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Conceitos fundamentais da Satisfação do Consumidor

CAPÍTULO 4 – SATISFAÇÃO DO CONSUMIDOR: CONCEITOS E MENSURAÇÃO

4.1. Conceitos fundamentais da Satisfação do Consumidor

Uma abordagem ao fenómeno da satisfação do consumidor implica de imediato uma explanação dos seus antecedentes e implicações em termos de investigação. A este propósito pode afirmar-se que a investigação pautada pelos paradigmas da satisfação do consumidor deu lugar a uma respeitável corrente de pesquisa que teve origem no trabalho preliminar de Cardozo (1965), na década de sessenta. O seu olhar apontou para um entendimento de satisfação como consequente

“not only upon the product itself, but also upon the experience surrounding acquisition of the product. Customer satisfaction, then, may be more a global concept than simply product evaluation. Satisfaction may involve evaluation of an entire product bundle or offering.” (Idem, p. 249).

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91 Esta foi a primeira de muitas explicações e definições avançadas para o conceito de satisfação e a profusão de trabalhos práticos e académicos realizados no âmbito da satisfação do consumidor revelou-se, desde então, pelo elevado número de artigos publicados a esse respeito (Peterson & Wilson, 1992).

Assente no binómio resultado/processo, as diferentes definições distinguem estas duas perspectivas concebendo a satisfação do consumidor como o resultado de uma experiência de consumo (outcome oriented) ou, por outro lado, pensando-a como uma experiência de consumo na sua totalidade (process oriented).

O princípio que subjaz à primeira abordagem é o que entende a satisfação do consumidor como a resposta deste a uma avaliação da discrepância percebida entre as expectativas e a performance corrente de um produto percebida após o seu consumo (Howard & Sheth, 1969; TSE & Wilton, 1988; Engel et al., 2005). A propósito da concepção orientada para o processo, esta mostra uma maior amplitude do conceito ao percepcioná-lo na perspectiva da experiência de consumo na sua plenitude. Realça, segundo Yi (1989), a óptica de processos perceptuais, avaliativos e psicológicos enquanto impulsores da satisfação do consumidor.

O paradigma da satisfação do consumidor ganha tanto mais peso quanto mais relevante se mostra a questão do elevado grau de informação e exigência por parte do consumidor para o desempenho global das instituições, quer visem o lucro ou não. Aliás, foram factores como a influência da satisfação do consumidor no processo de decisão de compra e a sua importância nos actos sequentes de consumo que lhe concederam um papel de primazia entre os diferentes temas do comportamento do consumidor e do Marketing (Nicosia, 1966; Howard & Sheth, 1969; Bettman, 1970).

A satisfação do consumidor é assim encarada como elemento decisivo para o sucesso dos mais variados tipos de organizações quando dela se sabem poder resultar práticas de repetição de compra, comunicação/divulgação boca-a-boca positiva, acréscimo de lucros e ainda quando se observam influências relativas à lealdade à marca (Farias & Santos, 2000; Kan et al., 2009; Zabkar et al., 2010).

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92 As estratégias organizacionais vêem-se enriquecidas com um fenómeno que após analisado revela a necessidade de aprimorar produtos/serviços por forma a alcançar e superar as expectativas do consumidor (Tajeddini, 2010). Kotler (2003) rotula em crescendo os diferentes níveis de satisfação do consumidor de dissatisfaction, satisfaction e delight, sendo que pelo último se entende todo o estado emocional positivo resultante da superação das expectativas do consumidor ao nível da surpresa (Rust & Oliver, 2000; Fuller & Matzler, 2008).

Ao nível da teoria microeconómica do comportamento do consumidor, “the satisfaction consumer derives from the consumption of commodities is termed utility” (Maddala & Miller, 1989, p. 88), estabelecendo-se desta forma o vínculo entre os dois conceitos – satisfação do consumidor e utilidade. Entendendo-se utilidade nesta perspectiva, acrescente-se que à satisfação total que um determinado consumidor pode alcançar pelo consumo de um bem atribuir-se-á a designação de total utility. Bentham (Kelly, 1990) e Smith (Sen et al., 1982) foram duas importantes figuras, no âmbito da economia, no que respeita à introdução e análise do conceito de utilidade, embora não o havendo nessa altura relacionado com a satisfação do consumidor.

A relação entre o valor dos bens e a utilidade proveniente do respectivo consumo é uma noção que só posteriormente se verá reflectida no trabalho do economista Jevons (1888). A noção de marginal utility é também da sua responsabilidade, remetendo para o aumento de total utility resultante “from a one-unit increase in the consumption of a particular commodity, holding the quantities of other commodities constant” (Maddala & Miller, 1989, p. 618).

Seja nos domínios da microeconomia ou do Marketing, entre outros, o conceito de satisfação do consumidor tem sido objecto de estudo consagrado e dele resultam um número considerável de modelos e teorias que foram sendo propostos na sequência desta busca incessante de explicações para o comportamento dos consumidores, no que respeita à satisfação. Destacam-se desta panóplia de estudos e paradigmas o da

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93 desconfirmação da expectativa, o da assimilação, o da equidade, o da atribuição e o do desempenho35 (Oliver & Swan, 1989a; Oliver & Swan, 1989b; Farias & Santos, 2000).

Aliás, as definições do conceito de satisfação de consumidor variam consoante as diferentes abordagens defendidas por cada autor, sendo que a investigação em torno desta temática assumiu diferentes vertentes ao longo do tempo. Note-se a que perspectiva a satisfação como proveniente de uma transacção específica (Johnson et al., 2001) ou a que se designa por satisfação acumulada e que assume uma posição mais consistente com as visões existentes na psicologia económica (Yi, 1989).

À primeira associemos uma visão da satisfação do consumidor como “a postchoice evaluative judgement of a specific purchase occasion” (Anderson, Fornell, & Lehmann, 1994, p. 54) que fornecerá um diagnóstico informativo específico acerca da aquisição de um produto ou serviço. À segunda convirá uma apreciação mais global da experiência de aquisição e consumo de um determinado produto ou serviço ao longo do tempo, disponibilizando um indicador mais consistente e integral da performance passada, presente e futura de uma determinada empresa, motivando o investimento desta em políticas de satisfação do consumidor.

Não se ocupará o estudo que pretendemos desenvolver da discussão que a tentativa de definição deste paradigma estimula. Adoptaremos a visão de Anderson, Fornell e Lehmann (1994) de que a satisfação é cumulativa, descrevendo a experiência total de consumo de um produto ou serviço e esclarecendo, consequentemente, acerca do desempenho actual e de longo prazo de uma empresa, instituição ou mercado. Acresce ainda ao benefício trazido por esta abordagem o facto da mesma conseguir predizer “subsequent behaviours and economic performance” (Johnson et al., 2001, p. 219), sendo esta característica elemento fundamental para que os índices nacionais de satisfação nela encontrem sustentáculo para a sua concepção e desenvolvimento.

35 A este respeito leia-se o artigo de Boewn intitulado “Antecedents of consumer satisfaction and dis-

satisfaction (CS/D) on long-haul inclusive tours - a reality check on theoretical considerations” (Bowen, 2001) que apresenta os diferentes paradigmas da satisfação do consumidor de forma muito elucidativa.

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94 Para um preciso entendimento do conceito de satisfação há que equacionar outros que lhe são intrínsecos (Williams & Soutar, 2009) e que nos permitirão apreender minuciosamente os diferentes Índices de Satisfação do Consumidor (ISC). Concentremo--nos, num primeiro momento, nos conceitos de expectativas e valor percebido e seguidamente na questão da lealdade.

Integrando a categoria de antecedente da satisfação, o conceito de expectativas pode ser perspectivado como o entendimento prévio que o consumidor conjectura no tocante à experiência de consumo de um determinado produto ou serviço. Segundo Oliver (1981, p. 33) “it is generally agreed that expectations are consumer-defined probabilities of the occurrence of positive and negative events if the consumer engages in some behavior”. A performance percebida de um determinado bem ou serviço permitirá confirmar ou não as expectativas criadas pelo consumidor e a sua experiência passada relativamente à performance será também ela um antecedente das expectativas criadas. Para Johnson e Fornell (1991), a experiência acumulada pelo consumidor a respeito de um determinado produto ou serviço e o incremento da informação disponível no que toca a performances passadas implicarão necessariamente a evolução das expectativas no sentido da confiança e precisão.

As expectativas são ainda resultado de um aglomerado informativo resultante das experiências anteriores, referidas anteriormente, bem como dos meios informativos, da comunicação oral (boca-a-boca) e da publicidade. É neste sentido que Zeithmal, Berry & Parasuraman (1993) apresentam o conceito de expectativas segundo diferentes perspectivas, considerando-as:

a) como prognósticos, antevendo-se os benefícios que se poderão alcançar ao adquirir um determinado produto/serviço;

b) como ideais, idealizando o benefício a retirar numa situação de perfeição hipotética;

c) baseadas na experiência, numa situação de um conhecimento prévio sobre o serviço/produto;

d) de mérito, considerando os benefícios a obter mediante o investimento realizado aquando da aquisição;

e) comparativas, tendo em linha de conta serviços ou produtos análogos adquiridos anteriormente.

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95 Por fim, pode sublinhar-se que na abordagem da satisfação acumulada, os efeitos a longo prazo de um acréscimo /decréscimo de expectativas deverão acentuar a subida/queda da satisfação do consumidor entendida na sua totalidade (Anderson et al., 1994).

No que respeita ao valor percebido este apresenta-se como um conceito multifacetado, prestando-se a diferentes interpretações. A sua importância crescente ao nível do pensamento estratégico e da obtenção de vantagem competitiva (Woodruff, 1997; Parasuraman, 1997; Stahl et al., 1999; Huber et al., 2001; Gallarza & Saura, 2006) baseia-se na sua dupla função de elemento essencial na fase prévia à aquisição de um bem ou serviço, bem como da sua repercussão na satisfação do consumidor, que verá aumentada ou diminuída a sua intenção de recomendar e repetir o consumo na fase de pós-aquisição (Dodds et al., 1991; Parasuraman & Grewal, 2000).

Sendo variável consoante os diferentes consumidores (Wikstöm & Normann, 1994), culturas (Assael, 1995) e épocas (Ravald & Grönroos, 1996), o valor percebido mostra- -se como um elemento dinâmico, experienciado previamente, no momento e posteriormente ao acto de consumo. O interesse que desperta nas diferentes entidades empresariais, com o intuito de gerar valor para diferentes públicos-alvo, colocou-o na vanguarda da investigação, maioritariamente na área do Marketing.

Contudo, a dificuldade de conceptualização deste conceito tem constrangido abordagens empíricas que implicam definições operacionais. O valor percebido foi então e primeiramente analisado à luz de um leque diversificado de outros construtos atinentes à formação do juízo de valor e, posteriormente, tendo em conta os efeitos correntes de factores psicológicos característicos do indivíduo. Segundo Ateljevic (2000) alguns destes factores são os benefícios percebidos, o preço percebido, o preço monetário, o preço psicológico, que podem ainda ser acrescidos de variados estímulos e respostas pessoais às características percebidas do produto, ao interesse no produto, às necessidades do indivíduo, aos motivos, às expectativas, à personalidade e até ao estatuto social.

É na sequência das contrariedades que todos estes elementos causam à mensuração do valor que atempadamente foram surgindo diversos métodos que atentam este objectivo,

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96 sendo o mais popular o de escala (Anderson et al., 1993; Al-Sabbahy et al., 2004). Recentemente o estudo empírico do valor percebido resultou em parte da investigação em torno das relações entre qualidade, satisfação e valor (Gallarza & Saura, 2006).

Finalmente, ponderemos o conceito de lealdade que se apresenta como elemento fundamental na classificação dos consumidores e que é actualmente reconhecido como um dos mais importantes indicadores do sucesso empresarial na linha de investigação do Marketing (Bauer et al., 2002).

Considerando a definição de lealdade proposta por Jacoby e Chestnut (1978) e partilhada por Dick e Basu (1994) que a entendem como “behavioural response expressed over time by some decision-making unit with respect to one or more alternatives” e a apresentada por Oliver (1997a, p. 392) que a define como “a deeply held commitment to rebuy or repatronise a preferred product/service consistently in the future, thereby causing repetitive same-brand or same brand-set purchasing despite situational influences and marketing efforts having the potential to cause switching behavior”, digamos que neste estudo tomaremos em linha de conta uma definição que aponta para o consumo repetido e continuado, proveniente de uma decisão que elege um determinado produto/serviço com respeito a uma ou mais alternativas dentro da mesma categoria (Olsen, 2007).

É na sequência desta breve análise e tomada de posição a respeito do conceito de lealdade que cabe mencionar quatro comportamentos distintos do consumidor classificados por Oliver (1999, p. 35) como cognitive loyalty, affective loyalty, conative loyalty, action loyalty e que podemos ver descritos na Tabela 4.1.

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Tabela 4.1 Fases da lealdade e respectivas vulnerabilidades

Stage Identifying Marker Vulnerabilities

Cognitive

Loyalty to information such as price, features, and so forth.

Actual or imagined better competitive features or price through communication (e.g. advertising) and vicarious or personal experience. Deterioration in brand features or price. Variety seeking and voluntary trial.

Affective

Loyalty to a liking: “I buy it because I like it.”

Cognitively induced dissatisfaction. Enhanced liking for competitive brands, perhaps conveyed through imagery and association. Variety seeking and voluntary trial. Deteriorating performance.

Conative

Loyalty to an

intention: “I‟m

committed to buying it.”

Persuasive counterargumentative competitive

messages. Induced trial (e.g., coupons, sampling, point- of-purchase promotions). Deteriorating performance.

Action

Loyalty to action

inertia, coupled with

the overcoming of

obstacles.

Induced unavailability (e.g. stock lifts – purchasing the entire inventory of a competitor‟s product from a merchant). Increased obstacles generally. Deteriorating performance.

Fonte: (Oliver, 1999, p. 36)

A lealdade do consumidor, nas suas diferentes vertentes, é reconhecidamente aceite como um factor crítico no sucesso a longo prazo de uma empresa (Hennig-Thurau et al., 2001) e segundo Hallowell (1996) permite corroborar a ligação entre satisfação, lealdade e lucro, já que na sua opinião o serviço prestado a um consumidor fidelizado apresenta custos muito reduzidos quando comparados com os necessários para o processo de angariação de novos consumidores, na apreensão de preços por estes consumidores e ainda nos custos de conservação/retenção dos mesmos.

Finalmente, e sendo nossa intenção utilizar o modelo ECSI para avaliar a satisfação de um consumidor muito particular, o licenciado em turismo, e havendo resumidamente reflectido a respeito da importância e dos conceitos que este fenómeno tem assumido ao longo do tempo, importa agora explanar acerca da sua mensuração, posicionando e caracterizando o método seleccionado para o nosso estudo em relação aos demais.

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