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Considerações gerais sobre a formação de professores na UE 28

1. Da Declaração de Bolonha até à atualidade

1.2. Síntese comparativa da Educação da UE 28

1.2.6. Considerações gerais sobre a formação de professores na UE 28

A partir de 2007, os estados membros privilegiam na formação de professores a aquisição de competências para poder responder às novas necessidades das turmas nas escolas. Deste modo, a Alemanha, o Reino-Unido e Portugal viram-se na obrigatoriedade de reformar os seus sistemas de formação dando mais enfâse à aquisição de competências pedagógicas. No entanto, a formação académica e a formação profissional têm proporções diferentes em cada estado membro não existindo ainda uniformização (FR, 2012a).

Para além de preocupar-se em certificar competências que poderiam servir de base para qualquer tipo de profissão, o sistema educativo insiste em dotar os alunos de ferramentas que lhes permitam ser competentes e competitivos no seio da sociedade independentemente do ramo profissional a seguir. O ensino superior tem responsabilidades acrescidas devido à necessidade de concorrer no mercado contemporâneo. Heitor (2003) afirma a esse respeito que

parece caber ao ensino superior a responsabilidade de responder a novas solicitações de criação e circulação de conhecimento […] à medida que nos vamos apercebendo das oportunidades, mas também das fraquezas da economia do conhecimento que emerge, e sobretudo da sociedade de aprendizagem em que vivemos. (Heitor, 2003, p.1)

De facto, para além de produzir e transmitir conhecimentos, para poder confrontar-se com a concorrência económica existente, não só na Europa, mas também a nível internacional, a educação deve produzir uma mão-de-obra qualificada para que, uma vez inserida na população ativa, seja o motor do crescimento económico (Amara & Baumann, 2008; Niclot, 2010).

Antes de entrar no mercado de trabalho, o candidato a professor deve passar por uma etapa essencial — a PES/estágio. Esta deve estar integrada na formação e merece que lhe seja atribuída a devida importância porque é o momento que permite a “integração de saberes” (Alarcão et al., 1997, p.9), estabelecendo uma relação interinstitucional entre dois

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mundos: o da escola, local de estágio, e o da instituição de ensino superior, local onde recebe a formação superior. É, sem dúvida, um momento a privilegiar em toda a formação, uma vez que inclui a formação prática em contexto escolar e permite a aplicação dos conhecimentos teóricos fornecidos pela formação prévia, este processo é guiado por professores tutores que acompanham e ajudam os estudantes a adquirir as competências necessárias à profissão de professor. Assim, os futuros professores continuam a aprender em contacto direto com o que pretendem fazer profissionalmente, em contexto de sala de aula com alunos reais e com o apoio de professores mais experientes para os ajudar a refletir, a criticar de modo construtivo, a tornar-se melhores profissionais a partir de costumes, métodos e trabalhos estandardizados relacionados com as tradições da prática de ensino. A equipa de profissionais que auxilia a sua entrada na profissão, embora ainda a nível de estágio, deve servir de guia na sua entrada no mundo profissional, permitindo assim que o estagiário construa o seu próprio caminho por tentativas e erros, refletindo e melhorando de modo a tornar-se num bom profissional.

Para que esta etapa seja benéfica, os professores que apoiam a PES devem promover nos estagiários em fase terminal de formação a capacidade de refletir, de desenvolver um espírito crítico para poder solucionar problemas que surjam na atividade profissional, formando assim profissionais reflexivos, competentes e atingindo o estatuto de investigador (Marquez, 2009; Valente, 2010).

No que concerne o conteúdo das formações, ainda subiste uma grande autonomia por parte da instituição de ensino superior em relação à escolha dos planos de estudo e dos seus conteúdos. No que se refere à especialização das matérias lecionadas, na maioria dos estados membros a formação inicial forma professores altamente especializados em apenas uma ou duas disciplinas. O professor primário continua a ser um especialista das disciplinas gerais, incluindo-se, neste caso concreto, o professor generalista em Portugal com habilitação para as quatro áreas de especialização: português, matemática, história e geografia e ciências da natureza.

Já no que respeita a entrada na carreira profissional de professor, prevalecem dois grandes tipos de organização: uma primeira que prepara os professores no momento de entrada na carreira com uma fase final que habilita à docência ou uma segunda que introduz medidas de apoio aos professores principiantes no sentido de os ajudar a integrar-se na profissão. Alguns estados membros, ainda poucos, juntam as duas modalidades para preparar melhor o futuro professor; sendo este um objetivo preponderante, será normal ver cada vez mais países a seguir este rumo (FR, 2012a).

Alguns países, tal como a Espanha, a Grécia, a Itália e o Chipre, obrigam à frequência de uma formação durante o período probatório30 dos primeiros anos da carreira profissional.

Esta fase de iniciação é acrescentada à formação profissional obrigatória para que os

30 O período probatório corresponde ao primeiro ano escolar de exercício efetivo da profissão docente,

na categoria de professor, sendo, geralmente, acompanhado por outro docente experiente, com a categoria de professor titular, com base num plano individual de trabalho.

estudantes adquiram as competências dos professores experientes (DGEC, 2010), para além de ser uma etapa que requer uma avaliação positiva para prosseguimento no mundo da educação com repercussões na sua carreira profissional.

No caso concreto de Portugal, a entrada no mercado de trabalho não é fácil pois aparecem inúmeras alterações na vida do recém-formado; para além de transitar do estatuto de estudante para o estatuto de professor, sofre alterações no seu modo de vida quer seja em relação à localização geográfica da sua colocação, quer seja em relação à instabilidade profissional, implicando uma readaptação das relações familiares, pessoais e sociais. Deve realçar-se que o recém-formado não recebe qualquer apoio específico à entrada na profissão por parte do Ministério da Educação. É entregue a si próprio, podendo ou não receber ajuda de colegas que voluntariamente se predispõem a integrá-lo, apoiá-lo, encaminhando-o para aperfeiçoar o seu percurso profissional. Este primeiro contacto seria uma mais-valia se for bem concretizado pois tem como objetivo permitir ajudar os principiantes nos primeiros anos de serviço, fazer com que se motivem para continuar a lecionar, melhorar a qualidade do ensino e devolver um feedback à instituição de formação para que também se consiga aperfeiçoar a formação inicial de base.

A vertente académica da formação inicial de professores é, sem dúvida, um dos pontos essenciais da sua qualidade e uma etapa essencial para aceder à profissão. Tal como define Estrela (2002, p.18), é “um processo de preparação e desenvolvimento da pessoa, em ordem ao desempenho e realização profissional numa escola ao serviço de uma sociedade historicamente situada”. No entanto, a formação inicial não se pode considerar como uma meta final pois é apenas um primeiro patamar de muitos outros que se constroem ao longo do percurso profissional de um professor. Este processo é contínuo, com vista a um aperfeiçoamento permanente, tal como refere Formosinho (2009, p.147), ao afirmar que a formação inicial deve representar a “etapa de um processo que é inerente à globalidade do percurso profissional”.

Os professores devem equacionar as necessidades de que precisam em relação à atualização da formação e à aquisição de conhecimentos, qualificações e competências. O processo de formação é um contínuo e gradual com vista a um aperfeiçoamento profissional (DGEC, 2010; García & García, 1992) porque por mais completa que seja a formação inicial, nunca consegue acompanhar as atualizações que ocorrem ao longo de toda a carreira profissional. A formação não pode ser considerada como um fim; exige que o professor esteja em constante reflexão sobre e para a profissão (Dewey 1933; Shön, 1983; Kemmis, 1985; Shön 1992; Zeichner 1993; Alarcão, 1996; Serrazina, 1998), ideia reforçada pelo novo perfil de professor desenhado pelo Processo de Bolonha porque só com esta reflexão redobrada se consegue acompanhar o progresso científico e tecnológico da sociedade.

O bom profissional, para não cair em desuso, deve apostar numa formação ao longo da vida para atualizar a formação inicial (Delors et al., 1996; UE, 2001). A sua evolução só será positiva se a formação de base já o é. Por isso, a formação contínua serve de aperfeiçoamento permanente pois não se transforma um produto negativo em positivo com

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formações esporádicas e que, embora sejam avaliadas, não penalizam diretamente o diploma já adquirido pelo professor que o habilita para a docência.

Dada a importância desta formação ao longo da vida, pode afirmar-se que o tempo destinado ao período de formação inicial por si só não é tão relevante; não é por ser de longa duração que o estudante se torna mais competente. O tempo dedicado à formação também é muito proveitoso se for acompanhando o percurso profissional do professor, principalmente em início de carreira, tal como acontece em Portugal através de ações previstas pela Portaria 352/86 de 8 de julho (PT, 1986a) e no Decreto-Lei 344/89 de 11 de outubro, no art. 25º, cap. III (PT, 1989).

As duas formações são importantes e completam-se mutuamente, a formação de base é essencial para que possa surgir uma formação ao longo da vida proveitosa e que requalifique os profissionais, tornando-os cada vez melhores. A este propósito, Delors et al. (1996, p.105) afirmam que se observa a tendência de que “quanto mais formado se é, mais desejo se tem de formação”.

A formação deve então “favorecer a capacidade de cada um construir os seus próprios mecanismos de pensamento e encorajar a capacidade de refletir sobre o que se passa à volta do professor” (Seco, 2005, p.83). Para tentar adaptar-se a estes novos desafios, pretende formar um novo perfil de professor que seja altamente qualificado e habilitado para a docência. Esta fase torna-se cada vez mais exigente por parte da sociedade porque as famílias, os alunos, os colegas, os profissionais e os próprios professores pretendem aumentar o nível de sucesso educativo, devendo estabelecer relações diferentes das de outrora com a família, transmitir valores, utilizar as novas tecnologias, tratar cada vez mais de burocracias e adaptar-se às constantes mutações políticas. O docente transforma-se num especialista dotado de muito profissionalismo porque a profissão exige um trabalho complexo, rigoroso e específico.

Com a implementação do Processo de Bolonha, o apoio prestado aos estudantes também é diferente, para além das horas de atendimento que existiam, os professores das instituições do ensino superior prestam apoio tutorial. A tutoria é um processo que envolve a ativação de recursos a vários níveis, sejam eles culturais, didáticos, pedagógicos ou ainda relacionais (Perrenoud, 1998b), tendo como objetivo o desenvolvimento total do estudante (Alarcão et al., 2006). Tal situação implica uma forma nova de trabalhar que até ao momento não existia; os professores não eram formados para saber como trabalhar durante as horas de tutoria. Eles adaptam-se e tentam responder a este novo desafio, fazendo com que as tutorias melhorem a formação e as práticas através da investigação, para que a aprendizagem global origine assim uma certa satisfação dos estudantes (Santos, 2010).

O novo espaço educativo europeu coloca ao nível da formação de professores desafios no sentido de conceder graus e diplomas que devem ser comparáveis, equivalentes e exequíveis a fim de “aumentar a qualidade e a eficácia dos sistemas de educação e de formação na UE” (UE, 2002b, p. 8). Para melhorar a qualidade da educação, deve-se, por sua vez, também aperfeiçoar a formação de professores porque os envolvidos no processo

educativo, estudantes, candidatos a professores e formadores, são os intervenientes ativos e mais predispostos para interferirem no terreno do sistema educativo. Deve fomentar-se a vinda para esta profissão de estudantes altamente qualificados, satisfeitos com a formação no sentido de assim se reunirem as condições necessárias para enfrentar os desafios da profissão a nível pessoal, profissional e social porque da formação inicial depende a capacidade dos professores responderem aos reptos lançados pela sociedade.

Já que “[o] conceito de qualidade na educação requer um conjunto de capacidades e competências, sem esquecer a motivação” (UNESCO, 2006b, p.49), os países têm de investir na formação inicial de professores, permitindo que estes sigam uma formação específica para poder fornecer um serviço de excelência. Só assim será possível ter uma educação de qualidade que, por sua vez, será propícia a fornecer bons resultados e satisfação na aprendizagem dos alunos. É incontornável que “o ofício de professor, sendo cada vez mais exigente, reclama também uma formação de qualidade cada vez maior (…) para além das fronteiras dos conhecimentos e técnicas do passado” (Leite, 2003, p.2).

A UE conseguiu atingir alguns dos objetivos pré-definidos pelo Processo de Bolonha que serve de elemento impulsionador de transformações nas universidades a nível nacional, mas que cada país aplica nos campos pretendidos e a seu ritmo. É um processo contínuo que se vai desenvolvendo ao longo dos anos, atingindo metas e propondo outras para o futuro, sempre no intuito de melhorias de qualidade e equidade. A melhoria do ensino poderá permitir superar muitas das dificuldades económicas e sociais que a Europa enfrenta atualmente, sendo para isso necessário um grande investimento neste domínio (Auduc, 2011). Por isso, o aperfeiçoamento dos sistemas educativos é uma preocupação na UE, bem como no mundo. Assim, a formação dos profissionais tem de evoluir para melhorar a performance de cada país em relação aos resultados apresentados nos diversos rankings. Ao investir na educação, o país forma professores cada vez mais competentes. Nesta lógica, estes bons profissionais formam, por sua vez, bons alunos.