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CONCEPÇÃO DE PROGRESSÃO CONTINUADA

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1 DA CRIANÇA AO PROFESSOR: ALGUMAS CONCEPÇÕES E SUAS

1.7 CONCEPÇÃO DE PROGRESSÃO CONTINUADA

No conjunto das concepções discutidas no presente capítulo, insere-se

justifica-se sob dois grandes eixos: pedagógico e político.

Do ponto de vista pedagógico, toda a fundamentação teórica acerca da gênese do conhecimento ajusta-se e justifica a idéia da progressão continuada. Ao compreendermos que o sujeito aprende na interação com o objeto de conhecimento e que o processo de conhecimento não é linear, visto que ocorre por apropriações de aspectos possíveis de serem observados no objeto de conhecimento e nos diferentes momentos em que este processo de apropriação acontece, compreende- se que a cooperação cria a zona de desenvolvimento proximal. Entre outros, é coerente que se pense o espaço e o tempo escolar de forma que possibilitem aos alunos apreender no seu tempo, na sua possibilidade de assimilação (na concepção piagetiana). Por isso, não é possível determinar que todos os alunos aprendam o mesmo conteúdo, ao mesmo tempo, de forma linear e com as mesmas intervenções.

Pensemos em uma criança que entrou esse ano na primeira série do Ensino Fundamental [...] atenção! – antes de assistir qualquer aula nossa, independente da camada social a que ela pertença, já tinha assistido a cinco mil horas de televisão [...] ela assistiu ao “Discovery”, ao “National Geographic” [...] Aprendeu uma série de coisas do nosso cotidiano. Aí, no primeiro dia de aula, ela entra na escola, senta na nossa sala e fica quietinha, e nós começamos a aula dizendo: “A pata nada”. [...] Muitas vezes nós estamos lidando em educação, seja em que nível for, desde o Ensino Fundamental até o de pós-graduação, dizendo: “A pata nada”. (CORTELA, 2002, p. 29-30)

Considerar os saberes das crianças, seus conhecimentos prévios e sua ação cognitiva no processo de aprendizagem, ou seja, considerar as crianças como sujeitos do processo de aprendizagem, considerar os alunos como seres inteligentes, com histórias de vida e experiências, bem como considerar que as diferenças podem favorecer a aprendizagem, são pressupostos que aproximam a ideia de progressão continuada da concepção construtivista do conhecimento.

Do ponto de vista político-ideológico, é claro que a ideia de reprovação não favorece o aprendizado, ao contrário, gera um movimento de exclusão. No entanto, a ideia de ciclo ou progressão continuada causa grande desconforto, pois a comparação de resultados de aprendizagem é realizada considerando somente os alunos que conseguiram concluir a 8ª série (hoje chamado de 8º ou 9º ano do Ensino Fundamental), ou seja, resultado dos que conseguiram concluir o Ensino Fundamental nos oito anos de escolaridade. A análise de Barreto (2002) contribui para melhor compreensão deste fato:

[...] Antes o rendimento escolar considerado satisfatório era dos alunos que chegavam ao final do Ensino Fundamental, tendo ficado para trás a grande maioria de alunos dessa geração que iniciou os estudos no mesmo ano dos concluintes da oitava série, retida nas séries anteriores. Esses alunos não conseguiam chegar ao final do curso, apesar de permanecer por oito anos ou mais na escola. Então, a impressão que se tem agora é que o nível de escolaridade baixou porque essa grande maioria está concluindo o curso. Mas, se considerarmos que todos podem chegar hoje até o final da oitava série, o ganho social e o conjunto de aprendizagens adquirido por uma geração inteira de estudantes é muito maior do que uma eventual perda de um pretenso padrão de desempenho dado pelos “sobreviventes” da oitava série em um regime altamente seletivo. Em uma fase de consolidação do regime de ciclos, entretanto, os esforços têm de se concentrar em maneiras de funcionar da escola que elevem o padrão de aprendizagem de todos os alunos, que ainda tem muito a melhorar. (BARRETO, 2010, p. 43)

O conceito de avaliação deve ser revisto junto à ideia de progressão continuada. Neste conjunto de conceitos que envolvem a Progressão Continuada, a avaliação passa a assumir um caráter diagnóstico e orientador da prática pedagógica e não mais o caráter de punição, de reprovação e exclusão.

É pública a análise de que em muitas Redes que adotaram a Progressão Continuada há problemas e riscos. Para isso, se fazem necessários ajustes para melhorar a implantação do conceito, já que ele tange questões conceituais muito enraizadas na cultura educacional, como analisa Cortela (2002):

Não estamos mexendo só com o poder docente. A idéia de ciclos mexe com a identidade docente construída na história. Por isso, é muito mais complexo. Essa organização por disciplinas e por séries tem uma marca conosco desde o período medieval. Ela aparece desde as primeiras organizações de natureza católica. É exatamente nessa organização por disciplina fechada – trivivum e o quadrivium, que eram a organização das disciplinas do período medieval – que ela vem até hoje. Por isso, mexer com a idéia da avaliação de série ano a ano não é mexer, repito, com a circunstância. Está mexendo aí com a identidade docente, com o modo no qual nós entendemos e o modo o qual entendemos a educação. (CORTELA, 2002, p. 22)

Apesar da complexidade da mudança da concepção de seriação para a progressão continuada, retroceder para a seriação não é a mais acertada decisão. O conceito de reprovação caminha paralelamente ao conceito de seriação e isto não interessa a nenhum dos lados envolvidos na Educação. Não é interessante aos cofres públicos, pois se gasta muito mais com a retenção; não interessa aos governos, pois índices de retenção não são bons cartões de visita e, principalmente, não interessa às crianças, pois está mais que provado que elas não aprendem mais com a retenção, pelo contrário, o efeito é drástico, tanto do ponto de vista da

autoestima, quanto do distanciamento da criança dos meios educacionais que, muitas vezes, representa o único contato com instituições públicas e com a possibilidade da construção da cidadania (cidadãos que possam pleitear e usufruir a participação social, a saúde, a cultura e a Educação).

Os pressupostos que sustentam a Progressão Continuada são

principalmente: a crença na capacidade que toda criança tem de aprender, o direito que toda criança tem de aprender, a compreensão que a aprendizagem depende, entre outros fatores, de boas intervenções didáticas e de que a diversidade é uma característica que enriquece a ação didática e não o contrário. Preceitos que ainda devem ser mais bem compreendidos por todos os envolvidos com a Educação, especialmente, a alfabetização.

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