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2. QUALIDADE DE VIDA NO CONTEXTO URBANO

2.1. CONCEITO DE QUALIDADE DE VIDA

A pesquisa sobre a qualidade de vida é caracterizada por ser investigada em diferentes áreas do conhecimento com distintos referenciais teóricos, o que resulta em uma variedade de diferentes abordagens presentes na literatura pertinente a essa temática (DIENER e SUH, 1997; VERLET e DEVOS, 2009). Devido à natureza multidisciplinar acerca da qualidade de vida, esse conceito tem sido abordado nos mais distintos campos do conhecimento, tais como: economia (LI e WENG, 2007), psicologia (KELES, 2012; VELİBEYOĞLU, 2014; McCREA, 2007; DASHORA 2009), planejamento urbano e meio ambiente (NOORAIE e TABIBIAN, 2012).

Na economia, o conceito tem os indicadores sociais como principal elemento (LI e WENG, 2007). Na perspectiva da psicologia, o conceito aparece elencado às reações subjetivas de um indivíduo com as suas vivências, indicando como os usuários percebem suas próprias vidas, felicidade e satisfação (KELES, 2012; VELİBEYOĞLU, 2014; McCREA, 2007; DASHORA 2009). No campo do planejamento urbano e do meio ambiente, os estudos sobre qualidade de vida tendem a ser tratados por planejadores urbanos e formuladores de políticas para a alocação de recursos e de planos de desenvolvimento (NOORAIE e TABIBIAN, 2012).

As distintas abordagens identificadas na literatura que trata de qualidade de vida denotam a complexidade de consolidar um conceito para a literatura que trata dessa temática. Ao realizar uma ampla revisão da literatura a partir de distintos campos do conhecimento, Santos (2011), destaca quatro abordagens que considera representarem de forma clara essas distintas conceituações e interpretações que são elencadas ao conceito de qualidade de vida, conforme representado no Quadro 1:

Quadro 1 -- Conceituações da qualidade de vida

Abordagem Concepção

Biológica

Percepção que o indivíduo possui da afecção física, a capacidade que supõe ter para realizar determinadas tarefas. Esta abordagem biológica centra-se nos estados de saúde física do indivíduo. Estudado maioritariamente pelas ciências da saúde: neste campo encontram-se muitas vezes estudos relacionados com a qualidade de vida do indivíduo doente.

Cultural

Conceito intimamente ligado com a educação na infância, com os hábitos e valores transmitidos, o que interfere na personalidade do indivíduo e interfere também na sua qualidade de vida futura. Perspectiva abraçada pela sociologia e psicologia, onde tentam discriminar a influência da educação no bem-estar do indivíduo enquanto ser social.

Econômica

O conceito surge ligado à satisfação de todas as expectativas econômicas e materiais. É, no entanto, subjetivo uma vez que depende de cada indivíduo, pois as expectativas esperadas de satisfação econômica variam de indivíduo para indivíduo. As ciências econômicas estudam a Qualidade de Vida no âmbito da posse de bens materiais. Os estudos que consideram a Qualidade de Vida um conceito econômico tendenciosamente procuram indicadores de riqueza para caracterizá-la.

Psicológica

Na perspectiva psicológica, qualidade de vida é autoestima e equilíbrio mental, é felicidade e satisfação, é ter boas expectativas em relação ao futuro. Na psicologia a Qualidade de Vida passa pela saúde mental adquirida pela percepção de bem-estar mental que induz a uma sensação de felicidade, daí que os estudos desta ciência passem, sobretudo pela análise da felicidade.

Fonte: Santos (2011, p. 14)

Ao provocar a discussão acerca dessas conceituações existentes na literatura, Santos (2011) contribui ao identificar algumas similaridades que parecem ser compartilhadas entre os investigadores. Em síntese, o conceito de qualidade de vida tende a estar relacionado à satisfação das necessidades e aspirações dos usuários em nível “individual ou coletivo” em relação aos aspectos “materiais e imateriais”, o qual resulta em uma perspectiva de análise “objetiva e subjetiva” com base na percepção de usuários (SANTOS et al., 2004). Essas dimensões da qualidade de vida são apresentadas de forma mais detalhada na sequência.

2.1.1. DIMENSÕES DA QUALIDADE DE VIDA

As dimensões da qualidade de vida são discutidas na literatura a partir de diversas áreas do conhecimento e autores que tratam dessa temática (NUVOLATI, 1998; HANCOCK, 2000; SANTOS et al., 2004; SANTOS, 2011). Dentre tais dimensões, pode ser destacada a distinção entre os aspectos individuais e coletivos (SANTOS et al., 2004); os aspectos materiais e imateriais (NUVOLATI, 1998), e aspectos objetivos e subjetivos da qualidade de vida (HANCOCK, 2000; SANTOS et

Santos et al. (2004) propõem uma distinção entre os aspectos individual e coletivo da qualidade de vida. Sob a perspectiva desses autores, os componentes individuais tendem a estar mais relacionados com as condições: econômicas, pessoais e familiares dos usuários; enquanto, os componentes coletivos tendem a estar mais relacionadas aos serviços básicos e públicos de um determinado local. Tais aspectos tendem a ser influenciados pelo contexto urbano e pelo sistema de valores desses usuários (DISSART e DELLER, 2000).

Uma segunda perspectiva acerca da qualidade de vida sugere a distinção entre os aspectos materiais e imateriais vinculados ao conceito (NUVOLATI, 1998). Segundo Nuvolati (1998), a primeira dimensão tende a estar relacionada às necessidades humanas básicas, como por exemplo, as condições de habitação, de abastecimento de água, do sistema de saúde, ou seja, aspectos de natureza essencialmente física e de infraestrutura urbana. Já a segunda dimensão, segundo o mesmo autor, tem ganhado destaque em estudos recentes e tende a estar relacionada ao ambiente, ao patrimônio cultural e ao bem estar dos usuários.

Uma terceira perspectiva de análise acerca da qualidade de vida trata da distinção entre os chamados aspectos objetivos e subjetivos (HANCOCK, 2000; SANTOS et al., 2004). O primeiro aspecto é facilmente apreendido na literatura por meio da definição de indicadores de natureza quantitativa, enquanto, o segundo remete à percepção subjetiva que os indivíduos têm sobre a qualidade de vida e que, claramente, difere de usuário para usuário, em virtude das diferenças culturais, econômicas e geográficas (SANTOS, 2011).

A Figura 2 apresenta, com base na revisão realizada por Santos (2011), as três principais dimensões responsáveis por compor a natureza multidisciplinar do conceito qualidade de vida:

Figura 2 – Dimensões da Qualidade de Vida

Fonte: Elaboração próprio autor (2018) com base em Santos (2011).

Aspectos objetivos e subjetivos Aspectos materiais e imateriais Dimensão individual e coletiva DIMENSÃO INDIVIDUAL

Condições: econômicas, pessoais e familiares dos usuários,

DIMENSÃO COLETIVA

Serviços básicos e públicos de um determinado local; Saúde; Segurança; Educação; Problemas Sociais. ASPECTOS MATERIAIS

Condições de habitação, qualidade e abastecimento de água, de infraestrutura urbana, áreas verdes.

ASPECTOS IMATERIAIS

Relacionado ao ambiente e ao patrimônio cultural.

ASPECTOS OBJETIVOS

Indicadores de qualidade de vida de natureza quantitativa

ASPECTOS SUBJETIVOS

Percepção subjetiva que os indivíduos têm sobre a qualidade de vida.

Cabe destacar que, nenhuma dessas perspectivas é mutuamente exclusiva, mas ao contrário, essas dimensões atuam de forma complementar para a análise da qualidade de vida (NUVOLATI, 1998; HANCOCK, 2000; SANTOS et al., 2004; SANTOS, 2011). A multiplicidade de dimensões que integram esse conceito tem levado a sua adaptação e aplicação aos mais diversos enfoques, tais como: ambiental, econômico, sociocultural e educacional, a partir de diversas escalas de abrangência. No contexto urbano, a qualidade de vida aparece vinculada à qualidade ambiental, passando a assumir significativa relevância a partir do intensivo crescimento das cidades. A qualidade de vida no contexto urbano é apresentada de forma mais detalhada na sequência desta pesquisa.