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CAPÍTULO V PROFISSIONALISMOS DO PROFESSOR JERÔNIMO ARANTES EM UBERABINHA (1907 a 1926)

1.4 Configuração da profissionalidade do professor na educação

1.4.2 Compromisso com a comunidade na profissionalidade do professor

A segunda dimensão da profissionalidade, identificada por Contreras, é o compromisso pessoal e político com a comunidade, cuja relação se faz entre o professor e a comunidade social no qual atua na sua prática educativa, por valorizar a ética profissional154.

Assim, exige o exercício da alteridade, em que o professor possa ter uma visão crítica de si e dos outros para contribuir nas soluções de problemas que existam e que possa ser requerido pelos membros da comunidade para posicionar-se para a solução dos mesmos155. Com estes

argumentos, a educação é um processo formador que ocorre em comunidade sob princípios

151 Ibidem, p. 78. 152 Ibidem. 153 Ibidem. 154 Ibidem, p. 78-79. 155 Ibidem, p. 79.

constituídos advindos das relações socioeconômicas e culturais da própria comunidade e de sua responsabilidade social.

Contreras argumenta que, por um lado, esse compromisso com a comunidade o professor vivencia e manifesta em espaços públicos em que há a prática de compartilhamento de ideias e de deliberações, a exemplo dos núcleos e das organizações de professores, as quais contribuem para nutrir e estimular a autonomia. Assim, na profissionalidade, “na medida em que compartilham problemas, discutem princípios, contrastam alternativas e soluções, analisam os fatores que condicionam seu trabalho, organizam sua ação etc.”, há uma constante avaliação crítica sobre as condições de trabalho, as intenções propostas, e a realidade vivenciada156. As decisões assumidas no grupo, caso esteja constituído, podem ser conservadoras, na obediência, ou transformadoras, em movimentos revolucionários. Todavia, as deliberações coletivas terão de ser ressignificadas pelo compromisso pessoal do professor, valorizando, assim, a sua autonomia profissional.

Por outro lado, esse compromisso com a comunidade envolve a dupla consciência, que pode se manifestar em conflito, em tensão: de um lado estimula a responsabilidade dos professores em serem autônomos, e por outro lado, os responsabiliza pelo conflito evidenciado entre a autoridade dos profissionais e a da sociedade157.

O compromisso com a comunidade tem alguns pontos fundamentais e frágeis para a autonomia do professor. Quando há uma redução do envolvimento da sociedade, verifica-se um aumento da influência dos aparelhos administrativos e burocratizados e, os currículos escolares podem se tornar restritivos para o professor, enquadrando-o no “[...] papel de funcionário obediente e ao resto da sociedade ao de espectadores”158.

Contreras apresenta os argumentos de Kogan que afirmou a respeito da necessidade de os professores se posicionarem a favor da sua própria categoria profissional com compromisso com a comunidade, e mediarem os conflitos diante de questões adversas. Além da mediação, o professor como agente político deve contribuir para encontrar as resoluções dos embates, como parte da sua tarefa profissional. E diz:

[...] No entanto como afirmou Kogan ‘a profissionalidade dos professores diante do legítimo direito da comunidade a intervir na educação consiste em interpretar as expectativas sociais como parte de seu trabalho na determinação do currículo. Os docentes não devem ser, simplesmente, uma parte num conflito entre pretensões e finalidades educativas. Parte de sua profissão deve consistir em mediar estes conflitos de maneira que se possa

156 CONTRERAS, José. A autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2002. p. 79.

157 Ibidem, p. 80.

entender o sentido e o valor de cada posição e encontrar a forma em que a escola possa realizar sua missão, sem limitar-se a ser o estopim das contradições nem a seguir irrefletidamente as diretrizes, ordens, correntes ou pressões do exterior.159

Todavia, essa ação política do professor por vezes tende a ser controlada pelo delineamento advindo da outra força estruturante, a profissionalização, que busca neutralizar pelos argumentos da racionalidade da lógica positivista o não pertencimento ao profissional da educação o direito de expressar em suas práticas educativas suas posições pessoais.

Contreras apresenta os argumentos fundamentados em McLaren que convergem com os de Kogan, na valorização da ação política do professor na sua prática educativa na educação a favor da justiça e igualdade social. E argumenta:

[...] a profissionalidade pode significar uma análise e uma forma de intervir nos problemas sociopolíticos que competem ao trabalho de ensinar [...]. Parece, então, legítimo perguntar-se, como parte da prática profissional do ensino, pela forma que a escola colabora de fato e de colaborar à promoção de práticas que têm um claro significado social. Por exemplo, se está favorecendo ou se está resistindo a que a educação escolar seja um lugar onde se reproduz e legitima a desigualdade e a injustiça social e em que forma.160

O autor apresenta, ainda, três justificativas sobre a atuação política na escola, sendo instituição educativa e de formação, também um local de práticas políticas. Em primeiro, por ser este o local em que são introduzidos os alunos às experiências, às ideologias, tanto do público quanto do privado da vida social, e no qual os professores são agentes formadores com posicionamentos políticos.

Em segundo, a prática docente pode incluir dentro de sua própria reflexão e ação a forma em que estes valores políticos se realizam em práticas de inclusão ou de exclusão, como ao que significa na formação nas atitudes e valores básicos dos cidadãos.

Em terceiro lugar, a instituição educativa é encarregada de propiciar uma compensação educativa como compensação social, e desta forma, o professor passa a ser agente potencializador a favor da diminuição das diferenças sociais161.

Considero pertinente associar a essa discussão o argumento de Magalhães, de que a instituição educativa desenvolve identidade com base na relação de contexto da perspectiva da cultura escolar.

159 CONTRERAS, José. A autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2002. p. 80-81.

160 Ibidem, p. 81.

[...] a instituição educativa apresenta uma identidade que não varia significativamente com as circunstâncias geográficas ou com as circunstâncias históricas. É, porém, na relação que estabelece com o público e com a realidade envolvente, na forma como a cultura escolar interpreta, representa e se relaciona com o contexto na sua multidimensionalidade, como na medida em que o público se apropria e se relaciona com as estruturas e órgãos de uma mesma instituição, que as instituições educativas desenvolvem a sua própria identidade histórica.162

Seja pelos conhecimentos produzidos em sua prática educativa com seus alunos, com base na herança do passado, na produção do presente, o professor tem intenção política de intervir na formação futura dos seus alunos, em convergência, preferencialmente, com a intenção política da respectiva instituição educativa em que atua. Todavia, deve haver o respeito pela co-existência das identidades, tanto do profissional quanto da instituição educativa e, consequentemente, dos compromissos profissionais de ambos com a comunidade.