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O futuro não é um lugar onde estamos indo, mas um lugar que estamos criando. O caminho para ele não é encontrado, mas construído, e o ato de fazê-lo muda tanto

o realizador quanto o destino. Antoine de Saint-Exupéry

134 De modo geral, conforme visto no Capítulo 2, pode-se dizer que a população residente ao longo do Rio do Carmo e de seus principais tributários, Rios Gualaxo do Norte e Gualaxo do Sul, não preservaram a mata ciliar e ainda não delimitaram a área de preservação permanente - APP definida pela Lei Nº 12.651/2012. Observa-se ainda que, é frequente a utilização das áreas estabelecidas por lei como APP para o cultivo de plantas forrageiras e arbóreas exóticas aos biomas Cerrado e Mata Atlântica, tais como gramíneas e eucalipto, e para a criação de animais também exóticos ao ecossistema local, a saber: gado, lhamas, vicunhas, cavalos, porcos e galinhas. Também é recorrente o lançamento de efluentes líquidos in natura e de

resíduos sólidos diretamente nos corpos d’água, além da prática de atividades garimpeiras

clandestinas no leito e entorno dos rios.

Tais práticas, além de desproteger os cursos d’água provocando erosão de suas margens, assoreamento de seus leitos, revolver os sedimentos contribuindo para a biodisponibilização das substâncias a eles aderidas, e favorecer o aumento do aporte de sedimentos e matéria orgânica, também provoca uma grande perda da biodiversidade vegetal e, por consequência, da biodiversidade animal locais. Considerando a especificidade da área que se situa em parte no Quadrilátero Ferrífero (Figura 2-2), práticas inadequadas de uso e ocupação dos solos geram ainda riscos de contaminação dos residentes e visitantes dessas áreas por metais pesados naturalmente presentes na região em altas concentrações, notadamente: arsênio (As), bário (Ba), cádmio (Cd), cromo (Cr), cobre (Cu), mercúrio (Hg), manganês (Mn), níquel (Ni), chumbo (Pb) e antimônio (Sb), conforme visto na Figura 2-1.

Em decorrência do rompimento da barragem de Fundão em 05/11/2015, as características limnológicas dos Rios Gualaxo do Norte, Baixo Rio do Carmo e Rio Doce foram substâncialmente alteradas. Esses rios tiveram o material sedimentado em suas calhas completamente revolvido e encontram-se assoreados pelo rejeito da mineração de ferro que matou grande parte da biota fluvial, e pessoas e animais que se encontravam às margens de seus cursos, além de remover a vegetação ciliar e demolir ou comprometer as edificações nas planícies de inundação. Passando por áreas com grandes concentrações de metais pesados como a calha dos Rios Gualaxo do Norte e do Carmo, o fluxo da lama transportou e continua a transportar esses metais ao longo do Rio Doce, tendo alcançado a foz no Oceano Atlântico e contaminado a fauna fluvial nesse percurso (APÊNDICE B).

A Figura 5-1 apresenta os metais e metaloides quantificados acima dos padrões limites de prevenção para uso agrícola e residencial da Resolução CONAMA 420 (2009) nos sedimentos, e acima do limite classes 1 e 2 e para cultivo de organismos aquáticos segundo os

135 padrões das Resoluções COPAM-CERH/MG 01 (2008) e CONAMA 357 (2005) na água, antes (ARB) e depois do rompimento da barragem de Fundão (DRB), nos Rios Gualaxo do Norte, Gualaxo do Sul, Rio do Carmo, Alto Rio Doce e afluentes conforme apresentado e discutido no Capítulo 4.

Figura 5- 1 – Metais e metaloides acima dos padrões brasileiros de sedimentos e água para uso agrícola e

residencial e acima do limite classes 1 e 2 e para cultivo de organismos aquáticos antes (ARB) e depois do rompimento da barragem de Fundão (DRB) nos Rios Gualaxo do Norte, Gualaxo do Sul, do Carmo, Alto Rio Doce e afluentes.

Metais e metaloides acima dos padrões brasileiros em: Rio Gualaxo do Norte e afluentes Rio Gualaxo do Sul e afluentes

Alto Rio do Carmo e afluentes

Baixo Rio do Carmo, Alto Rio Doce e afluentes

ARB DRB ARB DRB ARB DRB ARB DRB

Sedimentos As, Cr, Fe, Hg, Mn, Ni e S As - - As, Ba, Cd, Co, Cr, Hg, Ni e Pb As As, Cr e Sb - Água Al, Cd, Fe, Hg, Mn, P, Pb, S e Zn Al, As, Cd, Fe, Hg, Mn, P, S, Sb, Se e Zn As, Fe, Mn, P e S Fe, P e S Al, As, Cd, Fe, Hg, Mn, P, S e Zn Al, As, Cr, Fe, Mn, P, Pb, S e Zn Al, As, Fe, Hg, Mn, P, S, Sb e Zn As, Cd, Fe, Mn, Ni, P, Pb, S, Se e Sb Fonte da autora.

Observa-se no Capítulo 4, que grande parte dos metais pesados encontrados anteriormente ao rompimento da barragem de Fundão nos sedimentos do Rio Gualaxo do Norte e Baixo Rio do Carmo em concentrações acima das normas foram diluídos pelo fluxo da lama de rejeitos. Entretanto, o revolvimento do material até então sedimentado provocou a ressolubilização de metais que se encontravam imobilizados no leito desses rios. É importante destacar que, nas referências utilizadas, a amostragem de mercúrio (Hg) em sedimentos só foi realizada antes do rompimento da barragem de Fundão e, portanto, a ausência desse elemento nas células de sedimentos DRB da Figura 5-1 não representa a diminuição da concentração do mesmo.

Adicionalmente, é importante destacar que o material particulado depositado nas bacias de inundação atingidas pela lama de rejeitos constitui-se um material suporte e vetor de transporte de metais pesados e de micro-organismos a ele aderidos. E, caso a ressuspenção desse material não seja evitada, essas áreas podem se tornar focos de doenças decorrentes de contaminações por metais pesados e micro-organismos patogênicos, além de doenças respiratórias.

136 Ressalta-se portanto, a necessidade de que o plano de recuperação de áreas degradadas elaborado para a bacia do Rio Doce contemple a necessidade de mudanças nas formas de uso e ocupação do solo da região. É preciso promover e proteger a salubridade da área, ao mesmo tempo em que se promova e apoie atividades produtivas de baixos impactos ambientais, para que superemos o caráter de feitoria minerária e consigamos estruturar a população para alcançar condições de sobrevivência e progresso, ao invés de simplesmente atender às solicitações exógenas e alheias às especificidades e necessidades locais. Nesse sentido, o Capítulo 6 traz sugestões de intervenções de engenharia e gestão socioambiental visando mitigar os impactos identificados, além de promover o desenvolvimento sustentável e a qualidade de vida na região.

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