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Conceções espontâneas e conceções próprias

No documento Aprendizagem do conceito de limite (páginas 56-59)

2. Fundamentação Teórica

2.2. A aprendizagem do conceito de limite

2.2.3. Conceções espontâneas e conceções próprias

Cornu (1983, p. 67) explica-nos que a imagem conceptual não permanece vazia até que o aluno tenha um contacto explícito com esse conceito.

Cornu (1983) refere que Bachelard apresenta inúmeros exemplos de obstáculos: “a experiência primeira, o conhecimento geral, o obstáculo verbal, etc…” (p. 31). No trabalho de Cornu (1983), é estudada uma variante do obstáculo a que Bachelard chama experiência

primeira, sob a designação de “conceptions spontanées” (que vamos traduzir, neste

trabalho, por conceções espontâneas), bem como as barreiras impostas pelas palavras utilizadas para descrever o conceito de limite.

Deste modo, Cornu (1983, p. 67) define conceções espontâneas como sendo “ideias a

priori, que não são fruto de um ensino organizado”. O autor explica que estas conceções espontâneas surgem de diversas situações do dia-a-dia ou são induzidas por outras partes

da matemática. Cornu (1983, pp. 67 – 68) refere ainda que estas conceções espontâneas não desaparecem quando é dada a conhecer, aos alunos, a definição do conceito, persistindo sobre as conceções “matemáticas” que lhes são ensinadas. Assim, o autor estudou as conceções espontâneas dos alunos relativas ao conceito de limite.

Mas, Cornu (1983) faz também referência às “conceptions propres” (que, neste trabalho, iremos traduzir por conceções próprias), que resultam das conceções espontâneas e dos ensinamentos recebidos, constituindo, desta forma, um conjunto com uma determinada estrutura e lógica. Deste modo, Cornu (1983, p. 69) associa a noção de conceção própria à noção de imagem conceptual, definida por Tall e Vinner (1981).

Cornu (1983) refere que

as conceções próprias contêm simultaneamente as imagens mentais, as representações, as palavras ligadas ao conceito, mas também as definições, as propriedades, os “teoremas” (por vezes falsos…), os processos, os algoritmos, os exemplos. As conceções próprias podem comportar contradições, que não aparecem necessariamente, se os elementos contraditórios não são mobilizados simultaneamente. (p. 69)

41 Cornu (1983, p. 69) refere ainda que as conceções espontâneas podem ser identificadas no vocabulário que o aluno utiliza e na sua utilização aquando de situações específicas, nomeadamente, na resolução de exercícios. Assim, segundo Cornu (1983),

o objetivo do ensino não é apenas dar uma teoria sem defeitos, da definição às aplicações. O ensino deve agir sobre as conceções próprias, e transformá-las de modo a torná-las aptas à resolução de vários problemas, e a fazer desaparecer as contradições. (p. 70)

Cornu (1983) refere ainda que

o aluno, mesmo munido da definição matemática, faz apelo às suas conceções anteriores, às suas conceções espontâneas, assim que ele põe em ação a noção de limite. As conceções espontâneas, as ideias a priori, misturam-se com a noção tal e qual ela é ensinada, para dar lugar no espírito do aluno a conceções às quais ele fará doravante referência: as suas conceções próprias. (p. 111)

Relativamente às conceções espontâneas, Cornu (1983), no primeiro teste aplicado no seu estudo, concluiu que a palavra “limite” designa algo estático, fixo:

 “limite geográfico (fronteira)

 limite a não ultrapassar (restrição, natural ou imposta)  terminal que somos proibidos de ultrapassar

 limite impossível de atingir

 limite impossível de ultrapassar” (p. 79).

Já no segundo teste, encontrou as mesmas conceções que no primeiro, mas, as frases escritas pelos alunos estavam num contexto mais relacionado com a Matemática. O autor atribui este facto às questões anteriores, que poderão ter induzido as produções dos alunos (Cornu, 1983, pp. 103 – 104). Assim, as categorias encontradas são as seguintes:

 “o limite é muitas vezes um terminal, uma fronteira  como terminal, o limite é intransponível

 podemos tentar aproximar-nos do limite. Para alguns alunos, podemos atingir o limite; para outros, não podemos

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 parece que a conceção de limite entre alguns alunos é muito próxima da noção de limite superior ou de limite inferior”

(Cornu, 1983, p. 104).

Em 1981, Cornu referiu que, para os alunos, o termo limite

quase sempre significa algo estático, um limite geográfico fixo, limite a não exceder (moral ou regulamentar), fronteira que não se pode ultrapassar “os limites da condição humana…”. Há a noção de dificuldade de atingir o limite, e portanto a noção de “se aproximar indefinidamente”. Por vezes, o limite é o que separa duas coisas: a fronteira entre um campo de trigo e um campo de milho, o número é o limite entre o positivo e o negativo. Mas na maioria das vezes, o limite é o fim: não há nada do outro lado. (pp. 3 – 4)

Deste modo, o autor apresenta quatro modelos principais sobre a noção de limite:

 “Modelo : um limite é intransponível, é uma fronteira

 Modelo : o modelo que para alguns alunos coincide com a noção de extremo superior ou de extremo inferior

 Modelo : o limite pode ser alcançado  Modelo : o limite é impossível de alcançar” (Cornu, 1981, p. 4).

O autor refere ainda que o modelo predominante entre os alunos é o modelo , relativo à intransponibilidade do limite, o que poderá trazer consequências para a atividade matemática. Neste mesmo artigo, o autor refere que, para muitos destes alunos, a noção de limite não contém qualquer ideia de variação, de movimento, de aproximação a este limite. Por outro lado, o autor verifica que as conceções relativas ao conceito de limite são as mesmas para alunos de níveis de escolaridade mais elevados. (Cornu, 1981, p. 4)

Williams (1991) apresenta também algumas conceções relativas ao conceito de limite, referindo que “as conceções de limite são muitas vezes confundidas com questões sobre se uma função pode atingir o seu limite, se um limite é na verdade uma fronteira, se os limites

43 são processos dinâmicos ou objetos estáticos, e se os limites estão intrinsecamente ligados a conceções de movimento” (p. 219).

No documento Aprendizagem do conceito de limite (páginas 56-59)