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Considerei o pressuposto de que o processo de pesquisa é um mosaico posto à disposição da descrição de um fenômeno complexo e que “[...] a diversidade nas peças deste mosaico inclui perguntas fechadas e abertas, implica em passos predeterminados e abertos, utiliza procedimentos qualitativos e quantitativos” (GÜNTHER, 2006, p.202). Por conseguinte, o estudo se caracteriza como uma pesquisa de método misto e foram utilizadas como técnicas de coleta de dados: análise documental, questionário estruturado, entrevista narrativa e diário de campo.

A primeira etapa de coleta consistiu no levantamento de dados secundários contidos no banco de dados do Programa Ágora, relativos às Turmas Alfa-2008/1 e da Turma Beta- 2008/2. Estes dados possibilitaram a identificação daqueles que tinham concluído o curso, e as informações que facilitaram o contato com eles, inicialmente por correio, e, em seguida, por telefone. Planilhas de Excel foram utilizadas em procedimentos de organização dos dados coletados.

Posteriormente, foram enviados, aos duzentos e setenta sujetios egressos do curso, o questionário estruturado (Apêndice B) e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) (Apêndice C), que deveria ser devolvido assinado. Nesse caso, o egresso autorizava o uso dos dados do questionário que respondeu e se colocava disponível para uma entrevista. Junto, os egressos receberam um envelope com os selos exigidos pelo correio e os dados do remetente e de endereçamento devidamente preenchidos.

Após o retorno da correspondência, os dados informados foram organizados em planilhas de Excel e foi possível aplicar os critérios de inclusão para a etapa de coleta dos dados qualitativos por meio de entrevista: ter permanecido na Estratégia Saúde da Família durante todo o desenvolvimento do curso; residir no município sede do Polo de Apoio à Universidade Aberta do Brasil (Polo UAB) ao qual esteve vinculado durante o curso.

Além de ter possibilitado a aplicação dos critérios de inclusão, o questionário respondeu ao propósito de explorar alguns aspectos objetivos da relação que o sujeito respondente estabeleceu entre seu cotidiano, sua equipe e o desenvolvimento do curso. Esses dados são apresentados e discutidos no sétimo capítulo.

O critério de permanência no desenvolvimento da Estratégia Saúde da Família durante o desenvolvimento do curso está diretamente relacionado ao objeto de estudo, ou seja, o curso enquanto instrumento de educação permanente em saúde para os profissionais que o desenvolveram. Inserção na Atenção Básica e desenvolvimento da Estratégia Saúde da Família (ESF) foram pré-requisitos para inscrição no processo seletivo de alunos para o curso.

O critério de local de residência tem relação com a acessibilidade da pesquisadora aos sujeitos da pesquisa com menor custo. Assim, foi possível utilizar a estrutura física de Polo UAB para as entrevistas, e estas foram realizadas no local, dia e horário combinados, com o meu deslocamento para o município sede do Polo de Apoio à Universidade Aberta do Brasil ao qual o egresso esteve vinculado como aluno. Em apenas um caso houve deslocamento da pesquisadora do município sede de um Polo UAB para outro município, e a entrevista foi realizada na casa do entrevistado29.

A sequência das entrevistas foi definida por sorteio dos Polos de inserção dos egressos durante o curso. Após a definição da sequência, entrei em contato com os sujeitos, em cada Polo sorteado, e agendei a entrevista em horários subsequentes, em um mesmo dia, para todos os sujeitos moradores naquele município. Em três situações, consegui agendar a entrevista quando já estava no Polo, para horário no mesmo dia ou no dia seguinte. Em um dos Polos havia apenas um egresso a ser entrevistado e aproveitamos uma viagem que ele fez a Belo Horizonte para a realização da entrevista.

A técnica de entrevista narrativa (Apêndice D) é considerada como entrevista de profundidade e não estruturada (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2007). As entrevistas foram realizadas por mim, gravadas – com o consentimento dos informantes - e transcritas 29 Excepcionalmente, foi entrevistado um egresso residente a 33,5 km da sede de um Polo, com deslocamento

com todas as características possíveis. As transcrições foram realizadas após cada entrevista ou bloco de entrevistas realizadas em um mesmo Polo. Após a realização, transcrição e leituras de 05 (cinco) entrevistas e tendo considerado a pertinência da técnica, realizei mais 10 (dez) entrevistas válidas, utilizando os mesmos procedimentos anteriores. Das transcrições, eu realizei 08 (oito) e 07 (sete) foram realizadas por acadêmicas bolsistas do Programa Ágora/NESCON/FM/UFMG e revistas por mim.

O método de geração de dados por meio da entrevista narrativa está vinculado ao nome de Fritz Schütze, sociólogo alemão que empregou essa técnica de coleta de dados pela primeira vez em um projeto de pesquisa que buscava analisar as mudanças coletivas em uma comunidade da Alemanha, na década de 1970 (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2007).

Contudo, a narrativa tem origem antiga, na Poética de Aristóteles (RICOUER, 1994) e tem ganhado destaque como método de investigação pela consciência do papel que contar histórias tem na representação de fenômenos sociais. Apesar de nem todas as narrativas serem histórias, nela “as pessoas lembram o que aconteceu, colocam a experiência em uma sequência, encontram possíveis explicações para isso, e jogam com a cadeia de acontecimentos que constroem a vida individual e social” (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2007, p.91).

Os mesmos autores consideram que o enredo é fundamental na constituição de uma estrutura de narrativa, pois “é através do enredo que as unidades individuais (ou pequenas histórias dentro de uma história maior) adquirem sentido na narrativa. Por isso a narrativa não é apenas uma listagem de acontecimentos, mas uma tentativa de ligá-los, tanto no tempo como no sentido” (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2007, p.92).

Conforme proposta por Fritz Schütze (1973 apudJOVCHELOVITCH; BAUER, 2007, p. 97), a entrevista narrativa tem as etapas que apresento a seguir, no Quadro 1.

Quadro 1 - Fases Principais da Entrevista Narrativa segundo Fritz Schütze

FASES REGRAS

Preparação Exploração do campo

Formulação de questões exmanentes Iniciação Formulação do tópico inicial para narração

Emprego de auxílios visuais Narração central Não interromper

Somente encorajamento não verbal para continuar a narração Esperar para sinais de finalização (“coda”)

Fase de perguntas Somente “Que aconteceu então?”

Não dar opiniões ou fazer perguntas sobre atitudes Não discutir sobre contradições

Não fazer perguntas do tipo “por quê?” Ir de perguntas exmanentes para imanentes Fala conclusiva Parar de gravar

São permitidas perguntas do tipo “por quê?” Fazer anotações imediatamente depois da entrevista

Fonte: JOVCHELOVITCH; BAUER, 2007, p. 97.

Assim, após preparação prévia, a entrevista tem início com a pergunta geradora da narrativa, que pressupõe relação entre a experiência do informante e o tema da pergunta. O entrevistador deve evitar qualquer intervenção diretiva durante a narrativa; após certificar- se da coda (fim da história narrada), o entrevistador pode fazer perguntas que esclareçam aspectos abordados pelo entrevistado, expandindo detalhes sobre algo que apareceu na narrativa; na última etapa - a sugestão é que não seja gravada -, o entrevistador pode fazer perguntas sobre aspectos não mencionados na narrativa, incluindo a solicitação de explicações a partir da expressão “por que” (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2007; FLICK, 2007).

É pertinente registrar que os entrevistados fizeram uma narrativa contínua que teve uma duração, em média, de oito minutos e cinquenta e sete segundos, a partir da minha formulação: Conte para mim a sua história no desenvolvimento do CEABSF, do momento

em que você decidiu fazer o curso até o término, com apresentação do seu trabalho final de curso. Com a formulação das questões exmanentes, que foram transformadas em

perguntas imanentes - referenciadas em questões contidas na narrativa inicial -, a duração média de uma entrevista completa foi de vinte e oito minutos e cinquenta e cinco segundos.

Para calcular a média do tempo de uma entrevista completa, desconsiderei aquela que foi mais curta, entrevistado com menor tempo de formado e entrevista que durou onze minutos

e seis segundos; também desconsiderei a mais demorada, que foi de uma hora, doze minutos e dezesseis segundos, realizada na casa do entrevistado.

Registro que, neste estudo, não cumpri a sugestão de que a última etapa - denominada conclusiva - não fosse gravada. Os próprios apresentadores da proposta dizem que as regras funcionam mais como guia e orientação para o entrevistador, não indicando uma adesão acrítica. O esperado com o cumprimento das regras é criar uma situação isenta de constrangimento e garantir a disposição do informante de contar a sua história (JOVCHELOVITCH; BAUER, 2007). Portanto, considerei que manter a gravação garantiria o esperado da técnica e evitaria algum equívoco de interpretação que eu poderia fazer da fala dos entrevistados em consequência de um registro livre, sem possibilidade de revisão.

Considero que os dados coletados foram suficientes para minha aproximação ao objeto em análise, apesar de consciente de que as representações não foram maximizadas ou esgotadas. Procurei valorizar ao máximo a contribuição de cada entrevistado, para que eu pudesse efetivamente viver um processo que

Não é apenas um processo de informação de mão única passando de um (o entrevistado) para outro (o entrevistador). Ao contrário, ela (a entrevista) é uma interação, uma troca de ideias e de significados, em que várias realidades e percepções são exploradas e desenvolvidas. [...] tanto o(s) entrevistado(s) como o entrevistador estão, de maneiras diferentes, envolvidos na produção de conhecimento (GASKELL, 2007, p. 67).

Por último, registro que o diário de campo foi utilizado para anotar fatos observados e considerados relevantes, antes, durante e após as entrevistas, e foi usado como apoio no processo de análise.