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Conceito de intervenção do TCU em matérias de natureza regulatória

4. ANÁLISE EMPÍRICA DA FISCALIZAÇÃO DO TCU NOS MODAIS LOGÍSTICOS

4.3 Conceito de intervenção do TCU em matérias de natureza regulatória

Na década de 1990, diante da forte crise econômica, o governo brasileiro precisava desenvolver um novo modelo institucional para implantar o modelo de estado regulador sem a regra clássica da hierarquia. Para tanto, criou um tipo de entidade estatal sem subordinação ao poder central e que teria a prerrogativa de dar a última palavra na esfera administrativa73. Essa

lógica conceitual já foi abordada neste trabalho, pois serviu de base para a criação das agências reguladoras com capacidade decisória, autonomia, mandato fixo para seu corpo diretivo e especialização técnica. Tal modelo veio atender ao anseio do mercado que começava a desbravar setores antes estatais e exigia que a regulação fosse executada por entes

73 GUERRA, Sérgio. Regulação estatal sob a ótica da organização administrativa brasileira. Revista de

independentes. De acordo com Guerra74, com essa inovação, o governo do Presidente Fernando Henrique pretendeu demonstrar que a regulação deixava de ser assunto de Governo para ser assunto de Estado. A regulação, portanto, deveria sair do campo político.

Os governos vêm se utilizado cada vez mais de uma combinação de acordos contratuais, regras e outras ferramentas regulatórias para alcançar uma variedade de objetivos sociais e econômicos. Reguladores independentes também são amplamente solicitados a equilibrar valores econômicos e sociais algumas vezes contraditórios75. Nesse sentido, conceitualmente a finalidade das agências reguladoras é de regular o setor no intuito de ser uma terceira parte independente entre o Governo, concessionário e consumidor.

Ocorre que as instituições de controle, por meio de sua fiscalização, podem deslocar competências decisórias da esfera administrativa para sua esfera controladora. No final, o ente controlador substitui o órgão burocrático para decidir relevantes questões de políticas públicas, regulação e aplicação orçamentária76. Questão interessante que se coloca é a distinção de

perspectiva das agências reguladoras e do Tribunal de Contas da União sobre matérias regulatórias. Monique Menezes77 afirma que, assumindo a perspectiva do usuário-consumidor,

existem incentivos distintos entre esses dois entes para o resultado das regras regulatórias. As agências possuem uma diretoria estável, porém provisória que prioriza a tecnicidade das suas decisões. Por sua vez, o TCU é um órgão auxiliar do Poder Legislativo, seus ministros possuem mandato vitalício e, embora possua um quadro técnico qualificado, prioriza o cumprimento da lei em detrimento de questões técnicas de um mercado específico. Para Menezes78, a atuação de fiscalização do TCU seria a solução mais adequada, pois teria como base a utilização da lei que possui caráter universalista, e, portanto, garantiria o equilíbrio das regras para a realização de acordos mais justos entre os usuários e as empresas, quando

74 Id

75 WINDHOLZ, Eric e Graeme A. Hodge. Conceituando regulação social e econômica: implicações para

agentes reguladores e para atividade regulatória atual. RDA – Revista de Direito Administrativo, Rio de

Janeiro, v. 264, p. 13-56, set./dez. 2013. Pg. 14

76 MARQUES NETO, Floriano de Azevedo et al. Reputação institucional e o controle das agências

reguladoras pelo Tribunal de Contas da União. Disponível em :

<https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/3950200/mod_resource/content/1/floriano%20de%20azevedo%20mar ques%20neto%3B%20juliana%20bonacorsi%20de%20palma%3B%20danielo%20rehem%3B%20nara%20merl otto%2C%20yasser%20gabriel%20-%20reputa%C3%A7%C3%A3o%20institucional%20....pdf>

77 MENEZES, Monique. O Tribunal de Contas da União, controle horizontal de agências reguladoras e

impacto sobre usuários dos serviços. Revista de Sociologia Política, V. 20, n.43, out/2012, pg. 110

comparado às agências reguladoras, cujo objetivo constitucional é manter o equilíbrio econômico e operacional do sistema regulado.

Ocorre que a visão a ser adotada na regulação não pode ser apenas sob a ótica do usuário, tendo em vista que os interesses do setor regulado também devem ser considerados na discussão. Nesse sentido, afirmar que o TCU, por sua missão de aplicação da lei, teria mais condições de determinar a medida regulatória, não é adequado, pois pode gerar desequilíbrios regulatórios que desicentivem a participação privada em determinado setor. Citem-se, como exemplo, os reajustes tarifários, que, sob a perspectiva do usuário, devem ser evitados ou minorados ao máximo possível.

No entanto, a interpretação estrita de modicidade tarifária pode gerar sérios efeitos na qualidade dos serviços prestados e diminuir o nível de investimento necessário para prestação do serviço. A manutenção do equilíbrio regulatório não pode assumir uma posição subjetiva entre consumidor e prestador do serviço, mas ter em mente a necessidade de manter o equilíbrio do sistema regulatório, criando incentivos para que o privado opere de forma mais adequada o serviço e seja remunerado por uma tarifa que lhe garanta a rentabilidade adequada e seja justa para o usuário.

Assim, para análise dos acórdãos exarados pelo TCU, toma-se como premissa que as matérias regulatórias são de competência das agências reguladoras e a intervenção a ser analisada ocorrerá naqueles casos em que o TCU determina qual deve ser a decisão a ser adotada pela agência. Neste sentido, as determinações de caráter orientativo, como por exemplo, a definição de uma metodologia, não configuram conceitualmente uma intervenção do TCU no âmbito de uma decisória. Considera-se, portanto, uma intervenção regulatória do TCU quando esta Corte de Contas determina aquilo que deve ser feito, bem como a maneira como deve ser feita a metodologia, por exemplo.

Considera-se neste trabalho que houve intervenção do TCU em questões regulatórias quando o TCU interferiu diretamente no sistema regulatório e impôs as agências reguladoras, determinado comportamento sem que lhe fosse dada a oportunidade de propor outra solução.