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Condições normativas da ponderação

No documento Conflitos entre normas que se intercetam (páginas 76-79)

Capítulo III. Conflitos Normativos

4.1 Condições normativas da ponderação

A ponderação como método para resolver conflitos normativos está, intimamente, ligada com os conflitos entre princípios. Criou-se a ideia generalizada que a ponderação seria o método por excelência para resolver os

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conflitos entre princípios, sendo afastada como método resolutivo de outros conflitos normativos. Contudo, esta ideia comum não corresponde, no nosso entender, à realidade normativa, sendo, portanto, necessário determinar as situações em situações que se mostre indispensável recorrer à ponderação para solucionar conflitos normativos.

Como já foi mencionado, de forma abreviada ao longo deste trabalho, partilhamos da opinião de que a ponderação não resolve apenas os conflitos entre princípios, servindo também como método de resolução de colisões entre regras. Porém, esta afirmação exposta apenas desta forma mostra-se vaga, sendo, então, necessário recorrer a critérios específicos para demonstrar a aplicabilidade da ponderação como método de resolução de conflitos entre regras.

No decorrer deste segmento, é fundamental recorrer a certas distinções e categorizações dos conflitos normativos, explanados anteriormente. Desta forma, recorreremos, primordialmente, aos conflitos entre princípios, conflito este que se apresenta como o mais comum aquando da utilização da ponderação. O conflito entre princípios é comumente categorizado como um conflito de âmbito parcial-parcial. Assim, enquanto que duas ações específicas se intersectam e acabam por colidir, as restantes ações específicas presentes na estrutura disjuntiva dos princípios são afastadas do conflito. Há, portanto, uma intersecção entre normas-princípio, apresentando uma parte em conflito, enquanto que a restante parte encontra-se em total harmonia com a outra norma conflituante. Como conflito parcial-parcial é de elevada relevância analisar se esta categoria de princípios necessita da utilização do método ponderativo para ser solucionada. Empregando, novamente, o exemplo dado na análise das antinomias parcial-parcial, onde uma norma prescreve a proibição de comer na biblioteca da faculdade, no período das 14 horas às 18 horas, enquanto que outra norma permite comer na biblioteca nos períodos de chuva, chegamos, facilmente, à conclusão que ocorreria um conflito nos períodos em que se observasse, cumulativamente, períodos de chuva no intervalo temporal das 14 horas às 18 horas. Estaríamos perante dois estatutos deônticos opostos, permissão e proibição, para a mesma ação. Através da observação das normas de conflito tipificados no ordenamento jurídico, é possível concluir que estes se mostram insuficientes para a resolução deste caso e, consequentemente, casos

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idênticos a estes. Se, no sistema legal estivesse positivada uma norma com capacidade para resolver este conflito, ou seja, consoante os elementos em conflito e os elementos consistentes das normas em conflito, esta não seria uma norma de conflito, seria, então, uma solução específica para o conflito156.

Para além do conflito parcial-parcial, também o conflito concreto necessita de uma ponderação para que este seja solucionado. Destarte, os conflitos normativos que apenas surgem da incompetência concreta das consequências legais, visto que as normas só se tornam incompatíveis devido a um facto que torna os efeitos legais, abstratamente consistentes, em incompatíveis, necessitando, deste modo, do método de ponderação. Mais uma vez, o sistema jurídico não apresenta uma norma de conflito capaz de ultrapassar as caraterísticas diferenciadoras destes conflitos e resolver os mesmos.

Portanto, como foi possível verificar, não são apenas os conflitos entre princípios que necessitam da ponderação para solucionar os conflitos. Os conflitos entre princípios integram categorias de conflitos que também necessitam de ponderação. Assim, são as categorias de conflitos que integra os conflitos entre princípios que necessitam de um método de resolução de conflitos distinta das positivadas no sistema jurídico. As distinções de conflitos, parcial- parcial e conflitos em concreto também necessitam da aplicação do método de ponderação, em virtude de serem conflitos lógico e materiais, logo o recurso a uma norma de resolução de conflitos formal não se revelaria como suficiente para dar uma resposta coerente e consistente. Por outro lado, os conflitos em concreto, onde se enquadram os conflitos parcial-parcial e conflitos entre princípios, não apresentam também no ordenamento jurídico, norma de conflito capaz de solucionar este tipo de conflitos normativos, ocorrendo, novamente, uma lacuna enquanto a uma resolução tipificada.

Enquanto que os exemplos descritos supra, evidenciam uma margem positiva de ponderação, também é possível encontrar conflitos normativos sem uma norma de conflito aplicável que apresente uma margem negativa de ponderação157. Assim, é nossa crença que a ponderação tem um âmbito de

156 DUARTE, David, Normative Conditions of Balancing: Drawing up the Boundaries of

Normative Conflicts That Lead to Balances. In Legal Reasoning: The Methods of Balancing. Ed. J. R. Sieckmann, pág. 58.

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aplicação vasto, chegando mesmo a ser o método de resolução de conflitos normativos abstratos e, tal como os anteriores tipos de conflitos, não tenha uma norma de conflito aplicável. Dentro destas circunstâncias é possível mencionar os conflitos de segundo grau. Este tipo de conflitos pode dividir-se em duas formas distintas: (i) nenhum dos critérios de resolução de conflitos seja aplicado à situação concreta; (ii) pode também ocorrer que sejam chamados a resolver o caso concreto vários critérios de resolução, dando lugar ao aparecimento de várias respostas para um mesmo caso. Para a circunstância em estudo, interessa-nos o último cenário exposto. Os conflitos de segundo grau são conflitos em abstrato, uma vez que as normas já estão em conflito de forma abstrata e não existe uma norma que dê resposta a esta afluência de critérios de resolução. Portanto, um conflito, por exemplo, entre uma norma superior e geral e uma norma especial e inferior dois resultados distintos são obtidos. Por um lado, tendo em consideração o critério hierárquico, a norma superior prevalece, todavia, por outro lado, segundo o critério da especialidade a norma especial prevalece. A resolução dada pela ponderação terá que ser entre as normas em conflito material, ou seja, a escolha passará pelas normas originais do conflito e não pelas normas de conflitos. Desta forma, a solução dada pela ponderação é referente à normas em conflito, não estabelecendo um critério de prevalência entre normas de conflito, sendo, então, necessário sempre que ocorra um conflito de segundo nível, proceder a uma nova ponderação sobre as normas em conflito originais.

No documento Conflitos entre normas que se intercetam (páginas 76-79)