• Nenhum resultado encontrado

Considerações sobre a avaliação das propriedades da medida

2. Revisão da Literatura

2.4 Considerações sobre a avaliação das propriedades da medida

A análise das propriedades de medida de qualquer instrumento autorrelatado deve ser considerada e preceder à sua aplicação na pesquisa e prática clínica66. Considerando a subjetividade dos construtos avaliados pelos instrumentos autorrelatados, a avaliação das propriedades da medida é imprescindível e diz respeito a um conjunto de técnicas, com o emprego da estatística e do conhecimento adquirido pela psicometria, que possibilita avaliar o quanto a medida realmente mede o construto que se propôs a medir e quão acurada é a medida.

Os estudos voltados para a avaliação das propriedades da medida devem obedecer a um rigor metodológico para garantir conclusões adequadas sobre a qualidade psicométrica da medida, o que pressupõe a utilização de critérios padronizados de avaliação66.

Com vistas a contribuir com esta área do conhecimento foi criado o COSMIN - Group (COnsensus-based Standarts for selection of health

Measuremente INstruments), um consenso sobre padrões para seleção de

instrumentos de medida em saúde, uma iniciativa que reuniu pesquisadores de renome internacional com a finalidade de desenvolver critérios para avaliação da qualidade dos estudos sobre as propriedades da medida, com vistas a definição dos conceitos e de uma terminologia referente as diferentes propriedades da medida testadas atualmente. O trabalho destes pesquisadores resultou num checklist para avaliação da qualidade metodológica dos estudos de validação e uma taxonomia sobre a terminologia e conceitos utilizados nesta área do conhecimento66,67.

De acordo com o COSMIN, a qualidade de um instrumento de medida é descrita por seus domínios de qualidade e compreendem a confiabilidade, a validade e a responsividade67.

Embora se observe o empenho do COSMIN e de diferentes organizações na elaboração de uma taxonomia para as propriedades da medida, não há na

literatura um consenso sobre a terminologia utilizada para esta temática. Na literatura são frequentes as divergências em relação à terminologia – como deve ser denominada cada propriedade da medida, bem como em relação ao conceito, isto é, o significado de cada propriedade nos estudos de validação67.

As principais propriedades da medida que são investigadas nos estudos de validação de instrumentos autorrelatadas estão sintetizadas a seguir.

Validade

A validade refere-se à capacidade do instrumento em mensurar o fenômeno que se propõe a medir. A validade pode ser dividida em três tipos principais: de conteúdo, de critério e de construto 68,69,70.

A validade de conteúdo é definida como o grau em que o conteúdo do instrumento é um reflexo adequado do construto que se pretende medir71, representa o universo do conteúdo de um determinado construto68. Pode ser avaliada pelo julgamento sobre a relevância e abrangência dos itens do instrumento.

Neste tipo de validade a relevância de um conjunto de itens deve ser avaliada em relação aos seguintes aspectos: i) se os itens do instrumento são relevantes para o construto que se pretende medir; ii) se são relevantes para a população do estudo; e iii) se são importantes para a proposta do instrumento. A abrangência por sua vez, deve ser avaliada frente aos aspectos do conteúdo dos itens, a descrição dos domínios e a fundamentação teórica do instrumento71.

A validade de face, pode ser considerada um tipo de validade de conteúdo, e avalia se o instrumento aparentemente mede o construto em avaliação68. Pode ser definida como o grau no qual os itens do instrumento demonstram ser um reflexo adequado do construto a ser mensurado71. Trata- se de um subtipo da validade de conteúdo, cuja implementação pressupõe uma avaliação mais simplficada da relevância e abrangência do conjunto de itens. A validade de construto pode ser definida como o grau em que os escores de um instrumento são consistentes com hipóteses derivadas do

conceito em mensuração67, ou seja, avalia quão adequado o instrumento é em relação à definição conceitual do fenômeno investigado68.

A validade de construto pode ser testada por meio da validade convergente, divergente e de grupos contrastados68. De acordo com o COSMIN, a validade estrutural e validade transcultural também são consideradas validade de construto71.

A validade de construto convergente consiste na correlação significativa entre o escore do instrumento que avalia determinado construto com o escore de outro instrumento e/ou variáveis que medem o mesmo construto, sendo ambos aplicados aos mesmos sujeitos de pesquisa. A validade de construto

divergente é estimada pela utilização de dois instrumentos, no mesmo grupo de

sujeitos, que avaliem construtos opostos, sendo esperada a ausência de correlação entre eles68,72.

A validade de grupos contrastados consiste na aplicação de um instrumento em duas populações com características definitivamente diferentes em relação ao construto de interesse, sendo observada a capacidade do instrumento em distinguir essas diferenças; ou seja, o desempenho dos escores nos dois grupos avaliados deve diferir significativamente para que a validade de construto seja apoiada68,70.

Outro importante tipo de validade de construto, consiste na validade

fatorial ou a validade estrutural, nomenclatura adotada pelo COSMIN, que pode

ser definida como o grau em que os escores do instrumento refletem a dimensionalidade do construto mensurado. Na análise de fatores o objetivo é encontrar o número mínimo de fatores que explicam a variabilidade das respostas67.

O COSMIN agregou à validade de construto, a validade transcultural que pode ser definida como grau na qual o desempenho dos itens do instrumento de medida após tradução e validação cultural refletem adequadamente o desempenho dos itens no instrumento original67.

Considera-se validade de critério o grau no qual os escores de uma medida autorrelatada são um reflexo adequado de uma medida padrão “gold

standart”67. De acordo com o COSMIN, inexiste um padrão ouro para as medidas autorrelatadas, sendo a única exceção a versão breve ou reduzida de um instrumento. Nesta situação, a versão original do instrumento deve ser considerada o “padrão-ouro” da medida71.

A ausência de padrão ouro para instrumentos de autorrelato em saúde67, dificulta ou impossibilita a determinação da validade de critério, uma vez que se for encontrada correlação de fraca magnitude entre os dois instrumentos, não será possível distinguir a medida válida entre o instrumento em teste e a medida considerada “padrão ouro”70. Portanto, Scholtes et al. (2011)70, consideram mais apropriado, denominar de validade de construto, o teste entre instrumentos que medem o mesmo construtro.

A avaliação da validade de critério é dependente do tipo de respostas dos instrumentos. Quando o instrumento em teste e o padrão ouro possuem escores contínuos, emprega-se o coeficiente de correlação; se o instrumento em teste possuir escore contínuo e a medida de referênica apresentar escore dicotômico, deve ser utilizada a curva ROC – receiver operator chacaracteristic, na qual se obtém o ponto mais favorável entre os valores de sensibilidade e especificidade. Quando escore do instrumento em teste e do padrão ouro são dicotômicos, a sensibilidade e especificidade são os métodos indicados para validação70.

Sensibilidade e Especificidade

Além da validade e confiabilidade, a avaliação da sensibilidade e especificidade dos instrumentos de autorrelato69, chamados de screening tests ou testes diagnóstico73, também têm sido utilizados. Estes testes são empregados para avaliar a habilidade dos instrumentos em identificar corretamente a presença ou ausência da condição em avaliação73. Essas medidas são realizadas quando ambos instrumentos (em teste e a medida ouro), possuem escore dicotômicos.

A sensibilidade é a habilidade do teste em obter um resultado positivo quando a condição alvo está realmente presente73. A sensibilidade da medida, portanto, é a capacidade do teste em identificar “verdadeiros positivos” 69,74.

A especificidade é a habilidade do teste em obter um resultado negativo quando a condição alvo está realmente ausente73. A especificidade da medida, portanto, é a capacidade do teste em identificar “verdadeiros negativos” 74.

Não existem padrões de aceitabilidade determinados para sensibilidade e especificidade. Preferencialmente, os valores devem ser os mais elevados possíveis69. Os pontos de corte para a sensibilidade e especificidade, devem ser definidos por cada pesquisador considerando as consequências da presença de falsos negativos versus falsos positivos para a condição estudada73.

O valor preditivo positivo (VPP) estima a probabilidade de uma pessoa cujo resultado do teste é positivo, realmente apresente a condição, ou seja, esta medida representa a proporção dentre os que apresentam resultado positivo no teste que são verdadeiramente positivos73.

O valor preditivo negativo (VPN) estima a probabilidade de uma pessoa cujo resultado do teste é negativo, realmente não apresente a condição, ou seja, esta medida representa a proporção dentre os que apresentam resultado negativo no teste que são verdadeiramente negativos73.

Stirrat et al. (2015)24 em estudo de revisão sistemática que objetivou avaliar o processo de validação de escalas de adesão e as variáveis para avaliação da adesão encontraram que a sensibilidade e especificidade foram testadas em 12 das 43 escalas arroladas para o estudo, embora não haja consenso na literatura sobre a existência de um padrão ouro para avaliação da adesão medicamentosa75.

O resgate da literatura sobre as propriedades da medida evidencia que o processo de validação é contínuo e que as provas de validade são acumuladas com o tempo. Como não é possível assegurar que um instrumento forneça a medida real do construto avaliado, quanto maior o número de provas acumuladas mais próxima a medida estimada será da medida real 50. O foco deste estudo consiste na estimativa de parte das propriedades de uma nova medida de avaliação da adesão medicamentosa, com foco na validade da medida.

Documentos relacionados