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A Consolidação do Bloco Histórico Neoliberal e a Hegemonia burguesa nos anos

3 NEOLIBERALISMO E HEGEMONIA BURGUESA NO BRASIL

3.3 A Consolidação do Bloco Histórico Neoliberal e a Hegemonia burguesa nos anos

“Sem a existência de um proletariado constituído como classe independente, não haverá sindicatos e partidos operários independentes (e se eles o forem, isso não alterará ou alterará muito pouco a situação), já que os interesses de classe da burguesia estarão sempre presentes para atrofiar as classes trabalhadoras, ou seja, para atrofiar os sindicatos e os partidos operários”. Florestan Fernandes

O processo contraditório e acidentado de adesão das frações burguesas à candidatura de Collor dificultou a implantação do regime neoliberal nos primeiros anos da década de 1990. Segundo Martuscelli (2012), não obstante a burguesia brasileira nunca tenha se oposto ao conjunto das políticas neoliberais, houve desde o início resistências seletivas às suas políticas no intuito de preservar o papel ocupado por setores do capital produtivo nacional diante do aparelho de Estado e do mercado interno.

A situação de recessão econômica somada à essas resistências seletivas engendraram uma situação típica de instabilidade hegemônica forçando os setores burgueses a um entendimento provisório para evitar a ascensão dos setores populares ao Palácio do Planalto. O fato de esse processo ter se dado em tal situação é o principal fator explicativo da crise do governo Collor. Sem o apoio de setores importantes do empresariado para a implementação das políticas, Collor se obrigara a limitar o próprio padrão regulatório neoliberal.

Uma análise da política empreendida pelo Governo Collor revela a persistência de medidas que não condizem necessariamente com o padrão regulatório neoliberal do Estado sobre a economia, o que contribui para a instauração de um “equilíbrio instável” entre as frações dominantes. O conteúdo e o processo de implementação dos dois planos de estabilização monetária possibilitam visualizar melhor essa questão (Martuscelli, 2012, p. 27).

respeito da abertura comercial e financeira (mas não no ritmo de tais mudanças), tais políticas foram acompanhadas, durante a gestão do “caçador de marajás”, pelo confisco de ativos financeiros e pelo congelamento de preços, medidas que desferiam duros golpes na indústria nacional ampliando a dificuldade de competir com os produtos importados de alta tecnologia do estrangeiro. O principal resultado prático das mudanças ocorridas nesse primeiro e curto capítulo da ascensão neoliberal foi o aumento expressivo do poder do capital financeiro e das grandes transnacionais. Isso se evidenciava no início da política de privatizações levada a cabo pelo governo no setor siderúrgico e petroquímico.

Em ambos os casos, a presença do grande capital bancário e financeiro foi marcante na compra das principais empresas estatais – o que expressa uma tendência que se ampliou ao longo dos anos 90, a da ampliação dos investimentos dos bancos no setor não- financeiro, iniciada com o controle das estatais privatizadas, vindo a se materializar, posteriormente, no próprio controle das empresas privadas e, portanto, fortalecendo o processo de financeirização da economia brasileira (Idem, p. 30).

Dessa forma, as críticas seletivas do empresariado industrial às políticas neoliberais eram expressão, também aqui, da dupla contradição vivenciada por esse setor de classe: de um lado, a pressão imperialista para a abertura comercial e financeira e, de outro, a necessidade de um programa que conseguisse dar resposta às contradições entre capital e trabalho que se agudizaram durante a década de 1990. Restava, assim, tecer críticas não ao conteúdo das reformas, mas ao ritmo e a forma de sua implementação. Tais críticas eram quase sempre apresentadas de forma corporativa e setorizada, mas nem por isso deixaram de intervir e dificultar, nesse primeiro período, os planos do governo, já que representavam contradições internas ao capital, em particular entre as frações industrial e bancária.

para o interior do aparelho estatal, envolvendo as frações burguesas na elaboração e comprometimento com as políticas, centralizando o poder na esfera do executivo e, em particular, em sua área econômica com um destaque para o papel do banco central. Nesse cenário, as denúncias de corrupção contra o governo forneceram, aos setores burgueses, a possibilidade de canalizar seu descontentamento sem colocar em risco a construção de hegemonia do projeto neoliberal e sem gerar tensionamento com a burguesia dos países centrais. A conjuntura de recessão econômica dava ao processo contra Collor o apoio ou, pelo menos, a passividade das classes trabalhadoras e dos setores médios que se viam prejudicados em seus rendimentos e em suas condições de vida.

Entendemos aqui que, numa situação de crescimento econômico, a tolerância em relação à corrupção no governo poderia ser mais ampla. Ocorre que num momento em que a própria base de apoio do Governo Collor estava desgastada e a recessão econômica produzia efeitos deletérios sobre os rendimentos de diversos segmentos sociais, o aparecimento de denúncias de corrupção contra o governo tende a ter um impacto negativo para a continuidade deste no poder, passando a luta contra a corrupção ser utilizada pelos grupos de oposição ao governo como uma estratégia de resistência política (Martuscelli, 2012, p.56).

O neoliberalismo padecia, no início dos anos 1990, da dificuldade de constituir-se como projeto hegemônico de classe capaz de dar coesão aos setores burgueses e, ao mesmo tempo, exercer hegemonia sobre as demais classes em voga. O desafio era canalizar a insatisfação tanto dos setores burgueses quanto das classes subalternas sem conflitos ou rupturas, em uma conjuntura onde a burguesia dos países centrais, agora sob hegemonia da banca financeira, já não admitia concessões ao capital nacional como no ciclo de desenvolvimento ocorrido de 1930 a 1964. Para isso o neoliberalismo atuou em duas frentes: de um lado, mobilizava o poder de barganha do capital financeiro internacional tanto na compra das estatais como na compra do

capital privado nacional; de outro, investia na combinação do processo de reestruturação produtiva com a fragmentação, cooptação e bombardeio ideológico no seio das classes populares. O capital concentrado nos grandes meios de comunicação, monopólio oriundo das concessões estabelecidas durante o regime de 1964, passa a ocupar papel central nesse contexto.

Entretanto, como afirma Pomar (2002), esses dois elementos eram ainda insuficientes para uma hegemonia estável ao neoliberalismo como bloco histórico. Era necessário encontrar um segmento social que representasse, ao mesmo tempo, o projeto neoliberal como resposta consistente à crise econômica e que não estivesse vinculado aos setores mais atrasados da política nacional. Nenhuma fração de classe conseguiria, sozinha, ocupar tal papel. Nesse sentido, a ascensão do PSDB à presidência com Fernando Henrique Cardoso e o Plano Real representavam também a projeção de uma categoria social, que estivera vinculada à luta democrática na década de 1980, mas com considerável comprometimento com as classes dominantes.

Foi, desse modo, um achado que a maioria da intelectualidade brasileira, como segmento especial da classe média urbana, tenha encampado as ideias da modernização neoliberal e se disposto a assumir a direção do Estado e levar adiante a instalação do projeto de inserção subordinada do país à globalização. Essa subsunção é ainda mais notável quando se considera o fato de que, do ponto de vista político, tal intelectualidade estava situada à esquerda, havia se encontrado na oposição ao regime militar e era uma crítica assumida do modelo militar de desenvolvimento capitalista imposto ao país (Pomar, 2002, p. 81).

Pomar considera, ainda, que a funcionalidade desse setor à hegemonia burguesa está ligada ao fato de que, embora a burguesia seja a sua principal fiadora, a base social característica dessa intelectualidade eram os proprietários intelectuais e os novos setores assalariados ligados às novas tecnologias da informação. Estes setores do proletariado eram mais facilmente conquistados pela ideologia neoliberal que propagava aos quatro cantos as

possibilidades de ascensão social ligadas às novas tecnologias. Pense-se, por exemplo, na proliferação durante a década de 1990 de cursos de informática que, segundo o discurso dominante, eram um pré-requisito fundamental à entrada no mercado de trabalho. Os exemplos de indivíduos que enriqueciam com as novas invenções em suas garagens, o símbolo de Bill Gates e congêneres, alimentava a crença na competição individual e no enriquecimento rápido, embora fossem pouquíssimos aqueles que lograram alguma ascensão de classe a partir das novas tecnologias.

Essa intelectualidade portanto, representada na figura de um sociólogo saído do mesmo núcleo de intelectuais que consagrara Florestan Fernandes e Octávio Ianni, cumpria um papel ideológico fundamental na legitimação do neoliberalismo perante a sociedade. O neoliberalismo não era apresentado como uma necessidade dos setores dominantes, tampouco uma necessidade identificada com os políticos tradicionais. Aparecia como uma formulação da

intelligentsia brasileira de “centro-esquerda”, passível de modificações e

reformulações que provinham dos centros intelectuais dos países centrais. O início da chamada contrarreforma do Estado Brasileiro se daria, portanto, com a derrota de Lula em 1989, mas se completaria somente com a chegada de Fernando Henrique Cardoso à presidência reunificando os interesses burgueses em torno do Plano Real.

Segundo Behring, o plano representava, diante do trauma da inflação que chegara à 50% ao mês em 1994, uma verdadeira chantagem eleitoral, legitimando o plano e a candidatura de FHC como uma alternativa de estabilização econômica (BEHRING, 2008, p. 156). A própria candidatura de FHC era, nesse sentido, o ponto de encontro entre os interesses burgueses internos com as exigências da dominação imperialista no continente:

O Plano Real não foi concebido para eleger FHC; FHC é que foi concebido para viabilizar no Brasil a coalizão de poder capaz de dar sustentação e permanência ao programa de estabilização do FMI, e viabilidade política ao que falta ser feito das reformas preconizadas pelo Banco Mundial (FIORI apud BEHRING, 2008, p.156).

Os efeitos dessa política se fariam sentir progressivamente durante os anos 1990. A sobrevalorização do câmbio exigia uma captação cada vez maior de recursos do exterior para equilibrar a balança de pagamentos, combinada com uma altíssima taxa de juros para atrair os capitais especulativos, aumentando enormemente a transferência de lucros para setores improdutivos. Na linguagem dos “novos tempos” o que antes eram metas do desenvolvimento soberano, tornam-se riscos à estabilização econômica. A expansão da produção e do mercado interno, que necessitam do investimento estatal, passam a ser vistas como gastos desnecessários do Estado e como incentivos à inflação. Cortam-se os investimentos na indústria, justamente no momento em que esta é pressionada a adaptar-se ao novo padrão de acumulação importado dos países centrais.

Esse quadro facilitava a aceleração de políticas de desmonte dos direitos conquistados, particularmente aqueles consagrados pela Constituinte de 1988. A prioridade passa a ser a redução do chamado “custo Brasil”, destinado a reduzir o “gasto” com a força de trabalho tornando o país atrativo aos investimentos do grande capital internacional com vistas a alargar a extração de excedente. A seguridade social foi, sem dúvida, o principal alvo dessa política com a isenção de ICMS para as empresas exportadoras e com o desvio dos recursos da política social para o antigo Fundo de Estabilização Fiscal, hoje chamado Desvinculação das Receitas da União (DRU).

O outro objetivo explícito da primeira gestão de FHC foi a reforma do Estado. Para isso, mobilizou um setor da intelectualidade já bastante comprometido com os interesses da burguesia brasileira desde a década de 1980. Luís Carlos Bresser Pereira foi o nome escolhido para dirigir o Ministério da Administração e Reforma do Estado (MARE). Note-se que Bresser-Pereira justificava a necessidade da redução do aparato estatal como momentânea e diretamente ligada à crise da dívida externa e às práticas de populismo econômico herdadas do período ditatorial. Dessa forma, ele próprio não se

considerava um defensor do Estado mínimo, descrevendo a reforma do Estado como um momento de uma narrativa bem mais ampla que compreendia a superação do Estado social-burocrático, segundo ele característico do pós- Guerra, através do neoliberalismo, a partir do qual se seguiria uma retomada das políticas sociais em experiências de social-liberalismo (cf. Behring, 2008). A reforma do Estado estaria relacionada, segundo Bresser-Pereira, a quatro problemas fundamentais:

[...] (a) um problema econômico-político – a delimitação do tamanho do Estado; (b) um outro também econômico-político, mas que merece tratamento especial – a redefinição do papel regulador do Estado; (c) um econômico-administrativo – a recuperação da governança ou capacidade financeira e administrativa de implementar as decisões políticas tomadas pelo governo; e (d) um político – o aumento da governabilidade ou capacidade política do governo intermediar interesses, garantir legitimidade, e governar (Bresser-Pereira, 1998, pp.48-50)

Como afirma Behring (2008), ao analisarmos a reforma do Estado, é sempre importante distinguir entre a reforma como projeto político, econômico

e social mais amplo e a reforma do aparelho do Estado, orientada para tornar a administração pública mais eficiente. Isso é importante porque a missão

assumida e levada adiante pro Bresser-Pereira excede em muito uma mera reforma administrativa. De fato, naqueles anos houve uma redefinição conceitual dos papéis do Estado e dos pares público-privado. A tônica geral da reforma era transferir para o setor privado toda e qualquer atividade que pudesse ser controlada pelo mercado. Surge, aqui, a figura do “setor público não-estatal”, permitindo que o setor privado assuma a gerência dos recursos estatais e a mercantilização de serviços como saúde, cultura, educação e a pesquisa científica. A flexibilização e descentralização das decisões e investimentos estatais ou, em outras palavras, a diminuição da autonomia relativa do Estado frente aos interesses privados, aparecia na linguagem do MARE, como um pressuposto da eficiência do Estado.

A reforma do Estado tinha, dessa forma, a função de adaptá-lo às suas novas funções diante dos ajustes neoliberais. Em outras palavras, reduzir o

Estado em tudo aquilo que não reforce a sua função primordial que é a garantia dos interesses gerais do grande capital. Essa garantia, contudo, em tempos neoliberais já não compreende os interesses de uma burguesia nativa como prioritários. A função do poder político central em cada país passa a ser, antes, a de adaptar a burguesia interna às exigências e ao padrão de acumulação do capital financeiro internacional.

Expressa-se aqui a funcionalidade de uma intelectualidade orgânica aos setores dominantes no aparelho de Estado. A reforma do Estado visava também imprimir uma determinada visão de mundo e uma determinada linguagem ao aparelho estatal, um discurso passível de criar um determinado tipo de conformismo nas diferentes classes sociais. Trata-se de um discurso ideológico de legitimação de interesses de classe que dita quais temas e questões podem ou não entrar na ordem do dia, que estabelece o que pode ou não ser dito e debatido não só no interior do aparelho de Estado, mas no conjunto da sociedade a respeito daquilo que representa os interesses gerais da coletividade.

Ao reorganizar as prioridades e a função do Estado nacional, o neoliberalismo operava também um deslocamento ideológico de diversas categorias que impulsionaram um longo debate das forças políticas no Brasil até a década de 1980. Elimina-se qualquer dicotomia entre público e privado. Num aparente paradoxo, a ideologia neoliberal propagava a ideia de que os interesses públicos seriam melhor garantidos pela gestão privada, devido à ineficiência do Estado e das influências políticas que nele incidiam. O particular e privado passa a ser sinônimo de eficiência e neutralidade, enquanto aquilo que é estatal passa a ser visto como sinônimo de ineficiência e particularismos oriundos do “partidarismo”.

A própria eficiência da gestão pública passa a ser construída à imagem e semelhança da empresa capitalista tendo como pressupostos a racionalidade dos gastos e a maximização dos investimentos. Nesse sentido, categorias como desenvolvimento ou progresso social passam a adquirir conotação negativa. A garantia de direitos universais pelo Estado também passa ao

segundo plano do discurso governamental, já que representariam um perigoso paternalismo que intensificaria o mau uso do dinheiro público.

O conceito de reforma, tão caro ao pensamento progressista brasileiro no ciclo ideológico do desenvolvimentismo, agora passa a ser associado à adaptação do Estado aos interesses do capital financeiro internacional. Agora são os próprios setores dominantes que falam em um pacote de reformas necessárias, embora tais “reformas” em pouco ou nada alterem a correlação de forças entre as classes fundamentais.

Como dissemos, o neoliberalismo não se resume a uma ideologia de classe, mas a forma como a ideologia, o poder político, a estrutura jurídica, em suma, as superestrutura de uma sociedade adapta-se às mudanças operadas no seio da estrutura social, nas relações entre as classes fundamentais, ao padrão de acumulação da classe dominante. Dessa forma, a própria reforma do Estado e as mudanças no discurso ideológico que lhe são correspondentes transmitem para o conjunto da sociedade as mudanças exigidas pelo novo padrão de acumulação. Isso fica claro quando observamos na própria empresa capitalista as mudanças que seriam, doravante, determinantes para a adaptação do Brasil ao domínio do capital financeiro e monopolista internacional, principalmente naqueles setores em que o regime militar ainda não havia promovido sua ascensão. A adaptação do Estado era também a adaptação do capitalismo brasileiro ao processo de desindustrialização e desnacionalização que estaria por vir durante toda a década de 1990.

Isso induziu ao descontentamento de importantes setores do empresariado com o ritmo do processo de internacionalização de nossa economia, com o aumento da taxa de juros e com a consequente queda no investimento produtivo e endividamento das empresas. Isso sem falar de que a compressão da renda e do consumo, estimuladas pelo desemprego também prejudicavam setores da burguesia mais voltados para o mercado interno. Lentamente se opera, durante os anos 1990, uma mudança no seio da burguesia brasileira ocasionada por diversos fatores:

a) O processo de concentração e centralização de capitais induzido pela liberalização do comércio com a entrada de capitais estrangeiros e o processo de aquisição e fusão entre empresas; b) Os processos de privatização das empresas estatais que

favoreceram prioritariamente os grupos coligados ao capital estrangeiro;

c) As reformas voltadas a desregulamentar a economia privilegiavam o capital financeiro, que também sofre um processo de concentração e controle do capital bancário nacional pelo capital estrangeiro. Isso obrigou o capital produtivo a diversificar suas fontes de lucro investindo no setor financeiro (particularmente nos juros da dívida pública). Soma-se a isso a política de altas taxas de juros, outro fator de deslocamento dos investimentos para a especulação financeira;

Esse conjunto de fatores, somado às exigências da reestruturação produtiva, modificariam de forma drástica o perfil do empresariado ocasionando mudanças nas práticas da burguesia e uma crise de representatividade diante de seus aparelhos privados de hegemonia e sua relação com o aparelho de Estado. Com isso, muda-se o discurso preponderante entre os empresários que durou até a metade da década de 1980. Nos anos 1990 o estatismo, o nacionalismo e o intervencionismo cedem lugar à pragmática do mercado, da livre-iniciativa e do internacionalismo. Isso repercutiu na representação do empresariado destacando novas lideranças mais ligadas aos setores que melhor se adaptaram à abertura comercial e à esse processo de concentração e centralização de capitais, criando uma maior fragmentação e heterogeneidade da representação empresarial.

O primeiro sinal dessa mudança data ainda do governo Collor. Segundo a pesquisa realizada por Bianchi (2010) a disputa no interior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), entre a chapa de Carlos Eduardo Moreira Ferreira e a chapa de oposição de Emerson Kapaz para a direção da entidade em 1992, com a vitória do primeiro sobre o segundo, representava

uma importante derrota dos setores industriais mais prejudicados com o processo de abertura comercial e financeira. Ambas as chapas eram compostas por setores do grande empresariado, mas a chapa de Kapaz representava majoritariamente setores nacionais produtores de máquinas e equipamentos que haviam sido duramente atingidos pela abertura dos mercados. Além disso, embora considerasse a abertura comercial um processo natural, Kapaz era bastante crítico ao neoliberalismo em seus discursos, reivindicando a alternativa neodesenvolvimentista formulada por institutos como o IEDI e PNBE. Ferreira, por sua vez, aglutinara em sua chapa uma maioria de empresários vinculados às multinacionais e ligados ao sistema financeiro.

As eleições de 1992 para o complexo Fiesp-Ciesp mostraram a existência de divergências no interior do empresariado industrial que ultrapassaram os níveis econômico-corporativos e mostraram as dificuldades inerentes à constituição de um projeto hegemônico. No embate eleitoral predominou uma versão mais forte do neoliberalismo, mas a articulação de um projeto liberal-