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Comprometimento com o SUS atual e visão de futuro: o SUS onde quero estar

7.2 Interpretando as Narrativas

7.2.4 Comprometimento com o SUS atual e visão de futuro: o SUS onde quero estar

Esta categoria temática é resultado de uma pergunta exmanente, ou seja, que compunha as perguntas que originalmente considerei que gerariam dados que poderiam contribuir para a minha apreensão do objeto em estudo. Projetei que o discurso dos entrevistados poderia ajudar-me a compor um quadro que revelasse um futuro do qual eles fariam ou não fariam parte, desvelando a intencionalidade e a predisposição para construir o SUS.

Após a análise dos dados coletados e, principalmente, após a interpretação que fiz das unidades de contexto que categorizei em Dificuldades e facilidades vivenciadas na

implantação e implementação de um novo modelo de atenção à saúde, percebo que aquela

minha projeção foi confirmada: todos os entrevistados falam de um futuro para o SUS que os inclui, apesar das dificuldades encontradas no trajeto dessa construção. Mesmo aqueles que, no momento da entrevista, não estavam vinculados a uma equipe de saúde da família ou saúde bucal querem refazer o vínculo.

Para um sujeito, a esperança é que tenham aposentado aqueles que não querem mudar e que haja um investimento em novos quadros, ou seja,

[...] são aquelas pessoas que estão ali, que já trabalham há 20 anos, já têm seu vínculo, querem ficar daquela mesma forma, não querem mudar. E eles são os entraves que a gente sabe que, daqui a pouco, eles vão aposentar; eles trocam e a gente... Vamos investir em quem tá entrando, vamos começar a estimular as pessoas, para que não fiquem daquela forma; esses aí daqui a pouco serão substituídos e aí a gente vê melhora (CD-23).

Para esse sujeito, investir significa qualificação, por meio de concretização da política de EP, e concurso público, que dê estabilidade aos profissionais, principalmente aqueles que buscaram por qualificação. Infiro que ele está engajado na ideologia sanitarista de consolidação do SUS com uma visão de futuro que precisa ser nutrida, para expandir e contaminar. Dou esse sentido a uma unidade de contexto que, do meu ponto de vista, tem um pensar com o coração e um agir com o pé no chão:

Eu sonho com ele bem estruturado, bem organizado e consigo perceber isso, que vai começar dos pequenos municípios, porque é onde que eu vejo que é mais fácil de se

organizar, que tem um número menor de profissionais, um sistema mais rudimentar. [...] Se você tem uma atenção primária organizada, você consegue aliviar os outros níveis de forma, assim, gigantesca. [...] Então, temos que organizar a nossa demanda aqui primeiro (CD-23).

Na mesma lógica de argumentação, outro entrevistado diz que:

Eu acho que o PSF vai melhorar, vai se fortalecer e vai, realmente, virar o centro da rede. E que a hora que a gente diminuir, a hora que restringir o acesso, a atenção primária vai conseguir, realmente, controlar quem vai para atenção secundária e quem volta; porque, aí, vai ter que fortalecer a referência e a contrarreferência. Fortalecendo a atenção primária e a referência e a contrarreferencia, a atenção secundária vai ficar só com aqueles casos que precisam dela realmente. E, aí, vai possibilitar uma melhora grande da atenção secundária e a alta complexidade vai estar ainda melhor (CD-13).

Um entrevistado fala do SUS como um ente (um ser) que deve estar sempre atento, pois a única coisa constante é a mudança e o SUS precisa estar vigilante para não se tornar obsoleto. Ou seja, aqueles que fazem o SUS devem refletir sobre a experiência vivida e essa reflexão deve contribuir para novas escolhas, melhores que as anteriores. Para ele:

[...] todas as políticas de saúde tiveram os pontos positivos e serviram de base para a gente estar no SUS hoje. Nem que seja de base para ponto crítico: isso não pode fazer isso pode (CD-3).

Interpreto que, em uma perspectiva de ser sujeito em um processo de construção, o entrevistado se coloca como guardião de uma proposta em que crê e não quer ver frustrada em sua caminhada rumo ao futuro, pois representa recuperação de cidadania para muitos. Para tanto, diz que “a gente tem que ter esse olhar crítico da política [...] a gente tem que ver para não deixar corromper” (CD-3). Considera, também, que é fundamental que haja maior investimento na divulgação dos direitos dos cidadãos em relação ao SUS, pois, muitas vezes, são os que mais precisam que não conseguem ser atendidos, por falta de informação. Paralelamente ao fortalecimento do SUS, é preciso investir em educação escolar, pois “quem tem conhecimento ganha a vantagem [...] se a população cresce em grau de escolaridade, em nível de conhecimento e tudo, ela tem condições de saber como ela utiliza esse sistema”, ou seja, reivindica seus direitos.

A possibilidade de fortalecimento do SUS, de um vir a ser a partir da participação da comunidade e com valorização de processos educativos, também é argumento de outro entrevistado, conforme unidade de contexto a seguir:

O SUS pode ser lindo, desde que as pessoas, os profissionais estejam engajados com a proposta. Que as pessoas queiram participar ativamente, que elas façam, que elas deem o melhor que podem; que elas possam, realmente, discutir, que elas possam estudar. Inclusive promover o controle social, envolver a comunidade no processo, envolver novos parceiros, investir em educação permanente [...] com a criação de grupos de discussão, de envolvimento com o controle social, com o Conselho de Saúde.... (CD-7).

Dois sujeitos usaram o argumento de que, para qualificar a atenção, é preciso que os profissionais se vejam ou vejam seus familiares entre os usuários do SUS. Um deles, em especial, faz referência a sua opção por ser usuário do SUS, ao expressar sua visão do SUS no futuro:

Eu acredito no SUS. Nem plano de saúde eu tenho. Eu trabalho pelo SUS. Ah, se eu não valorizar o SUS, quem vai valorizar? Eu acredito que tem profissionais muito bons, só que, é lógico, tem a parte, isso que eu falo, toda parte administrativa tem um impasse. Então, sempre vai ter um probleminha que não está se ajeitando. Mas isso, até no plano de saúde tem, que a gente vê muito na mídia – televisão, jornais, revistas – que também tem suas falhas. Então, como os planos de saúde são diversificados e têm problemas, porque o SUS, que é tão amplo, não vai ter problema? (ENF-48).

Ainda em relação à comparação entre Planos de Saúde e o SUS, um entrevistado afirma que

Eu creio sim, que vai melhorar mais ainda [...] todos nós precisamos, até porque plano de saúde, hoje em dia, quase ninguém tem e quem tem é difícil de pagar; quando você paga, não é todo lugar que é credenciado, e o SUS não. O SUS é nacional e qualquer lugar que você precisou ele está ali [...] (CD-38).

Ouso inferir que o entrevistado ficaria surpreso com a informação divulgada recentemente de que o número de pessoas vinculadas aos planos de saúde atingiu 46,6 milhões no segundo trimestre de 2011, um crescimento de 7,6% em relação a 2010, segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (CARNEIRO, 2012).

Surge, porém, a possibilidade de interpretar que os profissionais acreditam que, se for feita uma comparação de mérito, ou seja, que envolva a análise de princípios que devem caracterizar a prática desenvolvida no SUS e a de outras propostas, a melhor opção é o SUS. A unidade de contexto a seguir sustenta essa minha interpretação:

Eu não vejo outra opção melhor. Eu acho que com, principalmente, essa estratégia, eu falo assim: o paciente, eu nunca vi o paciente tão próximo, o paciente é muito próximo da gente; do médico, da equipe como um todo. O paciente chega lá, ele sabe a quem ele se refere; (...) o paciente me encontra, ele fala com o enfermeiro, ele fala com o agente, ele fala comigo. Ele tem alguém que o acolha. [...] Ele sabe o nome do médico dele (MED- 8).

Porém, o entrevistado faz uma ressalva quanto à visão de futuro promissor que ele visualiza para o SUS, caso não ocorram mudanças relativas ao espaço de gestão e a quem o ocupa. Diz que:

[...] para ser secretário de saúde, eu acho que tem que ter um curso pelo menos [...] não pode ser uma nomeação política. Você tem que ter um mínimo de formação para você saber o que você está fazendo. Eu acho que o entrave é este: quem são os gestores da saúde? O ponto de entrave para o SUS funcionar é esse, os gestores; eles têm que ser pessoas capacitadas. [...] Porque, senão, não vai funcionar. Senão, vai ficar só resolvendo problemas de pessoal, que nem RH, e não vai ficar melhor (MED-8).

7.2.5 Alguns aspectos que devem ser considerados em uma avaliação do