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Uma pesquisa voltada para os discursos que envolvem o trabalho educacional pode trazer, num primeiro momento, a idéia de que muito já foi dito sobre o assunto. Todavia, é no caminhar das reflexões sobre esses discursos que percebemos o quanto ainda temos que avançar nas investigações para entendermos a complexidade desse universo.

Tal complexidade solicita do pesquisador um engajamento com os valores educacionais e com as dimensões técnicas que envolvem essa esfera, assim, entender o ensino como trabalho é resgatar, ou melhor, evidenciar as características profissionais desse universo, valorizando o trabalho do profissional nessa área, pois as características profissionais são muito evidentes em outras profissões, mas não no ensino.

Dessa forma, ao utilizarmos algumas categorias da análise do discurso na investigação do trabalho prescritivo educacional foi possível perceber, ao longo da análise dos documentos, o caráter “fluído” que essas prescrições apresentam em relação ao papel do professor, o que, ao nosso ver, pode causar um desconforto maior do que o seu direcionamento incisivo para as suas atividades. Outro aspecto a ser ressaltado, nesse momento, é o fato de os documentos se constituírem como prescrição que estabelece o que precisa ser feito, mas não

como deve ser feito esse trabalho educacional. Essa dimensão enunciativa parece pressupor, por parte do enunciador, um co-enunciador em concordância e engajado com os seus princípios político-ideológicos, uma vez que as diretrizes gerais foram postuladas e, agora, cabe a ele executá-las.

Nessas reflexões finais, também é pertinente voltarmos para a questão do

gênero profissional do professor no que diz respeito a sua presença nos prescritos. Nesse sentido, as análises finais apontam para o predomínio dessa

instância em relação ao estilo profissional, pois o gênero profissional apresenta uma “parte estável da profissão” – o espectro profissional – e o discurso nesses documentos não se volta para questões do dia-a-dia dos profissionais da educação, isto é, aos embates que ele trava para resolver seus problemas de acordo com o seu estilo, mas foca-se na figura idealizada de um profissional empreendedor que, para estar em concordância com os tempos atuais em que novas posturas profissionais são exigidas, precisa demonstrar capacidade de gerir seu trabalho em prol de seu aluno que, nesta perspectiva, não é aquele que apenas quer aprender, mas também é visto como aquele cliente que precisa ser atendido com eficiência.

Todavia, é na continuidade dos estudos sobre o trabalho educacional que poderemos avançar sobre as reflexões acerca das dimensões discursivas que se inter-relacionam nesse campo, considerando as concepções provenientes do campo empresarial para o educacional e as possibilidades de um outro olhar que esse fenômeno pode oferecer para a organização da escola. Essa perspectiva é interessante porque as redes e parcerias que o mundo atual impõe a todos cobra da sociedade e, conseqüentemente da escola, uma organização de trabalho estratégica que não foi constitutiva de sua existência no passado.

Também é preciso ressaltar numa investigação sobre as prescrições do trabalho a possibilidade de o profissional renormalizar (Shcwartz, 2000) essas prescrições, isto é, de seguir em frente e adequar as normas às situações reais de trabalho, as quais apresentam imprevistos a todo instante. Esse aspecto é importante no estudo do trabalho educacional, pois nessa atividade - os gestos, os pensamentos, as atitudes e os anseios - são direcionados, não para objetos ou máquinas, mas para seres humanos em constante estado de evolução. Podemos evidenciar, assim, um outro aspecto que contribui para a fragilidade das prescrições no trabalho humano.

Como afirmado anteriormente, é necessário o desenvolvimento de pesquisas que busquem outras interfaces do trabalho educacional, isto é, que

analisem os discursos sobre esse trabalho, os quais compõem movimentos que enfatizam uma imagem a ser propagada , como também é importante destacar a necessidade de estudos que busquem a voz do professor frente aos discursos sobre o seu trabalho.

Assim, a análise discursiva dos prescritos referentes ao trabalho educacional, na articulação da Lingüística Aplicada com as abordagens da Ergonomia e da Ergologia, permite o embasamento em teorias que estudam o trabalho humano, possibilitando a reflexão sobre a heterogeneidade das relações sociais que permeiam esse complexo campo; e também afloram traços característicos desse trabalho que precisam ser capturados pelo pesquisador e socializados junto àqueles que buscam contribuir para o avanço das reflexões sobre o ensino em nosso país.

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Textos da Internet:

htpp://cenp.edunet.sp.gov.br www.educacao.sp.gov.br

ANEXO 1

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