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A educação superior brasileira nas últimas décadas se expandiu em um contexto de grandes contradições. A partir dos anos 2000 houve um aumento expressivo nos recursos direcionadas para as IFES, principalmente após o REUNI, o que possibilitou a interiorização de muitas universidades para cidades de pequeno e médio porte. Esse movimento tem gerado o acesso de muitos estudantes que, historicamente, foram excluídos desse nível de ensino, principalmente após as políticas de cotas. Mas por outro lado e ao mesmo tempo, houve uma expressiva alocação de recursos públicos em IES privadas, através do FIES e PROUNI, o que fortaleceu a perspectiva privatizante da educação superior enquanto mercadoria.

De acordo com dados do censo da educação superior de 2018, o número de estudantes matriculados no ensino superior ainda é imensamente maior nas instituições privadas, evidenciando que a chamada democratização do acesso esteve voltada majoritariamente para uma formação barata nivelada por baixo; sem um verdadeiro compromisso com o tripé ensino, pesquisa e extensão e com a ausência de uma formação crítica, capaz de pensar soluções para a sociedade como um todo. Essa dinâmica tem possibilitado a manutenção da divulgação dos valores e da ideologia burguesa, ao mesmo tempo em que gera a formação da mão de obra necessária para o modo de produção predominante.

Nesse contexto, constatou-se que a assistência estudantil nas IFES teve muitos avanços nos últimos anos, sendo uma importante estratégia de combate à evasão e à retenção nas universidades federais. E a implementação do PNAES foi fundamental para fortalecer a assistência estudantil nas IFES, pois grande parte das universidades federais só passou a fomentar ações, de forma sistemática, voltadas à permanência dos estudantes em situação de vulnerabilidade social, com o advento dessa política de governo.

Observou-se que as ações de assistência estudantil na UFERSA só foram sistematizadas após a criação do PNAES, sendo similar à maioria das IFES brasileiras. Assim, com a regulamentação dos programas de apoio ao estudante, houve uma diversificação das ações, a partir de várias áreas: estruturou-se uma equipe mínima de assistência estudantil (Psicólogo, Assistente Social e Técnico Desportivo); criou-se os Restaurantes Universitários, ampliou-se a moradia estudantil para todos os campi, antes do PNAES só existia esse serviço no campus de Mossoró; passou-se a ofertar diversas modalidades de bolsas, estabeleceu-se várias atividades de esporte e aprovou-se o apoio financeiro para a participação em eventos.

Essas ações têm sido fundamentais para a permanência dos estudantes na UFERSA, mas percebeu-se que a operacionalização da assistência estudantil na instituição, assim como em outras IFES, tem alguns limites e contradições; houve uma expansão a partir do REUNI, mas não na mesma proporção do aumento da demanda, principalmente após a implementação da política de cotas. Os recursos financeiros destinados à assistência estudantil não são suficientes para atender aos discentes, em algumas situações são acessíveis apenas aos estudantes mais vulneráveis. Isto está relacionado com a macro política neoliberal que tem um forte caráter assistencialista.

Outro aspecto do PNAES que tem impacto no atendimento das necessidades dos estudantes da UFERSA é a definição de um público alvo prioritário (estudantes provenientes de escolas públicas e com renda per capita de até um salário mínimo e meio), o que evidencia uma focalização das ações para um grupo específico de discentes.

Além disso, observou-se que, assim como em muitas universidades, a assistência estudantil da UFERSA tem como características: a bolsificação, o curto tempo de vigência de muitas ações e a exigência de condicionalidades em grande parte das atividades realizadas, o que demonstra ser uma fragilidade da política. Percebeu-se ainda o uso da rotatividade dos estudantes assistidos como uma alternativa de atendimento a um maior número de discentes.

Constatou-se também que não há ações específicas para os estudantes cotistas, que têm características específicas e precisam ter atividades direcionadas para eles.

Verificou-se ainda que, apesar da existência de algumas tentativas de avaliação da política através de fóruns estudantis e questionários, estratégias muito importantes para direcionar as ações de apoio ao estudante, estas ainda não foram regulamentadas nas normativas que estruturam a assistência estudantil da UFERSA. E isso parece ser uma limitação presente na política como um todo, pois no PNAES não são mencionados meios de se fazer avaliação das ações desenvolvidas, deixa-se isso a cargo das IFES.

Constatou-se que não existe uma política de assistência estudantil na instituição pesquisada, o que pode fragmentar as atividades desenvolvidas e dificultar a organização de ações mais amplas de apoio ao estudante. E analisando o documento do PNAES, observa-se que não há elementos que apontem para a necessidade de criação de uma política institucional de assistência estudantil nas IFES.

Observou-se também que na assistência estudantil da UFERSA não há uma prática de levantamento de demandas entre os estudantes, para a definição das ações. Talvez não exista essa prática em virtude da sobrecarga de atividades dos profisisonais ou pela falta de uma cultura institucional que evidencie a importância dessa prática no cotidiano de trabalho. E ao que parece, isso pode ser uma prática presente no desenvolvimento do PNAES em nível nacional, o que pode ser um limitador no atendimento das demandas dos estudantes, pois pode estar gerando a oferta de atividades que não estão dentro das reais necessidades dos discentes.

Assim, a assistência estudantil tem se efetivado, em grande parte, com ações de transferência de renda, ou seja, os recursos são depositados diretamente nas contas do estudantes, que recorrem aos serviços privados para garantirem o suprimento de suas necessidades básicas, o que contribui para o processo de monetarização em substituição à

políticas de Estado de direito permanente, institucionalizadas em equipamentos na infraestrutura das IFES.

Além disso, o PNAES é operacionalizado de forma seletiva, focalizada e condicionada, uma lógica cada vez mais comum nas políticas sociais, mas que contraria uma perspectiva mais universalizante e de promoção de justiça social. Desse modo, as ações e programas de assistência estudantil têm se destinando apenas aos estudantes mais vulneráveis, evidenciando um processo de inclusão pela exclusão.

Percebeu-se também que o montante de recursos direcionados para a assistência estudantil não aumentou na mesma proporção dos estudantes ingressantes, por isso não são suficientes para garantir o atendimento das necessidades mínimas dos discentes. E, atualmente, tem-se observado uma redução dos recursos destinados ao orçamento das IFES, o que impede a ampliação do atendimento das demandas de assistência ao estudante, o aumento dos recursos humanos e a melhoria da infraestrutura das universidades federais.

Mesmo diante dos limites e contradições na operacionalização da assistência estudantil, ela é uma importante estratégia de permanência, pois tem possibilitado que muitos discentes concluam seus cursos de graduação. Por isso a importância da transformação do PNAES em uma política de Estado, que possa garantir estabilidade institucional para a continuidade dos programas e fortalecimento das ações de apoio ao estudante no ensino superior.

Em que pese a importância do PNAES, é necessário entender que este não vai resolver sozinho as desigualdades e opressões existentes no contexto universitário, porque esses problemas são decorrentes da questão social e não serão alterados somente por ele, necessitando de um conjunto de outras políticas (assistência social, segurança pública, saúde, mobilidade, etc.). Por isso, a permanência do estudante no ensino superior deve ser pensada e articulada a partir de diversas políticas – universais e intersetoriais.

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