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Considerações finais

No documento Estudo químico de chás brasileiros (páginas 104-178)

alguns chás brasileiros que apresentam atividade biológica.

Iniciamos o estudo fitoquímico de uma série de plantas que estão sendo estudadas pelo grupo da prof.ª Dr.ª Alba R. M. Souza Brito do IB/Unicamp e da prof.ª Dr.ª Clélia ª Hiruma- Lima do IB/UNESP-Botucatu, que frente a testes de atividade antiúlcera apresentaram resultados muito promissores quando comparados com os de drogas antiúlceras conhecidas. Assim, iniciamos o fracionamento dos extratos ativos com o objetivo de se detectar quais são os princípios ativos responsáveis pela atividade antiúlcera e conferir, posteriormente, se a atividade aumenta com os componentes puros ou se pode estar havendo algum efeito sinérgico nos extratos.

As plantas incluídas no estudo de plantas com atividade antiúlcera foram: Alchornea castaneifolia Willd A. Juss (Euphorbiaceae), Curatella americana L. (Dilleniaceae), Hancornea speciosa Gom. (Apocynaceae) e Quassia amara L. (Simaroubaceae), que apresentou também atividade antiinflamatória.

O FDA classifica as cascas de Quassia amara como narcótico e antipirético, duas características que sugeriam a existência de alguma atividade analgésica e antiinflamatória de seus componentes químicos (Germonsén-Robineau, 1998). Os extratos apolares, principalmente o hexânico, realmente apresentaram boa atividade analgésica. Os resultados dos testes de analgesia indicaram que a atividade do extrato hexânico é dose-dependente.

Duke (1992) relatou que a quassina já foi usada no tratamento do alcoolismo, apresentando propriedades farmacológicas semelhantes ao dissulfiram, um dos principais medicamentos para o tratamento de alcoolismo crônico. O dissulfiram diminui os níveis de substância P, um dos neurotransmissores responsáveis pela transmissão da sensação de dor (Hang et. al., 1997). Desse modo, o conhecimento da similaridade dos efeitos entre o dissulfiram e a quassina facilita a proposição de um modelo de ação para a atividade analgésica de Quassia amara.

Nossos resultados contradizem o uso popular de Q. amara, que é consumida como infusão para o tratamento de dores, pois o mesmo não é tão ativo como analgésico. Em geral, verificamos que os extratos mais polares apresentam baixa atividade analgésica (Toma et. al., 2002a - anexo).

Apesar de não apresentarmos os resultados dos testes antiúlcera, também foram realizados ensaios para avaliar esta atividade nos extratos hexânico, diclorometânico, etanólico e etanólico 70%. Destes extratos, apenas o extrato etanólico 70% não apresentou atividade

mecanismo de ação provavelmente está relacionado com a produção de prostaglandinas e de muco (Toma et. al., 2002b-anexo).

No Tocantins, região onde foram coletadas C. americana e H. speciosa, a população utiliza o chá das cascas dessas plantas para afecções gástricas. Em uma fase inicial de nosso trabalho preparamos os chás com 1g em 10 mL de água, proporção semelhante àquela usada pela população para verificar se exibia alguma semelhança na composição química entre a infusão e o extrato etanólico, uma vez que os ensaios antiúlcera de indometacina/betanecol realizados com os extratos etanólicos de ambas plantas, demonstraram atividade muito similar.

Também na fase inicial fizemos análises por HPLC-DAD dos chás de C. americana e H. speciosa, apresentando-se semelhantes, com picos com

t

R entre 6 e 21 min. Os espectros no UV

dos picos dos 2 cromatogramas indicam substâncias semelhantes, com tempos de retenção próximos e com espectros UV semelhantes. Além disso, eles concordam também com o

t

R = 9,3 min e o

espectro UV do padrão catequina-padrão.

De C. americana foi possível identificar a catequina (Ca4), e detectar alguns de seus derivados galato. Existem estudos biológicos comprovandos que a catequina e seus derivados, inclusive seus polímeros (os taninos condensados) apresentam atividades antiúlceras. Uma das principais atuações das catequinas nos sistemas vivos é a inibição enzimática. Elas inibem a ação da histidina descarboxilase, inibindo assim, a formação de histamina que é o sinal bioquímico para a produção do ácido clorídrico gástrico (Lewis et. al. 1991). Outra interação importante sobre o sistema enzimático é a inibição das cliclooxigenases, no processo de contração dos músculos lisos, em alguns processos antiinflamatórios, alérgicos e também gastrintestinais, pois essas enzimas catalizam a conversão de alguns ácidos graxos para a síntese de prostaglandinas, que são as substâncias responsáveis pela manutenção da integridade da mucosa gástrica (Harborne, 1993;. Lewis et. al. 1991). A medicina popular da Indonésia utiliza o chá das folhas de Artocarpus integra, ricas em catequinas, para o tratamento de úlceras e outra afecções gastrintestinais (Lewis et. al, 1991).

Foram detectadas outras atividades biológicas dos derivados de catequina. Eles apresentam atividade comprovada contra 11 tipos de vírus e notou-se que os mais ativos eram 3- hidroxilados. A (+)-catequina foi, dentre os derivados testados, a substância que apresentou a maior atividade contra os vírus da hepatite e apresentou também uma importante atividade hepato-protetora (Harborne, 1993).

Em C. americana também foram identificados os triterpenóides de esqueletos lupano, oleanano e ursano. Foi possível a identificação do ácido ursólico, ácido oleanólico e seus acetatos em

Ca1 e de betulinaldeido em Ca2. Ca3 contém uma mistura de betulinaldeído e ácido betulínico. Os triterpenos têm atividade bem conhecida nos mecanismos de proteção contra úlceras gástricas. Eles são excelentes estimulantes da síntese de muco, inibindo uma enzima redutase de prostaglandinas e permitem a manutenção de um alto nível de prostaglandina na mucosa gástrica. Outro mecanismo atribuído à ação dos triterpenos na proteção contra a úlcera é a inibição da secreção de pepsina (Lewis et al., 1991).

Alchornea castaneifolia apresentou resultados significativos nos ensaios biológicos antiúlcera, sendo que as folhas apresentaram resultados mais expressivos do que as cascas. Para Ac1 sugerimos uma estrutura bastante simples, parecida como um derivado de fluoroglucinol. Derivados de fluoroglucinóis podem apresentar dois anéis aromáticos ligados entre si por um grupo CH2.

Contudo, biossinteticamente a estrutura de Ac1 não apresenta correlação com aqueles de derivados de fluoroglucinóis,tendo em vista os padrões de oxigenação observados nos anéis de Ac1.

H. speciosa é uma das plantas utilizadas no tratamento de úlceras gástricas pela população do cerrado de Tocantins. Segundo Lewis et al. (1991) os efeitos antiulcerogênicos e antissecretor da catequina são atribuídos à ação inibitória da histidina descarboxilase. Contudo, o efeito inibitório comprovado da catequina à H+/K+-ATPase pode estar contribuindo na atividade, uma vez que esta enzima é essencial ao processo de secreção ácida no estômago.

Por testes químicos e pelos resultados da revelação com cloreto férrico da parte mais polar do extrato de H. speciosa, pudemos considerar positiva a presença de taninos, que possuem comprovada atividade antiúlcera (Lewis et al., 1991).

Avaliando-se os resultados obtidos e os dados da literatura, temos observado que existe uma relação entre a atividade antiúlcera e atividade antioxidante das substâncias. Flavonóides somam duas atividades de muito interesse para o ser humano: apresentam boa atividade antiinflamatória e são protetores da mucosa gástrica contra vários agentes ulcerogênicos. Normalmente, antiinflamatórios são agressores do estômago (DiCarlo et al.,1999). Notamos que grande parte das substâncias que encontramos como antiúlcera, catequinas, flavonóides, taninos, fenólicos em geral, são conhecidos pelas atividades antioxidantes, inclusive sendo possível estimar algumas atividades antiúlcera a partir de ensaios antioxidante. Os farmacologistas do grupo de pesquisa da prof. Souza-Brito tentam encontrar um mecanismo que justifique a proximidade dos resultados positivos para os dois tipos de atividade biológica.

No caso das espécies de Ilex, em levantamento bibliográfico foi encontrada a existência de muitos problemas no reconhecimento de Ilex paraguarienses com relação aos seus

feminino de I. paraguarienses.

Se as confusões ocorrem em uma espécie tão utilizada e tão importante comercialmente como I. paraguarienses, as demais espécies também devem apresentar grandes problemas de identificação. Assim, o nosso trabalho, além de ter o objetivo de revelar os componentes químicos de chás medicinais brasileiros, também pôde fornecer dados importantes para uma melhor identificação de espécies de Ilex.

Pelo levantamento bibliográfico sobre espécies de Ilex, encontramos relatado que I. dumosa (possível sinônimo de I. amara) apresenta em sua constituição 4 saponinas majoritárias derivadas do oleanano (Schenkel et al., 1995): o ácido 3β-O-α-L-arabinopiranosil-(1-2)-β-D- galactopiranosil-olean-12-en-28-óico (Ia4), o ácido 3β-O-β-D-glucopiranosil-(1-2)-β-D- galactopiranosil-olean-12-en-28-óico (Ia8 é o ursano), o ácido 3β-O-α-L-arabinopiranosil-(1-2)-β- D-galactopiranosil-olean-12-en-28-óico 28 -O-β-D-glucopiranosil éster (Ia10) e o ácido 3β-O-β-D- glucopiranosil-(1-2)-β-D-galactopiranosil-olean-12-en-28-óico 28-O-β-D-glucopiranosil éster (Ia5). Algumas dessas substâncias foram encontramos em I. amara, podendo reforçar a hipótese de sinônimos. Por outro lado, encontramos outras saponinas além dessas 4 e não apenas de esqueleto oleanólico, como também de esqueleto ursólico e ursólico-19α-hidroxilados, indicando que o estudo químico dessas plantas pode ser ainda mais aprofundado, fornecendo resultados importantes.

A saponina encontrada por Schenkel et al. (1995) em I. theezans, 28-O-β-D- glucopiranosideo do ácido rotúndico, não condiz com a que encontramos, substância It1. A diferença entre elas é que o açúcar de nossa molécula está ligado na posição 3. Mas, de um modo geral, com relação a I. amara, I. theezans é pobre em saponinas, sendo sua composição majoritária de triterpenos, principalmente ácido rotúndico.

As principais atividades biológicas de saponinas estão relacionadas com suas propriedades tensoativas, complexantes, hemolíticas e tóxicas. (Mahato et al., 1988)

A atividade hemolítica de saponinas e a atividade citotóxica dependem do número de monosacarídeos ligados à hidroxila em C-3. Quanto maior a cadeia sacarídica, maior será a citotoxicidade apresentada pela saponina. A relação entre estrutura, atividade hemolítica e efeito tensoativo de 5 derivados do ácido oleanólico foram estudadas, indicando que saponinas monodesmosídicas apresentam atividades hemolíticas mais acentuadas que as bisdesmosídicas. Assim, pôde-se concluir que a atividade hemolítica de monodesmosídeos diminui com o aumento do comprimento e o aumento das ramificações da cadeia sacarídica. A ação tensoativa é maior em bisdesmosídeos e aumenta com o comprimento da cadeia. Desse modo, concluímos que a

característica estrutural que potencializa a atividade hemolítica diminui a ação tensoativa e vice- versa (Mahato et al., 1988).

Os resultados da atividade hemolítica realizada em nosso trabalho concordam com a tendência apresentada por Mahato et al. (1988) sendo que as dissacarídicas na posição 3 apresentaram atividade mais intensa, enquanto que as trissacarídicas menos intensa. Notamos que as duas saponinas com açúcar acetilado não apresentam atividade. Segundo a tendência que apresentamos, as saponinas mais polares não apresentam atividade hemolítica. Assim, podemos justificar o motivo pelo qual as saponinas extraídas com metanol apresentam atividade hemolítica, enquanto que as extraídas por infusão, obviamente com cadeias sacarídicas mais longas e ramificadas, não.

As saponinas, de um modo geral, são altamente tóxicas quando aplicadas intravenosamente. No entanto, quando administrada oralmente os efeitos tóxicos são bem mais baixos (Mahato et al., 1991), felizmente, a toxicidade diminui por via oral, uma vez que consumimos muitos alimentos ricos em saponinas, como o mate, uma das principais bebidas dos moradores do sul do Brasil e Argentina.

A toxicicidade mais baixa para as saponinas ministradas oralmente permite que o uso de plantas medicinais seja uma boa alternativa para a ingestão dessas substâncias. Como exemplo, observou-se redução na taxa de colesterol e triglicerideos no soro sanguíneo de ratos alimentados com alfafa (Medicago sativa), que apresenta diversas saponinas derivadas do ácido zânico, que difere do esqueleto oleanano por uma hidroxila na posição 22 (Mahato et al., 1991; Kalac et al.,1996).

Outra atividade muito importante de saponinas, muito utilizada, principalmente por países com problemas de saneamento, é a molusquicida. No combate da esquistossomose, tenta-se encontrar substâncias que combatam o caramujo aquático, hospedeiro do esquistossoma. Saponinas derivadas do ácido oleanólico, monodesmosídicas, mostraram atividade molusquicida (Treyvaud et al., 2000). Saponinas bisdesmosídicas não apresentam atividade no extermínio dos caramujos (Mahato et al., 1991; Treyvaud et al., 2000). Dessa forma, é possível pressupor que algumas saponinas encontradas em espécies do gênero Ilex possuam tal atividade. Dentre as saponinas apresentadas aquelas triglicosiladas na posição 3, derivadas do ácido oleanólico: Ia3 e Ia7.

As saponinas são constituintes presentes em grande quantidade nos chás a que estamos habituados a consumir. As saponinas do chá preto e verde (Camellia sinensis) apresentam efeito inibitório no esvaziamento gástrico e um efeito acelerador do trânsito gastrintestinal em ratos. (Murakami et al., 2000). Murakami et al. (1999) também observou que as saponinas do chá preto proporcionavam a proteção das mucosas gástricas para lesões induzidas por etanol. Assim, podemos inferir que algumas saponinas podem apresentar atividade antiúlceras. O alcaçuz (Glycyrrhiza

al.,2000).

Em nosso estudo de I. amara também encontramos o flavonóide kaempferol -3-O- rutinosídeo. Na literatura encontramos apenas trabalhos apresentando triagens visando a presença de flavonóides em Ilex. Nesses trabalhos foram avaliadas as presenças de kaempferol, quercetina, kaempferol-3-O-arabinopiranosídeo, quercetina-3-O-arabinopiranosídeo, quercetina-3-O- glicopiranosídeo, quercetina-3-O-[glicopiranosil(1-2)]-arabinosídeo, rutina, proantocianidina, isorhamnetina, apigenina e luteolina (Ricco et al. 1995; Matínez et al.1997). Na literatura não encontramos referências de Ia12 em Ilex. Além disso, tem-se que derivados do kaempferol são menos freqüentes em espécies da América Central. Segundo Ricco et al. (1995), I. dumosa, possível sinônimo de I. amara, não apresenta derivado de kaempferol em sua composição, por outro lado, no trabalho de Matinez et al.(1997), foram analisados espécimes de I. dumosa de diferentes regiões da América do Sul e Central, sendo detectada a presença da aglicona kaempferol em algumas delas. Isto indica que a produção dos derivados de kaempferol pode estar condicionada ao ambiente onde se encontra a planta. Com essa variação da composição de I. dumosa sendo dependente do local em que floresce, é difícil estabelecer uma regra para marcação taxonômica, para corroborar na sinomização I. dumosa e I. amara, a partir de sua composição flavonoídica.

Em nossa análise de I. theezans encontramos outra substância fenólica, que também não apresenta referência na literatura sobre sua presença em Ilex. É um derivado da arbutina, a hidroquinona glicosilada sulfatada na posição 2 da glicose (It5).

Terapeuticamente, a arbutina é utilizada como diurético e antiséptico, sendo a principal responsável pela atividade encontrada em uva-ursina (Arctostaphylos uva-ursi), uma planta usada como infusão no tratamento de cálculos renais (Briukhanov et al. 1998; Malinowska, 1995).

It5 foi detectada nos chás de I. amara e de I. theezans. Assim podemos considerar que é a arbubina pode ser uma das substâncias responsáveis pelo efeito diurético encontrada em várias espécies de Ilex. Em análise por HPLC-DAD, I. paraguariensis, não apresentou It5; no entanto, comparando-se o tR do padrão de arbutina com o cromatograma do chá de I. paraguariensis,

podemos indicar a presença desta.

Por trabalharmos com extratos muito polares, foi necessário o uso de técnica de fracionamento que minimizasse os problemas causados pela adsorção permanente pela fase estacionária. Buscamos técnicas mais apropriadas para a elaboração dos fracionamentos e identificações. Dentre as técnicas cromatográficas, pode-se apontar as cromatografias em contra corrente (CCC) como sendo as mais adequadas para os fracionamentos dos chás. O motivo principal

para o emprego de tais técnicas é que as mesmas não envolvem a utilização de fase estacionária sólida, não existindo assim o risco de perda de substâncias por adsorção permanentes. Além disso, dentre as CCC, selecionamos a HSCCC como a mais adequada para o desenvolvimento dos refracionamentos de algumas frações que se apresentavam misturas complexas de substâncias e quantidade não muito grande de amostra.

Utilizando HSCCC pudemos considerar que a técnica é bastante eficiente e rápida. Conseguimos separar grupos de substância que em TLC apresentavam praticamente o mesmo Rf.

Além disso, podemos recuperar toda a amostra injetada, sem correr o risco de adsorções permanentes. O extrato de Hancornea speciosa é um exemplo disso: a maior parte do extrato, devido à sua alta polaridade, não e luiu, podendo no final do experimento ser recuperado. A rapidez do fracionamento também é um ponto favorável para o uso dessa técnica, sendo possível realizar em um dia o mesmo fracionamento que levaria 3 dias ininterruptos de GPC ou semanas de DCCC.

O fracionamento de H. speciosa resultou em frações com algumas substâncias majoritárias. A análise por TLC dessas frações comparadas com padrões de ácido clorogênico e catequina mostraram que essas duas substâncias são majoritárias em H. speciosa.

Contudo, em alguns casos o problema não reside apenas no processo de fracionamento, mas na concentração dos metabólitos secundários nos chás medicinais. Um exemplo é o chá de Sorocea bomplandii (Moraceae), no qual foi detectada a presença de flavonóides por TLC, mas em concentrações muito pequenas, inviabilizando qualquer tipo de estudo fitoquímico tradicional. S. bomplandii é um adulterante das espinheiras-santas e já foi encontrada sendo comercializada como espinheira-santa em mercados populares. Apesar de não apresentar toxicidade (Bianchi et al., 1993), o uso de S. bomplandii pode agravar o estado do paciente ulceroso, uma vez que essa espécie não apresenta os mesmos efeitos terapêuticos das espinheiras-santas. Dessa forma, percebe-se que é importante a determinação dos constituintes dessa espécie.

Dentre as técnicas atualmente disponíveis para a separação e identificação on-line de compostos de plantas, estão a HPLC-RMN e HPLC-MS. Assim, realizamos a análise do chá de S. bomplandii utilizando as técnicas hifenadas HPLC-MS-[MS] e HPLC-RMN, tentando encontrar parâmetros químicos de comparação entre essa espécie e as espinheiras-santas, cujo chá tem atividade antiúlcera

As análises do chá de S. bomplandii foram eficientemente realizadas através do uso de HPLC-RMN e de HPLC-MS-MS, comprovando as vantagens dessas técnicas no caso de metabólitos secundários em concentrações muito baixas. Partindo de apenas 10 mg de amostra pudemos identificar os componentes principais do chá de S. bomplandii. As análises indicaram a presença de derivados glicosilados de flavonóides, cujas agliconas foram facilmente identificadas pelo espectro de RMN 1H devido aos sinais característicos de absorção do anel B, que apresenta um sistema do

também é fácil notar o número de unidades glicosídicas pela presença dos sinais dos prótons anoméricos dos açúcares, que apresentam sinais entre δ 4,5 e δ 5,5.

Os espectros de massas, por sua vez, também permitiram uma análise confiável dos derivados dos flavonóides de S. bomplandii. Os derivados do kaemperol apresentaram um sinal correspondente à aglicona m/z 285 na ionização negativa ou m/z 287 na ionização positiva, e os derivados da quercetina com um oxigênio a mais em sua composição m/z 301 (negativa) e m/z 303 (positiva). Além das agliconas, é fácil identificar a quebra das unidades de açúcares, com perdas de 162 u para as hexoses e de148 u para as pentoses.

Evidentemente, como qualquer técnica de análise, a HPLC-RMN e HPLC-MS-[MS] também apresentam limitações: nenhuma delas permitiu estabelecer inequivocamente a identidade dos açúcares ligados às agliconas. Para isso seria necessário realizar outros experimentos, como os de RMN 13C, COSY H/H e similares.

Como ponto altamente positivo, essa metodologia nos possibilita obter informações para realizar um controle de qualidade mais eficiente para as verdadeiras espinheiras-santas – espécies de Maytenus aquifolium e Maytenus ilicifolia, que apresentam em sua composição flavonóides glicosilados, mas com quatro unidades de açúcares ligadas á aglicona (Sannomiya, 1998), ausentes em S. bomplandii. Tais substâncias são úteis como marcadores químicos na comparação entre as plantas mencionadas.

Por esses motivos, a aplicação de técnicas hifenadas torna-se muito importante para o estudo de chás medicinais. Como se pode constatar pelos resultados obtidos com o chá de S. bomplandii, essas técnicas permitem a análise de quantidades muito pequenas de amostra e de matrizes muito complexas. Ademais, por se tratar de técnicas cromatográficas acopladas on-line a espectrômetros, esses últimos atuam como detectores universais e também fornecem informações relevantes para a determinação estrutural. As técnicas hifenadas, HPLC-[MS]n e HPLC-RMN, são

rápidas e consomem pouco solvente.

O estudo dos chás medicinais e de extratos polares deixou clara tanto a importância quanto a dificuldade em se trabalhar com esse tipo de material: a partir do conhecimento da composição química do material avaliado biologicamente é possível tecer considerações sobre o porquê da atividade apresentada e prever a realização de outros ensaios, que podem aprofundar os conhecimentos dos mecanismos de ação da droga. Por outro lado, surgem outras dificuldades. Do ponto de vista de isolamento - que necessita de técnicas cromatográficas baseadas em princípios que não a adsorção - é necessário dispor de materiais e equipamentos apropriados, como GPC, DCCC e

HSCCC, que ainda não são de domínio comum no campo da fitoquímica. Do ponto de vista de determinação estrutural, as moléculas polares apresentam peculiaridades estruturais, como os glicosídeos. O fato de conter vários tipos e unidades de açúcares, torna a região do espectro de RMN

1H entre δ 3 e δ 4 muito difícil de se analisar, sendo necessária a utilização de técnicas de alta

resolução, como TOCSY, HMQC e HMBC, além de espectrometria de massas.

Finalmente, a abordagem interdisciplinar (etnobotânica-farmacologia-fitoquímica- química analítica) possibilitou uma visão mais ampla e real da temática das plantas medicinais, de suas potencialidades, tanto para a ampliação do saber acadêmico quanto para a validação dos conhecimentos tradiconais.

No documento Estudo químico de chás brasileiros (páginas 104-178)

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