar e agir.”

Um estilo de pensamento ao mesmo tempo em que direciona o pensamento, a percepção e a cognição, tem uma função educativa essencial para a formação de um grupo que partilha o mesmo estilo, chamado de coletivo de pensamento (Tesser, 2006). Esse coletivo é composto pela comunidade de cientistas de uma área disciplinar, que se configura em uma unidade social e partilha as premissas de um determinado estilo. É necessário ressaltar certa cumplicidade entre seus membros, “uma socialização de estilo e um culto comum de ideal de verdade” (Cutolo, 2002, p. 36).

Para Da Ros (2000), os pressupostos mais importantes dessa epistemologia construtivista são: abordagem integradora dos fenômenos, a delimitação que todo conhecimento é socialmente construído e que as observações são sempre influenciadas pelo estilo de pensamento de seu observador. Este autor argumenta que para Fleck a relação cognoscitiva não é bilateral, pois, além do cognoscente e do objeto a ser conhecido sempre existem as relações históricas, sociais e culturais, ou seja, o estado do conhecimento naquele momento histórico. Esse estado do conhecimento, em última instância, delimita os contornos dos estilos de

pensamento, o que leva a afirmar que um fato científico é, de certa maneira, um subproduto dos estilos de pensamento.

O saber é uma atividade social e por este motivo não pode ser compreendido como ato individual. A construção do conhecimento exige esforço e trabalho claramente cooperativo, que só é possível com a circulação de ideias nos coletivos. Dessa forma, todo fato científico está impregnado por um estilo de pensamento, portanto é fundamental que ele seja contextualizado e que seja compreendida a transitoriedade das verdades científicas, pois, tal conhecimento está condicionado pela atividade social do ser humano ao longo da história (Cutolo, 2002).

Uma visão geral do fenômeno exige a explanação das diversas concepções, para em seguida chegar a uma aproximação da realidade de forma ampliada na busca de uma totalidade, visto que, não são apenas as observações empíricas que fundamentam um estilo de pensamento, mas uma determinada maneira de ver aquele fenômeno. No entanto, dentre as diversas concepções há certa dificuldade de entendimento, pelas percepções diferenciadas, típicas de diferentes estilos de pensamento. Tal dificuldade de entendimento Fleck denomina de incomensurabilidade (Fleck, 1935/2010). Assim, é possível afirmar, embasando-se nessa compreensão, que os estilos de pensamento analisados a seguir são incomensuráveis entre si.

Essas percepções dirigidas, ou estilos de pensamento, são partilhados por um coletivo de pensamento que constrói um corpo teórico estruturador, correspondente a uma determinada prática. Sobre isso, serão analisados os dois estilos de pensamento mais evidentes na compreensão da promoção de saúde. A seguir, são delimitadas as características desses estilos, evidenciando-se que eles, em seus mais variados matizes, fundamentam e estruturam as relações estabelecidas entre gestores, profissionais e usuários, repercutindo na organização dos serviços de saúde e nas relações estabelecidas.

Vale ressaltar que o presente estudo tem como marco norteador o estilo de pensamento da Nova Promoção de Saúde em sua vertente crítica, por compreender que tal proposta é a mais condizente com o SUS e com um país (Brasil), que tem nas desigualdades sociais sua marca fundamental. Parte-se de uma concepção que propõe a emancipação dos sujeitos e o fortalecimento comunitário, na busca ativa de melhores condições de vida e saúde, na medida em que se mostra inviável propor alterações de estilos de vida em contextos de total abandono, falta de acesso a serviços e oportunidades.

3.4.2 O Estilo de Pensamento da Promoção de Saúde