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Conclusões e considerações finais

No documento Tese Escrita Final final (páginas 85-95)

O presente estudo permitiu-nos identificar e compreender as perspetivas e práticas dos docentes do 1.º e do 2.º ano de escolaridade, no domínio da estimulação da Consciência Fonológica (CF) em alunos com Dificuldades de Aprendizagem Específicas da Leitura e da Escrita (DAE_LE), de um estabelecimento de ensino da cidade de Lisboa.

Neste ponto do trabalho pretendemos responder às questões de estudo que formulámos inicialmente.

 Quais as perspetivas dos docentes sobre o trabalho pedagógico com alunos com DAE_LE? Em que medida são consistentes com as indicações da literatura? (Questão 1)

Para respondermos a estas questões, procurámos identificar: por um lado, as opiniões das entrevistadas quanto às condições ou requisitos necessários para responder eficazmente às necessidades dos alunos com DAE_LE, por outro, as perceções sobre a capacidade atual da instituição educativa onde trabalham e dos docentes para o mesmo efeito.

Os testemunhos salientaram quatro principais condições/requisitos e que encontram suporte na bibliografia consultada: a intervenção precoce, o apoio e a motivação que minimizam as dificuldades de leitura e escrita (e.g. Teles, 2004; Hennigh, 2003; Coelho, 2014); o ensino e os recursos educativos adaptados e estimulantes (Coelho, 2014); a adaptação dos exercícios (Coelho, 2014) e, finalmente, a formação dos docentes em DAE_LE (Cogan, 2002, citado por Pinheiro, 2009).

Os resultados apontam para alguma incapacidade dos docentes face às DAE_LE, que resulta da falta de competências especializadas para garantir a qualidade da sua ação educativa. A esta necessidade ou lacuna, junta-se a dificuldade do trabalho com turmas de grande dimensão, inviabilizando uma intervenção e apoio individualizado aos alunos com DAE_LE.

Todavia, as perceções das participantes são consensuais quanto ao retrato das condições existentes no estabelecimento de ensino onde trabalham: tem condições privilegiadas, em termos dos recursos humanos especializados, uma vez que dispõem de profissionais tais como psicólogos e serviço de Educação Especial (EE) que têm por função detetar, diagnosticar, intervir e acompanhar quando necessário (Coelho, 2014).

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 Que boas práticas pedagógicas, no domínio do ensino-aprendizagem da leitura e da escrita, os docentes sugerem, com base na sua experiência profissional? E em que medida são apoiadas pela literatura na área? Será que acrescentam elementos novos? (Questão 2)

Os resultados evidenciaram duas práticas distintas com os alunos com DAE_LE: estratégias ao nível da estimulação da CF e outras desenvolvidas no ensino- aprendizagem da leitura e da escrita.

A estimulação da CF no 1.º Ciclo do Ensino Básico (CEB) é justificada pelo seu papel determinante para a aprendizagem da leitura e da escrita. Os resultados confirmam o que é mencionado na literatura consultada, ou seja, o desenvolvimento da CF apresenta uma relação recíproca e interativa com a aprendizagem da leitura e da escrita, pelo que se salienta a importância de promover estas competências aquando da entrada no Jardim de Infância (JI) e no 1.º CEB (Rios, 2011; Sim-Sim, 1998). No entanto, nem todas as crianças conseguem adquirir e desenvolver tais competências. Certas lacunas significativas poderão passar despercebidas no JI e só serão identificadas aquando no ingresso no 1.º CEB. Nesta altura, poderão emergir dificuldades ao nível da leitura e da escrita, com repercussões a vários níveis, incluindo no sucesso escolar (Freitas, Alves & Costa, 2007). Assim, os Educadores de Infância (EI) e os docentes do 1.º CEB devem atuar ao nível da prevenção das dificuldades de CF, bem como estimular o desenvolvimento desta competência, promovendo o sucesso da aprendizagem da leitura e da escrita (Viana, 2006, citado por Rios, 2011; Freitas et al., 2007).

Para estimularem a CF de todos os alunos, além do trabalho específico com os que apresentam DAE_LE, as participantes reportaram diferentes tipos de tarefas reconhecidas pela literatura (Rios, 2011; Freitas et al., 2007): de consciência da palavra (ex: ordenar e contar palavras numa frase), silábica (ex: produção de palavras a partir de sílabas e divisão/segmentação silábica), intrassilábica (ex: identificação e produção de rimas) e fonémica (ex: identificação de palavras com igual fonema inicial e segmentação fonémica).

Nos resultados, salientaram-se duas práticas defendidas pelas entrevistadas sobre as quais não encontrámos qualquer referência na literatura, designadamente: a utilização do manual de português (do 1.º ano de escolaridade) que contempla muitos exercícios de CF; os jogos no 1.º CEB permitem explorar desde as unidades fonológicas maiores até às unidades intrassilábicas e fonémicas (ex: Jogo das Palavras). No entanto, Sim-Sim et al. (2008) afirmam que é adequado a utilização de

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jogos que trabalham a CF na Educação Pré-Escolar. São recursos que possibilitam a continuidade educativa e que promovem o sucesso da aprendizagem da leitura.

Para além da CF, os resultados apontam para outras estratégias desenvolvidas no ensino-aprendizagem da leitura e da escrita, com os alunos com DAE_LE, defendidas por autores tais como Coelho (2014), Hennigh (2003) e Torres e Fernández (2001): métodos e exercícios adaptados às particularidades e necessidades específicas dos alunos com DAE_LE. São exemplos, os exercícios de completamento/construção de frases e de associação, bem como a combinação do método sintético com o global. A adaptação dos exercícios incluí uma complexidade crescente e gradual dos mesmos. Trata-se de uma referência de trabalho pedadógico apontada por Coelho (2014) que permite aos alunos ultrapassar as dificuldades e adquirir um ritmo de trabalho semelhante ao dos colegas.

Ainda que as entrevistadas deem conta de estratégias pedagógicas adequadas e previstas na literatura, o elenco que apresentam é limitado face às possibilidades existentes. Esta situação poderia ser facilmente ultrapassada com formação contínua na área.

 Como perspetivam o envolvimento das famílias no trabalho pedagógico com alunos com DAE_LE? (Questão 3)

A família constitui um alicerce fundamental para os alunos com DAE_LE (Pinheiro, 2009; Hennigh, 2003). No entanto, as entrevistadas reportaram duas atitudes, quase antagónicas, das famílias perante as DAE_LE dos filhos: uma atitude de negação e uma atitude de aceitação (Hartwig, 1984, citado por Hennigh, 2003). A primeira compromete a motivação dos alunos, conduzindo a um aumento das suas dificuldades, incluindo ao nível da leitura e da escrita. A atitude de negação dos pais condiciona também a sua disponibilidade para colaborar. A segunda é, geralmente, faseada/gradualmente construída. Outros fatores surgem nos nossos resultados para explicar a falta de colaboração dos pais: a indisponibilidade em termos de tempo e dinheiro, bem como a falta de informação sobre as DAE_LE. Sobre estes aspetos não encontrámos qualquer referência na literatura.

Ainda que com pouca expressão nos resultados e sem suporte na literatura que consultámos, parece-nos importante realçar a defesa, por uma das entrevistadas, da formação dos pais em DAE_LE, para prevenir eventuais faltas de colaboração ou práticas educativas inadequadas e em sintonia com os docentes, ajudar o aluno a ultrapassar as suas dificuldades.

Registámos ainda nos resultados, a defesa da articulação e cooperação entre professores titulares e famílias, traduzida na partilha de informação, de práticas, na

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interajuda e na definição conjunta de objetivos que melhor se adequem ao aluno com DAE_LE (Rief & Heimburge, 2000; Hennigh, 2003).

Limitações

Como todos os estudos, o nosso também apresenta algumas limitações. A primeira diz respeito ao facto de nos termos circunscrito ao discurso das participantes, sem o confrontarmos com as práticas efetivamente desenvolvidas. Teria sido mais enriquecedor e esclarecedor se tivéssemos triangulado os dados das entrevistas com dados de observação direta e amostras de escrita dos alunos com DAE_LE, por forma a ter uma noção mais correta e detalhada das tarefas e estratégias utilizadas pelas docentes, bem como sobre os respetivos efeitos nos alunos com DAE_LE. Outras limitações são inerentes à metodologia (qualitativa) usada e que procurámos compensar com o suporte teórico, tanto ao nível dos procedimentos de recolha, tratamento e análise de dados, como ao nível da interpretação dos resultados.

Sugestões para estudos futuros

A Consciência Fonológica (CF) e as Dificuldades de Aprendizagem Específicas da Leitura e da Escrita (DAE_LE) são dois temas que, nos últimos anos, têm sido muito explorados pela literatura. No entanto, consideramos ser sempre possível aumentar o conhecimento. Parece-nos relevante dar continuidade a este estudo, explorando outras dimensões como, por exemplo, os papéis da família e do serviço de Educação Especial na estimulação da CF. Não conseguimos encontrar na literatura sobre a CF, referencias ao envolvimento destes intervenientes, o que poderá ser fruto, entre outras razões, da falta de conhecimento existente sobre o assunto.

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