• Nenhum resultado encontrado

1 INTRODUÇÃO

2.4 ASPECTOS TÉCNICO-ECONÔMICOS, CONJUNTURAIS E GEOPOLÍTICOS

2.4.9 Conjuntura e geopolítica

2.4.9.1 Conjuntura

O controle de recursos e reservas de minerais estratégicos e fontes de energia tem sido alvo de políticas desenvolvimentistas de diversos países ao redor do mundo há séculos, mais especificamente do século XVIII até metade do XIX. Com a Revolução Industrial, houve o desenvolvimento de novos meios de industrialização, de produção em massa e de processos de geração de energia, de modo que esse interesse estratégico teve um aumento considerável (HOBSBAWM, 1997). Nesse sentido, os países que possuem e administram seus recursos estratégicos detêm o controle das matérias-primas indispensáveis ao desenvolvimento da indústria moderna contemporânea.

Assim, países/jurisdições que possuem essa vantagem competitiva podem lograr grande poder de barganha nas negociações comerciais internacionais. Isso porque a dependência industrial de determinado produto, aliada ao monopólio comercial do produto final (produto acabado), culmina no controle dos preços e na circulação de produtos no mercado. Os ETR, que são considerados estratégicos para qualquer nação, especialmente as desenvolvidas e em desenvolvimento, vêm se tornando fonte de disputas comerciais e são pauta estratégica em muitos países. A crescente demanda por esses elementos provenientes de bens minerais estratégicos tem preocupado algumas nações no que toca à disponibilidade desses insumos no mercado, uma vez que a China figura como principal detentora de sua produção e tem tomado atitudes preocupantes no sentido de restringir o acesso das demais nações a essas matérias-primas, por meio da imposição de cotas, taxas de exportação e outros instrumentos de restrição no comércio internacional.

O expressivo aumento do consumo interno da China, decorrente do crescimento da economia do país, a necessidade emergente de energias limpas (fato que contribui muito para o aumento da demanda por produtos à base de ETR) e os impactos ambientais das atividades da cadeia produtiva dos ETR estão entre os motivos alegados pelo governo chinês para programar crescentes restrições, que começaram a ser impostas pela China em 2005. Esse fato provocou elevação dos preços internacionais de compostos de ETR. Entre 2005 e 2010, as quantidades autorizadas pelo Ministério do Comércio chinês para a exportação desses elementos

sofreram quedas expressivas. Entre 2009 e 2010, a queda foi de quase 40%, passando de 48.000 toneladas em 2009 para apenas 30.258 toneladas em 2010, quantidade mantida praticamente inalterada nos anos seguintes.

Além das cotas de exportação, as empresas mineradoras de terras-raras estão sujeitas a licenças para exportação expedidas pelo Ministério do Comércio chinês. Desde 2006, a China vem reduzindo o número de companhias licenciadas por meio da adoção de regras de licenciamento e de regulações ambientais mais duras. Segundo o Serviço de Pesquisa do Congresso norte-americano, em 2006, 47 empresas chinesas e 12 joint ventures receberam licenças de exportação. Em 2011, o número de empresas licenciadas de capital exclusivamente chinês caiu para menos da metade (22) e foram licenciadas 9 joint ventures. Na primeira rodada de alocação de cotas de exportação em 2012, o governo assegurou cotas para 9 empresas e 17 deveriam esperar por resultados de inspeção ambiental. Em maio de 2012, as cotas provisionais dessas empresas foram aprovadas, totalizando, assim, entre empresas de capital chinês e joint ventures, 26 empresas de terras-raras a receberem licenças de exportação em 2012, número inferior ao de 2011 (MORRISON; TANG, 2012). A regulação do mercado de terras-raras chinês inclui, ainda, as tarifas de exportação. Essas tarifas variam, atualmente, de 15% a 25%. Em 2007, elas foram estabelecidas em 10% e eram aplicadas a menos itens.

Um exemplo claro do que a política de cotas de exportações de TR da China provocou no mercado foi presenciado nos preços dos OTR com pureza superior a 99%: eles aumentaram quase seis vezes, no caso do európio, e até mais de 30 vezes, no caso do samário, entre os anos de 2009 e 2012. Os aumentos dos preços dos óxidos de neodímio e de disprósio foram superiores a 12 vezes nesse mesmo período: o óxido de neodímio saiu de 19 US$/kg em 2009 para 234,40 US$/kg em 2011. A dependência mundial em relação à produção chinesa preocupa principalmente os países com plataformas industriais avançadas, intensivas no uso de alta tecnologia. Especialmente o Japão, que importou, em 2012, 82% de sua demanda de ETR da China, o que equivale a cerca de 40% das exportações chinesas. Já os Estados Unidos importaram outros 18% do que os chineses produziram (BRASIL, 2013). Outros países se destacam na importação desse setor: Alemanha, França, Áustria, Estônia, China, Coreia do Sul, Brasil, Canadá e Rússia.

Diante dessas movimentações, em 2012 os EUA, a Europa e o Japão denunciaram a política de cotas de exportação impostas pela China na Organização

Mundial do Comércio (OMC). Essa organização deu parecer favorável aos países denunciantes, pedindo ao governo chinês o encerramento de tais cotas. Em dezembro de 2014, a China encerrou a política de cotas de exportação para ETR; no entanto, especialistas garantem que a regularização do suprimento e a estabilização dos preços de ETR não deverão ocorrer no curto prazo (PAUL, 2015).

Além disso, a China é também a principal detentora da tecnologia e da infraestrutura industrial necessária para atuar em todas as fases da cadeia produtiva de ETR. Fora da China, atualmente, apenas a Austrália e a Malásia possuem projetos com os pré-requisitos ambientais e comerciais aprovados para isso (PATRIOTA, 2015). A norte-americana Molycorp Inc., que já tinha retomado a produção de terras-raras em 2010 (as atividades haviam sido paralisadas em 2002 por conta de acidente ambiental), teve seu retorno foi saudado, por alguns, como um passo em direção à independência americana no que tange às terras-raras. A Molycorp Inc. começou a planejar e construir sua infraestrutura para processar o minério de terras-raras de sua mina em Mountain Pass. No entanto, com a queda dos preços das terras-raras ao longo dos últimos 4 anos e problemas com endividamentos, a companhia se viu com grandes dificuldades para se manter em operação. Assim, foi necessário o pedido de recuperação judicial da Molycorp Inc., anunciado em agosto de 2015 (JAMASMIE, 2015).

Um dos principais motivos apontados por analistas do setor para a crise da Molycorp foi o fato de 98% da composição das reservas de sua mina ser constituída de cério e lantânio, que já eram dois dos ETR com os mais baixos valores de mercado e tiveram seus preços depreciados em cerca de 80% nos últimos 4 anos; a isso se somam, é claro, as dívidas acumuladas com credores. Os Estados Unidos possuem histórico de envio de terras-raras pesadas por meio da Molycorp às suas instalações na China para transformação e agregação de valor, incluindo a instalação de Magnequench, por meio da aquisição da empresa Neo Material Technologies. A China detinha uma participação de 62% na Neo Material Technologies no momento da aquisição da Molycorp em 2012. Assim, a nação americana encontra-se em situação de grande dependência da China para materiais de ímãs de terras-raras, e agora a exportação de ativos de terras-raras dos EUA para a China irá intensificar essa dependência, pelo menos por mais alguns anos (SCHUESSLER, 2014).

São várias as especulações sobre as reais razões que levaram a China a restringir as exportações de terras-raras nos últimos anos. A competição com o Japão tem sido citada como um dos principais motivos. A forte dependência do Japão em relação à produção chinesa, haja vista o país não possuir reservas desses elementos, tem levado empresas japonesas de alta tecnologia fabricantes de produtos que utilizam terras-raras a se instalarem na China, agregando valor ao território chinês e nele gerando empregos. Outra razão para a restrição da exportação de terras-raras pelos chineses seria o aumento da demanda do país e a política de formação de estoques adotada pelo governo, especialmente de terras- raras pesadas. O aumento da demanda seria resultado da atração de empresas de tecnologia em território chinês à procura de um suprimento estável e mais barato de terras-raras, e da implementação de uma estratégia “verde”. A China anunciou, em 2010, que sua indústria automobilística deverá fabricar um milhão de veículos elétricos e híbridos nos próximos anos. Um dos planos anunciados recentemente pelos chineses, para o período de 2010 a 2020, é de ter 330 GW de eletricidade eólica instalada, o que representa três vezes a potência total instalada no Brasil (LIFTON, 2012).

Considerando que a questão ambiental foi a principal justificativa dos chineses para a restrição às exportações, nesse contexto há diretrizes para o desenvolvimento dos recursos minerais (2009–2015) publicadas em 2009 pelo governo chinês. O documento, que estabelece as normas para a proteção e o uso racional dos recursos naturais chineses para o período mencionado, define as terras-raras, o tungstênio e o antimônio como commodities minerais protegidos, o que significa estarem sujeitos ao estrito controle do governo. O compromisso assumido pela China de combater a poluição e reduzir as emissões de carbono levou ao fechamento de minas que não atendiam aos requisitos ambientais e à suspensão de licenças para mineração de terras-raras até 2012.

Especialistas consideram que o governo chinês está na direção correta e avançou na questão ambiental associada à mineração de terras-raras. Outro fato a ser considerado é a política recente do governo central de racionalização e reestruturação de sua indústria mineradora de terras-raras, de forma a torná-la mais eficiente e lucrativa, concentrando toda a cadeia de produção em grandes empresas, o que também provocou o fechamento de minas de pequeno porte (LIMA, 2012). O Ministério da Indústria e Informação Tecnológica (MIIT) é o responsável

pelo plano de desenvolvimento que tenta reorganizar a indústria dos ETR (WÜBBEKE, 2013). Contudo, o Estado tem enfrentado queixas não só internacionalmente, mas principalmente no âmbito interno, pois não houve plena aceitação das medidas por parte dos produtores e governos locais chineses.

A situação se torna mais problemática porque é fato que as políticas nacionais são realmente implementadas quando aplicadas localmente, e é o que ocorre na China devido ao importante papel das províncias e subprovíncias no setor industrial ao controlarem e supervisionarem as licenças relativas às empresas mineradoras (PATRIOTA, 2015). Essa descentralização do controle do governo central se originou no período entre 1956 e 1978, quando houve reconfiguração das empresas estatais, as quais saíram do controle do governo central para serem administradas por governos locais como prefeituras e províncias (LEITE, 2011, p. 109). Apesar dos esforços do Estado para centralizar o parque industrial de mineração de terras-raras, ele continua fragmentado e dividido entre o governo central, as províncias e algumas empresas privadas (WÜBBEKE, 2013). Vale salientar que os problemas com o contrabando, que influenciam a tentativa de regulação das exportações, continuam.