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Capítulo II – Competências sociais

4. O perfil pragmático dos indivíduos com Síndrome de Williams

4.1. Comunicação verbal

Como já foi referido, as características seguidamente apresentadas encontram-se relacionadas com o fenótipo da linguagem da SW numa vertente relacionada com a área da pragmática.

As primeiras descrições acerca do fenótipo da SW estavam relacionadas com diversas áreas da linguagem e incluíram as seguintes características: fala fluente, bem articulada e gramaticalmente correta (Von Arnim & Engel, 1964; Jones & Smith, 1975 referidos por Rossi, 2010). Estas

características têm vindo a ser atribuídas ao bom funcionamento do circuito articulatório-fonológico – input auditivo da informação (audição) e output verbal (fala) (Jarrol, Baddley & Philips, 2007 referidos por Rossi, 2010).

O termo Cocktail Party Speech foi um dos primeiros a ser associado à SW como forma de caracterizar o seu fenótipo e foi introduzido por Udwin e Yule (1990). Esta descrição está relacionada com comportamentos verbais e características da personalidade e da pragmática de indivíduos com SW e inclui: fala fluente e bem articulada, comportamento sociável, uso de frases e comportamentos estereotipados, clichês, fala perseverativa (numa tentativa de preencher o espaço comunicativo) e introdução de experiências pessoais não relevantes e fora do contexto.

O vocabulário recetivo e expressivo concreto, bem como a sintaxe, têm sido identificados como áreas relativamente fortes nos indivíduos com SW. Em contraste com o vocabulário concreto encontra-se o vocabulário relacional/conceptual, no qual os indivíduos com SW apresentam grandes dificuldades; a este nível incluem-se os termos espaciais e temporais, conceitos quantitativos e dimensionais, conjunções e disjunções (Mervis & John, 2010).

As características da comunicação verbal em crianças com SW têm sido documentadas em diversos estudos. Neste âmbito, tem sido utilizada a Childrens’s Communication Checklist (CCC-2), constituída pelas seguintes 10 escalas: discurso, sintaxe, semântica, coerência, iniciação de conversações inapropriada, linguagem estereotipada, uso do contexto, comunicação não-verbal, relações sociais e interesses. Aquando da aplicação desta checklist verifica-se que, de um modo geral, os indivíduos com SW evidenciam dificuldades em todas as áreas (Laws & Bishop, 2004, referidos por Mervis & John, 2010).

Os autores acima referenciados verificaram, no seu estudo com uma amostra de 19 indivíduos com SW, que estes apresentaram conversas estereotipadas (frases com conteúdo confuso e repetitivo), iniciação de conversações inadequadas, dificuldade na manutenção do tópico de uma conversa e dependência excessiva do contexto como forma de interpretar o que lhes foi dito.

De uma forma geral, os resultados anteriormente apresentados foram corroborados no estudo realizado por Rossi et al. (2007) com um grupo de 12 indivíduos com SW. Constatou-se que a intenção em realizar um ato comunicativo foi semelhante ao grupo de controlo (indivíduos com a mesma idade, sem diagnóstico de SW e com normal desenvolvimento da linguagem). Contudo, foram verificadas diferenças estatisticamente significativas em relação ao uso dos recursos comunicativos verbais e não-verbais para concretizar as intenções comunicativas com ocorrência de iniciativas inadequadas (enunciados ecolálicos e perseverativos e introdução de tópicos sem o uso de estratégias linguísticas que sinalizam a introdução de um novo tópico) e respostas desadaptadas por parte dos indivíduos com SW.

Ainda de acordo com o mesmo estudo, foram também identificadas dificuldades por parte dos indivíduos com SW quanto à organização formal das conversações, no respeito pela manutenção dos turnos de conversação (relacionado com o comportamento impulsivo) e na mudança de tópico de conversa (devido a restrições lexicais); foram, ainda, verificadas nestes indivíduos características de fala precisa e ininteligível variável, ocorrência de alterações fonológicas, uma maior frequência de turnos por minuto, um menor comprimento do enunciado e uma frequência aumentada para o uso de partículas que interferem no encadeamento dos enunciados (ruturas da fala – pausas, repetições). No geral, verificou-se uma dificuldade por parte dos indivíduos com SW em atingir os

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objetivos comunicativos durante a conversação. Como conclusão, Rossi et al. (2007) referem que estes indivíduos podem apresentar características comunicativas recorrentes entre si, diferindo quanto ao grau de comprometimento, o que sugere um relacionamento com o prejuízo cognitivo apresentado por cada um.

As dificuldades conversacionais supramencionadas foram comparadas, em diversos estudos, às dificuldades linguísticas típicas dos distúrbios semântico-pragmáticos da linguagem nos indivíduos com diagnóstico de Perturbação Específica do Desenvolvimento da Linguagem (PEDL) (Laws & Bishop, 2004, referidos por Rossi et al., 2007).

Estas características peculiares do fenótipo de linguagem conferem ao indivíduo com SW não só dificuldades no relacionamento interpessoal como também, o aumento de oportunidades de comunicação com os outros, favorecendo o processo comunicativo do ponto de vista funcional. Este aspeto pode conferir-lhes uma “aparente” competência comunicativa, o que pode induzir os professores e outros intervenientes no seu processo educativo e de desenvolvimento a avaliar as suas competências comunicativas como adequadas.

Mais especificamente, a utilização de recursos sonoros e prosódicos e moduladores entoacionais (altura melódica, aumento no tempo de fonação e aumento da tensão fonémica (Rossi et al, 2007)) nas conversações por parte destes indivíduos, confere ao parceiro de comunicação um elevado grau de envolvimento comunicativo (Fishman et al., 2011). Este estilo comunicativo é característico dos contadores de histórias devido ao uso excessivo de marcadores de entonação; contudo, a este nível os indivíduos com SW apresentam dificuldades significativas relativas à coerência e complexidade da estrutura narrativa.

Dadas as diversas manifestações clínicas da SW, outros comportamentos relacionados com a área da pragmática podem ser agrupados numa outra categoria – comportamentos socioemocionais, seguidamente apresentada.