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2. BASILÉIA 2 E REGULAÇÃO BANCÁRIA INTERNACIONAL

2.2. Basiléia 1

2.2.4. Comentários finais sobre Basiléia 1

Embora não seja o objetivo deste trabalho explicitar de forma detalhada Basiléia 1 e seus resultados, alguns pontos principais cabem ser destacados a respeito de seus impactos sobre o sistema bancário internacional.

Conforme evidenciado por BCBS (1999a), de modo geral, houve um aumento dos níveis de capital dos países do G-10 após a implementação de Basiléia 1, embora não haja evidências que possam determinar uma relação direta de causalidade.

Com relação às formas de ajuste dos bancos pouco capitalizados ao nível mínimo requerido, BCBS (1999a) aponta que o tipo de atitude dos bancos se procedeu, de modo geral, pela forma menos custosa, ou seja, pelo aumento do nível de capital nas fases cíclicas expansivas e pela redução dos ativos ponderados pelo risco nas fases de retração econômica. Este fato ilustra um comportamento procíclico dos bancos para a realização destes ajustes.

De acordo com o discutido por Guttmann (2006), o Acordo foi implementado em uma época de desaceleração econômica nos Estados Unidos e principalmente no Japão, onde repercutiram os efeitos negativos da queda dos mercados acionários. Com isto, a necessidade de enquadramento contribuiu para a ocorrência de credit crunchs no Japão em 1989 e nos Estados Unidos, no biênio 1990-1991.

As principais críticas sobre a metodologia deste Acordo podem ser resumidas como se segue:

- O critério para diferenciação de risco dos ativos soberanos e interbancários utilizado em Basiléia 1, conforme se localizassem na OCDE ou não, pode ser considerado ad hoc, passível de inconsistências. Um exemplo é a diferenciação por empréstimos soberanos a

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Estas dívidas subordinadas possuem critérios mínimos para sua elegibilidade como capital em nível 3. Devem ser não seguradas, subordinadas e totalmente subscritas; devem ter uma maturidade original de pelo menos dois anos; não podem ser quitadas antes da data prevista, a não ser que haja autorização neste sentido pelas autoridades regulatórias; e devem estar sujeitas a cláusulas de lock-in, o que significa que o principal ou os juros não podem ser pagos se tal desembolso implicar no desenquadramento dos padrões mínimos de capital.

países com perfis de riscos semelhantes. De um lado, México e Turquia recebiam ponderação de riscos zero. De outro, países como Brasil e Argentina possuíam ponderação de 100% (Mendonça, 2002; Barrel e Gottschalk, 2005).

- Não é considerada a diferença de risco entre diferentes ativos dentro da mesma faixa de ponderação. Este fato não permitia uma discriminação fina entre os níveis de riscos de ativos com a mesma categoria e estimulava a prática de arbitragem regulatória por parte dos bancos, como comportamentos de cherry picking. Como as exigências de capital regulatório eram as mesmas indistintamente da percepção de risco das exposições, havia o incentivo para que os bancos concentrassem em suas carteiras operações mais arriscadas, por exigirem um nível de capital econômico33superior aos índices regulamentares, em detrimento dos tomadores com melhores percepções de riscos, que exigiriam um menor nível de reservas de capital.

- Relacionado ao último fato, o Acordo estimulou o uso de mecanismos de securitização de crédito como forma de evitar a necessidade de reservas de capital para ativos com menor percepção de risco. Conforme observado por BCBS (1999a), Basiléia 1 produziu o incentivo à transferência de ativos com menores níveis de risco para operações fora dos balanços, por meio de empresas de propósito específico (SPEs), concentrando nos balanços os ativos mais arriscados.

- Os índices de Basiléia dos bancos, nestas condições, podem não refletir as reais condições de solvência. Conforme mencionado por Guttmann (2006:181):

“O requerimento de capital regulatório escondia o perfil de risco econômico dos bancos baseado em probabilidades correntes de default e insolvência. Os bancos com, por exemplo, uma base de capital de 12% poderiam estar em boa situação em comparação com a meta mínima de 8% para o capital bancário, mas estariam, na realidade, severamente sub-capitalizados se sua alocação interna de capital econômico contra seu portfólio de empréstimos exigisse um requerimento de capital de 15%, por exemplo. A imposição de um padrão uniforme de capital regulatório obscurecia a alocação apropriada de capital econômico.”

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O conceito de capital econômico se refere ao nível de capital calculado pelos bancos como suficiente para suportar as perdas decorrentes de uma determinada exposição a um nível de confiança definido. Não necessariamente este conceito equivale ao conceito de capital regulatório, que se refere ao capital requerido pelas autoridades de supervisão, dada a taxa de ponderação de riscos que estas determinam.

- Havia o incentivo a operações interbancárias de curto prazo nas operações fora da OCDE. Os menores requerimentos a operações com prazos inferiores a um ano em comparação a prazos superiores, estimulavam que as primeiras fossem preferidas às últimas. Diante de mudanças de cenário econômico, havia a tendência de que os bancos receptores destes fluxos se tornassem mais expostos, em virtude da possibilidade de aumento do ônus financeiro num cenário de taxas de juros crescentes ou de dificuldades de renovação de crédito. BCBS (1999c) comenta que há evidências de que esta distinção entre prazos pode ter contribuído para o aprofundamento da crise asiática em 1997.

Durante a década de 1990 até o primeiro semestre de 1997, houve uma tendência crescente de empréstimos bancários para os países mais afetados pela crise asiática, com a predominância de operações de curto prazo e interbancárias, conforme evidenciado na Tabela 3. Após o período em que se deflagrou a crise, no segundo semestre de 1997, houve uma redução dos fluxos de crédito para estes países, de aproximadamente 20% entre o final de 1997 e junho de 1998. Com a reversão da situação macroeconômica nestes países, o Acordo de Basiléia, ao incentivar a realização de operações de curto prazo, pode ter contribuído para processos de credit crunchs e aumento da dificuldade da rolagem dos créditos anteriores.

Tabela 3: Crédito bancário para os principais países do Sudeste Asiático*, proveniente de bancos do G-10.

Operações dez/93 dez/94 dez/95 dez/96 jun/97 dez/97 jun/98 Em milhões US$ 503.481 635.206 716.218 735.016 791.041 754.752 607.116 Evolução % 26,2 12,8 2,6 7,6 (4,6) (19,6) Curto prazo (%) 83 81 80 76 77 75 68 Longo prazo (%) 17 19 20 24 23 25 32 Interbancário (%) 50 47 52 60 61 57 51

* Seguintes países: Coréia do Sul, Tailândia, Malásia, Indonésia, Filipinas, Hong Kong, Cingapura, Taiwan e China. Fonte: elaboração própria, a partir de BCBS (1999c)

Em junho de 1999, foi emitida a primeira proposta com vistas à revisão do Acordo de Basiléia (BCBS, 1999b). As discussões se intensificaram na forma de documentos de consulta até culminarem no segundo Acordo de Basiléia.