• Nenhum resultado encontrado

Concepção de Professores sobre Bullying: os julgamentos

4. Resultados e Discussões

4.1 Concepção de Professores sobre Bullying: os julgamentos

Os limites da minha linguagem significam os limites do meu mundo. (Wittgenstein)

A escola é um espaço privilegiado de transformação social e, por isso, é bastante relevante entender as práticas educativas que acontecem em seu interior no que concerne ao enfrentamento do bullying.

Para isso, buscou-se entender a forma como docentes da educação básica significam e interpretam esse fenômeno de violência, compreendendo que os limites de suas concepções também limitarão suas ações, como afirmou o filósofo presente na epígrafe desse capítulo.

Por essa crença, a aplicação dos instrumentos teve início a partir de uma indagação feita aos (às) docentes, cujo foco era identificar o conhecimento dos (das) participantes acerca do significado de bullying escolar e os locais nos quais eles e elas ouviram falar sobre esse termo.

Tal indagação foi realizada em função da crença de que, embora discussões sobre bullying estejam presentes cotidianamente em debates educacionais e sociais, inclusive de forma bastante desgastada, essa manifestação de violência ainda é uma teoria emergente na literatura, sobretudo quando falamos da nacional.

Por isso, esta pesquisa buscou saber se os (as) docentes conheciam o que é bullying e em quais locais eles e elas conheceram essa expressão tão cheia de significados.

Como resultado, pode-se afirmar que 100% da amostragem conhecia o fenômeno e afirmava poder conceituá-lo. Em seguida, foi lançada uma questão que buscava conhecer os locais nos quais os (as) participantes tinham construído suas aprendizagens.

Onde ouviram falar sobre o termo? Essa questão era relevante, visto que, analisando os resultados a partir da perspectiva dos Estudos Culturais da Educação, encontram-se variadas pedagogias construindo formas de ser e pensar. Por isso, conhecer os locais nos quais docentes constroem conhecimento contribui para compreender suas concepções e seus pontos de vista.

Assim, as respostas oferecidas à questão: “Você já ouviu falar em bullying? Onde? Se sim, de que formas: através de algum meio de comunicação? Através de momentos de formação continuada?” foram agrupadas nas seis categorias apresentadas a seguir:

Categorias Respostas Categorizadas

Categoria 1: Formação continuada - Grupos de Estudo na Escola; - Palestras;

- Congresso.

Categoria 2: Meios de comunicação:

jornais e revistas

- Reportagens de revista.

Categoria 3: Meios de comunicação:

programas de televisão

- Reportagens exibidas pela TV.

Categoria 4: Formação inicial - Na faculdade.

Categoria 5: Conversa com colegas

de profissão

- Conversas casuais com colegas de profissão.

Categoria 6: Livros - Leitura em livros.

Ao se observar o quadro dois, é possível perceber que os (as) docentes informam-se, em muitos lugares, sobre saberes específicos da profissão (incluindo bullying). Tais lugares podem ser representados pela busca de conhecimentos em livros científicos, indo até as conversas informais com colegas de profissão.

De modo geral, as respostas evidenciam que os (as) participantes informam-se em mais de um lugar. Dentre esses locais, é possível perceber que a maior parte das respostas esteve vinculada à busca de informações nos momentos de formação inicial e continuada de professores, o que é natural em função das especificidades da profissão docente.

Entretanto, chamou atenção o fato de haver um alto percentual de participantes que afirmou buscar informação sobre o tema através dos meios de comunicação, o que pode ser observado no quadro a seguir:

Categorias Quantidade de Respostas %

Categoria 1: Formação continuada 14 82,35

Categoria 2: Meios de comunicação:

jornais e revistas 10 58,82

Categoria 3: Meios de comunicação:

programas de televisão 03 17,65

Categoria 4: Formação inicial 04 23,53

Categoria 5: Conversa com colegas

de profissão O1 5,88

Categoria 6: Livros 02 11,76

Quadro 3: Percentual dos locais nos quais docentes buscam informação

Conforme é possível observar, muitos aprendizados sobre bullying foram transmitidos através dos meios de comunicação, o que contribuiu para a construção de valores e modelos de comportamento nos espectadores, sem que os mesmos os percebam.

O currículo da mídia não tem nenhum caráter impositivo. Chega‐se a ele por interesse e deleite, e, pelo mesmo motivo, adere‐se a ele. Ao longo de nossas vidas, pelo menos as de quem vive desde a segunda

metade do século XX, ele é responsável por boa parcela de nossos aprendizados sobre o mundo, sobre os outros e sobre nós mesmos (COSTA et al, 2003, p. 10).

Assim, entender os valores implícitos apresentados pela mídia, seja ela escrita ou áudio-visual, é uma urgência para o aperfeiçoamento do sistema educacional brasileiro e a mudança de padrões de interação social. É necessário que, no centro dessa reflexão, o bullying seja visto e reconhecido, pois, caso contrário, corre-se o risco de que o fenômeno continue no escuro, passando despercebido por milhares de escolas que demonstram dificuldade em percebê‐lo e, consequentemente, ficam sem condições de preveni‐lo e superá-lo.

Mas, como a mídia tem retratado esse fenômeno? Quais supostas verdades ela tem ajudado a construir no imaginário dos (as) docentes? Longe de esgotar respostas para essas perguntas, será feita uma breve reflexão sobre o discurso midiático brasileiro diante do bullying escolar.

Nos discursos que a mídia traz sobre o tema, é possível destacar o fato de não haver, muitas vezes, a delimitação do bullying como uma violência que acontece entre pares.

Tal questão pode ser observada ao se realizar uma busca no Google pela expressão: “professor alvo de bullying”. Como resultado, é encontrada uma série de matérias em blogs e jornais virtuais, cujos conteúdos retratam docentes que se sentem vitimizados pelos alunos e, por isso, afirmam ser os próprios educadores os principais alvo de bullying.

Não apenas na internet acontece esse tipo de equívoco. O mesmo foi realizado por uma novela brasileira exibida em 2009 pela Rede Globo: “Caminho das Índias”. Nesse folhetim uma professora de nome Berenice era intimidada por um estudante de nome Zeca que, além de assediar a educadora moralmente, intimidava diversos colegas em sala de aula, sobretudo um jovem indiano de nome Indra.

Os comportamentos de Zeca foram exibidos de forma generalista, equacionando as violências dirigidas aos educadores àquelas direcionadas aos (às) colegas. Ao fazer isso, a novela sugeria que todos eram igualmente vítimas de Zeca e, assim sendo, todos (professora e alunos) eram alvos de bullying.

Além desse equívoco, é comum encontrar-se um discurso midiático generalista sobre o problema, apontando toda e qualquer forma de violência como sendo manifestações de bullying. Quem não se recorda do caso da jovem Geisy Arruda, que foi hostilizada por diversos estudantes de uma universidade particular em São Paulo?

Na ocasião, vários jornais noticiaram que essa jovem tinha sido alvo de bullying na faculdade. É fato que ela sofreu uma violência bastante grave, sendo humilhada, violentada verbal e psicologicamente, tendo sua dignidade ferida. Mas é fato, também, que não se pode afirmar que tais violências eram práticas de bullying, visto que não se tem relatos sobre a repetição dessa ação.

Diante do exposto, vale chamar atenção que é na esteira dessas incompreensões que docentes têm construído seus julgamentos sobre bullying escolar, suas características e efeitos na escola.

Por isso, não causa surpresa que esse fenômeno seja tão mal interpretado nas escolas e, até mesmo, ignorado (FISCHER, 2010), de modo que, por mais que esteja na moda, como relatam muitos educadores, continua segregado e esquecido pelas práticas educativas no Brasil.

Alguns dos equívocos conceituais dos docentes participantes serão apresentados a seguir.

4.2 Toda prática de bullying é violência, mas toda violência também é