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COMPOSIÇÃO FLORÍSTICA DE FLORESTAS ESTACIONAIS AO LONGO DE UM GRADIENTE ALTITUDINAL NO PLANALTO RESIDUAL DO URUCUM MS

Figura 1 Mapa 3D de Localização das Áreas de Estudo do Gradiente Altitudinal da Morraria do Urucum Ladário MS

COMPOSIÇÃO FLORÍSTICA DE FLORESTAS ESTACIONAIS AO LONGO DE UM GRADIENTE ALTITUDINAL NO PLANALTO RESIDUAL DO URUCUM MS

INTRODUÇÃO

As florestas estacionais tropicais são formações predominantemente arbóreas que ocorrem em áreas onde a precipitação anual é menor que 1600 mm, com um período de seca de 5 a 6 meses com precipitação total menor que 100 mm (Gentry 1995; Grahan & Dilcher 1995; Pennington et al. 2000). Recentemente essas formações têm sido encaradas como uma nova unidade vegetacional nas Américas (Prado 2000). Essas florestas estão subdivididas em Florestas estacionais semidecíduas que podem perder de 20 a 50% das folhas no período seco e florestas estacionais decíduas que perdem mais de 50 % das folhas no período seco (IBGE 1992). As florestas decíduas são caracterizadas pela forte presença de espécies armadas, com folhas pinadas e/ou com caules fotossintetizantes e armazenadores de água (Medina 1995; Killeen et al. 1998). São formações cuja estatura, está relacionada ao número de meses com menos de 200 mm de chuva por ano (Holbroock et al. 1995). Nas Américas essas formações ocorrem associadas aos cerrados, que diferem dessas nas condições ambientais pelo fato de possuírem solos ácidos e distróficos com altas concentrações de alumínio (Furley & Ratter 1988) enquanto que as florestas estacionais decíduas estão, geralmente assentadas sobre solos ricos, com boa saturação por bases e de pH moderado a alto (Ratter et al. 1978).

As formações semidecíduas têm sido objeto de vários trabalhos na América do Sul, principalmente no sudeste do Brasil (Cesar & Leitão-Filho 1990; Custodio-Filho et al. 1994; Oliveira-Filho et al. 1994 a,b; Salis et al. 1995; Oliveira-Filho et al. 1997; Oliveira-Filho et al. 2001; Paula et al. 2004). Já as formações florestais decíduas têm sido pouco estudadas e só recentemente, despertado a atenção dos pesquisadores (Killeen et al. 1998; Ivanauskas & Rodrigues 2000). Pelo fato de estarem sempre sobre solos férteis, têm sido objeto de forte devastação, em todos os lugares onde ocorrem, podendo ser consideradas como uma das mais ameaçadas unidades de vegetação nas Américas, restando apenas cerca de 2 % de toda a sua cobertura original na América Central (Janzen 1988).

As florestas estacionais decíduas estão distribuídas nas Américas de forma descontínua e fragmentada em núcleos. Na América do Sul esses núcleos estão distribuídos em forma de um arco, chamado por Prado & Gibbs (1993), de arco pleistocênico, em referência a sua possível origem no período pleistocênico com posterior fragmentação no holoceno em decorrência das mudanças de clima seco para úmido nas áreas entre os fragmentos. Segundo esses autores, os núcleos da América do Sul são: 1) Núcleo das caatingas; 2) Núcleo de Missiones, que se estende da região de Corumbá-MS até a região de Missiones na Argentina, parte de Santa Catarina e do Paraguai; 3) Núcleo Piedemont, que se estende de Santa Cruz de La Sierra na Bolívia até Tucuman e as serras de Catamanca no noroeste da Argentina. Além desses núcleos existem, em fragmentos, entre as cordilheiras dos Andes na Bolívia, Peru, Equador e Colômbia (Pennington et

al. 2000). Essas áreas têm sido objeto de estudos de vários autores como Prado & Gibbs (1993),

Killeen et al. (1998), Prado (2000), Bridgewater et al. (2003), Linares-Palomino et al. (2003). A essas formações é atribuído um alto grau de endemismos, oriundo em muitos casos, da vicariância. Esse fenômeno, de acordo com Pennington et al. (2000, 2004) resultou da fragmentação desses ambientes, após a retomada de um clima mais úmido no quaternário precedido por períodos secos no final do terciário e início do quaternário. Pennington et al. (2000) discutiram que o número de espécies endêmicas pode ser, na realidade, menor que o atualmente admitido, em função da ausência da percepção de que essas formações são uma unidade. Isso, segundo Pennington et al. (2000), influenciou muitos autores a descreverem disjunções biogeográficas de uma espécie como espécies diferentes.

No Brasil essas formações vêm sendo estudadas com mais intensidade nos últimos anos sob o aspecto florístico e estrutural (Pedrali 1997, Rodrigues & Araújo 1997, Ivanauskas & Rodrigues 2000, Silva & Scariot 2003), mas apesar disso ainda permanecem pouco conhecidas quanto a alguns aspectos biogeográficos, biológicos e ecológicos.

Na região do Pantanal sul-mato-grossense, ao longo da calha do rio Paraguai, existem uma série de morros de relevo residuais onde podem ser encontradas várias áreas de floresta estacional como a morraria do Amolar, Urucum e morraria do Conselho, no sentido norte sul. As primeiras informações sobre a vegetação dessa região foram feitas por botânicos que acompanharam expedições ao longo do século XIX como Riedel, entre 1825 e 1829; Manso, no período de 1830 a 1839; Weddel, em 1845 e Spencer Moore, em 1891 (ver Hoene 1923 para um histórico). Uma compilação sobre os exemplares coletados e descritos nessas expedições pode

ser encontrada em Dubs (1998), que catalogou mais de 1000 tipos coletados nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul depositados em vários herbários. Mesmo com todo esse conjunto de informações disponíveis, essas formações necessitam ser melhor conhecidas, uma vez que muitos dos trabalhos realizados na região sempre descobrem espécies nunca citadas (Pott et al. 2000; Salis et al. no prelo).

Essas florestas decíduas têm como uma das unidades vegetacionais vizinhas o Gran Chaco, que influencia floristicamente a região. Prado et al. (1992) estabeleceram os limites entre essas formações e as áreas chaquenhas no Estado de Mato Grosso do Sul. Alguns estudos foram desenvolvidos para caracterização de áreas de floresta estacional decídua ao longo dos morros na borda oeste do Pantanal como os de Prance & Schaler (1982), Ratter et al. (1988), Juracy et al. (1999), Pott et al. (2000) e Salis et al. (no prelo). Entretanto poucos apresentam listagem com espécies não arbóreas, como os de Prance & Schaler (1982) e Juracy et al. (1999).

Toda morraria do Urucum está sob forte pressão antrópica, devido ao desmatamento para agricultura e atividades de mineração. Segundo Pott et al. (2000), cerca de 30 % da vegetação nativa foi substituída por pastos ou policultura e outros 15 % são áreas secundárias convertidas em capoeira. Apesar disso, a região oferece uma boa oportunidade para realização de estudos florísticos, uma vez que ainda possui várias áreas ainda intactas e ainda uma variação altitudinal bastante acentuada, possuindo os pontos mais altos do Estado de Mato Grosso do Sul (Okida & Anjos 2000).

O presente estudo teve como objetivo realizar um levantamento florístico das florestas estacionais da morraria do Urucum existentes na Bacia da Lagoa Negra ao longo de um gradiente altitudinal. Teve ainda o propósito de contribuir para a atualização sobre o conhecimento florístico complementando trabalhos anteriores sobre a região.

MATERIAL E MÉTODOS

Área de estudos

A área de estudo está localizada no planalto residual do Urucum, situado ao sul das áreas urbanas das cidades de Corumbá e Ladário. Este planalto é composto predominantemente pelas morrarias do Urucum, Santa Cruz, São Domingos, Grande, Rabichão e Tromba dos Macacos. O relevo residual é originado de movimentações tectônicas terciárias. No morro Santa Cruz se

localiza o ponto mais alto do Estado de Mato Grosso do Sul (1065 m), com declives entre 20 e 40% e topos tabulares (Okida & Anjos 2000).

De modo geral toda superfície da área estudada é formada pela cobertura dendrítico- laterítico pleistocênica, que é composta por sedimentos conglomeráticos e depósitos de talus, com predominância de minérios de ferro oriundos da formação Santa Cruz. Nas áreas de planície essa cobertura forma uma carapaça (bancada) laterítica que se situa, em geral, na base dos solos de toda área de influência da sedimentação dos morros, aflorando nas áreas de linha de drenagem das águas (Brasil 1982; Haralyi & Walde 1986; Anjos & Okida 2000).

O clima da região é do tipo tropical megatérmico (temperatura média do mês mais frio superior a 18ºC), com inverno seco e chuvas no verão, Awa na classificação de Köppen (Soriano 1997). Na série analisada por Soriano (1997), entre 1975 e 1996, a temperatura média anual foi de 25, 1 º C, oscilando entre 21,4 e 27,7 º C. A média das máximas foi 30,6º C atingindo máximas absolutas de 40º C entre outubro e janeiro. Já a média das mínimas foi de 21º C atingindo mínimas absolutas próximas de zero. A umidade relativa média anual foi de 76,8%, oscilando entre 71,8% e 80,9%. A precipitação média anual foi de 1070 mm, com o período mais chuvoso de novembro a março, com 68% das chuvas e o mais seco de junho a agosto com 7% (Figura 2). Todos esses dados são provenientes da estação climática do Inemet em Corumbá a 130 m de altitude. Ao longo do gradiente altitudinal estudado houve uma tendência de aumento da pluviosidade com a altitude em escala logarítmica (Capítulo 1).

A vegetação da região é bastante variável, constituída principalmente por florestas estacionais (decíduas e semidecíduas); as formações rupestres de topo de morros (campos limpos de cerrado e cerrado lato sensu); vegetação de bancada laterítica; matas ripárias do rio Paraguai; matas inundáveis associadas às baías Negra e do Arroz; e formações com vegetação aquática e as matas de galerias dos córregos nas partes altas dos morros (Bortolotto et al. 1999, Pott et al. 2000).

A região é muito rica em tipos diferentes de solos, em geral com alta fertilidade. Spera et

al. (1997) descreveram os solos da região, sendo que, na área estudada, os principais tipos de solo

mapeados são os litólicos eutróficos e cambissolos eutróficos. O primeiro apresenta horizonte A chernozêmico de espessura média ao redor de 30 cm, assentado diretamente sobre o substrato rochoso ocorre ao longo das encostas das áreas estudadas. O tipo cambissolo eutrófico foi

predominante na área de planície, e é caracterizado por um horizonte A chernozêmico seguido de B incipiente, com textura média e pouco cascalhenta.

Coleta de dados

As coletas foram realizadas em cinco áreas utilizadas no estudo fitossociológico dispostas ao longo de um gradiente altitudinal com intervalos de 200 m entre cada uma, com exceção do primeiro para o segundo ponto (ver capítulo 1). As áreas estão localizadas no município de Ladário-MS na Bacia da Lagoa Negra. A primeira delas, a 100 m de altitude, se localiza na fazenda São Sebastião do Carandá em uma área de planície não inundável entre os morros Santa Cruz e Rabichão (19º 6’ S; 57º 31’W). A segunda foi estabelecida na fazenda São João, a 200 m de altitude (19º 11’S; 57º 31’W). A terceira e quarta estão localizadas na fazenda São Marcelo nas altitudes de 400 (19º 10’S; 57º 35’W) e 600 m (19º 11’”S; 57º 34’W). A quinta área foi estabelecida na fazenda Paraíso, a 800 m de altitude (19º 11’S; 57º 36’W). Todas as áreas voltadas para a mesma face do morro.

Além das áreas escolhidas para o levantamento fitossciológico, foram realizadas coletas ao longo das trilhas de acesso às áreas, nas estradas de acesso a Fazenda Rabicho e na estrada de acesso à Lagoa Negra. Algumas coletas complementares foram realizadas nas estradas de acesso das mineradoras (Urucum Mineração e Mineração Corumbaense Reunidas), na vertente norte da morraria (município de Corumbá). Foram excluídas as espécies que ocorreram nas áreas de influência da inundação do rio Paraguai, que foram objeto de outro levantamento (Damasceno- Junior 1997). Também foram excluídas do presente levantamento as espécies de formações campestres (campos limpos de cerrado e vegetação de bancada laterítica, Damasceno-Junior em preparação) bem como as de cerrado stricto sensu. Assim, o levantamento abrangeu as espécies de florestas estacionais que ocorreram entre a área inundável do rio Paraguai e as partes mais altas da morraria do Urucum.

Foram coletados todos os espécimes de fanerógamas encontrados férteis dentro das formações florestais de hábito arbóreo/arbustivo e herbáceo, bem como espécies trepadeiras, lianas, epífitas, parasitas e hemiparasitas. As coletas tiveram periodicidade quinzenal durante os anos de 2001 e 2002. Também foram acrescentadas coletas realizadas na área fora desse período e incorporadas ao herbário COR. Todos os exemplares coletados foram prensados e desidratados segundo procedimentos usuais em coleta botânica, sendo posteriormente montados em cartolina,

etiquetados e armazenados no herbário COR/UFMS com duplicatas para o herbário UEC. Foram acrescentadas na lista de espécies exemplares que não foram encontrados férteis durante as coletas e que ocorreram no levantamento fitossociológico (Capítulo 1). As espécies dos levantamentos realizados por Fernandes (1999) para Bromeliaceae e Rodriguez (1999) para Orchidaceae também foram acrescentadas à lista por terem sido realizadas na mesma área objeto deste levantamento.

As identificações foram feitas por intermédio de consulta a bibliografia especializada, pelos professores e pós-graduandos do Departamento de Botânica da UNICAMP e por comparação em consulta aos herbários COR, CPAP, UEC, ESA, HRCB, SPF, SP e NY ou enviados a especialistas.

Na análise dos dados, as listas das formações encontradas foram comparadas à lista do levantamento da mata ripária do rio Paraguai, adjacente à área estudada, realizado por Damasceno-Junior (1997).

O sistema de classificação utilizado foi o de Cronquist (1981), com exceção de Leguminosae, que foi considerada como uma única família (Polhill & Raven 1981).

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