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2.2. ESTUDO DE FÃS

2.2.2. Comunidades de fã online

Na década de 1930, tem-se, através de colunas de revistas, a constituição das primeiras comunidades de fãs, as quais discutiam a respeito e apoiavam os produtos da mídia da época. Um exemplo é a coluna de cartas da Amazing Stories27, onde, em forma similar a um fórum, os fãs de ficção científica conseguiam se comunicar com outros fãs e, inclusive, escritores de suas estórias favoritas (VIMIEIRO, 2013). Em 1966, com o surgimento de

26 Associação de duas pessoas ou personagens transformando-os em casal. 27

Revista americana de ficção científica, organizada por Hugo Gernsbeck. Considerada a pioneira em sua área a abordar a temática da ficção científica, teve seu primeiro exemplar lançado em março de 1926, sendo em 2005 o último exemplar impresso, ganhando algumas edições em formato pdf após essa data.

grupos de fãs organizados, a partir da criação de grupos em torno de programas televisivos28, ainda com a temática da ficção-científica, e o envolvimento destes fãs com a produção dos programas foi determinante para que, nos anos 1970, juntamente com a proliferação de programas televisivos que envolviam o sentimento de parceria e amizade e o êxito do filme Guerra nas Estrelas, para o progresso da cultura de fãs (COPPA, 2006 apud BANDEIRA, 2009). Com o boom da internet, tais práticas que antes ocorriam como trocas de cartas, ou debates, foram transpostas para a internet

Essas novas comunidades são definidas por afiliações voluntárias, temporárias e táticas, e reafirmadas através de investimentos emocionais e empreendimentos intelectuais comuns. Os membros podem mudar de um grupo a outro, à medida que mudam seus interesses, e podem pertencer a mais de uma comunidade ao mesmo tempo. As comunidades, entretanto, são mantidas por meio da produção mútua e troca recíproca de conhecimento (JENKINS, 2009, p. 57).

É importante salientar as similaridades e diferenças entre comunidade de fãs e fã- clube. Como salienta Monteiro, T., (2005), a expressão comunidade de fã carrega em seu âmago um universo mais amplo que os fã-clubes, ou seja, os fã-clubes estão contidos dentro das comunidades de fãs, assim como os fãs individuais e o que distingue uma comunidade de fã de um fã-clube é a sua imaterialidade. Como exemplo citado por Monteiro de como funciona essa imaterialidade, é em relação à não co-presença física e a interação não presencial. No primeiro caso, por mais que seja possível de se organizarem reuniões, ou de os fãs encontrarem-se na apresentação de seu artista favorito, a maioria das interações entre os fãs acontece sem a presença no mesmo espaço físico. Sobre a segunda característica refere-se ao fato de boa parte das interações mantidas entre os fãs acontecer a partir da mediação de algum meio de comunicação, como o computador e as redes sociais, em que “a interação presencial não é um fator determinante para a sobrevivência da comunidade” (MONTEIRO, T., 2005, p.46). Os dois exemplos estão imbricados, ainda, à forma como os criadores da comunidade administram a mesma. De forma geral,

Os membros de comunidade de fãs, [...] podem não compartilhar o mesmo espaço físico, e nem interagir presencialmente, mas ainda assim a comunidade possui uma existência, que se fundamenta, principalmente, “na partilha de um mesmo repertório de referências simbólicas”, referentes ao objeto de culto. Esse nível fundamental, por ser o mais abstrato, é também o menos visível, o menos verificável em termos empíricos, ainda que corresponda ao principal elemento aglutinador na esfera do sensível, uma vez que é ele o responsável por manter a comunidade unida a despeito da não co-presença física e da não-interação presencial. Duas ou mais pessoas que jamais se encontraram, que jamais conversaram entre si, ao compartilhar um mesmo

28 há desacordo a respeito de qual foi a série que propiciou o primeiro grupo de fãs, se seria The Man From

repertório de referências, de certa forma podem se considerar membros de uma mesma comunidade. (MONTEIRO, T., 2005, p.46)

Pensando no caráter simbólico que as comunidades de fãs possuem, Janotti Jr (2003) propõem a expressão comunidades de sentido, em que designa a associação de sujeitos a partir de seus gostos, interesses em comum, afetos, seus hábitos de consumo, “obedecendo a determinadas produções de sentido em espaços desterritorializados, através de processos midiáticos que se utilizam de referências globais da cultura atual” (JANOTTI JR, 2003, p. 4). Essas interações acontecem em busca de um “ideal comunitário”, o qual contribui para que os sujeitos se reconheçam e reconheçam sujeitos semelhantes a eles independente do local em que esteja partilhando “imagens, vestuários, posicionamentos corporais, valorações presentes nos objetos culturais que fundam esses territórios simbólicos” (JANOTTI JR, 2003, p. 5) chegando a constituir traços que formam e ajudam no reconhecimento de uma comunidade de sentidos a nível global.

As comunidades de sentido, apesar do caráter global, possuem certos traços que limitam seus membros e sua formação, como a escolha por determinados valores e sentimentos, o que pode acarretar regras de conduta na comunidade - que em alguns casos podem ser consideradas opressoras - e a incorporação de aspectos locais, como determinados vícios de linguagem e comportamentos. “A Comunidade de Sentido fornece uma espécie de „capital cultural‟ para que a vivência de determinados valores seja partilhada [...]” (JANOTTI JR, 2003, p.6).

“A internet não apenas facilitou o encontro e contato com outros que compartilham nossas preferências como também o acesso às mais diversas informações e conteúdos sobre ídolos ou produtos da cultura de massa” (MONTEIRO, T., 2007, p.13). O acesso a variados tipos de informação na internet é enorme, o que impossibilita que cada fã consiga consumir tudo o que é veiculado a respeito de seu ídolo. Assim, para Jenkins (2009), se apropriando do conceito de Pierre Lévy, constituem-se dentro das comunidades inteligências coletivas, como uma forma de consumo coletivo, onde todos os membros compartilham saberes e constroem um saber coletivo, ou seja, o compartilhamento acaba por “sustentar sua existência e alcançar seus objetivos. Todo o conhecimento restante é retido por indivíduos que ficam a postos para compartilhar o que sabem quando surge a ocasião” (JENKINS, 2009, p. 57). Essa construção coletiva também pode ser vista como uma forma de constituir uma memória a respeito da vida do artista, a qual é compartilhada com cada membro.

Cria-se uma memória coletiva do grupo, referente ao culto a determinado objeto, às práticas específicas relacionadas ao artigo midiático em questão. A memória coletiva

ajuda a formatar a identidade do grupo e, por extensão, as identidades de cada indivíduo que se sente parte da comunidade, ao compartilhar com os demais as mesmas lembranças, o mesmo substrato simbólico e as mesmas referências (MONTEIRO, T., 2006, p.9).

Deve-se ter consciência que essa construção coletiva não ocorre de forma tranquila, pois as trocas em comunidades online dificilmente ocorrem sem alguma forma de conflito, sejam com membros novos, ou entre membros antigos. As interações entre os membros também variam, criando-se ligações mais fortes com determinados indivíduos, com os quais se interagem mais, em detrimento de outros membros com os quais se troca informações mais precisas. Porém, prevalece o reconhecimento de que cada membro é fundamental para o fortalecimento do grupo e para a sensação de união da comunidade.

3. A CULTURA POP E NÓS

Por entendermos Lady Gaga como um produto da cultura pop, acreditamos ser necessário discorrermos sobre o tema. Por isso, neste capítulo, trazemos uma breve discussão sobre a origem da cultura pop, assim como uma reflexão sobre uma de suas vertentes, a música pop. Por conseguinte, apresentamos propriamente a cantora Lady Gaga, evidenciando seus álbuns e elementos importantes, como suas aparições públicas e polêmicas, para entendermos o fascínio de seus fãs.