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Nós enxergamos, estamos cegos ou fingimos que não

4. Resultados e Discussões

4.3 Nós enxergamos, estamos cegos ou fingimos que não

Assim que você pensar que sabe como são realmente as coisas, descubra outra maneira de olhar para elas

(Robin Williams)

Buscando identificar se os educadores reconheciam práticas de bullying na escola na qual trabalhavam, foi inserida a seguinte questão: “Você observa situações de bullying na escola que leciona? Se sim, com que frequência?”.

Ao serem indagados sobre a existência de bullying em suas escolas, foram encontrados discursos diferentes entre os docentes, confirmando, negando ou ressaltando que a escola não permitia que condutas de bullying

23 WWW.aprendersemmedo.org,br

acontecessem. As categorias que agrupam os julgamentos sobre a existência de bullying são ilustradas no quadro a seguir:

Categoria Respostas Categorizadas

Categoria 1: Sim, com pouca

frequência

- Vez ou outra ocorre;

- Sim, com pouca frequência; - É difícil ocorrer;

- Em alguns momentos sim, mas não em níveis considerados altos;

- Felizmente com pouca frequência.

Categoria 2: Sim, com alta frequência - Apelidos e intimidação com maior

frequência;

- Frequência aproximada de 3 dias por semana;

- Diariamente.

Categoria 3: Sim, mas não ressaltou

a frequência

- Sim.

Categoria 4: Não vejo, mas existe. - Não observo, mas já ouvi narração de fatos acontecidos na escola.

Categoria 5: Não há bullying na

escola.

- Não, pois quando há a equipe pedagógica intervém;

- Não, mas o bullying pode acontecer sem ser percebido pelo professor; - Não;

- Não há bullying, mas há crianças com dificuldades de relacionamento.

Quadro 6: Frequência do bullying na escola

Ao observar tais categorias, é possível perceber que as respostas podem ser agrupadas em dois grandes blocos de respostas: aquelas que reconhecem que há bullying na escola, compondo as categorias um a quatro, e o grupo formado pelos docentes que acreditam não existir bullying na escola, compondo os sujeitos da categoria cinco.

Analisando o primeiro grupo, encontram-se discursos diferentes sobre a existência do bullying, que vão desde a existência frequente do fenômeno na escola, até a crença de que esse é um problema eventual.

Vale destacar que foi ressaltado pelos docentes que a prática de apelidos e da intimidação são as manifestações mais comumente encontradas na escola, conforme é evidenciado na seguinte resposta: “Sim, a intimidação e apelidos com maior frequência, mais (sic) nada que gere um desconforto maior aos envolvidos” (PF09EFI24).

Além de destacar o tipo de comportamento mais comum nas práticas de bullying na escola, a resposta anterior também chama atenção para uma tentativa de minimizar os impactos do bullying sobre a vida dos alunos na escola.

Essa não foi uma tentativa exclusiva dessa docente. Outros professores também o fizeram, naturalizando as práticas de bullying e ressaltando que a escola não é omissa diante de tais questões, conforme respostas a seguir: “Sim, o bullying é natural em qualquer espaço em que exista relacionamento entre seres humanos [...]. Porém, a intervenção dos educadores sempre soluciona, pois há uma equipe preparada para combater o bullying” (PM07EFIEFIIEM); “Em alguns momentos sim, porém não considerados em níveis altos, pois a intervenção é realizada muito rápida” (PF17EI).

A partir dessas respostas é possível observar que, embora reconheçam a existência do bullying na escola, houve uma tentativa dos professores em ressaltarem que não há sofrimento intenso dos alunos e/ou que os docentes atuavam no enfrentamento do problema.

Vale destacar que, nessa indagação, não foi perguntado aos docentes o que era feito no enfrentamento do bullying, nem mesmo o que sentiam os estudantes diante das vivências de violência na escola.

O grupo que compõe a categoria cinco também ressaltou a intervenção que a escola realizava para justificar a não ocorrência de bullying no âmbito

24 Para entender a forma usada para categorizar os docentes, destaca-se que foram utilizados

letras e números: a letra P indica que é um professor (a), a letra M ou F indica o sexo de quem é citado (a), os números seguintes indicam a ordem aleatória pela qual cada conjunto de respostas individuais foi incluída no conjunto de respostas de todos os participantes e as letras que seguem os números equivalem ao segmento de atuação dos docentes (EI equivale a Educação Infantil, EFI Séries Iniciais do Ensino Fundamental, EFII Séries Finais do Ensino Fundamental e EM Ensino Médio).

educacional, conforme resposta do professor a seguir: “Não, pois quando surgem as primeiras dificuldades de relacionamento a equipe pedagógica observa o fato com seriedade” (PM15EFIIEM).

Por mais que, durante a coleta de dados, tenha sido informado ao grupo participante o fato das informações escritas nos instrumentos de pesquisa serem sigilosas, acredita-se que os (as) educadores (as) se sentiram intimidados em expor a real situação da escola e, quando o fizeram, tentaram minimizar a gravidade do fato e ressaltar a competência da equipe técnica da escola.

Tal tendência justifica-se pelo fato da escola aqui analisada ser uma instituição particular de ensino, local onde as práticas do medo e da coação dos professores são mais comumente encontradas.

Pensando na questão quantitativa, vale uma indagação: a maior parte dos docentes acredita que esse é um problema recorrente, eventual ou inexistente? A resposta a essa questão pode ser encontrada no quadro a seguir:

Categorias Quantidade de Respostas %

Categoria 1: Sim, com pouca

frequência.

07 41,18

Categoria 2: Sim, com alta

frequência.

03 17,65

Categoria 3: Sim, mas não ressaltou

a frequência.

01 5,88

Categoria 4: Não vejo, mas existe. 01 5,88

Categoria 5: Não há bullying na

escola.

05 29,41

Quadro 7: Percentual da frequência do bullying na escola

A partir dos dados, nota-se que um alto percentual de educadores (as) acredita que não há bullying na escola, o que pode ser entendido pelo não reconhecimento do que seja, de fato, o bullying. Isso pode ser observado pelas respostas dadas à questão três, que negam a existência do fenômeno ou tentam mascarar o problema e proteger a instituição educativa da exposição

através da pesquisa. Além disso, pode-se pensar que o não reconhecimento do problema por um alto percentual da amostragem deve-se ao fato do distanciamento dos docentes diante dos problemas que são dos alunos (como é o caso das situações de bullying na escola).

É interessante notar o que está implícito em nossas ações enquanto professores: uma crença de que o que diz respeito aos conflitos entre os alunos ocupam um grau de importância menor dentro da instituição educativa (TOGNETTA, 2011, p. 137).

Os outros quase 70% dos docentes reconheceram a existência do fenômeno; contudo, ao exemplificarem as ocorrências de bullying, o fizeram de forma incorreta, conforme resposta da professora PF13EFI: “Ano passado tive um aluno que era muito ‘grosso’, tinha apenas 6 anos e muitas vezes deixei-o sem recreação, pois quando estava com os colegas não sabia brincar”.

Além de exemplificar erroneamente o fenômeno, equacionando-o aos comportamentos grosseiros, há outro aspecto que merece ser ressaltado na fala da referida professora: ela acredita que, deixando o aluno fora das brincadeiras, ele aprenderá a se relacionar com os colegas. Tal forma de resolução de conflito é característica própria dos ambientes coercitivos, visto que a supressão da situação de conflito é rapidamente aplicada, ignorando qualquer possibilidade de transformar a situação conflituosa em momentos nos quais os alunos poderão aprender a se relacionar mais assertivamente.

Diante da hipótese de que os professores generalizam todo comportamento inadequado como bullying, o que pode ser confirmado pelos dados já apresentados, realizou-se mais uma solicitação aos docentes: “Descreva alguns dos comportamentos que acontecem em sua escola que você caracteriza como bullying”.

É sobre as formas pelas quais o bullying se manifesta nas escolas que trataremos a seguir.

4.4 – Os Meninos de Muitas Caras: as principais condutas de bullying na