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Conceito de [vr na perspectiva ético-religiosa

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C. Novas denúncias contra o inimigo (v 20b-24b)

III. Afirmação de fé (v 24c) 24c

3.1. Abordagem conceitual

3.1.2. Conceito de [vr na perspectiva ético-religiosa

Não se pode falar propriamente, em uma separação entre o significado profano e religioso do conceito de

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no Antigo Testamento, pois a vida comum e religiosa estão intrinsecamente ligadas. Em uma sociedade com variadas expressões de sua sacralidade, onde as prescrições do direito divino dominavam a vida, toda a conduta contrária à comunidade, era, ao mesmo tempo, contrária a Deus.

No entanto, a ênfase ético-religiosa ocupa grande parte dos textos bíblicos, quando se refere ao comportamento dos

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. Eles são como abominação para Javé (Prov. 15.8) e por isso Javé está longe deles (Prov. 15.29). O

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é acusado de não temer a Javé (Ecl. 8.13). Na literatura sapiencial e especialmente nos Salmos caracterizados como de Lamentação250, os conceito paralelos251 como

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ֻ, os que praticam a maldade (Sl.

249

RINGGREN, H. Theological Dictionary of the Old Testament, p.3

250 A lista de Salmos de Lamentação varia entre alguns autores que trabalham o saltério. Marc Girard, por

exemplo, classifica 89 composições do saltério como sendo poemas de lamentação, os quais o autor prefere chamar de “Salmos de libertação”. Erhard Gerstenberger classifica como lamentação, 58 Salmos, divididos entre salmos de lamentação individual e coletiva. Para este trabalho usamos a classificação

109 5.6; 14.4; 55.4 e outros);

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os que odeiam Javé (Jó. 8.22; 2 Cr. 19.2); e os que odeiam Sião (Sl.129.5); os que

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não servem a Javé (Mal. 3.18), ou os conceitos opostos como ‘

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piedoso (ISm 2.9); para salvar teu povo

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(Hab. 3.13); a todos que o amam

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(Sl. 145.20); o que confia

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em Javé (Sl 32.10), mostram claramente um sentido religioso que coloca o

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no centro das inquietações teológicas sobre a miséria experimentada nas adversidades da comunidade de Javé. As fórmulas litúrgicas de confissão usadas por Israel em determinados casos, temos pecado; temos faltado; temos sido malfeitores (1 Re 8.47; 2 Cr 6.37; Dn. 9.15), revelam a conotação penitencial, onde o emprego do

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equivale à descrição de falhas ou erros com fórmulas cunhadas nas liturgias, confessando sua culpa, como é o caso de Jr 14.20: “Conhecemos Javé a nossa maldade (

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) e a culpa (

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) de nossos pais...

a) Transformações estruturais

O período persa, proporcionou o surgimento de novos e importantes temas para a constituição fé judaica nas comunidades pós-exílica. A piedade vivida e refletida está assentada nas estruturas sociais e no padrão comportamental da existência cotidiana e dos rituais religiosos.

Os Salmos, que em tempos posteriores desenvolveram-se em situações vivenciais bem diversas como contextos familiares, comunidades, organização tribal e nacional, ganharam no pós-exílio finalidades próprias. Os diversos gêneros foram preparados de acordo com as necessidades cultuais e comunicativas dentro da comunidade, na tentativa de dar sentido às vigentes transformações.

A perda da antiga fé familiar, provocou mudanças na estrutura social e na espiritualidade das comunidades, que concentraram as expressões religiosas na ligação

desenvolvida por Gerstenberger. Cf. GIRARD, Marc. Como ler o livro dos Salmos: Espelho da vida do

povo. São Paulo: Edições Paulinas, 1992, p.22; GERSTENBERGER, Erhard S. Psalms Part. 1 . With na introduction to cultic poetry. Volume XIV e GERSTENBERGER, Erhard S. Psalms Part 2. Lamentations. Volume XV. In: KNIERIM, Rolf and TUCKER, Gene M., editors. The Forms of the Old

Testament Literature. Grand Rapids, Michigan: Wiliam B. Eerdmans Publishing Company. 1988.

110 individual com Deus. “O sujeito da fé não é mais a família, mas o confessor individual de Javé, no seio da comunidade”.252

Nestas circunstâncias, a transitoriedade torna-se uma séria dificuldade para o sujeito da fé que está relativamente só. Gerstenberger ressalta:

“O tom de lamento é inegável. Não se trata porém, de um perigo atual, concreto, de doença, difamação ou algo semelhante, mas da transitoriedade, do passageiro na existência humana e do tempo de Deus que perdura muito.”253

O antigo grupo familiar não é mais a unidade básica da religião a qual todos pertenciam de forma natural. Todos que aderissem a Javé, deveriam decidir pelo Deus da nova comunidade religiosa com responsabilidade pessoal de suas ações. A comunidade assume em parte, a proteção de que o indivíduo precisa, mas é o comportamento de cada um perante Javé e perante o próximo que é decisivo para saber se uma pessoa pertence ao grupo dos justos

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; ou dos que se comportam com rebeldia perante Javé, ou seja, os malfeitores

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. No projeto desenvolvido para esta nova sociedade, a presença do

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, que já não é bem-vinda, torna-se ainda mais, sinal de degradação moral e de transtornos sociais.

Na esteira destas transformações estruturais, a comunidade pós-exílica experimentou um exigente desafio ético religioso que sobrepôs até mesmo as camadas sociais mais elevadas. O livro de Jó é um destes exemplos, onde se representa a crença de que as vítimas de grandes catástrofes são necessariamente um

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(Jo 11.20; 15.20; 18.5; 20.5). Fortemente ligado ao destino do fiel, está a pergunta sobre as forças que causam o sofrimento e a morte. No mundo onde ainda não havia o conhecimento científico para as causas das doenças, as necessidades básicas para a vida eram consequências de poderes sobrenaturais e demoníacos produzidos pelos inimigos.

252

GERSTENBERGER, Erhard S. Israel no tempo dos Persas, p. 239; Cf. ALBERTZ, Rainer. Historia

de la religión de Israel en Tiempos del Antiguo Testamento:Vol. 2. Desde el exílio hasta la época de los

macabeos. Madrid: Editorial Trotta, 1999, p. 686-688.

253

GERSTENBERGER, Erhard S. Israel no tempo dos Persas: Séculos V e IV antes de Cristo. São Paulo: Edições Loyola, 2014, p. 238

111 Os Salmos de Lamentação desenvolvem este modelo em que a descrição do inimigo era correspondente à situação concreta da necessidade do indivíduo queixoso. Ou seja, o sofrimento ou as condições de vida do orante eram apresentadas ao “especialista”254

, este, por sua vez, diagnosticava as causas individuais e preparava orações para as doenças correspondentes em um culto de súplicas.255

A solução teológica para explicar estes males recorrentes é a cólera divina. Numa sociedade com constante falta de segurança e estabilidade, as adversidades são facilmente entendidas como a reação de Deus aos pecados ou comportamentos falhos. A miséria torna-se imanente ao sistema. As ameaças de morte e as condições de salvação são necessidades universalizadas.

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