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Consequências do abuso sexual para a criança e para o adolescente

O abuso sexual infantil à luz dos direitos humanos das criancas e adolescentes

5.3 Consequências do abuso sexual para a criança e para o adolescente

O meio cultural, no qual estamos inseridos, condena em qualquer circunstância o abuso sexual infantil. Compreende-se que há uma lei moral e cultural que impede tal ato, além é claro de leis positivadas que proíbem o abuso sexual em crianças e adolescentes. No entanto, quando essa lei cultural ou moral, na qual a sociedade está enquadrada, é violada, isso por si só já causa prejuízo para a criança ou adolescente vítima de abuso. Nesse tópico pretende-se discutir as consequências do abuso sexual infantil nas crianças e adolescentes vítimas de tal ato e como isso afeta o seu desenvolvimento humano.

As consequências do abuso sexual infantil, conforme afirma Trindade e Breier (2013, p. 81), dependem de alguns fatores e podem surgir a curto ou a longo prazo. Infere-se com isso que as consequências traumáticas vivenciadas pela criança ou adolescente depende do tipo de agressão que sofreu, a diferença entre a idade do agressor e a idade da vítima, o tipo relação que havia entre abusador e vítima, também é apontado como um dos fatores que influenciam nas consequências do abuso. Outros fatores também são retratados como a duração e a frequência dos abusos e um aspecto mais subjetivo que é a personalidade da vítima e o meio em que ela vive. Para além dessas questões objetivas, que são importantes, enquanto indicadores das consequências que um abuso pode ocasionar, é importante também trazer à luz que “várias são as formas e manifestações da violência praticada contra a criança e, onde a violência se faz presente, a cidadania, assim como princípio constitucional da dignidade humana estão atingidos e dilacerados” (AZAMBUJA, 2011, p. 59). Assim a autora corrobora com a lição de Ingo Sarlet

[...] onde não houver respeito pela vida e pela integridade física e moral do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde não houver limitação do poder, enfim, onde a liberdade e a autonomia, a igualdade (em direitos e dignidade) e os direitos fundamentais não forem reconhecidos e minimamente assegurados, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana e esta (a pessoa), por sua vez, poderá não passar de mero objeto de arbítrio e injustiças. (SARLET, 2001, p. 59)

O abuso sexual fere a dignidade da criança ou do adolescente de modo severo, pois a transforma em um objeto, fazendo com que a vítima pense que ela perdeu sua condição de sujeito de direitos, e a partir de então outras consequências vão surgindo. Retomando o que anteriormente foi desenvolvido que é a ideia do segredo, as vítimas quando conseguem enfrentar seus medos, expondo o abuso sofrido, “sentem-se, de alguma forma aliviadas do peso do segredo.

Podem encontrar pela frente credibilidade e proteção, mas também podem se deparar com descaso” (SANTOS, PELISOLI; DELL’AGLIO, 2012, p. 63).

Nesse sentido, quando elas encontram a proteção, têm assegurado sua dignidade, mas ao contrário, quando sua revelação é recebida com descaso ela sofre mais uma violação, sendo que nesse momento é a sua dignidade que enquanto ser humano que está sendo violada e mais uma vez se sente coisificada. Uma característica interessante de salientar é a de que as crianças que são protegidas quando revelam o segredo do abuso, as manifestações mais notórias tendem a desaparecer, pois isso faz com que a criança o adolescente reencontre o interesse por si (FLORENTINO, 2015, p. 142).

Quando a criança ou adolescente é vítima de abuso sexual pode vir a desenvolver algumas patologias, o que não nos cabe aqui discutir exaustivamente cada uma dela, mas apenas apresentar ao que estão sujeitos as crianças e adolescentes vítimas de abuso sexual. Essa situação abusiva pode desencadear algumas psicopatologias.

A principal delas é o transtorno de estresse pós-traumático, que envolve revivência do trauma, reatividade fisiológica e estratégias de esquiva [...], transtornos de ansiedade também são comuns, assim como alterações de humor, como a depressão. Em se tratando de consequências a longo prazo, alguns autores apontam que a maioria das pessoas que apresentam personalidade

boderline foram sexualmente abusadas na infância, o que indica

que esse evento é um grande risco para o desenvolvimento dessa patologia [...] (SANTOS, PELISOLI; DELL’AGLIO, 2012, p. 63) Que o abuso sexual infantil causa impacto na criança é fato indiscutível, no entanto, se o impacto é negativo ou prejudicial é algo que alguns poucos pesquisadores tem discutido. Os estudos justificam que o maior dano é causado pelo adultos e profissionais, do que propriamente o abuso em si. Afirmam que quando os adultos ficam sabendo do abuso a reação deles é a responsável pelo trauma que é verificado na criança. Muitos pedófilos afirmam que as crianças são seres que tem curiosidade sexual, por isso não é

prejudicial, quando é feito com carinho e gentilmente (SANDERSON, 2008, p. 168).

Essa ideia de que o abuso não é prejudicial para a criança refutamos completamente, pois como já percebemos a criança e o adolescente, são seduzidos, com promessas, para que aceitem as investidas do abusador, além de sobrepor à criança e o adolescente o fato de manter em segredo tal abuso. Diante disso é inconcebível qualquer posicionamento positivo quanto ao abuso sexual infantil.

O impacto causado pelo abuso sexual é inquestionável sendo que não se restringe apenas ao impacto sexual, mas também psicológico, social e emocional. De fato, a maneira com a qual é recebida a revelação do abuso pode gerar uma revivência do trauma, mas isso não é fundamento para que o abuso continue ocorrendo. Dobke descreve os danos que sofrem as vítimas de abuso sexual

O abuso sexual causa nas vítimas danos primários e secundários. Por dano primário, compreende-se o dano causado pelas etapas de desenvolvimento do abuso, ou seja, pela fase da sedução, de interação sexual abusiva e do segredo, que adiante serão consideradas. Dano secundário é aquele causado por fatores diversos e subsequentes ao abuso.

O dano secundário e a vitimização das crianças que sofreram abuso sexual acontecem e níveis distintos, quais sejam: 1) estigmatização social; 2) traumatização secundária no processo interdisciplinar; 3) traumatização secundária no processo família-profissional; 4) traumatização secundária no processo familiar; 5) traumatização secundária no processo individual. (DOBKE, 2001, p. 23)

A autora segue afirmando que a preocupação com os danos secundários atinge níveis internacionais, pois a ONG Childline, por meio da responsável por crianças violentadas, Gaby Cloete, destacou a importância de da celeridade processual nesses casos de abuso, com o mínimo de dano nas vítimas, com o intuito de minorar a revitimização. Cloete salienta que a justiça ainda tem muito no que avançar nesses julgamentos, pois a maneira de questionar as

crianças e adolescentes deve ser de modo que evite outros traumas (DOBKE, 2001, p.23).

A vítima é o personagem central de toda essa situação que envolve o abuso sexual, primeiro por ser criança ou adolescente ela tem (deveria ter) a proteção integral de quaisquer que fossem os atos cometidos contra ela. Quando acontece o abuso há uma falha em relação a essa vítima que não deve perpetuar, os profissionais devem ter muito cuidado ao lidar com essas situações para que se evitem rotulações que podem dificultar o tratamento terapêutico da vítima. Com o intuito de conseguir o seu intento, não raras vezes o abusador ameaça dizendo que vai matar a mãe, ou a própria vítima, diante disso a criança acaba tendo medo de que as ameaças se concretizem e segue sendo abusada (SANTOS, PELISOLI; DELL’AGLIO, 2012, p. 63).

Conforme Borges e Dell’Aglio (2012, p. 94-95) o desenvolvimento da criança vítima de abuso sexual pode ser comprometido e há uma série de manifestações de alterações emocionais, comportamentais, sociais e cognitiva, bem como pode desencadear dificuldades de concentração e isolamento social, incluindo inclusive, até quadros psicopatológicos severos, necessitando de intervenções com profissional comprometido que minimizem as consequências causadas. Segundo as autoras problemas de ajuste social é comumente observado em crianças que sofreram abuso, além de quadros de comorbidade são frequentemente associados às vítimas podendo entre eles ideações suicidas, psicose, transtorno de ansiedade generalizada, entre outros.

Tantos casos em que o abuso foi revelado ou que hajam suspeitas é necessário que a criança ou adolescente passe por exame pericial. Nesse momento que inicia o trabalho interdisciplinar de diversos profissionais das mais variadas áreas de atuação como por exemplo, profissionais da saúde (médicos e psicólogos), da educação, da assistência social, além de autoridades policiais e do sistema judicial (Ministério Público, Defensoria Pública, Advogados e Poder Judiciário). A proposta dessa interdisciplinariedade é

atenuar o máximo possível os problemas que interferem no atendimento da criança ou adolescente.

A criança deve ser reconfortada e ser conscientizada de que ela é sujeito e não objeto da ação sofrida, ou seja, apesar do processo de vitimização sofrido, existem recursos internos que podem ser explorados. Além disso, importa esclarecer que o adulto agressor manipulou e agiu contra a criança, fez uma contravenção à lei, e que todos os profissionais estão presentes e dispostos a ajudá-la a encontrar a melhor alternativa. (NEVES et al, 2010, p. 108) É notório que o impacto causado pelo abuso sexual em crianças ou adolescentes implica em sérios problemas comportamentais, psicológicos, cognitivos e sociais, que se não tiverem um atendimento adequado, podem levar para a vida adulta prejudicando ainda mais o seu relacionamento com outras pessoas, seja com filhos, cônjuge e até mesmo pessoas alheias a essa trama do abuso. Devida a violação aos direitos das crianças e dos adolescentes que nos cabe então analisar como está regulamentada a proteção das crianças e adolescentes nos órgãos nacionais e internacionais.

5.4 Direitos humanos das crianças e a proteção contra a