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Conflitos e convivência entre o Direito da Propriedade Industrial e o

No documento Almir Garcia Fernandes.pdf (páginas 134-142)

No plano teórico, tanto o Direito da Concorrência quanto a Propriedade Industrial são subsistemas jurídicos com objetivos de aspectos aparentemente convergentes, pois em ambos está presente o interesse de intensificar o bem-estar social.

O ponto de conflito entre estes subsistemas jurídicos está nos meios pelos quais buscam atingir esse bem-estar social: se por um lado o Direito da Concorrência “visa maximizar a eficiência econômica abolindo os entraves existentes no mercado”399, a Propriedade Industrial, por seu turno, utiliza-se da possibilidade de exclusão de terceiros não autorizados e da limitação da concorrência para garantir o retorno financeiro aos investimentos empresariais em tecnologia e marketing.

Em ambos os casos o desenvolvimento do bem-estar social se destacará, pois com a preservação do mercado, objetivada pelo Direito da Concorrência, os consumidores poderão ter acesso a diversos produtos e serviços ofertados a preços e condições justas. Da mesma forma ocorre com a Propriedade Industrial, pois a preservação de investimentos é um verdadeiro estímulo para a realização de novos investimentos que possam melhorar a qualidade de vida e otimizar os processos produtivos. Nas palavras de Lemley: “Quando as Leis da Propriedade Industrial são fortes, as leis do Direito Antitruste também serão fortes, e vice-versa.”400

Mesmo que o direito de excluir concorrentes possa parecer aparentemente um contrassenso às normas do Direito da Concorrência, em longo prazo os benefícios sociais são maiores que os prejuízos imediatos de uma pequena restrição sobre bens específicos.401

§1° Monopólio de exploração da Propriedade Industrial

Fato equivocado que contribuiu com a ideia de que a exploração da Propriedade Industrial fosse vista como um contrassenso à preservação da concorrência é a sua associação à ideia de monopólio, pois, sob o ponto de vista do Direito Antitruste, os monopólios estão

399 MONTEIRO, Luis. Ibidem, p. 40.

400 LEMLEY, Mark A. A new balance between IP and Antitrust. (April 1, 2007). Southwestern Journal of

Law and Trade in the Americas, v. 13, 2007; Sanford Law and Economics Olin Working Paper n. 340.

Disponível em SSRN: http://ssrn.com/asbtract=980045. Acesso em 15 abr. 2015. p. 2 (tradução própria).

401 Nesse sentido destaca MONTEIRO, Luis: “O bem-estar social em longo prazo depende da eficiência dinâmica do marcado assim como a sua tendência para a eficiência alocativa. A eficiência dinâmica toma em consideração a invenção e a comercialização de novos processos e produtos vocacionados para o aumento do bem-estar social, tanto na perspectiva da melhoria da qualidade dos produtos, como também na óptica da promoção do crescimento através de uma maior eficiência produtiva. Op. cit., p. 41.

relacionados a uma situação de mercado em que prevalece o interesse de apenas um agente em detrimento de outros. Trata-se, portanto de “situação específica de concorrência imperfeita, em que um agente econômico detém o mercado de produto ou serviço, impondo sua vontade e estabelecendo o preço aos que comercializam.”402

Os titulares de patentes e registros, em tese, exerceriam, assim, uma posição dominante no mercado com relação aos bens de que são titulares.403 Por outro lado, destaca-se que essa posição se consolida por intermédio de garantias jurídicas e não propriamente de uma reserva econômica e exclusiva do mercado, pois nem sempre o exercício de um domínio jurídico resulta necessariamente no domínio econômico.

O “monopólio” jurídico conferido aos bens da Propriedade Industrial garante ao seu titular a exploração econômica, não de um mercado, mas sim sobre uma determinada inovação ou símbolos distintivos. Não há qualquer violação aparente da concorrência pela simples exploração desses bens, a não ser que essa exploração se mostre abusiva.

Analisando esses aspectos, Lilla destaca que:

A exclusividade conferida pela propriedade intelectual, também denominada de “monopólio legal” por restringir o acesso aos bens intelectuais a terceiros, poderá resultar em custos sociais que em determinadas situações poderão sobrepor-se às eficiências decorrentes da inovação, uma vez que o titular desses direitos terá condições de cobrar preços supracompetitivos ou recusar transacionar esses bens com seus concorrentes.404

No universo da Propriedade Industrial, as principais críticas a esse poder econômico voltaram-se principalmente para as patentes, pois estas, frequentemente, foram associadas a uma estrutura monopolista de conhecimento tecnológico, o que poderia levar, por consequência, a uma redução na rivalidade entre agentes no mercado.

O privilégio conferido ao titular da patente lhe oferece uma “vantagem considerável sobre seus concorrentes, sendo o único a poder desempenhar a atividade de explorar o invento”405, lhe sendo outorgado, inclusive, o direito de excluir aqueles que dela indevidamente se utilizarem, ou mesmo de impor restrições contratuais para a disseminação desse conhecimento.

402 FIGUEIREDO, Leonardo. Ibidem, p. 98.

403 Importante destacar o conceito de posição dominante extraído da jurisprudência da União Europeia apresentado por MONTEIRO, Luis: “uma empresa em posição dominante é aquela que dispõe de um poder econômico que lhe dá a possibilidade de obstar à manutenção de uma concorrência efectiva no mercado em causa, conferindo-lhe a possibilidade de optar por comportamentos independentes numa medida apreciável face aos seus concorrentes, aos seus clientes e, finalmente, aos consumidores”. Ibidem, p. 65.

404 LILLA, Paulo. Ibidem, p. 39.

Por outro lado, ressalta-se novamente que o direito de exclusividade, sobre a exploração dos bens da Propriedade Industrial, conferido pelo Estado, pode ser caracterizado como “monopólio” apenas no sentido jurídico, ou seja, o de explorar o invento e impedir a exploração indevida de terceiros, entretanto esse “monopólio jurídico” não pode ser confundido com o monopólio econômico, que representa a dominação de um mercado relevante e a retirada do direito de escolha por parte dos consumidores.

Nesse sentido, Pimentel e Barral destacam a diferença entre estas duas posições (jurídica e econômica), na exploração da Propriedade Intelectual, cujo raciocínio também se aplica à Propriedade Industrial:

A proteção jurídica tende a garantir ao seu titular a recuperação de investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) tecnológico, que podem ser públicos ou privados, diretos ou indiretos. Garante também uma posição econômica privilegiada e lícita nos mercados regionais ou nacional, para uma empresa em concorrência com outra, ao permitir a exclusividade de processo industrial, de comercialização de um produto ou serviço, de seu signo distintivo, de obra literária, artística ou científica.406

Para Lilla, o entendimento de que as patentes eram capazes por si só de conferir uma posição de domínio de mercado aos seus titulares prevaleceu até a primeira metade do século XX, devido à existência de diversos casos de “patente misuse nos quais a questão era verificar se o titular de uma patente estendia de forma indevida o monopólio conferido pela patente a produtos não patenteados, oferecidos como condição para a aquisição do produto patenteado.”407

Não há, portanto, em se falar em monopólio no sentido econômico, em virtude da simples aquisição do direito de exploração exclusiva dos bens da Propriedade Industrial, até mesmo porque tal prerrogativa insere-se num contexto jurídico, de bens não escassos e passíveis de substituição em sua grande maioria.

§2° O Retorno aos investimentos empresariais no desenvolvimento de patentes

Não se pode negar que existe uma justificativa de caráter econômico, para a manutenção dos privilégios temporários de exploração de patentes associada ao direito do inventor de explorar economicamente seu invento como um prêmio por seus investimentos, também como incentivo estatal na exploração e criação de novas tecnologias.

406 PIMENTEL, Luiz Otávio; BARRAL, Welber. Direito de Propriedade Intelectual e desenvolvimento. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2006, p. 11-12.

Lemley ensina, inclusive, que numa economia de mercado privado, os indivíduos não vão investir suficientemente na invenção ou criação, a menos que o retorno esperado exceda o custo de sua criação - ou seja, a menos que possam esperar um lucro razoável a partir do seu esforço.408

Desse modo, as vantagens jurídicas que o titular da patente possui sobre outras empresas concorrentes são justificadas sob o argumento de que são necessárias para assegurar o investimento realizado pelos inventores, bem como de toda a estrutura que se organizou no sentido de buscar as melhorias tecnológicas e de produção.

Ainda sob esse fundamento, depreende-se que também a coletividade irá se beneficiar da proteção jurídica da Propriedade Industrial, pois esta será vista como instrumento a serviço do bem-estar social, conferindo vantagens, não somente ao empresário que lhe detém a titularidade, mas também a toda a coletividade, seja pelo constante incentivo a novas tecnologias ou pela disponibilidade do conhecimento gerado por meio da publicidade dos depósitos.

Existem, desse modo, segundo Ascarelli, duas visões distintas no universo das patentes quanto às finalidades de sua concessão: uma, identificando-as como estímulo ao trabalho individual, pelo que o inventor teria acesso à tutela jurídica como meio para continuar produzindo, e outra, pela qual haveria interesse público no estímulo ao progresso tecnológico e científico.409

Consolidam-se, dessa maneira, duas bases distintas, relacionadas entre si, quanto à proteção dos bens da Propriedade Industrial. A primeira, cujos interesses públicos predominam, ligada à existência de estímulos individuais à inovação, voltada para o desenvolvimento econômico e social, e outra individual, eminentemente privatista, que permite ao seu titular a exclusão de terceiros que queiram se apropriar indevidamente desses bens.

A tensão com o Direito da Concorrência se traduz na dicotomia entre o incentivo estatal à exclusividade temporária reconhecida aos bens da Propriedade Industrial e as garantias, também estatais, organizadas para a coibição da dominação de mercados, bem como na manutenção das liberdades de iniciativa e concorrência, cujas bases constitucionais elevam-nas à condição de garantias fundamentais.

408 Tradução própria do original de LEMLEY, Mark. In a private market economy, individuals will not invest sufficiently in invention or creation unless the expected return from doing so exceeds the cost of doing so - that is, unless they can reasonably expect to make a profit from the endeavor. A new balance between IP and Antitrust

(April 1, 2007). Southwestern Journal of Law and Trade in the Americas, p. 3.

409 cf. ASCARELLI, Tullio. Teoría de la Concurrencia y de los Bienes Inmateriales. 3 ed. Barcelona: Bosch, 1970, p. 276.

Os conflitos entre a Propriedade Industrial e o Direito da Concorrência se estabelecem, em virtude da dificuldade em harmonizar a exploração dos bens incorpóreos protegidos pela primeira, e a finalidade precípua das leis antitruste, que visam proteger a concorrência e o processo competitivo, impedindo certos tipos de condutas que interrompam o mercado livre.410

Tal fato está relacionado com a possibilidade da Propriedade Industrial ser utilizada como “fachada para encobrir cartéis, ou restringir a concorrência entre tecnologias que apresentem produtos que se substituem ou quando surgem como meio de exclusão de novas tecnologias do mercado.”411

Nesse sentido, aventa-se a hipótese de que a exploração dos bens da Propriedade Industrial poderia gerar uma relação de poder ao seu titular, especialmente pela possibilidade de controle do mercado dos bens que oferta, seja em relação a um concorrente específico, ou a todos inseridos no mesmo universo econômico. A exclusividade jurídica que lhe foi outorgada pelo Estado poderia ser utilizada indevidamente como instrumento para restringir o acesso de terceiros aos bens, objeto dessa proteção, permitindo-lhe cobrar preços muito acima dos custos marginais, ou mesmo impor limites contratuais indevidos.

Vale lembrar que a cobrança de preços muito acima dos custos marginais, ou custo de produção, no caso específico dos bens da Propriedade Industrial, não pode ser considerada, por si, uma violação da concorrência, pois os consumidores, em muitos casos, aceitam de forma voluntária pagar valores muito superiores por uma tecnologia mais avançada em detrimento de outras similares, ou por um determinado produto representado por uma determinada marca que lhes confere um status social, se comparado com outros produtos despidos de marcas registradas ou cuja utilização não lhe satisfaz o interesse subjetivo.412

É relevante citar que independente da discussão sobre a cobrança de preços abusivos ou mesmo da forma que venha a ser caracterizado, o ilícito concorrencial, quando tem por premissa o abuso de exploração da Propriedade Industrial, é capaz de gerar consequências negativas, tanto aos empresários que pretendem participar do mercado, quanto aos consumidores em geral.

Tal fato ocorre, principalmente quando da análise dos custos sociais, decorrentes da exclusividade da exploração de determinadas invenções, e mesmo da forma como são exploradas por seus titulares.

410 cf. LEMLEY, Mark. Antitrust law protects competition and the competitive process by preventing certain types of conduct that threaten a free market. p. 5.

411 MONTEIRO, Luis. Ibidem, p. 33.

412 Nesse sentido, destaca TOLENTINO, Claudia: “Sabemos que as emoções que relacionam pessoas a marcas não estão somente ligadas a experiências reais com o desempenho dos produtos ou dos serviços cujo sinal visa distinguir. Boa parte dos motivos que explicam a construção de uma marca forte não é palpável. As pessoas amam as marcas mais do que gostam dos produtos por ela assinalados. Ibidem, p. 45.

Para garantir o bem-estar social, tanto na esfera privada, quanto na esfera pública, o Estado oferece diferentes formas de regulamentação, que não se mostram incompatíveis, mesmo que sua aplicação possa se voltar para aspectos distintos. No caso da Propriedade Industrial, a intervenção estatal ocorre na esfera privada, “pois o dano decorrente de uma atividade ilícita atinge o detentor da inovação ou o seu concorrente. No segundo caso (antitruste), o interesse tutelado é de natureza pública, pois a atividade ilícita ou a alta concentração pode gerar efeitos no mercado.”413

Vale ressaltar que, mesmo com essas atuações diversas, a exploração dos bens da Propriedade Industrial pode, “eventualmente, configurar um elemento muito importante para o julgamento de atos de concentração e condutas entendidas como infrações à ordem econômica,”414 uma vez que o ato infracional não está na Propriedade Industrial em si, mas na forma como seu titular se comporta perante os seus concorrentes.

Para Rosenberg, a tensão que envolve a proteção conferida aos Direitos da Propriedade Industrial “decorre do mau emprego – do ponto de vista do direito antitruste – do termo

monopólio no contexto da aplicação da legislação de proteção da propriedade intelectual, e dos

mal-entendidos decorrentes da utilização inapropriada.”415

Ainda, deve-se entender que a tutela conferida à Propriedade Industrial também é um instrumento de criação e manutenção da concorrência. Para Carvalho, “em vez de gerar monopólios, a propriedade industrial propicia aos comerciantes e aos industriais a possibilidade de competir. Portanto, em última análise, a propriedade industrial e o direito da concorrência são duas faces da mesma moeda.”416

Essa comparação somente é possível pelo fato de que, sob a perspectiva econômica, a existência de diferentes tecnologias e de um sistema que permita aos seus titulares explorá-las, em retribuição ao processo criativo, significa um estímulo à própria concorrência, tal como ressalta Salomão Filho: “já vai longe o tempo em que se acreditava que marcas e patentes conferiam verdadeiro monopólio no sentido econômico.”417

413 BRANCHER, Paulo. Ibidem, p. 73.

414 CAPUCIO, Camilla e MELO, Renato Dolabella. Remédios concorrenciais e propriedade intelectual. in OLIVEIRA, Amanda Flávio de; RUIZ, Ricardo Machado (coord.) Remédios antitruste. São Paulo, Singular: 2011, p. 211.

415 ROSEMBERG, Barbara. Considerações sobre Direito da Concorrência e dos Direitos de Propriedade Intelectual. in ZANOTA, Pedro e BRANCHER (org.) Desafios atuais do Direito da Concorrência. São Paulo: Singular, 2008, p. 174.

416 CARVALHO, Nuno. Ibidem, p. 57.

Veja-se que em nenhum momento a limitação de comercialização ou exploração de uma determinada tecnologia impede os concorrentes de constituírem outras de mesma classe, com técnicas diferentes.

Desse modo, deve-se reconhecer que o direito de exploração exclusiva sobre os bens da Propriedade Industrial não pode ser considerado como um monopólio econômico propriamente dito, até mesmo porque foge às definições clássicas, no sentido de haver apenas um único agente responsável pelo fornecimento de um produto específico.

É fato que inexiste monopólio econômico, pois o sistema de proteção conferido pela Propriedade Industrial permite a existência de concorrência entre diferentes processos tecnológicos. Não se trata de uma relação de proteção de um bem classificado como um objeto estático da produção em si, mas de uma relação dinâmica, que propicia o desenvolvimento da própria concorrência entre diferentes agentes.

A existência de um direito à exploração exclusiva de uma tecnologia, de um sinal distintivo, é na verdade um meio de tutelar a concorrência, pois incrementa a disputa entre os empresários, no sentido de buscar sempre melhores produtos, o que indiretamente gera benefícios sociais, justamente na concepção de métodos e produtos cada vez mais eficientes. É inegável concluir que, tanto as legislações de defesa da Propriedade Industrial, quanto as do Direito da Concorrência encontram elementos de convivência e compatibilidade, na promoção da eficiência econômica e social, promovendo a integração de interesses empresariais, consumeristas e públicos.418

Esse, inclusive, é outro elemento de conexão entre a Propriedade Industrial e a concorrência, pois a garantia jurídica da preservação da lealdade concorrencial permite o crescimento econômico, cuja expansão, em regra, também promove o desenvolvimento social, e a busca pela eficiência implica, quase sempre, em melhorias tecnológicas.

Haverá, portanto, instrumentos de bases constitucionais para garantir, tanto a exploração dos bens da Propriedade Industrial, quanto a preservação da concorrência, justificando inclusive eventual intervenção pública para regulamentar essa exploração, ou até mesmo impedi-la, desde

418 Nesse sentido Barbara Rosenberg mantém a mesma conclusão: Se por um lado, a exclusividade na exploração dos direitos de propriedade intelectual pode mitigar a concorrência estática e criar ineficiências alocativas que resultam em custos sociais, por outro lado essa exclusividade tem efeitos positivos, em termos de eficiência dinâmica, na medida em que estimula a concorrência pela inovação. Diante disso, pode-se afirmar, portanto, que os direitos da propriedade intelectual e o direito concorrencial perseguem a promoção do bem-estar social, ainda que por meios diversos. Patentes de Medicamentos e Comércio Internacional: os parâmetros do Trips e do Direito Concorrencial para a outorga de licenças compulsórias, p. 174-175.

que fundamentada na proteção social, seja em benefício da liberdade de iniciativa ou da proteção ao consumidor.419

Nesse sentido, referindo-se ao interesse social e ao desenvolvimento tecnológico, Ferreira Filho comenta:

Esta referência é inovação do texto em estudo. Quer dizer que o legislador, na estipulação do privilégio temporário, deverá levar em conta o interesse da sociedade brasileira e do desenvolvimento tecnológico e econômico do País. Isso não significa que o legislador possa em determinados casos abolir o privilégio, que só pode ser perdido se o inventor tiver a sua invenção expropriada conforme se apontou acima. Todavia, o prazo, quer dizer, o elemento temporal do privilégio pode ser estendido ou reduzido, levando-se em conta o interesse social ou o desenvolvimento tecnológico e econômico do País.420

Destaca-se que é nítida a conexão de interesses jurídicos tutelados que envolvem a prática de ilícitos concorrenciais e de violações da Propriedade Industrial, cujos preceitos sancionadores calibram-se com as normas constitucionais de proteção da propriedade e da ordem econômica.

O que gera a desarmonia nesse sistema é a prática abusiva de direitos que, no caso das relações concorrenciais e da Propriedade Industrial, pode ser entendida como sendo “a conduta perpetrada por um determinado agente detentor de um direito subjetivo ou outras prerrogativas garantidas no ordenamento jurídico, que dele se utiliza além das fronteiras e objetivos para os quais foi institucionalizado pelo corpo social.” 421

Assim, somente é possível falar em conflito entre a tutela conferida aos bens da Propriedade Industrial e relações que se estabelecem de proteção da concorrência, quando for constatada a prática de atos abusivos em detrimento das relações harmônicas entre os empresários.

419 Quanto essa intervenção na ordem econômica, destaca Eros Roberto Grau: “A introdução, no nível constitucional, de disposições específicas, atinentes à conformação da ordem econômica (mundo do ser), não consubstancia, em rigor, uma ruptura dela. Antes, pelo contrário, expressa – como venho afirmando – o desígnio de se aprimorar, tendo-se em vista a sua defesa. A ordem econômica (mundo do dever-ser) capitalista, ainda que se qualifique como intervencionista, está comprometida com a finalidade de preservação do capitalismo. Daí a feição social, que lhe é atribuída, a qual, longe de desnudar-se como mera concessão a um modismo, assume,

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